Assad «é profundamente desequilibrado», diz ex-conselheiro do presidente sírio
Ayman Abdel Nour, ex-membro do partido Baas sírio e ex-conselheiro do presidente Bashar al Assad, foi um dos reformistas com quem Bashar Assad se cercou quando chegou ao poder, em 2000. Obrigado a exiliar-se alguns anos depois, descreve hoje Assad como um homem «profundamente desequilibrado, que acredita que foi escolhido por Deus». Fundador do site noticioso All4Syria, em 2003, que quebrou o monopólio do governo sobre os media, inicialmente este cristão sírio queria acreditar que o novo presidente conseguiria mudar o regime por dentro. Não demorou a desiludir-se. O acesso ao seu site, uma lufada de pluralismo dentro de um país abafado pela polícia secreta, foi cortado em 2004.
Entretanto, o jovem tecnocrata afastou-se do governo para tomar a direçcão de um projecto de ajuda europeu na Síria. No entanto, a sua liberdade de expressão e o facto de o seu site continuar acessível a partir do exterior irritaram o poder. Obrigado a exilar-se em 2007, Ayman Abdel Nour vive hoje entre o Dubai e Montreal, de onde dirige o All4Syria, que pretende ser uma fonte de informação independente sobre a revolução síria.
Numa entrevista ao jornal francês Le Monde, Ayman afirma que Bashar «é um homem profundamente desequilibrado, que acredita que os manifestantes são todos fantoches do Qatar». «Ele acha que foi escolhido por Deus para conduzir a Síria e esse impulso começou nos anos 2000, à medida que as elites políticas, militares e religiosas do país o iam exaltando», acrescenta, prevendo que «acabará como Kadhafi: Um homem escolhido por Deus não pode fugir».
Mostrou-se ainda optimista quanto ao fim do regime, partilhando a ideia do Exército Livre Sírio de que os dias de Bashar al Assad estão contados, mas sublinhou nunca perder de vista o indefectível apoio de Moscovo a Damasco. «Mesmo que o regime caia, os russos podem ajudá-lo a refugiar-se na costa, perto de Tartus e Latakia, uma região de povoamento alauíta (uma seita dissidente do xiismo, de onde saiu o clã no poder) onde Al Assad poderia criar um mini-Estado.
Sobre a situação em Damasco, Nour disse que a destruição que o presidente sírio causou nos bairros de Midan ou de Mezzeh, onde arrasou parques alegando que rebeldes estariam ali a esconder-se, «enojaram a população».
«A famosa maioria silenciosa, que a propaganda do regime tinha encoberto com medo da revolução, está a abrir os olhos, entendeu que o regime está disposto a arrasar Damasco para salvar a cabeça», considerou. «Recentemente tive contactos com algumas das mais importantes famílias da burguesia sunita, os Shakhashero, Al-Azem, Al-Aidi e Sorbaji. Elas já não querem mais ouvir falar em Bashar. Algumas foram-se embora para Beirute», acrescentou.
Questionado pelo Le Monde sobre o papel da diplomacia, Nour disse não querer mais essa «diplomacia receosa», que atribui a «sua impotência à Rússia».
«Foi assim que nos vemos a correr o risco de encontrar um país cortado em três, com um reduto alauíta, um Estado curdo e um Estado sunita. A unidade da Síria está ameaçada. E não só por Bashar e os seus acólitos. As potências ocidentais estão a ter um papel nefasto», frisou.
Ayman Abdel Nour defendeu que os países ocidentais devem permitir que o Exército Livre Sírio (ELS) se muna de armas realmente eficientes. «Ele está a começar a equipar-se com lança-foguetes antitanques, mas são modelos antigos, que só funcionam contra os tanques mais antigos do exército sírio. Precisamos também de lança-foguetes terra-ar, contra os helicópteros. Sei que os ocidentais temem que essas armas caiam em mãos erradas ou que elas alimentem acertos de contas após a queda do regime. Mas estão errados. Não haverá vazio de poder. Estaremos prontos», garantiu.
Lusa