REVISTA PRAÇA VELHA /REVISTA CULTURAL DO CONCELHO DA GUARDA/DEZEMBRO 2007
Eis um dos cerca de vinte artigos publicados:
OLIVENÇA : UM COLONIALISMO ESQUECIDO
Carlos Eduardo da Cruz Luna/ Rua General Humberto Delgado, 22, r/c 7100-123-ESTREMOZ
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caedlu@gmail.com(Olivença: Duzentos Anos de Ocupação: 1801-2001)
Universidade Lusíada de Lisboa
17, 18 e 19 de Maio de 2001
OLIVENÇA: UM COLONIALISMO ESQUECIDO
Em 27 de Fevereiro de 1801, a Espanha, com o apoio francês, declarava Guerra a Portugal. Logo em 20 de Maio, Olivença capitulava, sem combate, enquanto Campo Maior resistiu com bravura dezoito dias, e Elvas não se entregou. Em 6 de Junho de 1801, portanto após pouco mais de um mês de Guerra, era assinada em Badajoz a paz, que punha termo à ironicamente chamada Guerra das Laranjas, nome que lhe foi dado em virtude do Primeiro Ministro Espanhol, Manuel Godoy, ter enviado para Madrid alguns ramos de laranjeiras ... que foi tudo o que conseguiu arrebatar nos arredores de Elvas !
Nascia assim,. Há duzentos anos, a Questão de Olivença.
O Tratado de Badajoz, de que os Historiadores espanhóis só costumam citar o Artigo 3º, desde logo foi violado por falta de concordância da França e, igualmente, porque, prevendo a cedência de Olivença e do seu Termo, não contemplava a entrega da aldeia de Vila Real a Espanha, apesar desta se situar na margem esquerda do Guadiana, por esta pertencer ao Conselho de Juromenha. E, contudo, foi o que se verificou.
Contavam muitos oliventinos e portugueses em geral que, à semelhança de Guerras anteriores, tudo voltasse à situação anterior. Enganavam-se, desta vez...
Entre 1801 e 1807, pouco há a registar... salvo, em 1805, a adopção do castelhano como língua na Câmara de Olivença... o que levou à demissão do vereador Vicente Vieira Valério, que, segundo a tradição, morreria na penúria por se negar a abandonar o uso do Português. Perante alguns protestos populares, ocorridos nomeadamente em 1805, Godoy prometeu ir meditar sobre o destino final de Olivença. Não o fez.
O ano de 1807, com a invasão franco-espanhola de Portugal e a violação do preâmbulo e do Artigo 4º do Tratado de Badajoz, restituiu legalmente Olivença a Portugal. Os liberais espanhóis, 1810, dispuseram-se a fazê-lo, em Tratado não ratificado.
Em 15 de Abril de 1811, tropas luso-britânicas expulsaram os franceses de Olivença. Todavia, Wellesley mandou devolvê-la a Espanha, comprometendo-se a ajudar Portugal a recuperá-la em futuras negociações.
O Tratado de paris de 1814 declarou nulo o Tratado de Badajoz, mas sem resultados práticos. Em 9 de Junho de 1815, em Viena de Áustria, e em, resposta a um memorando português, era assinado um Artigo (o 105) em que se reconhecia a pretensão portuguesa. Note-se que este artigo só pode ser totalmente compreendido em função do Memorando português, que quase nunca é citado e muito menos transcrito .
O governo espanhol só em 1817 (7 de Maio) aceitou sem reservas a Acta Final de Viena, mas ainda assim, não abandonou a região de Olivença. E, em 1818, tentou criar uma manobra de diversão, argumentando com a ocupação de Montevideu pelo Brasil. Elaboram-se alguns projectos de tratados, nunca ratificados e, portanto, sem valor. Em 1820, a força espanhola destinada a seguir para o Uruguay rebelou-se.... e derrubou o Governo Absolutista espanhol. Montevideu tornar-se-ia, em 1828, a capital dum estado independente.
As diligências portuguesas no sentido de recuperar Olivença chocavam-se sempre com o silêncio de Madrid. Algumas excepções houve, como o chefe de Governo Mendizabal, em 1835. Todavia, no mesmo ano era apeado do cargo !
Enquanto isso, em Olivença vivia-se alguma incerteza. Alguns locais foram-se acomodando ao Poder. Outros refugiavam-se em Portugal. Outros ainda mantiveram-se na expectativa.
Com um cinismo e uma sinceridade desconcertantes, encontravam-se no Arquivo Municipal de Olivença instruções bem claras visando a imposição, pela força de uma política, de uma educação, e de uma orientação económica, espanholas, visando a ruptura violenta com a tradição lusa. Foram as medidas de carácter económico as que mais minaram a moral portuguesa dos oliventinos, já que, em 26 de Janeiro de 1805, suspende-se o uso da moeda portuguesa em Olivença, e comunica-se a vários ofícios, nomeadamente aos aguadeiros, a obrigatoriedade de usar medidas espanholas (comprimento, peso, volume) .
No que se refere à educação, a vinte d fevereiro de 1805, decide-se suprimir toda e qualquer escola portuguesa, bem como, logicamente, o ensino do Português. Nesse mesmo ano de 1805, recorde-se, em 14 de Agosto, as actas da Câmara Municipal deixam de ser escritas em Português. Um pouco antes, em 1802-1803, Olivença, em termos religiosos, passava da jurisdição de Elvas para Badajoz.
Nomeadamente no campo do ensino, regista-se a oposição dos oliventinos a estas medidas. As Escolas privadas continuam a ensinar Português, até que são fechada a 19 de Maio de 1813, “com o objectivo de evitar qualquer sentimento patriótico lusitano” (A.M.O.leg/Carp 7/2-18, 19-05-1813, nº 1324).
Eram, todavia, muitos os oliventinos que queriam que os seus filhos fossem educados na língua materna, tentando encontrar professores particulares para tal, o que obrigou o “Ayuntamiento” a tomar medidas restritivas,... “proibindo-se as aulas particulares sob pena de multa de 20 Ducados” (A.M.O. leg/Carp 8%1-171,7-10-1820, nº 1704) , ou impondo, uma e outra vez, a absoluta obrigatoriedade de ensinar em Espanhol e não em português
Era crença geral em Olivença, em 1801 e anos seguintes, que, tal como se passara no final da Guerra da restauração (1668), com a normalização da vida política, social, e económica, e feita a Paz geral na Europa, o território voltaria para Portugal .
De qualquer forma a Tradição Lusitana manteve-se entre as gentes que, apesar das proibições, continuavam a usar os pesos e as medidas portuguesas, bem como as suas relações com Portugal, sobretudo no momento de importar cereais e outros produtos, e ainda no uso de impostos tradicionais (“Terça”; “Impozição”, etc.)
O tempo ia passando. E, por motivos vários (crises, guerras, lealdade nacional), vários oliventinos foram emigrando, principalmente a partir de 1815. Foi um movimento mais selectivo que massivo . De qualquer forma, só a partir da Segunda Metade do Século XIX se regista um ligeiro crescimento demográfico em Olivença. É também nesta época que se acentua a chegada em maior número de família procedentes do Norte de Espanha (principalmente de La Rioja, região de Camero), da Extremadura Espanhola, e até alguns portugueses, interessados na exploração de Grandes Propriedades , o que contribuiu para ir alterando a composição “étnica” da região.
Em 1840, o uso da Língua Portuguesa é proibido em todos os lugares de Olivença, incluindo as Igrejas. E, procurando dividir para reinar, o Estado espanhol dá a São Jorge de Alôr o estatuto de Concelho independente (1843). Perdê-lo-ia em 1862, enquanto Táliga (ou Talega), emancipada em 1850, não mais seria reintegrada em Olivença, passando a partir de 1871 a ter registos totalmente separados e próprios.
Algumas das pessoas vindas para Olivença no século XIX tiveram importância em Trabalhos Históricos de relevo sobre a “terra das oliveiras”. Cite-se, como exemplo, Victoriano Parra Garcia (Cádiz, 23-03-1808; Olivença, 07-02-1869), que, em 1844, escreveu “Ensayo sobre la topografia e História de la plaza de Olivenza”, publicada em 1909 somente, este trabalho contém muitos dados de interesse, historicamente correctos. Naturalmente pró-espanhol, Victoriano Parra conseguiu escrever um texto de inegável valor .
O ano de 1855 veria grandes mudanças na posse da terra. As leis de desamortização alteraram de vez a realidade. Forasteiros castelhanos, riojanos, e leoneses, e mesmo três família portuguesas, chamaram a sii imensas propriedades, abandonadas, vendidas, ou expropriadas, algumas desde logo a partir de 1801. Também se sucederam os matrimónios de recém-chegados com a população local. E, contudo, quem pouco beneficiou foi o trabalhador oliventino, que sem terra continuou .
A Rainha Isabel II, entretanto, concederia em 1858 o Título de Cidade a Olivença. Em 1868, num gesto popular, ofereceu uma túnica para cobrir a Estátua do Senhor dos Passos à qual os oliventinos manifestavam tradicionalmente grande devoção. Esse ano, todavia, assistiria ao Pronunciamento de Cádiz (30 de Setembro), cujos reflexos em Olivença se traduziram na destruição do Arquivo Municipal, perdendo-se importante documentação da Época pré-espanhola .
Antes, em 1864, a Comissão de Limites Hispano-portuguesa não logrou colocar delimitações internacionais no troço do Guadiana diante de Olivença, por a parte portuguesa não o consentir, atitude que se repetiria em 1923 e 1952... continuando a não existir hoje em dia fronteira legal na Região.
Entre 1820 e 1895, teve a sua existência um Professor destinado a desempenhar um importante papel na castelhanização de Olivença: Francisco Ortiz López. Descendente de espanhóis de Valverde de Leganés e homem de indiscutível cultura, dedicou-se a alfabetizar o povo oliventino, tendo todavia o cuidado de o fazer só e arrogantemente em castelhano. Combateu denodadamente a língua portuguesa, criando com isso o incrível paradoxo de a instrução popular em Olivença corresponder a uma acentuação duma situação colonial . Mais, os conflitos de geração tornaram-se muito importantes. Os jovens escolarizados, falando castelhano e tendo aprendido como sua a História de Espanha, defrontavam-se com as suas famílias, falando uma língua considerada inferior, incorrecta em termos sociais, nada útil, antes pelo contrário, em termos profissionais, por outro lado, as referências históricas, orais e difusas, da população, perdiam solidez perante o Ensino organizado da História do Ocupante... pa
ra já não falar nas falsidades históricas que, consciente ou inconscientemente, iam sendo divulgadas!
Ainda no século XIX, era evidente que o Estado Espanhol jogava com o factor tempo. Quando Lisboa referia a Questão de Olivença, chegando a falar-se (até cerca de 1930) em plebiscito, Madrid não respondia ou ostensivamente ignorava a existência de um diferendo. Assim foi em 1903, quando, em Vila Viçosa, num encontro entre os Soberanos Ibéricos, se falou no problema, bem como da possibilidade da Reconstrução da Ponte da Ajuda sobre o Guadiana.
Em 1910, o Presidente Teófilo Braga respondeu a insinuações espanholas sobre o reconhecimento da legitimidade espanhola (em troca, consta, do reconhecimento do Regime Republicano por Madrid) com ironia, propondo a anulação do Tratado de Alcañices de 1297 e o regresso, por exemplo, de Aroche e Aracena à posse portuguesa. O episódio é muito referido, mas deve-se ter algum cuidado, pois não está documentado, em aceitá-lo, sem reservas, como verídico.
Na assinatura da Paz de Versalhes, em 1919, Olivança esteve presente, já que a delegação portuguesa, presidida por Afonso Costa, tentou incluir a questão de Olivença, em vão, no texto do Tratado .
Acrescente-se que chegou a Olivença a notícia das diligências portuguesas em 1919. alguns intelectuais oliventinos pronunciaram-se com entusiasmo perante a acção da Delegação Portuguesa. Logo as autoridades oliventinas, preocupadas, produziram um texto que, não respeitando minimamente os factos históricos, circulou como abaixo-assinado . A burguesia espanhola ou espanholizada, bem apoiada pelas autoridades, esforçou-se por conseguir o máximo de assinaturas.
Em 15 de Abril de 1880 nascera, em Badajoz, Jesús Rincón Giménez. Filho adoptivo de Olivença, escreveu duas obras de indiscutível valor sobre a cidade (Memorial Oliventino, 1916; Menudenciais históricas de la Muy Noble, Notable y siempre Leal Ciudad de Olivenza, 1920), sendo, depois de Victariaça, numa visão que, não sendo imparcial, não deixa de ter méritos, pelos cuidados e tentativa de rigor científico. Faleceu em 1937 .
Em Portugal, refugiara-se o oliventino Ventura Ledesma Abrantes (1883-1956), homem que, em vida, encarnou o ideal de reintegração daquela parcela de território em Portugal. Chegado a Lisboa, tudo o indica, em 1903, para não cumprir serviço militar em Espanha, integrou-se na vida intelectual portuguesa, e, para além de ser o fundador do Grupo de Amigos de Olivença (1945) que não foi o Grupo Conservador que alguns julgam, esteve ligado, à primeira Feira do Livro de Lisboa.
Sabe-se que no início do Século XX existia em Olivença um grupo pró português, com homens como Manuel Gonçalves Verão, Firmino Martins Rui, Manuel Justo Gonçalves, António Ramos, e Francisco Lemos, entre outros.
A castelhanização de Olivença prosseguia. A Guerra Civil de Espanha (1936-1939) veio acelerar o processo. Muitos oliventinos içaram bandeiras portuguesas nas suas casas, mas Salazar nada fez por eles. Apenas a G.N.R. tinha ordens de deixar ficar em Portugal refugiados da Guerra que provassem ser oliventinos. Quando regressaram a Olivença (1939-1940), foram vítimas da Repressão Franquista... que, no seu caso, apenas chegou com três ou quatro anos de atraso.
Refira-se ainda que, em 1938, o Coronel Rodrigo Botelho se propusera avançar com tropas de Elvas sobre Olivença, sendo disso impedido por ordem de Salazar.
A atitude portuguesa de então, de nem sequer se aproveitarem as semelhanças entre os Regimes de Franco e Salazar, para já não falar do triste apoio deste ao ditador espanhol, foi muito sentida em Olivença, cuja população, agora mais reprimida, se sentiu abandonada.
O Franquismo continuou as tendências anteriores, dando-lhes um carácter mais repressivo e eficaz. É significativo, e vem na sequência de intenções e procedimentos anteriores, que o diplomata Franquista José Ibañez-Martín escrevesse, em 16 de Setembro de 1959, no final de uma informação para Madrid: (...) “a nossa preocupação no interior da Espanha deve ser, como é de facto, cuidar ao máximo da Cidade de Olivença para que ninguém possa objectar no sentido de que, se fosse portuguesa, estaria melhor cuidada, e, no que respeita ao interior de Portugal, ESPERAR QUE O TEMPO VÁ, A POUCO E POUCO, VARRENDO O QUE RELAMENTE NÃO É OUTRA COISA SENÃO UM PROBLEMA ARTIFICIAL .
Alguns dos oliventinos que defendiam Portugal tiveram problemas. Manuel Gonçalves Verão acabou por vir para Portugal, e outros o fizeram também, sendo quase sempre ajudados por Ventura Ledesma Abrantes. Os que ficaram, tiveram de se calar. Um deles, Francisco Lemos, ceramista, imitador da cerâmica “vegetalista” das Caldas da Rainha, foi “chamado” a Madrid na década de 1950, falecendo, amargurado e silenciado, em 16 de Setembro de 1963, em Olivença.
Não é por acaso que aumenta na época o número de oliventinos que se refugiaram em Portugal, principalmente na zona raiana e em Lisboa.
A pressão franquista, mais ou menos constante, recorria tanto às ameaças como ao desprezo.
O Português foi considerado a Língua dos inclusos, um “chaporreo” (“patois”) anacrónico... que mais não era que o Português Alentejano. O prestígio e o status social predominante estavam nas mãos de quem se exprimia bem em “espanhol”. Os apelidos, os nomes das ruas, dos lugares, das localidades, tudo foi profundamente castelhanizado. A História, completamente esquecida, falsificada, proibida.
Tornou-se comum, em Olivença, haver gente a falar português entre si, mas a falar só em castelhano para os filhos... e até a proibirem estes de se expressarem em Português!
Salazar, tão chegado a Franco, nada fez para influenciar o Ditador Espanhol. Tolerava o Grupo de Amigos de Olivença, mas nunca o deixou legalizar-se. Permitiu mesmo que a Espanha proibisse, a partir de 1954, a deslocação de crianças de Olivença à Colónia Balnear Infantil d’O Século. Nada disse quando, em 1960 foi proibido aos portugueses tirar fotografias a oliventinos. Apenas se negou, sempre, a reconhecer a posse do território por Madrid.
Os relatos da polícia Política Espanhola dessa época surpreenderam os estudiosos . Por exemplo, o grupo de Amigos de Olivença é classificado como maçónico, sob influência inglesa, e liberal. Chega-se a identificá-lo como próximo do partido Comunista Português . E sem dúvida que o seu presidente à data do 25 de Abril de 1974, o Professor Hernâni Cidade, não era de forma nenhuma afecto a Salazar. Curiosamente, após 1975, vários círculos espanhóis passam a classificar o Grupo como... Salazarista!
Também o General Humberto Delgado esteve ligado ao Grupo de Amigos de Olivença. É mesmo possível que tenha sido atraído ao local do seu assassinato na Ribeira de Olivença (e não, como costuma pensar-se, em Villanueva del Fresno) com uma qualquer promessa de insurreição a planear em Olivença. Note-se que, ainda na década de 1970, era impossível encontrar professores, polícias, funcionários vários, em Olivença... que tivessem nascido na cidade!
A Democracia em Espanha aliviou a pressão sobre as gentes de Olivença.
Todavia, o processo de espanholização não foi verdadeiramente posto em causa. Não foi publicada nenhuma obra com a versão integral dos tratados de 1801-17. A população não começou a aprender a sua História, antes continuou a saber apenas a História de Espanha. Não foram substancialmente alterados topónimos ou apelidos, que mantiveram as formas castelhanizadas. O Português, ensinado como uma Língua Estrangeira muito especial, não se tornou língua, no mínimo, co-oficial, e só desde 1999-2000 o seu ensino se generalizou ( com excepção de Táliga). E de forma nenhuma se procurou contrariar, na fundamental, os traumas psicológicos, as inibições, e os preconceitos criados.
O oliventino continua a seu alguém muito dividido. Por um lado, depois de duzentos anos, as suas referências são quase só espanholas. Por outro lado, os seus apelidos, a presença monumental portuguesa, a reacção que vê os espanhóis das localidades vizinhas ter perante as suas afirmações de “espanholidade”, algumas vagas tradições colectivas e familiares que não sabe explicar, fazem-no sentir-se de alguma forma diferente, reagindo, todavia, muitas vezes, como foi ensinado: com um nacionalismo espanhol agressivo e não fundamentado, facilitado pelo facto de o nível de vida espanhol ser, actualmente, um pouco superior ao português.
Note-se que este drama foi muito bem equacionado, poeticamente, por um autor local, em 1989 (Narciso de la Torre-Velver y Banco), um descendente de agentes de La Rioja, que, tal como a maioria dos outros, se integrou perfeitamente na realidade oliventina, cantando-lhe a “alma” com discernimento:
DOS LEALTADES
“A Mui Nobre, Notável e sempre leal vila de Olivença”
Olivenza, ciudad noble
reducto de dos alientos
silencio de dos verdades
para un solo sufrimento
Olivenza, por notable,
te dueles en monumentos
que amurallan dos mitades
de un único desaliento.
Hija de dos voluntades
y esposa de un rompimiento,
Olivenza, dos lealtades
desgarron tu sentimiento.
Ninguém informa também o oliventino de que não se pretende agredi-lo, já que uma reintegração em Portugal respeitaria os seus níveis de vida e privilégios administrativos. Por outro lado, diz-se-lhe que não é Portugal que reclama Olivença, mas sim alguns grupos de “loucos”.
Na verdade, o Estado Português não abdicou de Olivença. Ainda recentemente ( 11 de Novembro de 2000) foi inaugurada uma Nova Ponte da Ajuda sobre o Guadiana, feita exclusivamente por intermédio do estado Português, e que não é uma Ponte Internacional... o que é no mínimo insólito, pois, oficialmente, e Estado Espanhol finge ignorar a situação... e o Estado Português não tenta levar esta posição de relativa força mais além, às Nações Unidas, por exemplo, como faz Madrid em relação a Gibraltar!
Por outro lado, as autoridades espanholas estão a tentar que seja Madrid a restaurar a Velha Ponte Manuelina da Ajuda, de forma a contrariar o efeito do impacto diplomático que teve a construção portuguesa da Nova. Espera-se que as autoridades portuguesas estejam atentas.
Entretanto, Madrid prossegue na orientação que data do Século XIX. José Maria Aznar, em entrevista no Diário de Notícias de 28 de Janeiro de 2001, e depois de reclamar com vemência Gibraltar (pág.

, declarava, a propósito da Questão de Olivença, “uma maneira de solucionar os problemas é deixar sempre a solução para o ano que vem... Portugal não é um problema para Espanha, e gostaria que o inverso também fosse verdade. É certo que são precisas muitas décadas para mudar as mentalidades, e poderemos aproveitar a Europa para resolver problemas como estes (pág. 9)”. Até que ponto terá significado histórico tal declaração é discutível, mas não pode deixar de se reparar como ela se assemelha às palavras de José Ibañez-Martin de 16 de Setembro, de 1959, e já referidas (...”... esperar que o tempo vá, a pouco e pouco, varrendo o que realmente não é outra coisa senão um problema artificial”). Pelo menos, esta foi uma das poucas vezes em que um chefe de Estado Espanhol falou do assunto!
É urgente que não mais se faça silêncio sobre a Questão de Olivença, e que este colonialismo esquecido seja, pelo menos, colocado ao mesmo nível das ainda muitas situações coloniais que quase diariamente são denunciadas um pouco por todo o mundo.
Após Duzentos Anos de Aculturação Forçada, que em muitos dos seus aspectos se mantém, não é possível manter o silêncio por mais tempo!
Estremoz, 13 de Maio de 2001
Carlos Eduardo da Cruz Luna
