As opções dos EUA em relação ao Irão
Alexandre Reis Rodrigues
Teerão continua determinado em resistir às pressões internacionais e a não dar qualquer sinal de interesse em resolver a questão que o seu programa nuclear levantou. Conta, a seu favor, com a falta de consenso internacional sobre o que fazer para alterar a sua postura e com vários elementos fortes de dissuasão de qualquer acção militar, em especial, uma rede de grupos militantes que apoia, arma (geralmente, de forma indirecta através de aquisições na Coreia do Norte) e controla. Esta rede proporciona-lhe vários níveis de retaliação em caso de sofrer um ataque (Hezbollah, Hamas, são apenas os grupos mais conhecidos mas há diversos outros incluindo sunitas e curdos, ligações no Paquistão, no Iémen, etc.).
A contestação interna e a onda de instabilidade que o Governo enfrenta, desde a fraude eleitoral de Junho, embora louváveis na sua dimensão de luta por direitos fundamentais, apenas vieram complicar as expectativas de sucesso que a política de Obama de abertura ao diálogo e procura de uma solução pacífica criou inicialmente. O Governo não vai negociar qualquer aspecto do seu programa nuclear com o exterior enquanto se sentir acossado internamente por uma facção rival que quer sobretudo recuperar os seus privilégios e que, não tendo qualquer discordância de fundo sobre as ambições nucleares do país, até já aproveitou um breve sinal de cedência do Governo para o acusar de que está a deixar-se instrumentalizar pelo Ocidente!
Obama já terá concluído que a sua política de boa vontade, embora muito saudada na Europa por contraposição à postura agressiva de Bush, também não vai levar a qualquer saída útil. Em Janeiro ficou perante o primeiro embaraço de não ver atendida a data limite que tinha imposto a Teerão para dar uma resposta à proposta de um acordo, subscrito por Moscovo, sobre o enriquecimento de urânio no exterior do país. Parece agora começar a inclinar-se para uma postura mais dura, ameaçando com medidas que, no recente discurso da União, caracterizou como sendo de “growing consequences”.
Embora não tenha identificado essas medidas, sabe-se que se está a referir-se a sanções mais penalizantes, indo assim ao encontro dos que reclamam medidas de coacção fortes. É com esse propósito que a Câmara de Representantes aprovou recentemente uma lei que sancionará as companhias que vendam produtos refinados ao Irão (Iran Refined Petroleum Sanctions Act). No entanto, as perspectivas do impacto que essas iniciativas poderão ter no propósito de moderação do regime, mesmo considerando a situação de fragilidade em que o Governo iraniano se encontra presentemente, são, em qualquer caso, modestas. É a conclusão que ressalta da análise de três décadas de imposição de sanções crescentemente restritivas por parte dos EUA contra a República Islâmica.
Sanções económicas ou comerciais exigem solidariedade internacional; a da Rússia, geralmente considerada como decisiva, parece agora estar mais acessível do que em qualquer altura antes, dado o descontentamento que provocou a recusa iraniana do acordo de enriquecimento de urânio que Moscovo apoiava. A da Alemanha, também importante dado o volume de transacções comerciais entre os dois países, nunca esteve tão firme como agora, presumivelmente devido a pressão americana (bancos alemães sob o risco de terem que pagar mil milhões de dólares em multas por terem apoiado negócios com o Irão) e israelita (uma relação politicamente importante para Berlim).
Não fosse a China, o ambiente seria, de facto, muito mais favorável à imposição de sanções. Mas não é, porque Pequim está a aproveitar o vazio resultante da proibição imposta às companhias petrolíferas ocidentais de fazerem negócios com Teerão para robustecer os seus laços comerciais. Em 2008, importou mais de 40000 barris de petróleo por dia e em 2009 fez acordos comerciais e de investimento no montante de 17 mil milhões de dólares. A posição chinesa não é susceptível de mudar a curto prazo por duas razões: fidelidade aos princípios de não interferência externa que, como se sabe, reflectem principalmente preocupações internas quanto a eventuais intromissões do exterior nas questões da Formosa, Tibete, etc.; recusa em assumir uma posição de liderança global que poderia prejudicar a necessidade de se manter concentrada da protecção dos seus próprios interesses. Nesta perspectiva, o Irão não constitui um problema em que a China se queira envolver nem muito menos considera ser uma ameaça.
Mal grado a esperança que a instabilidade interna no Irão tem gerado sobre a possibilidade de uma mudança de regime, uma outra revolução é um desfecho altamente improvável. Será, por isso, erro crasso esperar que a dinâmica da situação interna, incluindo a pressão dos jovens, acabe por resolver o problema. Mesmo com mudanças no topo da hierarquia iraniana, para ajustamento à evolução da situação, não é de esperar uma política regional diferente, muito menos qualquer alteração de fundo ao programa nuclear.
Que caminho deverão então os EUA tomar nestas circunstâncias? Continuar a tentar captar o apoio internacional para sanções mais duras mesmo sabendo que estão esgotadas as cedências que poderiam ser feitas para conquistar a adesão da Rússia e da China? Continuar pacientemente a insistir com negociações mesmo não estando à vista qualquer indício de que Teerão abandonará a táctica de combinar avanços e recuos em função da pressão exercida pela comunidade internacional? Avançar com a opção militar que algumas correntes de opinião consideram ser a única forma de deter o Irão, apesar das dificuldades práticas da tarefa e das possibilidades de retaliação do Irão?
Sem nenhum caminho a destacar-se como o mais apropriado e com mais hipóteses de sucesso, os EUA continuarão a apostar nas duas primeiras linhas de acção mas precisarão de, paralelamente, começar a dar sinais concretos de que não permitirão que a hegemonia regional que o Irão procura alguma vez possa pôr em causa a segurança de Israel e dos países do Golfo. É o que, aliás, já iniciaram com algumas iniciativas que melhorarão o dispositivo de defesa anti-míssil na área, incluindo a instalação de baterias de mísseis Patriot de defesa anti-míssil no Kuwait, nos Emiratos Árabes Unidos, no Bahrain e no Qatar (estão previstas oito) e a presença de cruzadores de defesa aérea de área já equipados para integrarem o escudo de defesa contra mísseis balísticos.
Jornal Defesa