Orgulho de Ser Português

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HSMW

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« Responder #195 em: Novembro 12, 2008, 06:29:54 pm »
Citação de: "tyr"
introduzimos uma arma que fez com que a guerra permanente em que vivia o japão terminasse passado pouco tempo.

 :?
https://www.youtube.com/user/HSMW/videos

"Tudo pela Nação, nada contra a Nação."
 

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tyr

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« Responder #196 em: Novembro 13, 2008, 01:09:36 pm »
a introdução foi  a medio prazo tão benefica para o japão, que ainda hoje o festejam.

antes haviam batalhas em que duas facções de 1000 samurais tinhamcada uma 400 baixas, com a introdução da espingarda esta proporção passou a ser 100 baixas para os detentores de arcabuzes e 700 para os que não a detinham (obviamente os valores são hipotéticos e exemplificativos). Isto resultou que gradualmente as dezenas de daimios foram sendo derrotados ou tornados vassalos de um só que se tornou Shogum e trousse seculos de paz e estabilidade ao japão (após seculos de guerra constante).
A morte só é terrivel para quem a teme!!
 

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TOMSK

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« Responder #197 em: Novembro 14, 2008, 06:17:47 pm »
Duarte Pacheco, o defensor de Cochim, tão extraodinário português que o próprio navio onde embarcasse sentiria logo o peso da sua glória, cavando mais fundo as águas do fundo mar...



Batalha Naval do Passo de Cambalão - Abril de 1504

Aqui se contará como Duarte Pacheco e pouco mais de cinco navios portugueses enfrenteram a poderosa armada do Samorim, com mais de cem navios...

Durante a primeira guerra de Cochim, em 1503, tinham-se passado para o Samorim de Calicut dois italianos, idos à Índia nas naus portuguesas a mandado de Veneza, com o propósito de ensinarem os Malabares a fabricar artilharia e a servirem-se dela contra nós. Por outro lado, os Turcos tinham fornecido ao Samorim grande quantidade de canhões e espingardas. Por tudo isso, quando ele, em 1504, voltou a invadir o reino de Cochim, após a partida para Portugal de Francisco e Afonso de Albuquerque, dispunha de um exército e de uma armada muito melhor equipados que os do ano anterior.

Incluindo as tropas de quatro reis seus vassalos, o exército do Samorirn ascendia a mais de oitenta e quatro mil homens. A sua armada era composta por cerca de cem paraus, cada um deles armado com duas bombardas e cinco espingardas, cerca de cem tones com uma bombarda cada um e grande número de catures (navios ligeiros).
A concentração destas forças foi efectuada em Cranganor, donde partiram nos primeiros dias de Abril em direcção a Cochim, indo a armada pelos rios e esteiros que ligam as duas cidades, não só por ser já difícil, naquele mês, a viagem por mar, mas também por causa da fortaleza e da nau que defendiam a barra de Cochim.




Para enfrentar o enorme potencial bélico do Samorim, dispunha Duarte Pacheco Pereira somente de uma nau, em que deixou o mestre por capitão com mais vinte e quatro homens, duas caravelas com vinte e cinco homens cada uma e dois batéis artilhados, um dos quais capitaneado por ele próprio, guarnecidos cada um com vinte soldados. Na feitoria, estava o feitor, fazendo também as vezes de alcaide, com mais trinta e oito homens! A inferioridade das forças portuguesas em relação às do Samorim era de um para quinhentos em homens e de um para sessenta em navios!

Quando a invasão de Cochim se tornou iminente, Duarte Pacheco mandou construir uma forte paliçada diante do vau que na maré baixa dava passagem para a quase ilha em que estava construída a cidade. Além disso, mandou reforçar a protecção das caravelas e dos batéis com paveses feitos de tábuas da grossura de dois dedos e com arrombadas constituídas por sacos cheios com algodão, pendurados fora da borda, destinados a amortecer o impacto dos pelouros inimigos. Mandou também armar cada batel com quatro berços.



Apesar de todos estes preparativos, a população de Cochim e o próprio rei andavam muito descoroçoados por ver que as nossas forças eram insignificantes comparadas com as do Samorim. Para os animar, Duarte Pacheco efectuou vários assaltos de surpresa contra as terras de Cochim que se haviam passado para o lado do invasor, queimando-lhes muitas aldeias e matando-lhes muitos naires.
Sabendo então que o exército e armada do Samorim se estavam dirigindo para o passo de Cambalão (que hoje é muito difícil de saber exactamente onde ficava situado), resolveu ir esperá-los aí, levando consigo apenas uma caravela e os dois batéis, já que a nau, devido ao seu calado, não podia navegar nos rios e esteiros e a outra caravela ainda não tinha concluído a reparação das avarias que sofrera na guerra do ano anterior.

Chegado ao local, onde o rio teria cerca de cem metros de largura, fundeou os seus três navios com fortes amarras de ferro, para que o inimigo as não pudesse cortar facilmente, e mandou passar rejeiras de uns para os outros para, alando por elas, poderem orientar à vontade a direcção dos seus canhões.

Ao amanhecer do dia 16 de Abril apareceu a margem norte coberta de soldados que atroavam os ares com os seus gritos e o toque de inúmeros instrumentos bélicos. À borda de água tinha sido montada durante a noite, sob a direcção dos dois italianos, uma bateria de cinco canhões que começou logo a bombardear a caravela. Respondeu esta acto continuo e fê-lo tão eficazmente que a guarnição da bateria se pôs em fuga.

Nessa altura começou a despontar, detrás de uma curva do rio, a imensa armada de Calicut. À sua vista, alguns paraus de Cochim que tinham ido em companhia de Duarte Pacheco fugiram para aquela cidade, onde espalharam a notícia de que os portugueses estavam perdidos!




A verdade é que, sob o ponto de vista táctico, a escolha do local fora excelente. Devido à pouca largura do rio naquele ponto, os paraus inimigos só podiam avançar numa frente estreita. Por isso, os nossos navios só tinham que combater de cada vez com pouco mais de uma dezena. Por outro lado, devido à falta de espaço para manobrar, os que eram obrigados a retirar, destroçados e cheios de mortos e feridos, embaraçavam e desmoralizavam os que vinham atrás.
Não obstante, parecia milagre como três navios minúsculos iam conseguindo deter aquela mole imensa que avançava contra eles e que parecia submergi-los.

Primeiro, vieram vinte paraus, amarrados uns aos outros, disparando continuamente as suas quarenta bombardas e as suas cem espingardas, acompanhadas do arremesso de milhares de flechas. Mas os paveses e as arrombadas dos nossos navios funcionaram às mil maravilhas, aguentando bem o impacto dos pelouros, das balas e das flechas, enquanto os bombardeiros e espingardeiros portugueses chacinavam as guarnições dos paraus inimigos que não dispunham de qualquer espécie de protecção.

Ao fim de pouco tempo, dos vinte paraus que tinham iniciado o ataque, quatro já estavam meio alagados, cheios de mortos e feridos e incapazes de manobrar; os restantes, também com avarias diversas, mortos e feridos, viram-se obrigados a retirar. Mas foram logo substituídos por outro grupo de cerca de uma dezena de unidades que não teve melhor sorte. E, depois, veio outro grupo, e outro, e outro... Mas o resultado era sempre o mesmo: após algum tempo de duelo de artilharia com a nossa caravela e os nossos batéis, os paraus do Samorim eram obrigados a bater em retirada com muitas avarias e cheios de mortos e feridos.
Pelo meio-dia, estando já a água do rio tinta de sangue, a armada de Calicut cessou os seus ataques e bateu em retirada. Ao mesmo tempo, as tropas de terra que durante a batalha não tinham parado de lançar flechas sobre os nossos navios, afastaram-se também para fora do alcance da sua artilharia.

Nesta primeira batalha, conforme veio a saber-se mais tarde, teve a armada de Calícut para cima de mil e trezentos mortos. Dos portugueses não morreu nem ficou ferido nenhum! Abençoados paveses e arrombadas!

Poucos dias depois desta primeira batalha, veio juntar-se à flotilha de Duarte Pacheco a caravela que ficara em Cochim a acabar as reparações.
Vexado com a derrota sofrida, o Samorim resolveu fazer segunda tentativa no domingo seguinte, que era Domingo de Páscoa, começando por enviar sessenta paraus, por outro rio, contra a nau que estava em Cochim na esperança de que Duarte Pacheco fosse imediatamente em seu auxílio, deixando livre o passo de Cambalão.

Daí resultou que, cerca das nove horas, chegou uma embarcação com com um recado do rei de Cochim para Duarte Pacheco pedindo-lhe que fosse ajudar a sua nau que estava em apuros. Mas este não se deixou impressionar. No entanto, como a maré estava a vazar, resolveu ir com uma caravela e um batel em socorro da nau, pensando que poderia regressar, logo que a maré começasse a encher, a tempo de apoiar a outra caravela e o outro batel que ficavam defendendo o passo.
E assim aconteceu!
Logo que Duarte Pacheco chegou perto da nau, os paraus que a estavam a atacar, temendo ficar metidos entre dois fogos, puseram-se em fuga e ele, aproveitando a enchente, tal como previra, voltou rapidamente para o passo de Cambalão, onde a outra caravela e o outro batel estavam aguentando sozinhos todo o peso da armada de Calicut.



E repetiram-se as cenas da semana anterior. Os paraus do Samorim, durante mais de três horas, lançaram repetidos ataques sobre os navios portugueses, em tentativas desesperadas para os abordar, sendo de todas as vezes rechaçados com muitas avarias e um número elevado de mortos e feridos. Depois de terem perdido dezanove paraus, incendiados ou afundados e terem tido cerca de duzentos mortos, não tiveram outra alternativa senão retirar.

No dia seguinte, em vez de aproveitarem para repousar das fadigas da véspera, os portugueses foram atacar de surpresa uma povoação da ilha de Cambalão, tendo no caminho combatido com catorze paraus, que desbarataram!
E no dia imediato a esse teve lugar a terceira batalha que, tal como a primeira começou com um bombardeamento cerrado dos nossos navios por parte da bateria de terra. Mas o tiro desta era pouco certeiro e Duarte Pacheco deu ordem aos seus homens para não responder, a fim de dar confiança à armada inimiga para se aproximar. O estratagema resultou. Quando os navios que constituam a sua vanguarda se aperceberam que os portugueses já não respondiam ao fogo de terra, convenceram-se que teriam sofrido graves perdas e lançaram-se sobre eles atabalhoadamente, certos de que desta vez os iriam finalmente abordar. Só que no momento em que estavam prestes a chegar junto deles foram recebidos por uma salva disparada à queima-roupa de todos os canhões e todas as espingardas das caravelas e dos batéis que lhes mataram muita gente e meteram no fundo, de uma assentada, oito paraus!

O primeiro ímpeto do inimigo fora quebrado. Mas continuaram a vir mais e mais paraus que, uns após outros, ou eram afundados ou obrigados a retirar cheios de mortos e feridos.

Por volta do meio dia, quando a batalha estava já a esmorecer, um dos nossos batéis começou a arder. Reanimaram-se os malabares e todos os paraus que o puderam fazer concentraram sobre ele o seu fogo e os arremessos de flechas, na esperança de o tomarem. Mas, mais uma vez, as suas expectativas foram goradas. A guarnição do batel conseguiu dominar o incêndio e continuou a combater com a mesma eficácia de antes.

Só restava ao inimigo retirar. Foi o que fez, tendo perdido nesta terceira batalha mais vinte e dois paraus e sofrido mais de seiscentos mortos.
Logo que a armada de Calicut iniciou a retirada, Duarte Pacheco, apesar de ter os seus homens exaustos, foi em sua perseguição com os dois infatigáveis batéis e, saltando em terra, matou muitos naires do senhor de Cambalão e queimou-lhe mais duas povoações, sem perder um único soldado!

E com tudo isto andavam os Malabares e os «Mouros» assombrados e diziam que o Deus dos Portugueses estava combatendo por eles, pois que de outro modo não se podia explicar como é que, sendo tão poucos, alcançavam sempre a vitória, tanto em terra como no mar, contra inimigos tão numerosos!



Saturnino Monteiro                
em «Batalhas e Combates da Marinha Portuguesa» (Vol.I)
 

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André

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« Responder #198 em: Novembro 14, 2008, 10:21:39 pm »
Batalha do Golfo de Oman

Em fins de Fevereiro de 1554, largou de Goa, sob o comando de D.Fernando de Meneses, filho do vice-rei, uma armada que tinha como missão: em primeiro lugar, capturar as «naus de Meca» que nessa época do ano costumavam regressar ao mar Vermelho idas do golfo de Bengala ou do Achém; em segundo lugar, dar combate às galés turcas estacionadas em Baçorá se elas voltassem a sair para o mar. Compunha-se a dita armada de seis galeões (São Mateus, Santa Cruz, São Sebastião, São Tiago, São Lourenço e São Tomé), seis caravelas e vinte e cinco ou vinte e seis fustas e catures. Todos os navios iam muito bem equipados e municiados. Das suas guarnições faziam parte mil e duzentos portugueses, além dos habituais auxiliares canarins e malabares.

À chegada ao golfo de Adém, D. Fernando destacou um certo número de fustas e catures para a entrada do mar Vermelho a fim de investigarem o que por lá se passava. As informações que trouxeram foi que somente se encontravam em Moca três ou quatro das galeotas de Cafar.
Durante todo o mês de Março se conservou a armada de D. Fernando de Meneses cruzando no golfo de Adém sem que fosse avistada qualquer «nau de Meca». Será de supor que estas naus, tendo tido conhecimento da intensa actividade naval dos Portugueses naquela zona, tenham desistido das suas viagens. Em princípios de Abril, de acordo com as ordens que recebera de seu pai, D.Fernando dirigiu-se para Mascate, navegando ao longo da costa da Arábia. De caminho, desembarcou em Dofar, a fim de tentar conquistar um forte que os Fartaques tinham tomado aos Árabes da região, nossos aliados. Porém, depois de vários combates, acabou por desistir por não ter possibilidade, devido à ondulação, de desembarcar a artilharia pesada necessária para o bater.
Chegado a Mascate, D. Fernando de Meneses deixou aí o grosso da armada a «invernar» (passar a «monção») e seguiu para Ormuz com os navios de remo, acompanhando várias naus de mercadores e um galeão vindo de Goa, onde ia embarcado Bernardim de Sousa, nomeado capitão daquela praça em substituição de D. Antão de Noronha. Feita a entrega do cargo, foi o dito galeão mandado «invernar» também em Mascate, depois de nele ter sido embarcada a fazenda do capitão, dos fidalgos e dos soldados que nele haviam de regressar a Goa por terem terminado as suas comissões.




Em princípios de Julho, quando começaram a soprar os ventos de oeste, D. Fernando enviou três catures para a boca do Shatt al-Arab a fim de vigiarem as galés turcas. Utilizando barcos de pesca locais, alguns dos elementos das guarnições dos catures, provavelmente indianos, entraram no rio e foram mesmo a bordo das galés vender peixe! Desta forma ficaram sabendo que aquelas se estavam preparando activamente para sair para o mar. Moradobec fora substituído no comando da armada turca por Alecheluby, corsário afamado, a quem Solimão repetira a ordem de fazer regressar ao mar Vermelho quinze das galés que estavam em Baçorá.

Nos primeiros dias de Agosto, já com ventos firmes de oeste, Alecheluby deixou o Shatt al-Arab rumo ao estreito de Ormuz. Imediatamente um dos catures que ali se encontrava de vigia seguiu para Ormuz, a fim de alertar D.Fernando de Meneses, enquanto os outros dois acompanhavam à distância as galés turcas.

Logo que D. Fernando soube que a armada turca já se encontrava no mar, meteu-se nos navios de remo e foi para Mascate, onde deixara a «invernar» os galeões e as caravelas. Também D. Antão de Noronha, que saía de capitão de Ormuz e a quem o Vice-Rei encomendara que amparasse o filho por ser ainda muito novo, se meteu numa galeota com quarenta soldados e tomou o rumo de Mascate, para onde, como já referimos, tinha mandado o galeão em que devia regressar a Goa. Por seu turno, Bernardim de Sousa, o novo capitão de Ormuz, não querendo ficar ocioso, mandou artilhar e guarnecer com gente de armas um galeão e três ou quatro naus de mercadores que ali estavam e preparou-se para, depois de as galés terem passado, ir postar-se na boca do Shatt al-Arab a fim de impedir que se pudessem recolher a ele se, tal como acontecera no ano anterior, fossem obrigadas a retroceder. Decisão particularmente acertada que denota uma excepcional visão estratégica e um elevado espírito de iniciativa.

Chegado a Mascate, D. Fernando de Meneses embarcou no seu galeão, que era o São Mateus, acompanhado de D. Antão de Meneses e de Manuel de Vasconcelos, que lhe serviam de mentores, e fez-se ao mar com toda a armada, rumo ao norte, ao encontro do inimigo, aproveitando os ventos gerais de sueste que durante o mês de Agosto predominam no golfo de Omã. É de supor que o galeão de D. Antão de Noronha tenha acompanhado a armada.

À frente iam os catures e as fustas em missão de exploração. Seguiam-se as caravelas e, por fim, os galeões. Qualquer destas três esquadras devia ir formada em linha, isto é, com os navios ao lado uns dos outros, e com intervalos relativamente grandes entre eles. No entanto, essas linhas deviam ser bastante irregulares, uma vez que os Portugueses, de um modo geral, não se preocupavam com o rigor das formaturas. Na mente dos nossos capitães, a preocupação de ser o primeiro a abordar o inimigo prevalecia sobre quaisquer outras considerações de ordem táctica.
A 10 de Agosto, pela manhã, estando as nossas fustas e catures já muito perto do cabo Mussandão, começaram a avistar as galés turcas que estavam precisamente a dobrar aquele cabo, passando entre ele e uma ilhota que lhe fica fronteira. Vinham a navegar à vela e, logo que aproaram a sul, cingiram-se o mais possível ao vento, que naquela zona ainda soprava de oeste, seguindo em coluna ao longo da costa. Pouco depois, eram avistadas pelas nossas caravelas e galeões, que foram imediatamente ao seu encontro aproveitando o vento que na zona onde se encontravam soprava de WSW e SW.

De bordo das galés turcas o espectáculo devia ser impressionante. Na sua frente estendia-se uma muralha de cerca de quarenta velas que parecia intransponível. Mas Alecheluby não perdeu o sangue-frio e logo começou a idealizar a forma de sair da ratoeira em que se encontrava. Confiadamente, continuou em frente, permitindo que a distância aos navios portugueses continuasse a diminuir rapidamente, uma vez que as duas armadas iam praticamente a navegar a contra-bordo. Pouco depois, começava o duelo de artilharia entre as galés que iam à frente e as nossas fustas, a que um pouco depois se juntou o galeão Santa Cruz. O mar principiou a cobrir-se de pequenas nuvens de fumo negro resultantes dos disparos e em volta dos navios empenhados no combate começaram a levantar-se as «gerbes» resultantes da queda dos projécteis.

A bordo dos navios portugueses o ambiente era de franco optimismo. Capitães, fidalgos e soldados tinham como certo que em breve viriam às mãos com os turcos e não duvidavam que os esmagariam. Mas D. Antão de Noronha, que no íntimo se considerava o verdadeiro capitão-mor da armada, não queria correr riscos desnecessários. Vendo que o galeão Santa Cruz se adiantara bastante em relação ao resto da armada e que a coluna turca avançava directamente contra ele, receou que se o vento caísse lhe pudesse vir a acontecer o mesmo que tinha acontecido ao galeão de Gonçalo Pereira Marramaque no estreito de Ormuz no ano anterior. Como sabia que o Santa Cruz tinha pouca gente, passou-se para a sua galeota e foi-lhe meter dentro um reforço de trinta soldados, após o que voltou para o São Mateus, para junto de D. Fernando.

Entretanto o vento refrescara, fixando-se em sudoeste, o que fez aumentar a velocidade e a capacidade de manobra dos nossos navios de alto bordo. Mais alguns minutos e as nossas caravelas estariam em cima das galés! Foi então que Alecheluby desferiu o golpe que estivera preparando. A uma ordem sua, todas as galés, que já haviam sido devidamente prevenidas, arriaram as velas e, navegando a remos, executaram uma guinada simultânea para EB (um «turn», como hoje diríamos), aproando à ponta Lima, que era aproximadamente a direcção donde vinha o vento. Com esta manobra as galés turcas afastaram-se rapidamente dos navios portugueses, acabando pouco depois por ficar a barlavento de toda a nossa armada! Por mais que as caravelas e os galeões puxassem tudo para a orça, nenhum deles conseguiu chegar à ponta Lima antes de as galés a terem dobrado!

Em todos os nossos navios a decepção era profunda. No São Mateus, os principais capitães portugueses, colhidos de surpresa pela superior capacidade táctica dos turcos, discutiam acaloradamente acerca da forma de alcançar as galés sem chegarem a qualquer conclusão. Por fim, um piloto «velho» conseguiu fazer-se ouvir. Dizia ele que embora naquela época do ano predominassem no golfo de Omã os ventos de sueste, havia junto à costa da Pérsia ventos que davam para navegar para leste. Afirmava que já tinha feito por ali a viagem de Ormuz para Mascate e propunha que a armada atravessasse imediatamente para a outra costa, única maneira de conseguir alcançar Mascate antes de os turcos lá chegarem. À falta de melhor, a sugestão foi aceite, e, entregando-se aos caprichos de Eolo, D. Fernando de Meneses mandou fazer rumo para a costa da Pérsia. Afinal o piloto tinha razão. Encontrando ventos propícios, a armada portuguesa, navegando a curta distância de terra, progrediu rapidamente para leste. Quando pareceu aos pilotos que já deviam ter Mascate para ré do través, voltou a atravessar o golfo de Omã com vento largo e conseguiu alcançar Mascate sem dificuldade. Aí chegados, receberam os portugueses a agradável notícia de que as galés turcas ainda não haviam passado. A manobra resultara em cheio!
Antes de deixar a costa da Arábia, D. Femando tinha destacado um certo número de fustas e catures para irem acompanhando as galés e levarem para Mascate informações relativas à sua posição. À chegada a esta cidade despachou outro grupo de fustas para irem para norte, junto à costa, ao encontro daquelas.

Dois ou três dias se conservou a armada portuguesa em Mascate, aproveitando para fazer aguada e dar um pouco de descanso às guarnições. Entretanto, a armada turca arrastava-se penosamente ao longo da costa da Arábia, navegando exclusivamente a remos, o que a obrigava a fundear de tantas em tantas horas para dar repouso às chusmas. À distância, acompanhavam-na alguns catures e fustas portuguesas sempre vigilantes. Perto dos ilhéus que ficam defronte do cabo Suadi apareceram mais fustas pela proa, obviamente vindas de Mascate. Apesar de tudo, Alecheluby não estava preocupado. A persistência dos ventos gerais de sueste, embora exigisse um enorme esforço dos remadores, o que lhe era indiferente, constituía a melhor garantia de que as caravelas e os galeões portugueses que tinha deixado para trás não seriam capazes de o alcançar. O mais provável, pensava, era que tivessem recolhido a Ormuz.

Ao romper do dia 25 de Agosto as fustas que alguns dias antes tinham saído de Mascate regressaram com a informação de que haviam deixado as galés junto ao cabo Suadi e que, portanto, já deviam estar muito próximas. D. Fernando de Meneses mandou imediatamente suspender e fez-se ao mar com todos os navios vistosamente embandeirados e prontos para combate, jurando a si próprio que desta vez não havia de deixar escapar os turcos. Como habitualmente, seguia à frente uma linha de fustas, depois uma linha de caravelas e por último uma linha de galeões. Nessa altura o vento era moderado de leste, o que permitia aos nossos navios navegar praticamente à popa arrasada.

Como os portugueses iam a navegar à vela projectando-se sobre um horizonte de mar e os turcos vinham a navegar a remos projectando-se sobre a terra, era inevitável que avistassem a nossa armada muito antes de poderem ser avistados por ela. De começo, Alecheluby não se alarmou. Convencido de que a armada portuguesa estava muito para trás, pensou que as velas que começavam a avistar-se eram de navios mercantes que se dirigiam para Ormuz. Mas vendo que o seu número continuava a aumentar, acabou por compreender que, por razões que lhe escapavam, era novamente a nossa armada que tinha diante de si. Não obstante, apesar de se encontrar numa situação que parecia desesperada, não se desorientou. Partindo do princípio de que ainda não teria sido avistado pelos portugueses, aproximou-se ainda mais da costa, acabando por ficar encoberto por uma ponta de terra, onde, provavelmente, se terá deixado ficar à espera que os nossos navios passassem.

De bordo destes, as galés turcas só terão sido avistadas, já a curta distância, quando deixaram pelo través de BB a ponta de terra acima referida. Nessa altura, as galés lançaram-se à voga arrancada para barlavento, ao longo da costa, exactamente como tinham feito quinze dias antes no cabo Mussandão. Surpreendidos, os capitães dos nossos galeões e caravelas apressaram-se a guinar para BB e, orçando o mais possível, procuraram alcançar a costa que tinham pela proa antes de as galés lá chegarem.

O navio português que ia a navegar mais próximo de terra e que, consequentemente, parecia ter maiores possibilidades de interceptar as galés era a capitânia de D. Fernando de Meneses, o galeão São Mateus. Mas como levava as vergas braceadas no limite andava relativamente pouco e abatia muito. Com a respiração suspensa, a guarnição não tirava os olhos da coluna de galés que voavam sobre as águas com os chicotes dos comitres flagelando sem piedade as costas dos remadores. Estando o galeão ainda a uma certa distância da costa, a primeira galé cortou-lhe a proa passando-se para barlavento! E, logo a seguir, outra... e outra... e outra ... ! Não havia hipótese de chegar a tempo! As galés iam, mais uma vez, escapar-se! Foi então que alguém lançou para o ar a ideia de fundear para, ao menos, poder disparar a artilharia contra elas. Atabalhoadamente foi largado um ferro e carregado o pano. Lentamente, o galeão começou a fazer cabeça ao vento, enquanto os bombardeiros, tensos, aguardavam de morrões acesos. Finalmente o galeão ficou paralelo à coluna de galés e a pequena distância delas. Já nove tinham passado quando as bombardas do São Mateus começaram a disparar. Tiros curtos... tiros compridos... Em silêncio absoluto, os soldados e os marinheiros sustinham a respiração. De súbito, um pelouro de grosso calibre acertou em cheio na décima galé, metendo-lhe a borda dentro, quebrando-lhe muitos remos e matando-lhe numerosos remadores de BB. Impulsionada pelos remos de EB a galé atravessou-se instantaneamente. E foi o fim! Como as galés iam muito perto umas das outras a navegar a grande velocidade, quando a dianteira estacou, as que seguiam atrás dela não tiveram tempo de se desviar nem de estacar e roçando umas pelas outras partiram as apelações (conjunto de remos) e ficaram imobilizadas!



A bordo da nossa capitânia era o delírio! Já muito perto vinham as caravelas, qual matilha enfurecida, sequiosa de sangue. A primeira era a de D. Jerónimo de Castelo Branco. Ao passar muito perto da popa do São Mateus, um seu irmão que estava no chapitéu deste gritou-lhe entusiasmado: -Vara-me essa caravela, rapaz!- D. Jerónimo não fez a coisa por menos. Com o pano todo em cima meteu-se pelo meio das duas primeiras galés da molhada, até dar em seco. Cada caravela tinha somente vinte soldados; cada galé teria pelo menos cinquenta. Mas o maior bordo livre das caravelas era um factor decisivo no combate à abordagem, sobretudo porque permitia aos portugueses usar à vontade a sua arma preferida: as panelas de pólvora. Mal a nossa caravela se prolongou com as duas galés começou a lançar-lhes para dentro panelas de pólvora umas atrás das outras. Queimados pelas chamas e entontecidos pelas explosões, os seus remadores lançavam-se à água e os soldados desordenavam-se. Aproveitando a confusão, D. Jerónimo saltou para a galé que tinha por BB, com quinze soldados, e à lança e à espada matou os turcos todos que lá se encontravam e que não tiveram tempo de saltar para a água. Mas já vinha chegando a caravela de D. Manuel de Mascarenhas, que aferrou por BB a outra galé que D. Jerónimo já tinha aferrado por EB e logo mimoseou com nova chuva de panelas de pólvora. Com a sua guarnição quase toda queimada e completamente desmoralizada, esta galé foi facilmente tomada por D. Manuel de Mascarenhas, que imediatamente foi atacar a terceira galé. Nesta, o combate foi mais renhido, mas os turcos acabaram por ser todos mortos ou obrigados a lançar-se à água. E eis que mais duas caravelas entram de rompante na contenda: a de António Valadares e a de Fernando Monroi. Cada um deles aferra uma galé, lança-lhe para dentro numerosas panelas de pólvora e a seguir varre-a de proa à popa à lança e à espada. Após violentos combates, estas duas galés são tomadas. A última galé terá ficado para as caravelas de Nun'Álvares de Castro e de Jorge de Moura, as últimas a chegar. Depois de uma curta resistência, foi também tomada. Em menos de meia hora, seis galés turcas tinham caído nas mãos dos portugueses com quarenta e sete canhões de bronze, sendo alguns deles basiliscos, esperas, camelos e águias, ou seja, canhões de grosso calibre.

Enquanto prosseguia o combate entre as caravelas e as galés, as nossas fustas metiam-se entre estas e a terra e matavam à lançada todos os turcos que tentavam alcançar a costa a nado. Com as nove galés que lhe restavam, pairando a barlavento, Alecheluby assistia consternado à destruição das seis que tinham ficado para trás na esperança de que alguma ainda se pudesse escapar. Mas em breve se desenganou. Agora, a única coisa que lhe restava fazer era tentar salvar as que tinha consigo. Uma vez que em fins de Agosto predominam no mar da Arábia os ventos de sudoeste, optou por se dirigir à vela para o golfo de Cambaia.
Terminada a batalha, D. Fernando de Meneses deu ordem às caravelas para irem no encalço de Alecheluby e recolheu a Mascate com os galeões, as fustas e as seis galés turcas que haviam sido capturadas. Ali se demorou vários dias, festejando a vitória, baptizando as galés e guarnecendo-as com gente que tirou dos outros navios. Por fim, dirigiu-se para Goa, onde chegou nos primeiros dias de Novembro. De estranhar que, pelo menos, não tenha mandado as galés e algumas fustas para o golfo de Cambaia para apoiar as caravelas que, no caso de falta de vento, se poderiam ver em sérias dificuldades perante as nove poderosas galés turcas.

Entretanto, esforçavam-se aquelas por alcançar as galés, o que não era fácil porque lhes levavam um avanço considerável e iam a navegar com vento de alheta, o que lhes conferia uma velocidade pouco inferior à sua.
Finalmente, já muito perto da costa indiana, as caravelas de António Valadares e de Fernando Monroi, provavelmente as que iam mais adiantadas, avistaram as galés turcas. Mas estas não estavam dispostas a combater. Com vento fresco e mar de vaga, indo a navegar bastante dispersas e, possivelmente, com falta de água, só pensavam em escapar-se. Vendo já muito perto as nossas caravelas, as duas galés que iam mais atrasadas optaram por se dirigir para a costa, onde vararam e se desfizeram, uma junto de Damão e a outra um pouco mais abaixo, perto de Danu. As restantes sete dirigiram-se para Surrate, em cujo porto conseguiram entrar antes de serem alcançadas pelas caravelas de D. Jerónimo de Castelo Branco, Nun'Álvares de Castro e Manuel de Mascarenhas, que as ficaram bloqueando, fundeadas do lado de fora do «poço».

Neste meio tempo, as caravelas de António Valadares e de Fernando Monroi dirigiram-se para Baçaim, onde chegaram a 20 de Setembro. Desta cidade partiram imediatamente doze fustas para Surrate a fim de reforçarem as três caravelas que estavam bloqueando as galés. Poucos dias depois, quando a notícia dos acontecimentos do golfo de Omã chegou a Chaul, partiram também dali outras doze fustas com o mesmo fim.

A 23 de Setembro fundeou na barra de Goa uma nau do Reino que trazia um novo vice-rei: D. Pedro de Mascarenhas. Pela mesma altura chegava também a Goa um catur vindo de Mascate com a notícia da vitória alcançada pela nossa armada sobre os Turcos, bem como outros, vindos de Baçaim e de Chaul, dando conta da presença das sete galés em Surrate. Tratou logo o novo vice-rei de organizar uma armada destinada a acabar de vez com aquelas e a 10 de Outubro largaram de Goa, com destino a Surrate, dois galeões e trinta navios de remo sob o comando de Fernão Martins Freire, sobrinho de D. Pedro de Mascarenhas.

De notar que nesta altura, além das armadas ordinárias, tinham os Portugueses empenhados na guerra contra os Turcos oito galeões, seis caravelas e oitenta e seis galés, galeotas, fustas e catures, o que dá bem ideia da formidável potência naval que Portugal era então, apesar de todas as dificuldades de ordem financeira com que se debatia o Tesouro.
Chegado a Surrate, Fernão Martins intimou o capitão da cidade a que, nos termos do tratado de paz em vigor, lhe entregasse os turcos e as galés ou então que mandasse queimar estas. Escusou-se aquele, alegando que os turcos se tinham metido pela terra dentro e que já não havia nenhum na cidade. Quanto às galés, dizia que não lhe convinha entregá-las nem queimá-las porque temia represálias dos Turcos contra as naus de Cambaia que todos os anos, com «cartazes» dos Portugueses, iam ao mar Vermelho. Em contrapartida, propunha-se mandá-las cortar, cada uma delas, em três partes. Levado o assunto ao conhecimento do Vice-Rei, este anuiu. Na presença dos capitães portugueses, cada uma das sete galés que restavam da armada de Alecheluly foram serradas em seis bocados, ficando completamente inutilizadas. Deixando dez fustas a patrulhar o golfo de Cambaia, Fernão Martins Freire regressou a Goa, onde chegou nos primeiros dias de Novembro, praticamente ao mesmo tempo que D. Fernando de Meneses.



Desta forma terminou a campanha iniciada havia dois anos quando os Turcos tentaram apoderar-se de Ormuz com o fim de assegurarem as ligações marítimas entre Suez e Baçorá. Das vinte e cinco galés que empenharam nas operações com ela relacionadas, perderam seis em combate, três por encalhe fortuito ou deliberado e sete por internamente e posterior inutilização. Restavam-lhes duas no mar Vermelho e sete no Shatt al-Arab. Destas últimas, duas acabariam por ser queimadas pelos Persas por volta de 1555 e outras duas por ser tomadas pelos nossos em Barém, em 1559.

Para a vitória final dos Portugueses foram factores preponderantes a abundância de meios navais de que então dispunham na Índia, o receio que os Turcos tinham de se baterem com eles no mar e a forma inteligente como o vice-rei D. Afonso de Noronha movimentou as nossas armadas. Ao mesmo tempo que conservava as galés turcas encurraladas em Baçorá, contra-atacou, cortando as comunicações do mar Vermelho com o exterior, «jogada» que levou à desintegração do dispositivo naval turco no Índico.

De assinalar que em resultado da destruição da armada turca, e apesar de os Turcos continuarem senhores de Adém, as comunicações entre a Índia e a Abissínia foram restabelecidas. Outro ponto interessante a ter em conta é que em 1555 Solimão fez a paz com a Pérsia. Mera coincidência ou consequência directa da destruição da sua armada do Índico pelos Portugueses? Seja como for, a batalha do golfo de Omã coincide com o fim da expansão do Império Otomano para Leste.


Saturnino Monteiro                
em «Batalhas e Combates da Marinha Portuguesa» (Vol.III)

 

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TOMSK

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« Responder #199 em: Novembro 26, 2008, 07:23:10 pm »
Apresento-vos uma longa mas interessantíssima biografia sobre aquele que, muito provavelmente, foi um dos mais notáveis estadistas de sempre.
Que falta faz hoje um líder como Dom João II...


O Príncipe Perfeito



Maquiavel terá pensado em D. João quando escreveu o Príncipe. Foi Lope de Veja quem lhe chamou “Príncipe Perfeito”. Isabel a Católica chamava-lhe, com admiração e respeito, “o homem!”. Dom João II reinou 14 anos e mudou o destino de Portugal. Fundou o Estado Moderno e planeou a expansão ultramarina. Institucionalizou Portugal como potência mundial no final do século XV.

Dom João II sabia o que queria e sabia para onde ia. Queria garantir independência de Portugal; queria preservar a nossa posição em Africa; e queria chegar à Índia pelo Oriente. Muitas vezes tentou, algumas errou, mas nunca se afastou do objectivo que estava certo e foi atingido.

Embora fosse um homem guerreiro e tivesse vitórias militares, Dom João II foi acima de tudo um homem de Estado. Usou, por isso, mais a diplomacia do que a guerra. A progressão de Portugal ao longo de Africa e pelos mares, fez-se procurando a amizade e o comércio com os povos que encontrávamos, fosse qual fosse a sua cor. Ao mesmo tempo, Dom João garantiu que Portugal era soberano e respeitado, através de acordos e tratados arduamente negociados com as outras potências europeia da época. A paz no continente, a liberdade nos mares – foi a sua política.



Ele é, de facto, o Príncipe Perfeito, como lhe chamaram. Sem as suas medidas governativas, Portugal dificilmente teria sucesso na aventura dos Descobrimentos e conseguiria manter-se independente da vizinha Castela.
Com D. João II o dá os passos decisivos na conquista de todo o Atlântico Sul e do caminho marítimo para a Índia.
Ele é o monarca que, sem hesitações, centraliza o poder, pensa e projecta Portugal no futuro.
A sua visão ambiciosa, a tenacidade e a audácia diplomática permitiram que o Brasil hoje fale português e que o comércio via caminho marítimo para a Índia enriquecesse o país.
Os seus 14 anos de reinado mudaram o rumo de Portugal e deixaram uma herança valiosa, única na nossa história. E é devido ao seu sonho de um Portugal maior que milhões de pessoas falam português em todo o Mundo.

Dom João II nasceu em 1455. Quase não conheceu a Mãe. Mas a relação com o Pai – D. Afonso V – marcaria, para o bem e para o mal, a sua educação e preparação para reinar. Dom João II foi, em todos os momentos, um filho leal. Várias vezes teve de resolver os problemas que o seu Pai criou e deixou.



Portugal era um reino pequeno, pobre, profundamente rural e dominado por uma nobreza ainda feudal. D. Afonso V era o que chamaríamos um “mãos largas”. Para obter o apoio da nobreza às suas políticas, não a submeteu; ofereceu-lhe poder, mais poder, quase todo o poder. Quando D. Afonso V morreu, os ducados, em Portugal, tinham passado de 2 para 4; o número de condados subiu de 6 para 21; multiplicaram-se os títulos e a alienação das terras da coroa. Mau diplomata, D. Afonso V, envolveu o País em guerras curiosíssimas. Quando D. João II lhe sucedeu, afirmou, com sentido de humor, que só herdava as estradas do reino.

Mas D. João II estava atento ao que se passava na Europa. Começava a época da centralização do poder, na figura dos monarcas.

D. João II será o primeiro Rei português a chamar a si todo o poder.
Na segunda metade do século XV em que viveu, os turcos conquistaram Constantinopla. No que hoje é Itália, viviam-se os tempos dos Médicis e dos Sforza. Em Inglaterra, desencadeia-se a guerra das Duas Rosas, entre as Casas de York e Lancaster. Em França, reina Luís XI, um monarca que, passo a passo, centralizará o poder. O Papa continua a ser a grande autoridade do mundo católico.
D. João II preocupa-se: aqui ao lado, no reino de Castela, uma mulher forte será uma grande Rainha. Isabel unifica os tronos de Castela e Aragão. Estava em vésperas de nascer uma Espanha poderosa. O equilíbrio peninsular torna-se frágil, a segurança de Portugal fica ameaçada.



Enquanto jovem, D. João II seguiu a trajectória do pai nas conquistas do Norte de África.
D. João era fisicamente corajoso. Demonstrou-o quando tinha, apenas, 15 anos. D Afonso V preparava a conquista de Arzila; o filho pede–lhe para integrar o seu exército. O cronista Damião de Góis relata o seu estado de espírito: “depois de sua Alteza ter partido hei-de segui-lo e se não for como príncipe, será como aventureiro soldado”. O rei faz-lhe a vontade e é no desembarque em Arzila que D. João II se destaca como militar.

D.João faz parte do exercito de 30 mil homens com que o rei de Portugal toma Arzila. No final, o jovem príncipe mostrava o ferro torcido da sua espada, tantos e tais os golpes desferidos e recebidos. Ali foi armado cavaleiro, junto ao sangue derramado do Conde de Marialva: “Filho, Deus vos faça tam bom cavaleiro como este aqui jaz” disse-lhe o rei. D. João tinha 16 anos e começou ali a sua influência na política do reino.



Anos mais tarde, na célebre batalha de Toro, quando Afonso V fazia a guerra contra Castela, D. João voltaria a revelar bravura e inteligência como general.
O exército português tinha duas alas e o príncipe D. João comandava uma delas. Venceu os isabelinos e recolheu. Mas a ala chefiada por Afonso V foi destroçada. Nesta batalha que passou à história com resultado incerto, Portugal, por não vencer, perdeu. Mas afiançou-se a certeza de que D João II, se preciso fosse, saberia impor a lei da força.
Ele, no entanto, preferiu quase sempre a força da lei.

“Pela lei e pela grei” , seria a sua divisa.

A partir de 1474, Dom João II recebe do pai a responsabilidade pela politica ultramarina. D Afonso V entrega-lhe a liderança do comércio da Guiné e o governo dos domínios africanos. É este projecto – a expansão de Portugal pelo mar – que vai ocupar e definir o perfil de D.João II.

Pelo contrário, nos últimos anos do seu reinado, D Afonso V vira-se para a península, está obcecado com Castela e as circunstâncias permitem-lhe alimentar um sonho: a unificação das coroas portuguesa e castelhana.

Na verdade, em Dezembro desse ano - 1474 - morre o rei de Castela, Henrique IV. Abre-se uma querela sobre a sua descendência; na verdade, é uma verdadeira disputa pelo trono.



O rei entrega, então a regência de Portugal a Dom João. “Eu, se fosse senhor do mundo, confiaria de vós sem receio”, diz o pai ao príncipe. Este responde com lealdade:”obrigado sou a vos manter estes reinos e vo-los entregar pacificamente, cada vez que a eles tornardes, e se eu o contrário fizer, rogo a todos que me desobedeçam”.

A regência de Dom João é um contrato de limites mútuos. Por um lado, D. Afonso impede Dom João de retirar privilégios à nobreza – de quem depende cada vez mais. Por outro, Dom João obtêm do pai um compromisso secreto – não poderá fazer dádivas superiores a 10 mil reais sem seu consentimento.
No fundo, pai e filho conheciam-se bem. D Afonso sabia que o filho acreditava numa coroa sem capitulações. Dom João sabia que o pai era dado a prodigalidades.

Enquanto regente, Dom João definiu prioridades: equilibrar como podia uma Fazenda corroída pelas despesas da guerra e pela ausência de receitas nas terras da nobreza; administrar a justiça, mostrando simpatia pelas queixas populares em relação aos abusos de poder senhorial; garantir que as manobras de diversão dos castelhanos em território português não eram bem sucedidas; e pôr ordem no comércio da Guiné, ameaçado por navios castelhanos que, a mando ou com o consentimento de Isabel, disputavam as riquezas portuguesas.

A guerra da sucessão culmina com a Batalha de Toro na qual D. João II também luta para ajudar o pai. Mais uma vez destaca-se como guerreiro.
O grande confronto, de 2 de Março de 1476, acabou por ser considerado ganho por ambos os lados, mas, na verdade, saldou-se por uma derrota política para Portugal.



Em dois momentos da regência, D João II revela saber como exercer a autoridade e usar a astúcia.
Prova de autoridade: em face dos navios espanhóis que pilhavam e atacavam o ouro da Guiné, D João dá ordens para aprisionar os respectivos capitães e proteger a soberania portuguesa. Isabel é forçada a recuar.

Prova de astúcia é o episódio da ameaça de invasão de Évora. Conta Garcia de Resende que a cidade esteve cercada por 2 mil castelhanos. Dom João não tinha exército para a batalha – os meios estavam em Castela, com o pai. Ordena então que 300 cavaleiros, todos os que tinha, galopassem de um lado para o outro, perto do acampamento do inimigo, de modo a parecerem dez vezes mais. O plano resulta. Os castelhanos recuam e Évora fica a salvo.

Este aspecto é importante. Um século mais tarde, o Cardeal Mazarino escreveria uma impressiva definição da política da época como sendo a “arte de simular e dissimular”. Dom João, sobretudo perante potências estrangeiras, sempre simulou grandeza, mesmo nos momentos difíceis; e dissimulou as fraquezas, como se viu no cerco de Évora.
Também se diz, com acerto, que D. João II foi o primeiro monarca a usar, sistemática e planeadamente o que hoje chamaríamos serviços de informação. E na verdade, quer perante os outros Estados, quer em face das conjuras contra o trono, Dom João II consegui, quase sempre, saber o que o seu inimigo faria, sem o que o seu inimigo soubesse que ele sabia.

Voltemos às desventuras do rei em Castela. A guerra não estava a correr bem e Afonso V, num movimento mal medido, vai a França, na esperança de obter o apoio de Luís XI às suas pretensões.
O rei de França, como se diz agora, “chuta para canto”. Recebe Afonso V com grandeza, mas condiciona um apoio que não quer dar. Destroçado, Afonso V segue, quase só, para Jerusalém e pensa na vida religiosa. Escreve a Dom João, abdicando da coroa e intimando-o a proclamar-se rei. Conta Garcia de Resende: “ E em cumprimento do mandato del rey, o Príncipe foy alçado por el rey com toda a solenidade em Santarém”.
Estávamos em 1477. Mas D João só seria rei por 4 dias.

De facto, D.Afonso V é travado na sua peregrinação ao Médio Oriente. Resolve voltar. Dom João devolve-lhe a coroa, mas não aceita partilhar o poder, como o pai desejava.

Enquanto D. Afonso V fez a guerra com Castela e não a ganhou, Dom João tinha outra visão: contratualizar uma paz com os reis católicos que garantisse a independência de Portugal e os seus direitos além mar. Essa visão ganhará forma com o Tratado de Alcáçovas.



Assinado a 4 de Setembro de 1479, D. João II conseguiu reverter uma situação delicada para Portugal num acordo estrategicamente positivo para os nossos interesses.
O príncipe tinha um objectivo – retirar os castelhanos da costa africana, reservando para Portugal o comércio de ouro na Guiné. Enquanto negociador, apercebeu-se que os Reis Católicos eram – ainda – vulneráveis. E sabia que D. Joana, a Beltraneja, ainda era um trunfo, e jogou-o.

O que obtêm D. João?
Muito: garante para os portugueses a zona de Marrocos, todo o comércio da rota da Guiné e – o que não é despiciendo - o mar desconhecido em direcção ao sul. Os próximos 20 anos dos descobrimentos portugueses beneficiarão muito desta liberdade incondicional.

E o que oferece D. João?
Alguma coisa – as Canárias. Mas nada que verdadeiramente nos fizesse falta.
Oferece, sobretudo um direito teórico: a renuncia à pretensão da coroa castelhana. Portugal reconhece Isabel como rainha legítima e promete em casamento a um dos seus filhos a infeliz D. Joana; em alternativa, a Beltraneja, conhecida em Portugal como Excelente Senhora, pode professar a vida religiosa, o que de facto sucederá.
tratado incluía, ainda, outra cláusula matrimonial. Dom João já tinha um filho – também ele chamado Afonso. Ficou assente que casaria com a filha de Isabel a Católica, também ela chamada Isabel. Seriam educados juntos, aqui bem perto, em Moura.
Assim se desenha o plano de Dom João: a independência de - e a grandeza – de Portugal estão ligadas à expansão marítima; a paz com Castela fica estabelecida e, se um dia as coroas se unirem, será sob a égide de um varão português.



D. João II consegue a proeza de garantir para os portugueses a zona de Marrocos, todo o comércio da rota da Guiné e o mar desconhecido mais a Sul. Em troca, oferece as Canárias aos nossos vizinhos.
Alcançada a divisão do Atlântico por uma linha horizontal ao nível das Canárias, o Príncipe Perfeito tinha todas as condições para iniciar a sua verdadeira ambição – fazer todas as viagens, todas as navegações, todas as expedições, todas as descobertas que nos levassem à Índia.
Faltava, apenas, uma condição: ser “o senhor dos senhores, e não servo dos servidores” no reino de Portugal. Numa palavra, ser respeitado como rei e exercer o poder sem hipotecas. Para uns D. João II viria a ser uma espécie de César. Para outros, foi um monarca paternalista. Em qualquer caso, a sua forma de ser rei fundou o estado moderno em Portugal.

Quando D. Afonso V morre, em 1481, e o Príncipe Perfeito é definitivamente aclamado rei, já reúne uma larga experiência política. Por isso, não é de estranhar a sua determinação e perspicácia de actuação nas primeiras cortes de Évora convocadas logo para esse ano.

Foi em Évora, a sua cidade preferida, que D. João II iniciou o controverso processo de reforço do poder real.
O soberano estava na ofensiva. Já exigira da nobreza portuguesa um verdadeiro juramento de obediência. Mal habituados por Afonso V, senhores feudais de uma parte do país, alguns nobres das Casas mais importantes, ouviram o discurso de abertura do Dr. Vasco Fernandes de Lucena. Nesse discurso, combinado com o rei, ficava claro o que era jurar a obediência ao soberano: não atentar contra a sua vida; não revelar segredos do rei; respeitar a Fazenda do Estado; obedecer à justiça real; não dificultar ao monarca o que com ele se pudesse resolver a bem.
O juramento devia ser repetido – ao grito de “real, real , real, pelo muito alto muito excelente e muito poderoso senhor el rei Dom João” – pelos alcaides dos castelos e procuradores das cidades e das vilas, em todo o país.
Nas cortes, a homenagem seria prestada com o nobre ajoelhado e o rei sentado. O presságio de um sério conflito entre o rei e a aristocracia, ficou marcado pela atitude do Duque de Bragança. Ele era o chefe da primeira casa ducal do país. Achava que só a ele deviam obediência os súbditos de mais de 50 castelos, vilas e lugares. Foi o primeiro a vergar-se à autoridade de D. João II mas fê-lo sobre protesto – “coagido” , terá dito.



D. João II é o primeiro rei português a concentrar o poder nas suas mãos. À semelhança do que acontecia no resto da Europa, o monarca entende que, para concretizar a sua política, fazer o reino progredir e tornar-se um estado poderoso, precisa de retirar os excessivos poderes à nobreza. Pretende governar para o povo. Numa posição paternalista de senhor único dos destinos do reino, assume-se como grande defensor e responsável único. A sua atitude — o reino tinha um único senhor que protegia a sua gente — era espelhada no símbolo que escolheu: um pelicano que, ao ferir o peito, garante o sustento dos seus filhos.

Após as cortes de Évora, o conflito entre o monarca e a nobreza cresce num clima de conspiração e alianças com o vizinho reino castelhano. O final da crise interna vai saldar-se numa profunda derrota para as grandes casas senhoriais.

D. João deu sempre uma oportunidade aos que contra ele conspiravam. Avisou-os. Esperou que rectificassem. E só agiu – por vezes, violentamente - quando nada mais havia a fazer e tinha as cartas na mão.
Ficou célebre a sua recomendação de paciência no Governo do Estado:
"Há tempos de usar o olhar da coruja e tempos de voar como o falcão."

D. João II revela uma determinação implacável em aniquilar os inimigos. D. Fernando é julgado, acusado de traição e condenado à morte. Será decapitado em público, aqui na Praça do Giraldo. Os bens da casa de Bragança são confiscados.
São tempos sombrios que se vivem no reino português. Avisado de uma outra conjura para assassiná-lo, D. João II age rapidamente. Um dos implicados é o irmão da sua mulher, D. Diogo, duque de Viseu a quem o rei já tinha aconselhado a desistir das tramas de conspiração.
Mais uma vez, o rei convida o conjurado a desistir da trama. Mas D. Diogo não lhe deu ouvidos. Três vezes pressente D. João II que, no próprio paço ou em passeios de barco e a cavalo, o tentam liquidar. Escapa por pouco; e só escapa porque informadores, o informaram.

A 20 de Agosto de 1484, D. Diogo tinha 200 lanças à espera do rei para o eliminar. D. João II iludiu-o. No dia seguinte, chama-o à sua presença. Trata pessoalmente do assunto. Pergunta a D. Diogo:
-'Duque, que fariéis vós a quem vos quisera matar?"
-"Matá-lo-ia", respondeu D. Diogo
-"Pois o que vós em mim ordenáveis; em vós se cumpre",
terá respondido o rei que o apunhalou.
Estamos no século XV. O valor da vida é diferente. E em certo sentido, D. João matou para não morrer.



Apesar de implacável nestas situações, os cronistas da época descrevem D. João II como um homem prudente e formal, mas emotivo, bem disposto e perspicaz. Adorava xadrez ê gostava de festas. Quando era visitado por estrangeiros, não poupava em dignidades nem honrarias. Tinha um apuradissimo sentido da imagem de Portugal no exterior.

partir do momento que ficou claro quem detinha o poder, o caminho estava livre para D. João ll executar os seus planos de Governo.
O Príncipe Perfeito vai, então, solidificar alianças e lançar-se na aventura ultramarina. É a época áurea do seu reinado.

A primeira ideia de D. João II é estabelecer uma feitoria no Golfo do Guiné, protegida por uma fortaleza. Objectivo: criar um entreposto comercial em Africa, proteger o ouro, apoiar os navegadores.
O que hoje nos parece normal, no Sec. XV era inédito. Partem de Portugal nada menos do que 12 navios. Alguns vão carregados de pedras, madeiras, talhas, ferramentas e outros materiais de construção. De raiz será levantado um forte; de raiz será construída uma Igreja.
Tudo isto é feito em paz. O emissário de Dom João negoceia com Caramanasa, o soba de S. Jorge de Mina. Cerca de 60 portugueses ficam residentes. O comércio frutifica, Portugal afirma-se.
Dom João II inicia, assim, a colonização da Africa descoberta.



Era o ponto de partida. Mas Dom João procurava um porto de chegada: a Índia.
Para executar este plano, Dom João II rodeou-se dos melhores cientistas e de navegadores de excepcionais. Investiu na rota marítima e enviou expedições por terra.
Se um estadista se define pelos colaboradores que escolhe, a lista dos homens excepcionais que trabalharam com o Príncipe Perfeito é eloquente – Diogo Cão, Bartolomeu Dias, Vasco da Gama, Afonso de Albuquerque, Pêro da Covilhã, ou o astrónomo judeu Abraão Zacuto, expulso de Espanha e recebido na corte portuguesa.

Ao mesmo tempo que procurava contornar Africa, Dom João envia missões por terra à procura do mítico reino cristão do Prestes João.
Os primeiros expedicionários não passam da Terra Santa, porque não dominavam o árabe. Mas a expedição de Pêro da Covilhã e Afonso Paiva é proveitosa: falam várias línguas, disfarçam-se de mercadores e são verdadeiros espiões.

Em finais de 1488, Dom João II recebe o melhor prémio do seu esforço, a melhor notícia do seu reinado.
Bartolomeu Dias, outro escudeiro da Casa Real, vai à frente de três caravelas e ultrapassa o mundo já descoberto por Diogo Cão. Atinge 34 graus a sul do equador – e estamos na actual Africa do Sul. Vencendo tempestades perigosas e fazendo uso de uma determinação tenaz, Bartolomeu Dias, finalmente, encontrou o Cabo das Tormentas. É o extremo meridional de Africa.
Dom João II dá-lhe um nome sugestivo: Cabo da Boa Esperança. É a viragem decisiva na conquista do Atlântico Sul. Os portugueses abrem caminho marítimo para a Índia – como o rei sempre sonhara:



“Aqui ao leme sou mais do que eu: / Sou um povo que quer o mar que é teu; / E mais que o mostrengo que a me alma teme / e roda nas trevas do fim do mundo / Manda a vontade, que me ata ao leme, / De El-Rei D. João Segundo!”(Mensagem, Fernando Pessoa)

A vontade titânica de Dom João II é recompensada. Bem rodeado e bem aconselhado, o Príncipe Perfeito define, executa e mantém um plano que é um sucesso. Os navegadores portugueses provaram que o oceano era navegável; que o mundo equatorial era habitado; que era possível navegar longe da costa e orientar-se pelo sol e pelas estrelas; que África era contornável; que havia forma de chegar à Índia pelo mar; que a terra era arredondada e circun-navegável; e ainda viriam a provar mais a Ocidente, que a América era contínua; e que havia, no sul do continente americano, uma costa navegável, tal como a africana.

O mar, no século XV, era como o espaço, no século XX. Sob a direcção do Príncipe Perfeito, Portugal foi pioneiro, foi moderno e foi global.

No início, D. João II afastara a concorrência de Castela na aventura africana. Agora, precisa de legitimar, internacionalmente, os Descobrimentos, garantindo um império comercial. Talvez por isso, resistiu ao ímpeto de enviar imediatamente navios para a Índia. Na forja estava um novo tratado para estipular o que era o mar português.
Isso aconteceria em 1494, com o Tratado de Tordesilhas.

O catalisador desta negociação foi Cristóvão Colombo.
O Príncipe Perfeito não patrocinou os seus projectos. Colombo prometia chegar à Índia pelo Ocidente. Naquele tempo, D. João já sabia que os cálculos de Colombo não podiam estar certos.
D. João achou – e tinha razão – que Diogo Cão estava mais perto da verdade e da Índia. O caminho para lá chegar teria de se fazer contornando Africa.
O estilo exuberante de Colombo, exigindo consideráveis rendas e títulos do que descobrisse, deixara D. João II, mais formal, desconfiado.
Depois de muitas tentativas, Colombo convenceu Isabel Católica a apoiá-lo. No regresso da viagem em que descobriu Guanahani, Cuba e Haiti, Colombo passa por Lisboa, convencido de que descobrira a Índia.
Dom João II pressente o perigo de uma situação nova, em que os castelhanos, apesar de errados no destino, eram afortunados pela descoberta de terras a Ocidente, terras de que a Corte Portuguesa tinha rumores.



Toma, então, uma decisão: reclamar para Portugal, com base no Tratado de Alcáçovas, as terras que Colombo achara. Com uma mão, despacha uma embaixada para Castela; com a outra, prepara uma frota para tomar posse dessas conquistas americanas.

O movimento do Príncipe Perfeito, nesta situação adversa, surte efeito.
Começam as negociações com Castela, que mobilizarão os melhores talentos diplomáticos do reino.
Isabel a Católica tem um forte aliado no Papa espanhol, Alexandre VI.
A primeira proposta chega sob a forma de uma bula papal: impunha uma linha divisória no Atlântico, cerca de 100 léguas a Ocidente de Cabo Verde.
Dom João II não aceita. Tanta resistência opõe que Castela aceita a contra-proposta do Príncipe Perfeito: a linha que divide - digamos assim – o “mundo português” do “mundo castelhano” é afastada para mais 270 léguas para Ocidente, um ganho imenso que permitirá a Portugal reclamar, anos depois, o Brasil.
Tordesilhas consuma a habilidade diplomática de D. João II. Um pequeno país, com pouco mais de um milhão de habitantes, apossava-se de “meio mundo”, seguro das descobertas que já fizera em Africa e no Oriente.

Porque terá Dom João II exigido as 370 léguas? Nessa época de politica sigilosa, podem ter existido viagens secretas, com resultados que não conhecemos. Há indícios de que o Príncipe Perfeito conhecia a possibilidade de um território a Ocidente.



A politica tem consequências. Tordesilhas é a consequência fabulosa de uma politica ultramarina em que Portugal se abriu do mundo, teve sentido de risco, foi vanguarda científica e concentrou energias, não em guerras inúteis, mas em conquistas importantíssimas.

Dom João II era um estadista realizado, e levou Portugal a uma posição internacional que nunca mais se repetiria. A nível interno, viviam-se tempos de paz e a independência estava garantida.
No entanto, Dom João II não era um monarca feliz.

Em 1490, cumprira o seu plano: casar o Infante D. Afonso, herdeiro da coroa, com D. Isabel, filha dos reis católicos.
Esse casamento representava, para o Príncipe Perfeito, uma chave dupla. Por um lado, impunha uma certa paz entre os dois reinos peninsulares, cada um ficando livre para os seus desígnios: Portugal para a politica da expansão, Espanha para concluir a sua unificação como Estado. Por outro lado, D. João sabia que, se um dia as circunstâncias o permitissem, qualquer união ibérica seria feita sob o trono português.

O casamento de Afonso e Isabel representa uma outra faceta de Dom João II. Ele percebeu, sempre, que o respeito devido a um Estado é o respeito que esse Estado impõe. Levava este princípio muito a sério e aplicava-o no protocolo.
Se os casamentos reais eram verdadeiros tratados internacionais, então o casamento de um infante português com uma infanta espanhola teria, necessariamente, de ser inesquecível ; havia de por os espanhóis em sentido, no melhor sentido da palavra – a grandeza, a dignidade, aquilo a que os franceses chamam ‘panáche’.
Contam os cronistas que o cerimonial foi o maior jamais visto em Portugal.
Mas esta felicidade dura pouco tempo.

No Verão seguinte, D. Afonso, numa certa tarde, vai passear a cavalo. Acontece um incidente inesperado. O seu galope é interrompido por uma violenta queda. D. Afonso fica inconsciente e morrerá 24 horas depois.

Os anos dourados de Dom João II estavam no fim. O Rei fica atormentado pela sucessão da coroa; a tranquilidade com Castela está em risco; renasce a oposição na Corte. E desta vez, os adversários são muitos. Chegam à própria Rainha.
Na verdade, a morte de D. Afonso coloca um problema. O Príncipe Perfeito tinha um filho ilegítimo – D. Jorge. Durante a próxima década, esse filho tinha sido tolerado. A queda do herdeiro levará Dom João a tentar legitimá-lo para a sucessão : opõe-se a Santa Sé, opõe-se Castela, opõe-se uma parte da nobreza que espreita a desforra e opõe-se, compreensivelmente, a Rainha D. Leonor.
Motivo: na ordem necessária, se D. Jorge era o herdeiro, deixaria de o ser D. Manuel, irmão de D. Leonor.



Como frequentemente acontece com os grandes homens, D. João morre relativamente só em Alvor, no Algarve.
Dos seus últimos gestos, um é marcante: a nomeação de Vasco da Gama para ser o capitão da frota que deveria ir à Índia. O Príncipe Perfeito já não verá os resultados da sua obra.
Marcado pela doença, D. João tem consciência do fim. Alguns relatos afirmam que a sua última palavra foi “Jesus”.

Morria um rei irrepetível.

Contei-vos a história de D. João II. Falta dizer-vos porque é que D. Joao II foi o Grande Português
D. Joao II não fundou a nacionalidade. Mas foi com ele que Portugal se fez universal.
D. Joao II não era navegador. Era um homem de Estado: promoveu as navegações, planeou os Descobrimentos e conseguiu, para Portugal, o maior prestígio internacional de sempre.
D. Joao II não viu os resultados da sua obra. Por exemplo, não viu a Índia. Mas foi ele quem, contra ventos e marés, planeando, arriscando e recrutando os melhores, perseguiu o objectivo da Índia e abriu caminho para lá chegar.
D. Joao II não era poeta. Era apenas culto – e foi a sua visão que deu a Portugal a grandeza que os poetas celebraram.
Façam comigo um exercício. Comparem o Portugal do século XV com o Portugal do século XX. Com D. Joao II, Portugal foi central no mundo; no final do século XX, Portugal estava na cauda da Europa. Com D. João II Portugal foi moderno; no século XX, a situação de Portugal só pode definir-se numa palavra : atraso. É a diferença entre o esplendor e a tristeza.
D. Joao II foi a metáfora de um Portugal arrojado, vanguardista, culto, cientifico, grande, épico, universal – um Portugal que não voltou a repetir-se. O Príncipe Perfeito tinha defeitos – eram os da época. Mas as suas qualidades são intemporais – foi um estadista muito à frente, foi um Português à frente do seu tempo, teve a visão e a força que levaram Portugal, atrás de si.




Paulo Portas, Os Grandes Portugueses
 

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PereiraMarques

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« Responder #200 em: Novembro 27, 2008, 01:44:10 am »
Citação de: "TOMSK"




Só para referir que esse não é o brasão de armas (próprio/exclusivo) do Rei D. João II. O Brasão de D. João II tinha como timbre um pelicano e como lema "Pola Ley e pola Grey" ("Pela Lei e pela Grei (Povo)"). À semelhança do Brasão de Armas do seu filho ilegitimo D. Jorge de Lencastre, Duque de Coimbra, apresentado em baixo.




Citar
Brasão de Armas de D. Jorge de Lancastre (1481-1550)

2º Duque de Coimbra

Escudo de prata, cinco escudetes de azul postos em cruz, cada um deles carregado de cinco besantes do campo, dispostos em aspa; bordadura de vermelho, carregada de sete castelos de ouro abertos de vermelho, e um filete de negro posto em contrabanda e atravessante sobre tudo. Timbre: um pelicano ferido de vermelho, no seu ninho, alimentando os filhotes. Lencastre, Lancastre ou Alencastro são tudo formas do apelido derivado da denominação da Rainha D. Filipa de Lencastre e proveniente este nome do titulo de seu pai, o príncipe inglês João de Gand, Duque de Lancaster. Como apelido, foi dado pelo Rei D. João II a seu filho natural legitimado. Senhor D. Jorge que foi Duque de Coimbra e Mestre das Ordens de Santiago e de Avis. Foi casado com D. Beatriz de Vilhena, filha do senhor D. Álvaro de Portugal, filho do segundo Duque de Bragança D. Fernando e de sua mulher D. Filipa de Melo, com geração que deu continuidade a este apelido. A descendência portuguesa do referido filho natural do Príncipe Perfeito dividiu-se em dois ramos principais, dos Duques de Aveiro, que é hoje representado pela Casa dos Marqueses de Lavradio, e dos comendadores-mores de Aviz cuja a primogenitura caíu na Casa dos Condes de Vila Nova de Portimão.

O uso do Dragão (ou Serpente Alada) como timbre veio com D. João I, por influência inglesa e ligada à lenda de São Jorge, e manteve-se até ao fim da Monárquia em 1910.



Citar
Brasões de Armas dos Infantes
Filhos homens de D. João I de Portugal e D. Filipa de Lencastre. usaram as Armas de seu pai (Portugal/Aviz) com diferenças de tradição inglesa trazidas com o casamento de sua mãe e seu Mestre-de-Armas Principal, Arrieta (Harriet?). O dragão é o animal quimérico que é derrotado por S. Jorge, Patrono da Cavalaria e Patrono da Inglaterra e desde então também Patrono de Portugal. Grito de Guerra: "Arraial, Arraial, por S. Jorge e Portugal", diferenciando-se dos castelhanos que também como os portugueses usavam: "por Santiago", aquando do início dos ataques nas suas batalhas contra os inimigos.
 

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« Responder #201 em: Novembro 27, 2008, 08:42:08 am »
Obrigado PereiraMarques!

O facto do brasão não ter o tal pelicano também me chamou a atenção, mas como era referido como sendo de Dom João II, coloquei.
 

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« Responder #202 em: Dezembro 02, 2008, 12:00:03 am »
Em homenagem à Restauração:

Pela porta ou pela janela?



«A aparência pacífica dos coches que iam chegando ao Terreiro do Paço não assustou
os soldados da guarda, habituados como estavam à presença matutina, junto do palácio, dos cortesãos da duquesa. Prontos a agir, os conjurados esperavam com impaciência o soar da hora combinada.
Nove horas. Abrem-se quase ao mesmo tempo as portinholas dos coches, e os fidalgos descem; entretanto, Jorge de Melo, Estêvão da Cunha, António de Melo e Castro, o padre Nicolau da Maia e outros esperam ainda, dentro das carruagens, que venha do palácio o sinal de assaltarem a guarda castelhana. Os outros conjurados, a maioria, sobem rapidamente as escadas, entram na sala dos archeiros tudescos e, sem lhes darem tempo para suspeitar o que ia acontecer, desembainham as espadas e derrubam os cabides das alabardas. Fogem os archeiros, atónitos e desarmados, embora alguns tentem defender a entrada do corredor que conduzia aos quartos de Miguel de Vasconcelos e aos aposentos da duquesa de Mântua. No entanto, acabam também por fugir, atacados por Luís Godinho Benavente e mais três ou quatro fidalgos, deixando um morto e um ferido estendidos no chão.
Entretanto, D. Miguel de Almeida, exuberante de alegria, corre a uma varanda, abre-a a exclama, brandindo a sua espada:
— Liberdade! Viva el-rei D. João IV! O duque de Bragança é o nosso legítimo rei!
E as lágrimas de patriótica emoção correm–Ihe pelas barbas brancas agitadas pelo sopro do vento que vinha do rio.
Respondeu-lhe, da praça, um imenso brado de entusiasmo:
— Liberdade! Liberdade!
Decerto todos julgavam reconhecer, nesse heróico velho de oitenta anos, radiante de ardor juvenil, o símbolo de Portugal decrépito e alquebrado, de novo iluminado por um reflexo das suas grandezas passadas.»

Nesse momento, os conjurados que esperavam o sinal para intervir lançaram-se de

armas em punho sobre a guarda castelhana, apanhada de surpresa. A resistência foi inútil, embora os atacantes fossem apenas um punhado de homens.
D. António Telo, que jurara ser o primeiro a ferir Miguel de Vasconcelos, viu a certa altura passar um íntimo do renegado, Miguel Mansos da Fonseca. Sem mais detença correu para a secretaria, logo seguido por Pedro de Mendonça, João Saldanha da Gama, João Coutinho, Sancho Dias, João de Sá de Meneses, camareiro-mor, os dois filhos de D. Filipa de Vilhena, Tristão da Cunha de Ataíde e outros…
Encontrando no caminho o corregedor Francisco Soares de Albergaria, bradaram:
— Viva el-rei D. João IV!

— Viva el-rei D. Filipe!…—retorquiu o corregedor.
Duas balas acabaram com ele, mas as detonações atraíram a atenção de António Correia, oficial-mor da Secretaria do Estado, o qual, surgindo espavorido, foi logo abatido pelo punhal de António Telo — pois era também odiado pela sua acção de renegado e traidor.
Não se enganara António Telo a respeito de Miguel Mansos, que fora de facto avisar Miguel de Vasconcelos.

O secretário de Estado estava ainda na cama. Conhecedor do perigo que corria, levantou-se mais do que depressa, vestiu-se sumariamente e, perdida toda a calma, corréu a trancar a porta do quarto. Apavorava-o o rumor surdo que vinha dos corredores, e apoderou-se dele a certeza de que já não tinha qualquer possibilidade de salvação. A aproximação do tumulto representava para ele a perda de toda a esperança.
Num último gesto de defesa, agarrou numa arma carregada e, procurando à sua volta algum sítio onde pudesse esconder-se, foi agachar-se dentro de um armário, que, por ter prateleiras onde se acumulavam documentos, o forçava a uma posição deveras incómoda.
Mal havia fechado o armário quando a porta do quarto caiu, arrancada dos gonzos, e os conjurados entraram de roldão.
Não avistando ali Miguel de Vasconcelos, iam no entanto sair, na suposição de que ele se tivesse refugiado noutro lugar… quando o renegado fez um movimento involuntário dentro do seu esconderijo.
Com brados de raiva e de vingança, os conjurados dispararam as pistolas contra a porta do armário…
Miguel de Vasconcelos pagou assim, com a vida, a sua indigna acção de renegado. Duas balas atravessaram-lhe a garganta e já estava morto quando os conjurados agarraram no seu corpo e, através de uma das janelas abertas, o atiraram para o terreiro.
Em baixo, a multidão que já se havia acumulado, reconhecendo o cadáver do homem que fora o carrasco dos portugueses, lançou-se sobre o corpo, como alcateia de lobos sobre a presa.
Conta o historiador Rebelo da Silva:
«Nesta miséria e aviltamento acabou Miguel de Vasconcelos, que poucas horas antes era senhor quase absoluto do governo da monarquia; o seu castigo afrontoso excedeu o que a severidade de uma nação generosa pode impor ao mais culpado, mas não foi superior aos delitos que lho mereceram.»

Era necessário, todavia, que os conjurados se ocupassem da duquesa de Mântua, vice–rainha de Portugal… que provavelmente ainda pensava ser. A duquesa, mais corajosa do que o seu secretário de Estado —ou talvez confiada na sua condição feminina —, resolveu aparentar a maior serenidade, tanto mais facilmente quanto a atitude dos fidalgos portugueses que entraram na sala onde ela se encontrava nem por um momento se afastou da mais extrema cortesia.
Quando, porém, os ouviu dizer que Filipe IV de Espanha deixara de ser rei de Portugal, a sua cólera não pôde conter-se… e num furioso arrebatamento tentou falar ao povo, dirigindo-se para uma das janelas.
Impediu-a disso D. Carlos de Noronha, observando-lhe que, se insistisse em não reconhecer a mudança operada no reino, podia levar os conjurados a perderem-lhe o respeito.
— A mim?… —quase gritou Margarida de Áustria, num assomo de orgulho ofendido. — Como?
Forçando Vossa Alteza, se não quiser utilizar essa porta, a sair por aquela janela!
Dominada, a duquesa encaminhou-se silenciosamente para a porta dos seus aposentos. Aí, depois de rezar no seu oratório, completou os arranjos do vestuário e reapareceu, pondo–se à disposição dos conjurados.
Conduzida para o Mosteiro de Santos, durante o tempo que ali permaneceu viu-se sempre rodeada de todas as atenções…

Quarenta homens haviam bastado para dar o primeiro e decisivo passo… mas a tarefa tinha apenas principiado e foram necessários vinte e oito anos de lutas para que ela ficasse concluída…
 

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TOMSK

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« Responder #203 em: Dezembro 02, 2008, 11:47:26 pm »
Porque nem só de "espadas e tomates" vive o orgulho português, achei por bem destacar a já mais que provada, faceta, por vezes escondida, mas sempre solidária dos Portugueses:

"Penso que a solidariedade deve ser antes de mais um estilo de vida, na linha do que escreve João Paulo II ao afirmar que a solidariedade “não é um sentimento de compaixão vaga ou de enternecimento superficial pelos males sofridos por tantas pessoas, próximas ou distantes.
É pelo contrário, a determinação firme e perseverante de se empenhar pelo bem comum; ou seja, pelo bem de todos e de cada um, porque todos nós somos verdadeiramente responsáveis por todos” (SRS 38).

Mas, como não somos perfeitos, preferimos o que chamo “uma solidariedade de impulsos”, em determinados tempos e circunstâncias. Mas somos assim e pronto.

De qualquer modo, não posso deixar de destacar o facto de apesar da crise que todos vivemos, este fim de semana ter sido batido o recorde em ajudas ao Banco Alimentar: 1905 toneladas de alimentos recolhidos em apenas dois dias, mais 19% em relação a 2007.
Deste gesto de generosidade depende a sobrevivência de muitas pessoas. A distribuição destes alimentos já começou a ser feita por 1618 instituições, que irão atingir 245 mil pessoas, ou seja nas palavras da presidente do Banco Alimentar, Isabel Jonet, "2,5 por cento da população portuguesa" come graças a esta ajuda.

Este gesto é o somatório de dois tipos de solidariedade: a dos que dão alimentos e a dos cerca de 20 mil voluntários que se dispuseram a passar o seu fim de semana à porta das grandes superfícies comerciais.
Convém lembrar que, em 2007, campanhas deste tipo e excedentes oferecidos pelos vários agentes da indústria agro-alimentar atingiram cerca de 20 mil toneladas.
Contudo também convém ter muito presente o desabafo de Isabel Jonet: estes alimentos são em muitos casos apenas "uma ajuda pontual" para ultrapassar "uma situação mais difícil".
Isto é, há que passar para lá do simples gesto de dar coisas!

Ou seja, há que reorganizar a vida da nossa sociedade não só a nível macro (da responsabilidade dos governos, que dificilmente passará de uma solidariedade institucional, mais ou menos genérica, mas a quem compete criar as condições para que a dignidade de todos seja dignamente respeitada e promovida) mas também e talvez sobretudo a nível micro (da responsabilidade das comunidades e das pessoas, as únicas capazes de uma solidariedade pessoal e de proximidade, situada e personalizada)."

Retirado de http://feecompromisso.blogspot.com/
« Última modificação: Dezembro 03, 2008, 08:42:21 pm por TOMSK »
 

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« Responder #204 em: Dezembro 03, 2008, 10:44:12 am »
As atividades do Banco Alimentar são sem dúvida de louvar.

Pena é que cada vez haja mais PORTUGUESES a precisar do Banco Alimentar, ao mm tempo que o governo corre a oferecer milhões aos amigalhaços da Banca!!!!
"[Os portugueses são]um povo tão dócil e tão bem amestrado que até merecia estar no Jardim Zoológico"
-Dom Januário Torgal Ferreira, Bispo das Forças Armadas
 

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« Responder #205 em: Dezembro 09, 2008, 04:47:23 pm »
Mem de Sá
O homem que expulsou os franceses do Rio de Janeiro e se tornou num mito para colonos e indígenas




Um dos primeiros e mais famosos governadores do Brasil. Pertencia a uma nobre e ilustre família portuguesa, porque era irmão do poeta Francisco Sá de Miranda.

Tratando D. João III, que dividira o Brasil em capitanias por diferentes donatários, de organizar regularmente a colonização do Brasil e a autoridade da coroa sobre essa vasta região, nomeou primeiro governador do Brasil Tomé de Sousa, que teve como sucessor Duarte da Costa, seguindo-se a este Mem de Sá, que já foi nomeado pela rainha viúva e regente de Portugal, D. Catarina, chegando à cidade de S. Salvador da Baía, centro dos estabelecimentos portugueses na América, em 1558.

Teve Mem de Sá que vencer grandes dificuldades logo no princípio do seu governo; lutava com falta de recursos de todo o género, porque o Brasil pouco interessava o governo da metrópole, todo empenhado na sustentação das conquistas do Oriente. Duarte da Costa deixara o Estado em lamentáveis circunstâncias, os índios revoltados, e Mem de Sá teve que sustentar a guerra contra eles nas capitanias de Ilhéus e de Porto Seguro, e teve sobretudo na capitania de S. Vicente de debelar a terrível conjuração dos Tamoyos, que ameaçava sacudir para sempre os portugueses das praias americanas. Valeu-Ihe de muito nesta última circunstância o auxílio dos jesuítas, principalmente dos dois missionários Nóbrega e Anchieta, sem cujo concurso nada poderia fazer, por melhor vontade e maior energia que tivesse, o grande governador do Brasil.

Além das hostilidades dos indígenas, teve ainda Mem de Sá mais terríveis dificuldades a vencer, a peste e a fome. A varíola assaltou a cidade da Baía, e os aldeamentos dos índios amigos, devastou-os, e afugentou os aterrados selvagens. As terras ficaram sem serem semeadas, e no meio daquela pródiga e maravilhosa natureza da América do Sul, a fome assaltou os colonos portugueses. Mem de Sá conseguiu vencer todas as dificuldades agravadas pela qualidade dos colonos que de Portugal lhe remetiam, e que eram quase todos degredados e gente dissoluta. Mem de Sá conteve-os em boa ordem, e favoreceu dum modo notável o aldeamento dos índios, que os jesuítas dirigiam com incontestável zelo.

O acontecimento mais glorioso, contudo, do governo de Mem de Sá, foi a expulsão dos protestantes franceses, que se haviam estabelecido no sítio onde se erigiu depois a formosa cidade do Rio de Janeiro. Em 158..., um cavaleiro de Malta francês, chamado Nicolau Duarte de Villegagnon, que abraçara as ideias religiosas de Calvino, resolvera procurar fortuna em terras novas, e auxiliado pelo seu amigo e correligionário, o almirante Coligny, partiu para o Brasil, e estabeleceu-se numa das ilhas da baía do Rio de Janeiro, a que deu o nome de Goligny, e onde edificou um forte que devia ser inexpugnável pela natureza do terreno, e que se chamou forte de Villegagnon. O rei de França, apesar de andar envolvido com os huguenotes em acesas guerras religiosas, aplaudiu esta sua tentativa de colonização, e socorreu-os e reforçou-os com tropas comandadas por um tal Bois-le-Comte, que chegou ao Brasil em 1557. Afinal as discórdias que dividiam a França europeia, dividiram também a França antárctica, como os colonos franceses chamavam já às suas possessões americanas, assim como premeditavam chamar Henriville à cidade que tencionavam fundar como capital da colónia. Villegagnon abandonou os seus companheiros em 1558, e partiu para a Europa, mas os franceses, que tinham estabelecido com os indígenas relações de boa amizade, ficaram senhores da terra de que se tinham apoderado.
Foi em 1560 que Mem de Sá recebeu ordem para expulsar os franceses do Rio de Janeiro, ordem absurda por não vir acompanhada de quaisquer reforços. Mem de Sá, porém, não hesitou em cumpri-la, e no ofício que enviou à rainha regente dizia-lhe: «Eu me pus logo prestes o melhor que pude, que foi o pior que um governador podia.» Efectivamente, o exército que Mem de Sá pudera reunir, compunha-se de 120 portugueses e de 140 índios auxiliares, e com este corpo expedicionário, verdadeiramente irrisório, ia atacar uma ilha solidamente edificada, defendida por 150 bons soldados franceses, que tinham por auxiliares não menos de um milhar de índios Tamoyos.



Ainda assim, a energia de Mem de Sá obrou maravilhas, e um assalto dado por esse pequeno corpo de tropas pôs nas mãos dos portugueses a fortaleza, que Mem de Sá logo destruiu, não tendo gente para a guarnecer, ao passo que os franceses e os índios fugiam para o interior das florestas.

Logo que Mem de Sá se retirou para a Baía, voltaram os franceses fugitivos, tornaram a fortificar a ilha, e estabeleceram no continente o campo entrincheirado de Uruçú Mirim. Em 1564 é que chegou à Baía seu sobrinho Estácio de Sá, que vinha em seu auxílio. Mem de Sá, depois de ter conseguido expulsar definitivamente das margens da enseada do Rio de Janeiro os franceses e os seus aliados, tratou de mudar a sede da cidade que Estácio de Sá escolhera demasiadamente próximo da entrada da baía, e transportou-a para o sítio onde depois se desenvolveu, cresceu e prosperou, que é o monte de S. Januário, hoje Monte do Castelo. Depois de ter organizado a administração da cidade, cujo governo confiou a seu sobrinho Salvador Correia de Sá, partiu para a Baía, e ali residiu ainda por 5 anos, continuando a governar o Brasil.

Em 1572 chegou de Lisboa o substituto, e Mem de Sá, depois de ter governado o Brasil durante 14 anos, dispunha-se a partir para a Europa, quando a morte o surpreendeu. O seu cadáver foi sepultado no cruzeiro da igreja dos jesuítas da Baía, e o seu túmulo tornou-se por muito tempo objecto de veneração para os colonos e até para os indígenas, como o seu nome é ainda pronunciado com respeito pelos brasileiros, que lhe devem a fundação da sua capital.
 

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TOMSK

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« Responder #206 em: Dezembro 10, 2008, 03:09:20 pm »
E mais alguns desses gloriosos feitos portugueses na Índia...

5 portugueses contra 500 turcos



Durante o primeiro cerco a Diu (1538), António da Silveira defendeu a fortaleza com 600 portugueses, contra dezenas de milhares de turcos e cambaios. Ao fim de meses de lutas incessantes, o número de portugueses ainda capazes de manusear o mosquete ou a espada desceu para uns meros 40, tendo o adversário perdido para cima de 3.000 homens, acabando por desistir e ir-se embora.

Mas para o turco, a derrota no primeiro cerco não significou a desistência. Ao tomar conhecimento de que tão poucos portugueses se encontravam na fortaleza quando levantara o primeiro cerco, decidiu reaparecer, devidamente preparado e com novo exército gigante. Desta feita, no ano de 1546 surgiu com 13.000 homens em frente à fortaleza, entretanto restaurada, mas defendida apenas por 250 portugueses, liderados pelo seu capitão D. João de Mascarenhas. Ambos os lados tentaram conseguir introduzir reforços, recebendo os portugueses mais 200 e o turco mais 20.000.

A situação era desesperada, pois os nossos perderiam inevitavelmente se dessem luta em campo aberto, só lhes restando a defensiva. E desta vez o inimigo trazia engenheiros experimentados, que abriram grande quantidade de trincheiras à volta da nossa fortaleza, colocando nelas bombardas de enormes dimensões para derrubar os nossos muros.
Mas até se dar esta grande vitória, houve muitos momentos de dúvida, em que não se sabia se ela penderia para um lado ou para o outro.

Os engenheiros e artilheiros ao serviço dos turcos, parte deles italianos alistados para este fim, mandaram construir minas, aproximando-se assim da fortaleza portuguesa por baixo. Conseguiram colocar um grande número de barris de pólvora sob um dos nossos baluartes. Quando tudo explodiu, deu-se o caos. O grande efeito da pólvora oprimida fez com que as pedras da fortaleza fossem projectadas com tão violento impulso, que mataram 60 portugueses e centenas de adversários no campo inimigo! O turco não tinha dado ordem para recuar às suas próprias tropas para que os portugueses não se apercebessem do que estava tramando!

O baluarte estava destruído e em ruínas, tinha-se aberto uma brecha que permitia a entrada ao inimigo. Logo que os fumos da explosão se desvaneceram, o turco deu ordem a quinhentos dos seus mais experimentados soldados para assaltarem a fortaleza por aquela brecha.
Para os portugueses parecia ter chegado o fim. Tinham perdido tantos dos seus melhores homens, entre eles o filho do Vice-Rei, ficando muitos outros feridos e soterrados e agora o turco atacava por uma brecha que mais parecia uma porta aberta, como convite para que se apoderasse da fortaleza!

Porém, nesse mesmo instante, sem prévia combinação, saltaram cinco portugueses para a brecha a fim de fazerem frente aos 500 que, aos gritos, por ela tentavam entrar. O espaço era estreito e os turcos não se podiam fazer valer da sua quantidade numérica, aparecendo os seus soldados armados de cimitarras e sabres, mas não conseguindo atravessar a brecha mais do que três ou quatro de cada vez. Os portugueses recebiam-nos com as suas espadas e adagas de mão esquerda, mostrando como tinham aprendido a lutar.

Fizeram rosto ao inimigo, travando uma nova batalha de 5 contra 500! Ficaram sós por muito tempo, tendo os outros defensores portugueses pensado que o baluarte tinha caído e que o mouro tinha conseguido entrar, fazendo uma enorme gritaria, amedrontando qualquer um que se quisesse dirigir naquela direcção. D. João de Mascarenhas, que se encontrava com a maioria dos seus a defender outros baluartes e a porta principal, começou a dar-se conta de que a grande gritaria se mantinha no baluarte destruído mas estranhou que ainda não houvesse turcos no interior da fortaleza. Com quinze companheiros resolveu ir ver o que se passava. O espectáculo que viu ficou na história militar mundial.

Dos cinco portugueses, um estava morto e dos outros, três estavam feridos, porém continuavam em pé e a combater. À sua frente amontoavam-se os corpos dos adversários mortos e feridos, calculados em cerca de 200 e os restantes 300 turcos, com gritos de raiva e escalando a brecha por cima dos corpos dos seus camaradas, continuavam, em vão, a tentar conseguir entrar! Quando os reforços portugueses chegaram, substituindo os braços feridos e cansados por outros mais frescos, mais numerosos e prontos para participar, acabaram os turcos por recuar e abandonar o local. Mais do que lutar ficou aos novos combatentes a tarefa de rapidamente fechar a brecha.

O feito dos cinco homens animou todos os portugueses que ainda restavam na fortaleza, Embora tristes pela morte dos seus 60 camaradas na explosão do baluarte, conseguiram a vitória pela acção de cinco homens cujos nomes aqui menciono para que a sua memória se perpetue:
SEBASTIÃO DE SÁ
ANTÓNIO PESSANHA
BENTO BARBOSA
BARTOLOMEU CORRÊA
MESTRE JOÃO
, o cirurgião de Diu.

Jacinto Freire de Andrade: "Vida de Dom João de Castro Quarto Visorey da índia", edição de 1671, pág. 160; "Portugal Diccionario Histórico", edição de 1907, voi III. pág, 73/74).
fonte: Rainer Daehnhardt: "Homens, Espadas e Tomates", pág. 117-120


Ditosa pátria que tais filhos teve, e que merecem toda a nossa admiração. A estes homens, o nosso respeito e agradecimento pelo que fizeram pelo Império Português.
 

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« Responder #207 em: Dezembro 11, 2008, 12:51:38 am »
O Terribil Afonso de Albuquerque
“Basta um destes homens na história para se ter orgulho de ser português.”









Pertencentes à estátua erigida em sua homenagem na Praça do Império, em Lisboa.
Podemos ver a Conquista de Malaca, e ainda as ínumeras rendições dos inimigos, que sempre em maior número que os Portugueses, foram subjugados por este homem, o Terribil, o conquistador indomável, o governador dessas Índias distantes...
 

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« Responder #208 em: Dezembro 11, 2008, 12:07:53 pm »
Maria Ursula d'Abreu e Lencastro
Uma mulher de armas



Maria Ursula d'Abreu e Lencastro nasceu no Rio de Janeiro em 1682.
Em 1700, quando completou 18 anos, deixou a casa de seu pai, João d'Abreu d'Oliveira, e rumou para Lisboa onde se alistou como soldado adoptando o nome de Baltasar de Couto Cardoso.

Foi militar na Índia, onde participou na conquista da fortaleza de Amboina, onde se destacou por sua valentia e por estar entre os primeiros soldados a entrar na fortaleza. Foi promovida a cabo, quando servia na fortaleza do Chaul, após ter tomado parte na conquista das ilhas de Corjuem e Panelem. A sua valentia e mérito no desempenho das suas funções durante os doze anos que passou no serviço do exercito português foi reconhecida e recompensada por por D.João V de Portugal. Obteve baixa em 12 de maio de 1714, casou-se com Afonso Teixeira Arras de Melo, antigo governador do forte de São João Batista, em Goa.

O seu nome destaca-se por ser uma das poucas mulheres portuguesas conhecidas por terem servido nas forças armadas portuguesas durante a época colonial.
 

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TOMSK

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« Responder #209 em: Dezembro 13, 2008, 12:02:49 am »
E cá vai mais uma dessas fantásticas proezas portugueses, lá por mares de Índia...

Duas caravelas contra dezassete naus grossas



Uma das mais fortes praças do Samorim de Calecute foi sempre a de Cranganor. Lopo Soares de Albergaria soube, em 1504, que o Samorim estava a preparar uma armada para expulsar os portugueses do Índico. Tendo só duas caravelas e um pequeno grupo de 15 batéis, ao todo 360 portugueses, resolveu considerar o ataque inesperado como uma das mais eficazes formas de defesa, dando assim ordem de ataque à armada do Samorim.

Esta estava em Cranganor para ser apetrechada e preparada, encontrando-se já com quatro mil homens a bordo e muita artilharia.
A surpresa, porém, foi total. O nosso inesperado ataque com duas caravelas e alguns batéis contra uma armada de dezassete naus grossas, acabou na destruição de todas elas, que foram queimadas, e na tomada de Cranganor.

Este relato, de poucas palavras, parece simplificar uma batalha feroz, onde muito poucos deram o seu máximo, tanto em homens como em embarcações e material de guerra. Cada um dos 360 portugueses que tomaram parte nesta contenda teve o seu peso com as suas próprias demonstrações de bravura, capacidade e competência, para que o fiel da balança, ao fim do dia, se virasse favoravelmente em direcção aos lusos. Cada homem sabia que o aparecimendo desta forte armada do Samorim podia pôr em dúvida a continuação dos portugueses na costa do Malabar. Tomar a decisão de atacar a armada, ainda na sua fase preparatória, foi ousado, arriscado, mas também foi a atitude mais certa.

"O Panorama", vol. IV, edição de 1840; "Portugal Diccionário Histórico", vol. I, pág 121/122).
fonte: Rainer Daehnhardt: "Homens, Espadas e Tomates", pág. 65