Entrevista com presidente da FPF - parte 4
Madaíl: FC Porto não deve punido, porque "nada deve ser retroactivo"
06.06.2008 - 00h04 Hugo Daniel Sousa
Como comenta a exclusão do FC Porto da Liga dos Campeões?
Ficámos preocupados com esta questão. Se é verdade que a federação tem de respeitar a justiça desportiva a que está vinculada a nível internacional, que ainda não acabou porque ainda há recurso para o júri de apelo e o Tribunal de Lausana, mas há situações em que Portugal tem de pedir que haja equidade de tratamento relativamente a situações que foram ou são consideradas iguais. Não nos parece que tenha havido. E inclusivamente no acórdão da Comissão de Disciplina diz-se que este caso não é igual ao de outros países, porque nos outros países não houve corrupção de arbitragens. Não sei se aqui houve corrupção de arbitragem, mas a corrupção é toda igual, seja de árbitros, de jogadores, seja o que for. Há situações que não compreendemos.
Está a referir-se aos casos da Juventus e do Milan em Itália?
Sim, esses são os casos mais visíveis. Há muitas questões para discutir. Ainda há duas instâncias de recurso. O que pretendemos não é defender nenhum clube em concreto, mas sim defender a honorabilidade e a equidade em relação aos clubes portugueses. A UEFA não pode ter um peso e uma medida para uns e um peso e outra medida para outros.
E o que vai a FPF vai fazer?
Como esta decisão não é definitiva, vamos aguardar a decisão do júri de apelo. Esperemos que não, mas se houver necessidade de recorrer para o tribunal arbitral, vamos ver a posição que a federação vai tomar.
Mas essa posição da federação ainda virá a tempo de inverter a decisão?
A FPF vai analisar a decisão do júri de apelo e logo veremos o que é possível fazer. Temos de respeitar a UEFA, mas temos de solicitar equidade.
Julga que neste caso a federação fez tudo o que podia para defender o clube ou nem sequer tinha essa obrigação?
Queria clarificar essa questão. A federação não tomou partido. A FPF foi solicitada no dia 15 de Maio, porque a UEFA lê jornais, vê televisão. O director jurídico da UEFA perguntou ao nosso director jurídico se realmente o Porto tinha sido castigado e se dessas situações havia recurso ou não. O nosso jurista limitou-se a transcrever o acórdão da Comissão Disciplinar da Liga.
Para si a formulação do texto é imparcial?
O nosso secretário-geral foi questionado pela UEFA se iríamos licenciar o FC Porto, dissemos que sim e assim foi. Ainda mais, quando o Conselho de Justiça da FPF notificou o Porto dizendo que as decisões que poderão advir do recurso apresentado pelo seu presidente, Jorge Nuno Pinto da Costa, pode ter influenciado no caso do clube, nós também comunicamos isso à UEFA, dentro do período devido, que foi na segunda-feira passada. Agora penso que eles [UEFA] ignoraram isso nesta decisão [condenação em primeira instância]. Mas também não nos compete antecipar uma decisão de um órgão jurisdicional. Eles acham que sim, mas também quero dizer que dos quatro relatores [do Conselho de Justiça], três acham que sim e outro não acha nada ou diz não.
Mas há aqui uma divergência entre o entendimento do Conselho de Justiça e do director jurídico da FPF quanto ao facto de o recurso de Pinto Costa ter ou não efeitos na condenação do clube FC Porto?
Há, mas o director jurídico limitou-se a transcrever o que está nos regulamentos e a responder ao primeiro fax da UEFA, que perguntava o que se passou e queria saber se desta decisão há ou não recurso. Ele não disse, porque aí estaria a antecipar-se, se o processo de Pinto da Costa pode ou não ter influência no processo do clube, que para a justiça desportiva estaria fechado [porque o clube não recorreu]. Não seria o departamento jurídico a fazer esse juízo de valor. Não fomos nós que levámos o caso à UEFA, limitamo-nos a informar a UEFA quando esta o solicitou.
Além deste aspecto da relação entre o recurso de Pinto da Costa e o processo ao clube, havia a crítica de que o texto enviado à UEFA primeiro falava em corrupção e só umas linhas à frente dizia que era na forma tentada...
Isso é o que vem no texto da Liga. Nem sequer houve erros de tradução.
Já falou com o presidente do FC Porto sobre estes casos?
Não, não falei, mas já falei com pessoas ligadas ao FC Porto.
E sentiu esse descontentamento em relação à atitude da federação?
O Porto entende que fizemos juízos de valor e nós temos procurado demonstrar à sociedade que não. Juízo de valor seria o departamento jurídico ter dito que havia relações entre os dois processos, porque isso depende do órgão que está a julgar [Conselho de Justiça].
Sentiu pressões de outros clubes, eventualmente interessados no castigo do Porto?
Houve uma exposição, mas que não entendemos como pressão. Não vou dizer por quem, mas houve dúvidas relacionadas com o licenciamento. Mas este processo é técnico, tem a ver com estádios, contabilidade e finanças. É como um carro que vai revisão, está apto a andar, mas depois chega à estrada e não pode andar, porque tem um arresto ou multas. O processo de licenciamento não tem nada a com questões jurídicas. Na comunicação social, quem quiser falar, fala. Mas nestes casos a federação tem de ser isenta, e penso que temos sido, e procurar a defender os interesses de todos os clubes portugueses.
Mas nenhum clube fez pressão para a federação comunicasse o caso à UEFA?
Que eu saiba não. Mas mesmo que tenha havido, nem a mim chegou sequer.
Temos a indicação de que haverá pressões do Zenit de São Petersburgo para ficar com a vaga do FC Porto. Tem conhecimento desta pretensão?
Só pela comunicação social e por informações que recebi de Moscovo. Mas não sei como. O regulamento é claro, embora para às vezes para as interpretações da UEFA não sei. Para nós, é claro que um clube impedido de participar, seja por que razão for, é substituído por outro clube da mesma associação.
Pelo que conhece da UEFA, pensa que o FC Porto não terá hipóteses de vencer os recursos?
Eu estou no comité executivo da UEFA e, que eu saiba, não interfere nas decisões do comité de disciplina e do júri de apelo. Penso que não haverá qualquer influência nessa matéria, embora me tenha surpreendido a rapidez deste processo, que foi desencadeado quando o estado maior da UEFA estava no congresso da FIFA em Sydney [29 e 30 de Maio]. Mas também é verdade que as coisas na UEFA se resolvem mais rapidamente. Mas não tenho qualquer indicação de qualquer interferência.
Mas retira alguma ilação da rapidez?
Pensei sempre que as coisas se desencadeassem depois do Congresso da FIFA, mas sabemos que hoje há vários meios de comunicação. E se calhar até é bom para resolver tudo mais rapidamente possível.
De uma forma geral, acha que o FC Porto está a ser tratado de uma forma justa?
Não vou discutir os argumentos que o Porto apresenta, que também os temos aqui, e não entendemos as coisas da mesma forma que a UEFA, porque há uma questão de interpretação, como saber se a norma é retroactiva ou não. Há toda uma batalha jurídica sobre isso e eu tenho a minha opinião sobre essa matéria.
E qual é?
Para mim, nada deve ser retroactivo, mas a UEFA não entende desta maneira. Entende que o que conta é a data da sentença, mas estes são assuntos para discutir em sede própria.
Independente do desfecho, todo este caso manchará a imagem do futebol português na Europa...
Como quando surgiram os casos em Itália, mancharam o futebol italiano. Ainda hoje tenho a dúvida se o facto de a Itália não ter ganho a organização do Europeu [2012] tem alguma coisa a ver com isto. Mas claro que deixa sempre mancha, mas vamos tentar atenuá-la e vamos fazer com que o assunto seja tratado com justiça.
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