http://dn.sapo.pt/2008/06/06/dnbolsa/po ... ou_ue.html"Portugal não beneficiou da UE" ILÍDIA PINTO
Entrevista. O histórico presidente da AEP, Ludgero Marques, diz-se frustrado por Portugal não ter "usufruído das vantagens da democracia e da integração europeia". Por isso, não se sente bem num país que está praticamente na cauda da Europa. E lamenta que políticos e empresários não saibam falar a mesma linguagem
Ao fim de 23 anos, despede-se da AEP. Que mensagem deixa aos empresários?
(suspiro) Tenho de ser contido... De persistência. Os empresários têm diferentes dimensões e estilos, e como o nosso país não foi capaz de ajudar todos da mesma forma, os mais habilitados, internacionalizados e endinheirados são os que têm possibilidades de aproveitar as poucas oportunidades que existem. Quero dizer aos que sempre lutaram que podem vencer se forem persistentes.
Porque tem de ser contido?
Porque não me sinto bem num país que está praticamente na cauda da Europa. Sinto-me um pouco frustrado por, ao fim destes 34 anos de democracia boa - nem todas o são -, não ter usufruído das vantagens que a democracia nos deu e que a integração europeia nos quis dar. Por isso tenho de me conter.
Pelo contrário, deve criticar.
Vivemos numa situação de tanta dificuldade e há tanto potencial de instabilidade que não devemos concorrer para mais instabilidade.
Ou não quer incomodar o seu sucessor?
Não quero, nem vou incomodar. Apetece-me muitas vezes ir mais longe nas minhas apreciações mas acho que não o devo fazer. Devo dar as oportunidades todas que o País necessita para se equilibrar.
Que conselho dá aos empresários para ultrapassarem a crise?
É muito difícil dar conselho a um empresário que vive condicionado a toda a política nacional de restrições e muitas vezes de incompreensão que os governantes têm pelos fazedores da economia. Não é pelos utilizadores da economia, é pelos fazedores.
O que os distingue?
Os fazedores da economia estabeleceram empresas, criaram emprego e têm sido úteis. Os utilizadores são os que estão à espera das oportunidades e vivem também de certos momentos de especulação. Mas é para estes fazedores de dinheiro, que estão já numa área mais desenvolvida, que o Governo olha.
Refere-se à banca?
À banca e a toda a especulação que existe no País desde as telecoms, as galps, às grandes empresas e construtores. Que não quero criticar porque fazem o seu trabalho e devem fazê-lo bem. Só acho que o Governo não pode pensar que a salvação reside aí. Pelo contrário, está nos outros 98% de empresas que estão a criar emprego. Ainda hoje recebi um empresário de mobiliário, aflito, porque não sabia o que fazer à empresa e aos 28 trabalhadores. Está em dificuldades e não sabe o que fazer. Há tantos assim. Não há ninguém que fale neles. Só mais tarde, quando a empresa acaba e se manifestam para que o patrão não venda nada enquanto não pagar os salários.
António Borges criticou o apoio do Estado à fábrica da Ikea, sendo o mobiliário um sector que Portugal domina. Considerou que devíamos apoiar investimento estrangeiro que tivesse efeito reprodutor em termos de inovação.
Sempre disse que em vez de apoiar esse projecto em plena Capital do Móvel, o Governo devia apoiar fortemente a associação de 40 ou 50 pequenos e médios empresários da zona para que fizessem cá a nossa "Ikea". Espero que a AEP, com nova direcção, ponha esse projecto em andamento e tenha um resultado mais positivo junto dos ministros.
É difícil o contacto com os ministros?
Não, o que é difícil é a recepção das ideias. Sermos verdadeiramente ouvidos. Foi uma grande desilusão verificar que havia o medo de tratar de forma diferente uma associação com a dimensão da AEP, apesar de termos trabalho feito.
E os empresários, são ouvidos?
Os governantes e políticos não gostam de comunicar com quem não tem um vocabulário correcto. Infelizmente, temos uma educação e formação extraordinariamente baixas. Somos o país mais baixo da Europa.
A classe política está desenquadrada da realidade do País?
Eu acho que está. São poucas as excepções.
Mas os ministros visitam as empresas.
Sim, mas não olham, não vêem de facto. Os ministros trabalham muito, sete dias por semana. Sacrificam família e amigos. Não têm é a linguagem da indústria nem fizeram com que o País adquirisse a deles. Não sou capaz de indicar quem fizesse melhor. Queria era que entendessem a necessidade de evoluirmos efectivamente e não para a estatística.