A MARINHA JÁ BATEU NO FUNDO. O ZERO NAVAL ESTÁ INSTALADO. OBRIGADO SENHORES ALMIRANTES
GNR reforça-se com navio de patrulha costeira em cerimónia com MAI, mas sem MarinhaPOLÍTICA EXPRESSOO ministro Eduardo Cabrita inaugurou o "Bojador", o novo navio da GNR, que reforça a componente naval da Guarda no âmbito da estratégia europeia de policiamento costeiro. Mas o facto de não haver uma única farda branca na cerimónia revela o mal-estar da Marinha
Enquanto a Marinha de Guerra se debate com problemas orçamentais sérios que afetam a manutenção dos seus navios - como o Expresso revelou na edição impressa desta sexta-feira -, a GNR está a receber um “reforço decisivo no seu papel como Guarda Costeira”, assumiu o ministro da Administração Interna Eduardo Cabrita, na inauguração do “Bojador”, o novo (e maior) navio de patrulhamento da costa da Unidade de Controlo Costeiro da Guarda Nacional Republicana. Na cerimónia realizada na gare marítima de Alcântara, em Lisboa, nesta sexta-feira de manhã, não havia qualquer representante do Estado-Maior da Armada ou do Comando Naval da Marinha, o que revela o mal-estar dos militares quanto ao reforço do papel da GNR como autoridade marítima.
Este investimento na GNR insere-se no contexto da Frontex, a Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira, que desde 2005 desenvolve uma estratégia comum para a Europa ter uma proteção mais articulada das fronteiras externas. Em mais um dia debaixo de fogo por causa da requisição civil do resort alentejano Zmar, em Odemira, Eduardo Cabrita tentou focar a mensagem no policiamento marítimo, antes de falar da providência cautelar para impedir os imigrantes de serem alojados na propriedade: “Durante a Presidência Portuguesa”, da União Europeia, “Portugal assume o papel da Frontex como Guarda Costeira Europeia e, dentro da nossa dimensão nacional, assumimos um quadro de investimento que se traduz numa ligação a Espanha a Sul e a Norte, em que o investimento de €8 milhões neste navio permite uma capacidade de vigilância costeira com 1500 milhas de navegação autónoma”.
Segundo o próprio comandante-geral da GNR, tenente-general Rui Clero, o “Bojador” reforça “a capacidade da Guarda para o exercício das suas atribuições e competências na vigilância e controlo da costa, do mar territorial e da fronteira externa do espaço Schengen”, com o objetivo de desenvolver “operações que visam prevenir, detetar e fazer cessar ilícitos relacionados com a migração ilegal, o tráfico de seres humanos e outros crimes transfronteiriços, contribuindo fundamentalmente para a salvaguarda de vidas humanas”.
Rui Clero referiu-se ainda ao Sistema Integrado de Vigilância, Comando e Controlo (SIVICC), “cuja extensão ao arquipélago da Madeira foi concluído no final do ano de 2020", e que "irá ser ampliado para o arquipélago do Açores”. São projetos que, segundo o comandante-geral da GNR, “refletem a clara prioridade da tutela nesta valência, melhorando a capacidade de deteção, localização e identificação de ameaças no mar territorial, orla costeira e fronteira externa marítima da União Europeia”.
A questão é a de saber se existem fatores de sobreposição com a Marinha, que também tem competências de vigilância e policiamento do território marítimo nacional. O comandante-geral da GNR sublinhou que, em 2020 (ano de pandemia em que as atividades em geral caíram), a Guarda - mesmo sem ainda ter o novo navio - monitorizou “mais de 132.500 embarcações” e executou “cerca de 44.300 missões operacionais, com destaque para a vigilância terrestre e proteção de estruturas portuárias, monitorização e abordagem à criminalidade transfronteiriça, bem como na prevenção e repressão da entrada irregular de embarcações suspeitas, ações de prevenção ambiental e poluição marítima, controlo e prevenção de cidadãos estrangeiros em território nacional”. Como comparação, a Marinha, realizou 1178 ações de fiscalização em 2020 - os navios de guerra também têm como missão fiscalizar as pescas - quando fazia mais de 16 mil em 2010.
O destaque dado à GNR no domínio naval promete gerar polémica, até porque, o próprio ministro da Defesa, João Gomes Cravinho, escreveu há poucos meses um artigo no “Diário de Notícias” (em novembro), a defender o duplo uso - civil e militar - das Forças Armadas, com especial destaque para a Marinha, onde deixou um recado: “O exercício da autoridade do Estado no mar exige que as capacidades do Estado sejam devidamente articuladas, entre si e entre instituições, algo que acontece com grande regularidade e naturalidade.” A seguir, deu a Polícia Judiciária como exemplo, mas não mencionou sequer a GNR: “A título de exemplo, a coordenação com a Polícia Judiciária é necessariamente discreta, mas intensa e profícua: desde 2018, a Marinha desenvolveu 18 ações no mar com a PJ, que resultaram na apreensão de mais de 16 toneladas de haxixe e de cocaína, com um valor de mercado de várias centenas de milhões de euros”.
Segundo o ministro da Defesa, “no mar, próximo e mais longínquo, a Marinha, para além das suas missões militares, patrulha os espaços marítimos e executa anualmente inúmeras missões de busca e salvamento”, escreveu Gomes Cravinho no mesmo artigo, e “está sempre atenta a questões de natureza ambiental ou criminal, desde derrames de combustíveis à pesca ilegal ou ao tráfico de estupefacientes”. Mensagem para a Administração Interna?
https://expresso.pt/politica/2021-05-07-GNR-reforca-se-com-navio-de-patrulha-costeira-em-cerimonia-com-MAI-mas-sem-Marinha-ddc052c1