Relato interessante do falecido João Salgueiro, Economista e político. E que tinha acesso a informação privilegiada ainda antes do Golpe de 25 de Abril de 74.
Pormenor interessante, o Rosa Coutinho instigou terroristas para assaltar e matar os português, com o objectivo claro de correr com todos os portugueses em Angola!!!!!
Outro aspecto que o revolta, Portugal com a descolonização, deu de borla todos os bens dos portugueses, incluindo casas, terras, empresas, bancos!!!!! Somos uns beneméritos e depois perguntamos porque andamos sempre de crise em crise!!!!! Pois pudera, parecemos o filho rico que dá sem medir o que está a dar e andamos sempre a pedir a mesada e a queixarmo-nos de mais uma crise!!!!!
João Salgueiro: "Os portugueses não se importam"Despachava com Marcello Caetano, que o quis ouvir nas vésperas da revolução. Na altura do 25 de Abril teve duas conversas "rocambolescas", uma com António de Spínola, outra com Sanches Osório. Dizia que Portugal está atrasado porque "os portugueses não se importam". O humor fino era uma das suas características, e foi assim que escandalizou um grupo de senhoras que comentava touradas. Um retrato de João Salgueiro a partir de conversas inéditas.
"Cheguei ao gabinete do general Spínola, ele agarra-me por um braço e mete-me na casa de banho. Enquanto falava puxava o autoclismo constantemente: 'Estamos todos a ser escutados', 'isto não tem hipótese nenhuma'. Não me falou no golpe, mas [quando veio] não me admirei".
A história passou-se com João Salgueiro por altura do 25 de Abril. "Não estava a perceber nada do que se estava a passar. Pouco tempo antes dizia-se que estava tudo tranquilo; havia um problema no norte de Moçambique, mas, tirando isso, nada".
Para compreender as coisas perguntou a três ou quatro pessoas, e alguém lhe disse que Sanches Osório, porta-voz do Movimento das Forças Armadas, estaria disposto a recebê-lo para explicar tudo, tintim por tintim.
Telefonou ao major Sanches Osório e lá combinaram: "Onde?", perguntou. "Em minha casa, se puder". "Quando?" "Amanhã às quatro da manhã". João Salgueiro ri enquanto conta a história, mas segue as indicações à risca e, às três ou quatro da manhã, como combinado, está em casa do militar.
Ao longo das descargas de água, Spínola ia revelando: "Já fiz um disparate hoje""Disse-me coisas que me deixaram aterrado: 'Agora é que verdadeiramente começa a defesa do território nacional', 'tínhamos vergonha de andar fardados e agora temos orgulho na farda', 'a guerra vai ser outro afinco, estavam a defender uma ditadura e agora vão defender o país'. Isto - depois das manifestações dos soldados, de os oficiais se bandearem para o lado do inimigo, de entregarem as armas -, era inverosímil", considera.
Foi então que resolveu falar com António de Spínola, um encontro arranjado por José Blanco, da Fundação Calouste Gulbenkian. Ao longo das descargas de água, Spínola ia revelando: "Não sei como é que isto vai ser... Já fiz um disparate hoje; pensei que tinha sido inteligente, mas eles ficaram tão contentes com a minha decisão que, já percebi, enganei-me. Mandei o Rosa Coutinho para Angola, queria ver-me livre dele". "Eles", claro, eram os militares insurrectos.Anos mais tarde, quando esteve no Instituto de Defesa Nacional, o seu diretor, Altino de Magalhães, que foi vice-chefe do Estado-Maior do Exército e governador do distrito de Uíge entre 1972 e 1974, contou a João Salgueiro "histórias de outra história".
"Disse-me que não havia ali problema nenhum e que quando a coisa se começou a agudizar - uns bandos de africanos com catanas e machados invadiram Luanda e começaram a arrombar as portas dos portugueses -, pôs um pelotão de 30 homens na rua e eles correram tanto a fugir que até deixaram os sapatos para trás".
Altino de Magalhães conta que deu voz de prisão a Rosa Coutinho, por este estar a provocar uma insurreição em Luanda e a fuga de portugueses. Mas diz que quando comunicou a decisão a Lisboa o mandaram libertar o "senhor governador", que estava a "cumprir instruções da capital".
Para João Salgueiro ficou claro que queriam correr com os portugueses de lá. "Então, na África do Sul, que tinha Apartheid, não houve problema nenhum e vamos ter problemas em Angola? Não tínhamos".
"Outra coisa simpática foi oferecer tudo o que era português ao governo de Angola e ao governo de Moçambique. Todas as empresas de portugueses que lá estavam, incluindo os bancos, foram oferecidos ao governo local, sem indemnização. Portanto, os tipos foram corridos artificialmente e ficaram sem nada porque o governo resolveu oferecer o que era dos portugueses. Isto é uma trafulhice de todo o tamanho", indigna-se.A escolha do QuelhasTinha acabado o liceu quando leu um livro que o marcou profundamente, uma edição de bolso sobre a revolução industrial inglesa. "Era muito convincente, porque mostrava como um país que vivia na miséria - esgotos a céu aberto, epidemias constantes, revoltas em que a cavalaria entrava a malhar nos trabalhadores -, era uma potência mundial um século e meio depois, não só pelo poder económico, mas pelo avanço tecnológico e civilizacional".
Impressionado, João Salgueiro passou a interessar-se pelas questões do desenvolvimento. "O meu raciocínio era: se um país atrasado se pode transformar e desenvolver, é como dizer que as doenças podem ter cura. Aqui não é bem uma cura, mas, se o desenvolvimento está ao nosso alcance, é uma obrigação trabalhar para isso. Claro, cada um na sua esfera própria: um médico na saúde pública, um engenheiro nas estradas ou na indústria. Mas, se é possível, temos obrigação de colaborar nisso".
Nas Ciências Sociais, o curso mais parecido com o que queria era a licenciatura na única Faculdade de Economia, o Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras, atual ISEG.
No Quelhas aprendeu que há países com vocação agrícola, como Portugal - produzia bem cortiça, azeite e vinho -, e países com vocação industrial, como Inglaterra - que tinha ferro e carvão.
"Se o desenvolvimento está ao nosso alcance, é uma obrigação trabalhar para isso"E aprendeu também o princípio das vantagens comparativas. "A teoria das vantagens comparativas, uma teoria respeitável de comércio internacional, diz que se um país tem uma vantagem em determinado setor, deve especializar-se nisso. No meu entender, era uma teoria fraudulenta: ao especializar-se na alimentação, onde o consumo é menor do que o de vestuário, por exemplo, um país fica em desvantagem, porque tem um mercado menor e que cresce mais devagar".
"Portanto, tínhamos obrigação de não tomar como bom aquilo que nos ensinavam no Quelhas, uma teoria obsoleta", defendia.
Quando acabou o curso, os convites que recebeu não o atraíram, a não ser o que, na prática, o levaria aos Planos de Fomento. Recusou tudo o que lhe parecia de carreira, "empresas que pagavam mais salário" ou "bancos comerciais que acreditavam que dar crédito ao consumo ou fundo de maneio a empresas era excitante". E começou o seu percurso profissional como economista no Banco de Fomento Nacional, onde esteve entre 1959 e 1963.
Foi então que foi especializar-se em Desenvolvimento Económico para os Países Baixos. Jan Tinbergen, que viria a ser prémio Nobel em 1968, era o orientador da pós-graduação. "Era preciso criar as condições para o país se desenvolver, e isso inspirou todo o meu trabalho", afirma o economista.
O objetivo era criar cá o gabinete de estudos do Banco de Fomento Nacional. Quando regressou, veio também Roberto Fernandes, filho do embaixador português em Washington, que acabaria por voltar para os Estados Unidos por não se adaptar a Portugal - "não percebia porque éramos tão atrasados".
João Salgueiro recorda que quando foi ao enterro do avô, perto de Braga, foi preciso parar cinco vezes pelo caminho "porque o rio saiu do leito e não havia pontes. Fomos obrigados a esperar que o nível das águas baixasse".
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