Para que o Mundo não esqueça

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« Responder #105 em: Março 28, 2005, 07:55:41 pm »
Revoada dos falcões*

Fonte: Folha de São Paulo

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A afirmação de Condoleezza Rice, secretária de Estado dos Estados Unidos, de que "vamos construir um Oriente Médio de tipo diferente", lembra o que disse Cunning quando Bolívar terminou de derrotar os espanhóis em Ayacucho, nos Andes peruanos, em 1830. "A América Latina está livre e é nossa", festejou Cunning, na época ministro do Exterior inglês. A idéia de um "outro Oriente Médio", mais ocidental, menos islâmico, aberto a Israel, submisso a Washington, sempre ocupou a cabeça da agenda de montagem de um "novo século americano", o projeto de expansão imperial dos neoconservadores de Bush.

Rice e seus "vulcânicos", como era conhecido o grupo liderado por ela, se instalaram no Conselho de Segurança Nacional, dentro da Casa Branca, com esse propósito totalmente assumido. O mesmo se aplicou a Paul Wolfowitz, nomeado o segundo na hierarquia do Pentágono. Foi quem fez o "design" da invasão do Iraque e se encarregou de impulsiona-la. As autoridades civis de ocupação ficaram conhecidas como "wolfis", ou os rapazes de Wolfowitz, mas a operação tornou-se pesadelo do ponto de vista militar, tanto que sobreveio a convicção de que novas invasões ficam descartadas.

O projeto teria de encontrar novos instrumentos e por isso, em boa parte, há uma revoada de falcões, Rice pousando no Departamento de Estado, Wolfowitz no Banco Mundial, John Bolton na delegação junto à ONU, etc. Rice se encarrega de manter em ebulição as promessa de "espalhar a democracia", o mote adotado de forma agressiva no discurso de posse do segundo mandato de Bush. O foco é o Oriente Médio e a secretária de Estado cita como um possível modelo a transição nos ex-países comunistas da Europa oriental, hoje agrupados no que Rumsfeld, chefe do Pentágono, saúda como uma "nova Europa", sem os antiamericanismos da velha.

Ao lado de Rice foi colocada uma texana da intimidade de Bush, Karen Hughes, cuja tarefa é "mudar a percepção islâmica em relação aos Estados Unidos". A própria Rice fala que é preciso fazer muito mais do que é feito para "conter a propaganda de ódio muito comum no universo islâmico". É onde entra Hughes, que já foi repórter de televisão. Ela tem como assessora imediata Dina Powell, nascida no Egito, ex-diretora de pessoal da Casa Branca. O advento de um "poder popular", num pais árabe, o Líbano, faz a alegria de Rice e Hughes. É possível mudar sem invasões.

E capitaliza-lo por meio de retórica de intimidação da banda velha. Wolfowitz na presidência do Banco Mundial é encarado como movimento agressivo destinado a colocar o selo do governo Bush na maior fonte de ajuda aos países pobres. O Banco Mundial se torna Banco Americano, segundo o editor da "Foreign Policy". O arquiteto da invasão do Iraque assumirá o comando, caso sua indicação seja confirmada, de uma instituição que dá empréstimos totalizando, em média anual, 20 bilhões de dólares. Não estão isento de exigências. Elas em geral tem enorme influência na formação de políticas dos países que se endividam e com Wolfowitz podem ficar a serviço do governo Bush.

O presidente em retirada, James D. Wolfensohn, designado por Clinton, teve choques freqüentes com o pessoal de Bush. Na ONU se instalará John Bolton, uma nomeação intrigante. Como responsável por questões de desarmamento no Departamento de Estado ele adotou posições unilaterais desfazendo acordos. É em grande parte responsável pela impasse com a Coréia do Norte e quer posições de confronto com o Irã. Passa a representar os Estados Unidos numa instituição, a ONU, que procura manter a vigência de mecanismos multilaterais de negociações.

*Newton Carlos
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« Responder #106 em: Março 31, 2005, 12:50:14 pm »
A história do canadense exportado para tortura*

Fonte: www.tribunadaimprensa.com.br

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NOVA YORK (EUA) - No livro "O Império contra-ataca", saído há pouco, dediquei um capítulo especial à guerra do presidente George W. Bush e seu secretário de Justiça (procurador geral) John Ashcroft contra as liberdades civis dentro dos EUA. E nele citei o engenheiro Maher Arar, um cidadão canadense de 35 anos de idade, nascido na Síria, pai de duas crianças.

O pesadelo que Arar viveu é digno de republiquetas de banana do passado - e dos países mais atrasados do Terceiro Mundo. Mas aconteceu aqui, não em Uganda ou Sudão. No país presidido por Bush, ele foi preso duas semanas depois do 11 de setembro de 2001, no aeroporto Kennedy de Nova York, onde tinha de desembarcar para trocar de avião na rota da viagem de volta a Montreal, procedente de Zurique.

Com seu perfil árabe, Arar não escapou. Levado do aeroporto para o Centro de Detenção do Brooklyn, como suspeito de terrorismo, não teve permissão para falar (nem por telefone) com a família, advogado ou representante consular. E semanas depois foi deportado - não para o Canadá, mas para a Síria, onde sofreria tortura e humilhação por 10 meses, após escala na Jordânia, onde foi acorrentado e espancado.

Há agora um capítulo novo na história dele, relatado ontem aos americanos pelo "New York Tims". Antes de chegar a essa última fase do drama de Arar, vale a pena recordar o resto da história vivida por ele, tal como contada no livro.

Novo tipo de exportação dos EUA

Só mais de um ano depois da prisão Maher Arar pôde voltar ao Canadá, assim mesmo graças a indignada campanha popular. "Sou um pai e um marido. Sou engenheiro de telecomunicações e empresário. Nunca tive qualquer problema com a polícia, fui sempre bom cidadão. Simplesmente não posso acreditar que isso tenha acontecido comigo, que tenham destruído minha vida e minha carreira", disse ele ao programa "60 minutes", da rede CBS de televisão.

Arar processa os governos dos EUA, Síria e Jordânia pela sua temporada de mais de um ano no inferno, cortesia do governo Bush - talvez um capítulo extra do apregoado esforço americano para "disseminar democracia" no mundo. Os interessados podem encontrar mais dados em duas fontes diferentes. Uma delas é o artigo de Peter Beinart na edição de 31 de maio de 2004 da revista "New Republic".

O título ("Outsourcing") é uma alusão ao novo tipo de exportação de Bush - de gente a ser torturada. A reportagem do "60 minutes", de 22 de janeiro de 2004, "His year in hell" (O ano dele no inferno), acrescentou detalhes escabrosos e pode ser lida na internet: www.cbsnews.com/stories/2004/01/21/60II ... 4974.shtml

Esse episódio foi um dos que ajudaram a devassar a política Bush-Ashcroft de exportar suspeitos para tortura em países (Egito, Arábia Saudita, Marrocos, Jordânia, Síria, Paquistão, Uzbequistão, Indonésia, etc.) com os quais os EUA compartem informações de inteligência. Oficialmente a prática foi batizada de "extraordinary rendition". Os críticos preferem chamá-la "outsourcing torture".

"A moralidade daquilo tudo"

A novidade contada pelo "Times" é que seus repórteres afinal conseguiram encontrar registros na Administração Federal de Aviação capazes de corroborar o relato do vôo de Arar (acorrentado a uma cadeira da classe executiva, enquanto seus carcereiros americanos viam filmes e ignoravam solenemente seus protestos). Os registros identificam o jato (Gulfstream III, N829MG), itinerário e tudo.

A descoberta é relevante, pois as autoridades simplesmente negavam toda a história como fantasiosa. Nas alegações levadas a um tribunal em Nova York pelos advogados do Departamento de Justiça, onde pontificava o procurador geral Aschcroft, o governo Bush sustentava que Arar foi deportado para a Síria com base em informação secreta segunda a qual era membro da al-Qaeda.

O vôo dele, dizem os registros localizados, saiu de Nova York para um aeroporto perto de Washington e seguiu daí para o estado do Maine e, depois, Roma, de onde rumou para Jordânia e Síria. A data: 8 de outubro de 2002, dia em que foi assinada a ordem de deportação. "Acho que é este sim. Vocês de fato encontraram o avião que me levou", disse Arar pelo telefone, do Canadá, ao "Times".

Ele acredita que a identificação do avião vai ajudá-lo nos processos judiciais que move contra o governo. "É penoso para mim reviver tudo isso. Mas sei que vai fazer as pessoas entenderem que aqueles fatos aconteceram realmente da maneira como tenho contado. Espero que agora as pessoas parem para pensar por um momento. E façcam uma reflexão sobre a moralidade daquilo tudo".

Guantánamo na rota - e mais aviões

Os registros das viagens do mesmo avião mostram também uma viagem em dezembro de 2003 para Guantánamo, Cuba, onde os EUA mantêm centenas de detidos. É indício de que o mesmo aparelho ainda foi usado pelo governo para transportar gente para a base-prisão dos EUA. A suspeita é de que esse é o quarto avião usado para transporte secreto, clandestino, de presos entre países.

Segundo o "Times", antes foram identificados mais três aviões - um deles é de propriedade de uma companhia aparentemente criada pela CIA, segundo o jornal "Washington Post". Outro avião, descrito pelo "Chicago Tribune", costumava fazer vôos fretados comuns (inclusive para a equipe do Red Sox, de Boston) mas era usado em transporte de detidos para Guantánamo, quando tiravam dele o nome "Red Sox".

O Departamento de Justiça dos EUA recusou-se a cooperar com a investigação iniciada no Canadá sobre o caso Arar. E foi além: pediu a um juiz para arquivar o processo da vítima torturada, a pretexto que poderia revelar "informações secretas", comprometendo a segurança nacional. A gente já viu esse filme, claro. Mas só em países sob controle de ditaduras militares sanguinárias.

*Argemiro Ferreira
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« Responder #107 em: Abril 02, 2005, 01:45:59 am »
Receita para nada apurar sobre a fraude das ADM*

Fonte: www.tribunadaimprensa.com.br

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NOVA YORK (EUA) - A comissão criada pelo próprio presidente dos EUA para investigar por que os EUA erraram tanto ao jurar aos americanos e ao mundo que o Iraque tinha fantásticas armas de destruição em massa (ADM), entre elas até sofisticado programa de armas nucleares, concluiu a tarefa recomendando medidas concretas para que no futuro as informações de inteligência sejam verdadeiras.

Só para efeito de raciocínio, pode-se aceitar o pressuposto de que a culpa foi de fato das agências de inteligência, como sugere Bush - as 15, a começar da CIA, que a cada ano gastam mais de US$ 30 bilhões. E não da cúpula do governo (o presidente e o vice), que já encomendava a elas as informações que queria receber. Até porque a comissão foi criada para explicar por que elas (e não Bush, Cheney & cia.) erraram.

As 600 páginas do relatório, assim, ficam na periferia. Não entram no núcleo da questão. Por exemplo, a comissão horroriza-se com o fato de que informações dadas por uma fonte - o desertor iraquiano de codinome "Ball Curve" - tenham sido levadas a sério. Ele se bandeara para os EUA, bebia demais e queria fazer uns trocados. Inventou mentiras como a dos célebres "laboratórios móveis" de armas químicas.

As mentiras bem remuneradas

O tal personagem podia não ter imaginação suficiente para criar, sozinho, coisa tão sofisticada. Mas pertencia ao grupo do notório Ahmed Chalabi, lobista habituado a freqüentar o Pentágono de Donald Rumsfeld e Paul Wolfowitz, o vice-presidente Cheney e líderes do Congresso. Como Chalabi era remunerado pelo governo, o mínimo que podia fazer era fornecer "fontes" para dizer o que Bush-Cheney queriam.

Provavelmente todo especialista em inteligência com um mínimo de bom senso sabia que informações do tal "Ball Curve" - ou mesmo de Chalabi, pago todo mês com dinheiro do contribuinte americano - não eram confiáveis. Mas também sabia o que a cúpula do governo esperava ouvir. Os "laboratórios móveis", como o inexistente urânio da África, eram na medida: "confirmavam" a existência de ADM.

Estranho era alguém como o então secretário de Estado Colin Powell, que ousava resistir à guerra e contestar tais "informações" de inteligência, resolver recuar depois e comparecer ao Conselho de Segurança da ONU para dar o recado de Bush-Cheney - ou seja, repetir como verdade o que questionava no coração do governo. E era sabido o desprezo de Powell e George Tenet, diretor da CIA, por Chalabi e sua gente.

Os erros do jornalismo submisso

A comissão fez, ao final, 74 recomendações específicas para evitar no futuro os erros (supostamente das agências de inteligência) na avaliação de ADM. Sem ter analisado cada uma delas, desconfio que todas poderiam ser substituídas por apenas uma: o bom e velho bom senso. Como Powell e Tenet, os analistas sabiam que no caso do Iraque gente temerosa de perder o emprego achou conveniente deixar o bom senso de lado.

Valeria voltar ainda a outra pergunta. Por que a mídia, em vez de ter colocado em dúvida as informações claramente suspeitas sobre ADM, optou por engrossar o coro sobre a ameaça daquelas armas inexistentes? E a saudável relação adversária que devia ter com o poder, em nome do interesse público? Não me refiro à mídia patrioteira do australiano Rupert Murdoch e da seita coreana do reverendo Moon.

Falo da mídia respeitável. É sugestivo o papel do "New York Times", talvez o jornal com mais credibilidade no país - e sua opção posterior de fazer uma autocrítica qualificada, igual ao relatório da comissão. Pois teve o cuidado de evitar o núcleo da questão e ainda deixou impunes jornalistas como sua estrela Judith Miller, cujas reportagens enganosas venderam ao público a versão mentirosa do governo Bush.

Entre Blair e Miller, o que é pior?

Em colunas anteriores fiz referência à sobrevivência insólita de Miller nas páginas mais nobres do "Times". Não é difícil entender a razão. Se o que ela fazia era com as bênçãos de cima (e não por iniciativa própria, como Jayson Blair, exorcizado depois de descobertas suas fraudes), não havia por que puni-la pelo jornalismo fradulento. E preservou-se a imagem dela, apesar de suas mentiras terem ajudado a forçar a guerra.

Como há muito comparo os casos de Blair e Miller, fiquei agradavelmente surpreendido por ver que análise igual é feita pela jornalista Amy Goodman no livro "The exception to the rulers", publicado há pouco. "Miller encheu as primeiras páginas do `Times' de falsidades da propaganda do governo. Ao contrário de Blair, as mentiras dela deram pretexto para a guerra, que custou vidas", escreveu Goodman.

Dona de um corajoso programa diário em veículos alternativos do rádio e da TV, Goodman acrescenta no livro um detalhe que eu desconhecia: Miller foi a primeira jornalista a amplificar na mídia (e nas páginas do "Times") a imagem de Cheney, Condoleezza e outros de que era preciso atacar logo o Iraque e não esperar a "prova" de AMD na forma de um cogumelo atômico sobre os americanos. Haverá jornalismo mais irresponsável?

*Argemiro Ferreira
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