Porque é que tivemos de injectar dinheiro na CGD?
"11 grandes devedores da Caixa: cinco estão em liquidação – e há mais quatro que não pagam"Entre os grandes devedores de alto risco da Caixa Geral de Depósitos, há empresas em liquidação e outras que não estão a pagar empréstimos. Perdas de mais de mil milhões já terão sido reconhecidas.
- La Seda/Fábrica de Sines
- Grupo Efacec
- Vale do Lobo
- Autoestradas Douro Litoral
- Grupo Espírito Santo
- Grupo Lena
- António Mosquito
- Reyal Urbis
- Finpro
- Brisal, a concessionária da A17
- Pescanova/Fábrica de Mira
- Não estava na lista, mas é problemático. O caso Berardo
A lista dos maiores devedores em risco da Caixa Geral de Depósitos (CGD) não é oficialmente conhecida. A Caixa e o Ministério das Finanças recusaram entregá-la à comissão parlamentar de inquérito que investigou as causas de recapitalização do banco. Mas há um conjunto de grandes devedores com empréstimos em risco que são públicos. No ano passado até foi divulgada uma lista de 11 investidores que estariam nessa situação, no verão de 2015, que nunca foi desmentida. Alguns destes casos têm vindo a público, com números, nos processos de recuperação e insolvência que entraram no sistema judicial.
Entre os maiores devedores de risco da CGD, há sociedades que foram declaradas insolventes e que se encontram em processo de liquidação. Só nos últimos dois meses, aconteceram três casos, todos com sotaque espanhol. Dois em Portugal — a Artlant (fábrica da ex-La Seda em Sines) e a Acuinova (unidade de aquacultura da Pescanova em Mira), declaradas insolventes em julho — e um em Espanha — a sociedade imobiliária Reyal Urbis que foi para liquidação em junho.
Juntam-se a outras duas grandes devedoras da Caixa que já estavam em processo de liquidação, a Finpro e várias sociedades do Grupo Espírito Santo. No ranking das maiores dores de cabeça no crédito concedido, há ainda, pelo menos, quatro sociedades que não estão a pagar todos os empréstimos ao banco do Estado, encontrando-se em situação de incumprimento.
A Soares da Costa — viu o PER (Processo Especial de Revitalização) recusado pelo juiz, estando agora a preparar um novo plano. Duas concessionárias de autoestradas estão em incumprimento com os bancos financiadores e a sociedade gestora do resort de Vale do Lobo também tem crédito vencido.
As perdas estão quase todas reconhecidas. Ao longo do último ano, a Caixa Geral de Depósitos reforçou substancialmente as imparidades, sobretudo com a chegada à administração de António Domingues. Foi para cobrir as perdas provocadas pela limpeza de maus créditos que foi necessária uma recapitalização tão generosa.
Essa foi, também, a principal razão para a apresentação de prejuízos históricos em 2016 no valor de 1.859 milhões de euros. Está já aqui incluída grande parte dos prejuízos que a Caixa teve de encaixar com a insolvência e incumprimento de grandes devedores. Só as empresas em liquidação, a que se somam a Soares da Costa, que só será viabilizada à custa de um grande perdão de dívida, terão custado 1.400 milhões de euros em perdas de crédito.
O Observador sabe que os casos mais problemáticos foram provisionados quase na totalidade, pelo que o banco público não terá perdas adicionais com estas operações, apesar das falências conhecidas nos últimos dias. Isso mesmo foi afirmado pelo deputado socialista João Galamba, em reação a notícias sobre o impacto negativo das insolvências das unidades da La Seda e da Pescanova.
Mas isto não significa que as perdas não tenham acontecido, no passado ou até no presente. Ainda no primeiro semestre, a Caixa registou mais 300 milhões de euros em imparidades de crédito líquidas.
A comissão parlamentar de inquérito ao banco pediu a lista dos 100 maiores créditos, data de concessão e informação sobre reestruturações e/ou renegociações, bem como o nível de cumprimento, mas a sua entrega foi recusada em nome do sigilo bancário e segredo de supervisão. O relatório que não chegou a ser aprovado, apresentado pelo socialista Carlos Pereira, limitou-se a questionar o racional económico de operações como a La Seda e Vale do Lobo. Entretanto, o caso chegou à justiça.

O Ministério Público está a investigar suspeitas de ocultação de passivo na concessão de créditos da Caixa, sobretudo a partir de 2007. Na mira estão decisões dos órgãos de gestão do banco em várias áreas que são passíveis de configurar o crime de gestão danosa. O inquérito visa os grandes devedores do banco que obrigaram ao registo de imparidades de 1.401 milhões de euros, refere o acórdão do Tribunal da Relação que dá ordem ao Banco de Portugal para entregar documentos ao Ministério Público”.
“Os elementos já reunidos sustentam a suspeita de que a CGD foi confrontada com a necessidade de proceder ao registo de imparidades (desvalorização de ativos) que tiveram em grande parte origem na concessão de crédito, com violação de normas de racionalidade de gestão, nomeadamente no que tange à prestação de garantias, ou outras perdas, sobretudo na área do investimento.”
O MP assinala que as condições destes contratos foram alteradas várias vezes, nomeadamente no que toca a garantias. Denuncia a omissão de alguns registos de incumprimento, como triggers (gatilhos) de imparidades. E diz que foram detetados clientes com operações vencidas que estavam classificados como créditos sem incumprimento.
Algumas destas operações estarão relacionadas com os casos mais bicudos que são do domínio público. A lista divulgada em junho do ano passado pelo jornal Correio da Manhã tinha por base um relatório da comissão de auditoria interna da Caixa, entregue ainda ao Governo liderado por Pedro Passos Coelho, em agosto de 2015.
Este relatório chegou a ser entregue aos deputados da comissão de inquérito, mas de tal forma rasurado que não permitia identificar os clientes do crédito da Caixa. Apesar das cautelas, os devedores, a exposição da Caixa e as imparidades (perdas reconhecidas em balanço) foram notícia, amplamente reproduzida por outros órgãos de comunicação social.
A lista de grandes créditos em risco divulgada em 2016:
Artlant (fábrica da La Seda em Sines) — empréstimos de 476,4 milhões de euros — imparidades de 214 milhões de euros
Efacec (Grupo de engenharia detido pelo Grupo Mello e Têxtil Manuel Gonçalves que vendeu principal empresa a Isabel dos Santos) — empréstimos de 303 milhões de euros — imparidades de 15,2 milhões de euros.
Vale do Lobo (resort de luxo no Algarve) — empréstimos de 282,9 milhões de euros — imparidades de 138 milhões de euros.
Autoestradas Douro Litoral (concessionária da autoestrada no Grande Porto) — empréstimos de 271,3 milhões de euros — imparidades de 181,4 milhões de euros.
Grupo Espírito Santo (várias empresas não financeiras do GES) — empréstimos de 237 milhões de euros — imparidades de 79 milhões de euros.
Grupo Lena (construtora, turismo, concessões) — empréstimos de 225 milhões de euros — imparidades de 76,7 milhões de euros.
António Mosquito (investidor angolano com dois grandes investimentos em Portugal — a Soares da Costa e a Global Media, dona da TSF e DN e JN) — empréstimos de 178 milhões de euros — 49,2 milhões de imparidades.
Reyal Rubis (imobiliária espanhola) — empréstimos de 166,6 milhões de euros — imparidades de 133 milhões de euros.
Finpro (sociedade de investimentos em infraestruturas) — empréstimos de 123,9 milhões de euros — 24,8 milhões de imparidades.
Brisal (concessionária da autoestrada A17) — Empréstimo de 37,9 milhões — imparidades de 22,7 milhões de euros.
Acuinova (fábrica da Pescanova em Mira) — Empréstimo de 37,9 milhões de euros — imparidades de 22,7 milhões de euros.
Esta lista de créditos em risco representava empréstimos de 2,4 mil milhões de euros para imparidades de mais de 1.038 milhões de euros, em números que seriam de 2015. O Observador foi avaliar a evolução de cada um destes grandes devedores, através da consulta de documentos públicos, entre os quais processos que constam no portal da justiça, o Citius, e os relatórios e contas mais recentes disponíveis.
...... e continua
http://observador.pt/especiais/11-grandes-devedores-da-caixa-cinco-estao-em-liquidacao-e-outros-quatro-nao-pagam/Nota: Quando se fala em imparidades, as empresas estão a reconhecer na sua contabilidade que já perderam x€ por um mau empréstimo, mau investimento ou porque um cliente não paga. E quando se começam a colocar imparidades nas contas de uma empresa (banco neste caso), a probabilidade de perda total é grande. Resumindo, quando uma empresa coloca imparidades num determinado montante, reconhece que nunca mais vai ver esse dinheiro, pelo menos.