Note-se, falando por mim e pelo que li aqui, que ninguém está contra este projeto em si mesmo. Novo bote oceanográfico, capaz de arcar com um heli às costas? Ok, na boa. Ainda para mais pago pela UE. O que preocupa é a comunicação da Marinha à volta do mesmo, apresentando-o como algo completamente transformador e capaz de fazer tudo e mais alguma coisa. Primeiro, porque não é verdade e o discurso enganador depois tem consequências nefastas na perceção pública da Marinha e das suas capacidades. Segundo, porque começa a cheirar a desconversa para desviar atenções de outras coisas que fazem falta há muito tempo.
Olha, ocorre-me uma comparação. Tenho medo que isto seja o Aeroporto de Beja da Marinha. Em Beja gastaram 30 milhões para construir três barracões ao lado da pista da Base Aérea N.º11, comprar equipamento, e certificar aquilo tudo como aeroporto internacional. Se foi bom investimento ou não nem interessa para o caso, a questão é que foi um obra pequena (para o sector) mas que foi empolada de tal forma que agora temos metade do país absolutamente convencido de que existe ali uma estrutura equivalente aos aeroportos a construir em Montijo ou Alcochete, ambos projetos de vários milhares de milhões de euros. Tenho medo que a Marinha, ao estar a vender o NRP Holístico como um porta-aviões, acabe por convencer os portugueses de que não é preciso gastar nada em fragatas e submarinos e patrulhas e reabastecedores, etc etc.
É certo que este NPM, aparenta ser um exagero em termos de capacidades no papel, sobretudo quando se coloca a questão se os 100 milhões chegam para tudo. Quanto mais se quer meter no navio, mais risco há de derrapes. É aqui que a Marinha devia ter o bom senso de ter requisitos realistas.
Por outro lado, a conversa do NPM "faz tudo", nada muda face à conversa do Navpol "faz tudo". Utilizavam exactamente os mesmos argumentos para o NPL, tal como chegaram a usar para os NPOs, e mais recentemente nos KC-390. O NPL, chegou a ser colocado, por várias vezes, num patamar de prioridade acima de tudo o resto (excepto NPOs), incluindo acima do substituto do Bérrio, acima da substituição das VdG. E como foi até mencionado antes, até o Exército queria LPD na Marinha em vez dos submarinos. Também vimos episódios em que se adiou o MLU das VdG (orçamentado em LPM), por causa do LPD (compra de oportunidade), e acabámos por não ter nem um nem outro, e agora até temos a VdG encostada. Ou seja, o LPD/NPL, sempre distraiu muita gente para os reais problemas da Marinha.
Também acho que a Marinha não devia tentar vender o navio em questão como "navio faz tudo", acho que é um erro. Pode ressalvar as inovações e as capacidades, mas sem abusar como têm feito. Mas isto não muda o facto de que este é financiado em 100 milhões, e nenhum LPD no mundo Ocidental, se encaixa nesse valor.
E quando se fala "em vez do NPM, a Marinha devia mandar construir um LPD xpto", está-se a ignorar os valores em questão. Valores estes que até devem ser maiores do que falei antes, já que a inflação certamente pesará na construção naval! Se calhar um LPD/LHD pequeno baseado no Mistral, não ficaria a menos de 500 milhões. Alguém acha que a UE iria financiar um navio com esses valores? E se por algum milagre, fosse o caso, então meus amigos, que financiem novas fragatas em vez de um LPD!
É claro que a conversa seria outra, se este navio não fosse financiado, e fosse o nosso curto orçamento de defesa a pagar por ele.