Resolução do Parlamento Europeu, de 23 de Outubro de 2008, sobre a pirataria no mar
O Parlamento Europeu ,
– Tendo em conta a sua Resolução de 20 de Maio de 2008 sobre uma política marítima integrada para União Europeia(1) ,
– Tendo em conta a sua Resolução de 19 de Junho de 2008 sobre o assassínio banalizado de civis na Somália(2) ,
– Tendo em conta as Conclusões do Conselho "Assuntos Gerais" de 15 de Setembro de 2008,
– Tendo em conta as Conclusões do Conselho "Relações Externas" de 26 de Maio de 2008,
– Tendo em conta a Acção Comum 2008/749/PESC do Conselho, de 19 de Setembro de 2008, relativa à acção de coordenação militar da União Europeia de apoio às Resoluções n.º 1816 (2008) (EU NAVCO) e 1838 (2008) do Conselho de Segurança das Nações Unidas (3) ,
– Tendo em conta a Convenção das Nações Unidas de 1988 para a Supressão de Actos Ilícitos contra a Segurança da Navegação Marítima,
– Tendo em conta as Resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas n.° 1816 (2008), de 15 de Maio de 2008, e 1816 (2008), de 2 de Junho de 2008, sobre a situação na Somália,
– Tendo em conta o n.º 2 do artigo 103.º do seu Regimento,
A. Considerando que a pirataria no alto mar representa uma ameaça crescente à vida humana e à segurança, em especial nas águas ao largo da Somália e do Corno de África, incluindo a ajuda humanitária a cerca de 3,5 milhões de pessoas que carecem de assistência,
B. Considerando ainda que foi já denunciado o incremento da pirataria noutras regiões do mundo, como o Canal de Moçambique, determinadas águas próximas da Índia ou as Caraíbas,
C. Considerando que a persistência do conflito e da instabilidade política na Somália têm dado origem a actos de pirataria e de roubo à mão armada,
D. Considerando que, no último ano, aumentou o número e a frequência dos ataques criminosos a embarcações comunitárias de pesca, mercantes e de passageiros em águas internacionais junto às costas africanas, pondo em risco a vida das tripulações e tendo um impacto negativo importante no comércio internacional,
E. Considerando que a livre passagem das embarcações que exercem legalmente a sua actividade no alto mar representa uma condição prévia decisiva para o comércio internacional,
F. Considerando que tais actos de pirataria constituem uma ameaça imediata para os marinheiros, cuja subsistência depende do exercício, em condições de segurança e de legalidade, da sua actividade e profissão no mar,
G. Considerando que os pescadores da UE no alto mar têm sido alvo de ataques de piratas, e que a ameaça de pirataria levou um número importante de embarcações pesqueiras da UE a retirarem-se para centenas de quilómetros de distância da costa da Somália ou a reduzir a sua actividade de pesca na região,
H. Considerando que algumas das vítimas de actos de pirataria eram cidadãos comuns que desenvolviam pacificamente as suas actividades a bordo de embarcações de recreio nas águas ao largo do Corno de África,
I. Considerando que tais actos de pirataria são em parte resultado da violência e da instabilidade política na Somália e das suas repercussões no resto da região do Corno de África, mas também contribuem para as mesmas e para as respectivas consequências no que toca à população civil da Somália em termos de exposição a perigos, de falta de desenvolvimento e de interrupções da ajuda alimentar e de outras missões humanitárias,
J. Considerando que, segundo os factos apurados em 2007, foram assassinados 20 membros de tripulações, 153 feridos ou agredidos e 194 raptados,
K. Considerando que, para reagir ao agravamento de tal fenómeno, o Conselho de Segurança das Nações Unidas está actualmente a elaborar uma nova resolução que visa mobilizar a comunidade internacional, tendo em vista melhorar a aplicação dos instrumentos de repressão e de prevenção existentes, no quadro do Direito do Mar ou no quadro das resoluções do Conselho de Segurança,
1. Solicita ao Governo Federal Transitório da Somália que considere, em colaboração com a ONU e a União Africana, como crimes os actos de pirataria e os roubos à mão armada cometidos a partir da costa da Somália contra embarcações que transportam ajuda humanitária, procedendo contra os mesmos através da detenção dos seus autores no quadro da legislação internacional em vigor;
2. Toma nota da Acção Comum 2008/749/PESC, que institui uma acção de coordenação militar de apoio à Resolução n.º 1816 (2008) do Conselho de Segurança das Nações Unidas (EU NAVCO);
3. Solicita aos Estados-Membros que fazem parte do Conselho de Segurança das Nações Unidas que renovem as autorizações concedidas pela Resolução n.º 1816 (2008), de acordo com a intenção inscrita na Resolução n.º 1838 (2008);
4. Solicita à Comissão que procure formas de proteger contra a pirataria as embarcações de pesca, arvorando pavilhão da UE ou outro, que exercem a sua actividade em águas internacionais no noroeste do Oceano Índico, cooperando eventualmente com a Comissão do Atum do Oceano Índico;
5. Lamenta que o Conselho não tenha consultado o Parlamento sobre a decisão de lançar essa operação de Política Europeia de Segurança e Defesa (PESD), e insta o Conselho a fornecer ao Parlamento informações sobre o alcance da referida acção e sobre as tarefas exactas que serão executadas pela "Célula de Coordenação da União Europeia" no Conselho Europeu em apoio da missão marítima da PESD, EU NAVCO;
6. Solicita ao Conselho que estabeleça uma distinção clara entre o futuro mandato PESD e as missões de luta contra a pirataria empreendidas pelos seus Estados-Membros no âmbito da operação "Enduring Freedom" no Corno de África, tendo por objectivo lutar contra actividades terroristas; solicita orientações claras para a detenção dos piratas capturados e para procedimento penal contra os mesmos; solicita ao Conselho que evite qualquer implicação da EU NAVCO no conflito em curso na Somália; solicita uma coordenação eficaz com outras embarcações navais, sobretudo norte-americanas e russas, presentes na região;
7. Insta o Conselho e a Comissão a procurarem garantir a revisão e actualização, tão rápida quanto possível, dos instrumentos jurídicos da Organização Marítima Internacional (OMI) relativos à luta contra a pirataria e ao roubo à mão armada, tendo por objectivo proceder contra os autores desses crimes e obter a sua condenação;
8. Solicita ao Conselho e à Comissão que encorajem os Estados costeiros e todos os Estados-Membros da UE a ratificarem o Protocolo de 2005 à Convenção para a Supressão de Actos Ilícitos contra a Segurança da Navegação Marítima;
9. Convida os Estados-Membros que ainda o não tenham feito a transporem, o mais rapidamente possível, para a respectiva ordem jurídica interna as disposições pertinentes da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (UNCLOS) e da Convenção para a Supressão de Actos Ilícitos contra a Segurança da Navegação Marítima (SUA), permitindo definir claramente as jurisdições e garantir, desse modo, o procedimento criminal, com toda a segurança jurídica, em caso de captura de piratas ou autores de ataques à mão armada cometidos no mar;
10. Congratula-se com a intenção da Comissão de melhorar a coordenação com as agências europeias responsáveis pela segurança marítima, salientando em particular a prevenção das actividades ilícitas (tráfico de seres humanos e de estupefacientes, e imigração ilegal), sobretudo em águas internacionais; insta o Conselho a não equiparar o desafio colocado pelo terrorismo às questões relativas à imigração clandestina e ao tráfico de seres humanos e de estupefacientes;
11. Regozija-se com a iniciativa da Comissão de promover negociações para uma melhor gestão do espaço marítimo com países terceiros, e apoia vivamente o reforço da cooperação com os países vizinhos, tendo como objectivo a protecção dos mares para além das jurisdições nacionais;
12. Condena veementemente o comércio de armas e munições com bandos organizados que cometem actos de pirataria; solicita às organizações internacionais competentes que recomendem medidas preventivas adequadas, a fim de que as armas não cheguem às mãos desses grupos de piratas;
13. Solicita à Comissão que forneça ao Parlamento informações sobre qualquer decisão que possa vir a tomar sobre o financiamento de projectos relacionados com rotas marítimas cruciais no Corno de África, no estreito de Bab-el-Mandeb e no Golfo de Adém;
14. Solicita à Comissão que estude a possibilidade de fornecer apoio prático à Agenda de Saná/Dar-es-Salam da OMI e, em especial, à criação, nesse contexto, de um centro ou sistema regional de informação marítima;
15. Congratula-se com os progressos realizados pelo Conselho Europeu na preparação de uma operação naval da União Europeia contra a pirataria, tendo por objectivo garantir a segurança dos cargueiros em trânsito no interior de um corredor naval no Golfo de Adém;
16. Lamenta que a acção do Conselho não inclua as zonas de pesca dessa região, e solicita a adopção rápida de medidas nesse sentido;
17. Solicita à Comissão que crie o mais rapidamente possível, no âmbito da nova política marítima integrada, um sistema comunitário de coordenação e assistência mútua que permita às embarcações que arvoram o pavilhão de um Estado-Membro e que naveguem em águas internacionais protegerem as embarcações de pesca e mercantes de outros Estados-Membros;
18. Congratula-se portanto com a aprovação de uma alteração pelo Parlamento em primeira leitura ao orçamento geral da União de 2009, tendo por objectivo criar uma nova rubrica orçamental destinada a financiar um projecto-piloto que analise as possibilidades de financiamento, gestão e coordenação de um plano de acção comunitário para a protecção das embarcações comunitárias que transitem ou operem em regiões ameaçadas pela pirataria internacional;
19. Insta a Comissão e os Estados-Membros a apoiarem activamente, no âmbito da ONU e da OMI, a iniciativa promovida por vários Estados-Membros para alargar o direito de perseguição por mar e ar às águas territoriais dos Estados costeiros, desde que os países em causa dêem o seu acordo, e a desenvolverem um mecanismo de assistência coordenada contra casos de pirataria marítima; solicita igualmente à Comissão e aos Estados-Membros que diligenciem, de forma activa, para garantir a aprovação de uma nova resolução da Organização das Nações Unidas, dado que a Resolução n.º 1816 (2008) expirará em 2 de Dezembro próximo;
20. Manifesta o desejo de que a Comissão e a Organização das Nações Unidas não negligenciem, paralelamente à segurança das embarcações e ao exercício do seu direito de perseguição relativamente ao agressor, a via da cooperação e da normalização políticas com os Estados da região, a fim de lhes permitir reforçar a prevenção e a luta contra a delinquência marítima e as suas múltiplas motivações;
21. Solicita ao Conselho e aos Estados-Membros que expliquem os objectivos da operação militar naval da UE no quadro da Resolução n.º 1816(2008) do Conselho de Segurança das Nações Unidas, com o objectivo de pôr termo aos roubos à mão armada e aos actos de pirataria ao largo das costas da Somália; reconhece que as Resoluções n.ºs 1816(2008) e n.º 1838 (2008) do Conselho de Segurança das Nações Unidas foram redigidas ao abrigo do Capítulo VII da Carta das Nações Unidas, como única forma de legitimar o recurso à força; salienta, não obstante, que em caso algum se deverão considerar os actos de pirataria, bem como os actos de luta contra a pirataria, como actos de guerra; insta o Conselho Europeu a tratar a pirataria como um crime, no quadro da legislação internacional em vigor;
22. Solicita ao Conselho que promova todas as diligências para identificar e desmantelar as redes de criminalidade organizada que beneficiam de tais acções;
23. Solicita à comunidade internacional, bem como à Comissão, que disponibilizem todos os recursos humanos e financeiros necessários para apoiar a instituição de um regime democrático e estável na Somália, a fim de lutar eficazmente e a longo prazo contra a pirataria no alto mar;
24. Convida o Conselho e os Estados-Membros a adoptarem normas de intervenção claras e juridicamente incontestáveis para as forças navais empenhadas nessas operações;
25. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho e à Comissão.
(1) Textos Aprovados, P6_TA(2008)0213.
(2) Textos Aprovados, P6_TA(2008)0313.
(3) JO L 252 de 20.9.2008, p. 39.
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