Caro Cabeça de Martelo:
Muito obrigado pela sua resposta! Já não vinha há mais de um ano a este fórum, mas tenho que convir que é mesmo para isto que ele serve: é da contraposição de perspetivas antagónicas que se evolui. Por conseguinte, admito que não me tenha expressado bem no primeiro post:
1 – O regulamento de Operações em vigor no Exército Português, é o RC Operações de 2005. Neste documento, entre muitos outros assuntos, estão previstas as operações envolvendo transporte por meios aéreos, que são (aqui e em qualquer parte do mundo) as operações aeromóveis (Parte III, Cap 7) e as operações aerotransportadas (Parte III, Cap
. Não entrando em mais detalhes, a projeção de força terrestre por intermédio de vetor aéreo ocorre, no caso das operações aerotransportadas, de duas maneiras: desembarque aéreo e aterragem de assalto. O salto do paraquedista enquadra-se na primeira. Percebo perfeitamente o que me diz da diferença entre “paraquedistas” e “aerotransportados”. Há muitas coisas em causa, envolvendo vertentes desde a tipologia de treino e a própria mística. A resiliência que o paraquedista tem de ter para, encontrando-se isolado, após o salto, no espaço de batalha, durante a noite, conseguir manter a calma, reagrupar e cumprir a missão não surge do nada. Mais do que o treino de topografia, ou preparação física, é imperioso haver um cimento moral que confira a esses homens (e mulheres) a certeza de que vão conseguir (sim, porque o ponto crítico do paraquedista não está no salto em si, mas na aterragem e nos momentos seguintes).
No entanto, o assunto que JPMM trouxe dizia respeito a organização militar, nomeadamente quanto a quadros orgânicos que, normalmente, têm subjacentes imperativos de ordem tática e não mística. Ele próprio referiu que lhe parecia que o nosso modelo era baseado no modelo americano, o que também não é totalmente verdade. O que se passa é que os quadros orgânicos têm que ser elaborados de forma a que a força, assim constituída, possa aplicar os conceitos táticos que estão previstos na doutrina em vigor. No âmbito da NATO, a doutrina operacional conjunta tem de ser comum. E esta não pode diferir muito das doutrinas de operações conjuntas das potências com mais capacidades. Neste caso, todos nós, no ocidente, estamos confinados a seguir as tendências norte-americanas, com algumas variações que derivam das particularidades de cada país.
Em resumo, no que diz respeito a organização militar, a doutrina em vigor di-lo claramente: paraquedistas ou não, o que estas forças executam são operações aerotransportadas. E os quadros orgânicos não são elaborados de acordo com os lugares disponíveis no avião, mas sim de acordo com o que a força tem de executar no ªâmbito do plano tático terrestre.
2 – O nível de Ambição para o Exército, ainda em vigor, foi definido em 2007. Este nível de ambição traduziu-se por várias transformações organizacionais e foi definido no Plano de Médio e Longo Prazo, que se trata de um documento confidencial. No entanto, parte da materialização deste plano é do domínio público, nomeadamente, no que aqui se trata, que são as três brigadas. As três fazem parte daquilo que se chama a Força Operacional Permanente do Exército (FOPE), cujo nível de ambição é ter uma Brigada completa projetada, ao abrigo dos compromissos internacionais, ou, em alternativa, ter até três unidades de escalão batalhão (UEB) projetadas em Teatros diferentes. Até hoje, foi sempre esta segunda opção que se executou (e nunca atingindo o limite dos três batalhões). Na génese das brigadas, admitiu-se que as suas únicas que poderiam ser projetadas enquanto brigadas, seriam a BrigMec e a BrigInt, sendo que a BRR projetaria, como diz – e bem – subunidades constituídas de acordo com o requerido. É por essa razão que a BRR carece da maioria das unidades de apoio de combate de uma Brigada, pois acaba por ser uma Brigada mais para fins administrativos do que operacionais. Significa, também, que a tendência dos batalhões paraquedistas (e as companhias de comandos), é incorporarem o máximo de capacidades de apoio de combate aos mais baixos escalões, entrando-se, aqui, numa dialética entre se aumentar o armamento (especialmente coletivo) aos mais baixos escalões lhes incrementa ou retira capacidade de combate.
São os batalhões paraquedistas que apresentam maiores dificuldades nesta matemática: por um lado, as forças congéneres de outros países encontram-se “encaixadas” em unidades de maior escalão, que lhes proporcionam apoio de combate; por outro lado, a nossa especificidade aponta para a necessidade de concentrar apoio de combate aos mais baixos escalões. Ora, isto interfere claramente na tática e na interoperabilidade quando em operações combinadas. É um assunto longe de ser consensual, desde logo a nível interno, no Exército, mas um aspeto é certo: o mundo está em constante transformação e, hoje em dia, a busca não deve ser a de uma estrutura que seja solução definitiva, mas sim de uma estrutura flexível o suficiente para dar resposta a todo o espetro das operações militares.
Cumprimentos e muito obrigado pelo seu post!
Lemos