Alunos 'entrevistam' director da PSPSem segurança, sem guião, sem condições prévias. Alunos de uma escola de alto risco puderam olhar nos olhos o Director Nacional da PSP e atiraram perguntas incómodas, agressivas e mostraram porque a 'bófia' nem sempre é bem vinda. Oliveira Pereira respondeu a tudo. Sem pestanejar.
Quando é que os polícias têm autorização para matar?Nunca. Só como último recurso, para defenderem a própria vida ou defenderem a vida de alguém. Lembram-se do assalto ao BES, no ano passado? A polícia teve de disparar sobre os assaltantes porque estavam a ameaçar a vida dos reféns. Disparámos quando percebemos que não havia mesmo mais nada a fazer. Foi o último recurso.
Mas porque é que têm de matar sempre? Porque não utilizam outro tipo de armas que não matem?Asseguro-vos que um polícia só mata quando não tem outra hipótese. Há os que matam mal, mas esses são julgados e vão presos. Vou mandar-vos a lista dos polícias que estão presos porque mataram mal ou porque bateram em alguém sem nenhuma razão. Mas não se esqueçam que há polícias que são atacados a tiro. Quando era Comandante de Lisboa tive três homens mortos a tiro na minha zona. E tomem nota de uma coisa: ao contrário do que possam pensar, a lei para os polícias que se portam mal é muito mais dura que para a generalidade dos cidadãos.
(Burburinho na sala. Ouve-se ‘mentira, mentira’)
Não minto, nem venho aqui vender nada. Têm que acreditar do que digo. O que digo é a verdade absoluta.
É Deus?O que quero dizer é que estou aqui de coração aberto a falar com vocês. A explicar o nosso lado para que possam perceber algumas coisas sobre a nossa actuação. Há exemplos muito negativos da actuação da polícia. Mas garanto-vos que esses são castigados.
Podem haver revoltas das populações...As leis têm que ser cumpridas. A polícia existe para assegurar isso. Se não houvesse leis era apenas a ‘lei do mais forte’ que imperava. E vocês sabem bem que nos vossos bairros muitas vezes é isso que acontece. Há uma minoria, que por várias razões tem mais poder, tem armas, e as pessoas sérias são coagidas e ameaçadas. Isso não é admissível. A polícia quer acabar com esse clima de intimidação que há nos bairros. Justiça é a palavra adequada. Gostava de vos dizer uma coisa: o poder é sempre passageiro. Eu hoje estou aqui como Director da PSP, daqui a uns tempos deixou de o ser e volto a andar de autocarro como qualquer um de vocês. Os que pensam que o poder da força que exercem sobre os mais fracos duram para sempre, estão muito enganados. O poder é sempre limitado.
Há rapazes que às vezes se metem em confusão. Vão para a esquadra, levam porrada da polícia e não se podem queixar. Porquê?Todos os dias chegam ao meu gabinete dezenas de cartas de cidadãos a queixarem-se da actuação da polícia. Nada fica de lado. Quem actua mal é castigado. Há multas, suspensões e expulsões. Mas percebam que os polícias são pessoas como vocês. Também erram. E são punidos por isso.
Uma pessoa do bairro que levou com gás de um polícia na cara quis queixar-se e nenhuma esquadra da PSP aceitou a queixa...Como? Isso é uma falta disciplinar muito grave. Qualquer cidadão tem o direito a queixar-se e a polícia o dever de aceitar a queixa. O que vos posso sugerir é que se isso acontecer, queixem-se à GNR ou a outra força policial. Têm que aceitar.
As pessoas podem ter armas para se defenderem em casa?Podem. Devem pedir o respectivo licenciamento à PSP e estarem enquadradas pelos pressupostos previstos na lei. Tem que ser justificada essa autorização. Nem toda a gente tem essas condições. Nem todos pode ter armas, como é lógico.
Se eu fosse delinquente e estivesse a 10 cm de mim, matava-me ou levava-me à esquadra?Matar é sempre como ultimo recurso, em situações muito específicas. Como é óbvio faria todo o possível para levá-lo á esquadra.
Então porque a polícia matou o “Kuku” na Amadora?(Silêncio absoluto)
Como sabem esse caso está em tribunal. Se ficar provado que agiu mal será punido. Não tenham a menor dúvida.
Porque é que não dispararam para a perna ou um braço?E sabem o que aconteceu antes?
(Intervém um mediador social da escola)
Sou da Amadora e conhecia o Kuku. Vocês não sabem tudo. Eles antes roubaram um carro e andavam a assaltar pessoas. Quando a polícia os tentou parar ele começou a disparar contra a polícia.
(Silêncio)
(continua o Director Nacional) Não podem acreditar em tudo o que ouvem. O que distingue uma pessoa inteligente das outras é a capacidade de se questionarem. E vocês têm condições para isso.
Já deu um tiro a alguém?Nunca se justificou.
No outro dia estava a haver confusão lá no bairro, com tiros, e a minha mãe ligou para a polícia a pedir ajuda. Perguntaram se eram ‘os pretos’ e disseram que iam lá depois. Isto é racismo?A polícia não tem preconceitos. Há milhares de polícias que moram em bairros sociais como os vossos.
Porque é que a maioria das vezes a polícia não vem quando pedimos ajuda e só aparece para bater?(Aplausos)
Não interpretem esta conversa como uma competição. Não é precisa tanta agressividade. Percebo o vosso ponto de vista, mas não acham que só estão a ver os aspectos negativos? Estes exemplos que estão a dar são pontuais. Há polícias maus. Mas são uma minoria. Aqui nesta sala, por exemplo, quantos são maus? (três levantam o braço) Estão a ver? São sempre uma minoria.
(Intervém a subcomissária Luísa Monteiro, Directora do Contrato de Local de Segurança) Vocês só falam dos maus exemplos. E os bons? A polícia conseguiu tirar 50 crianças de famílias que as maltratavam. Passavam fome, eram espancadas. Eram da Quinta do Mocho. Não vamos só lá para bater.(Muitos aplausos)
Porque é que estas boas acções não aparecem nas televisões e nos jornais?É verdade. É um problema que sentimos e que dá, a ver até pelos exemplos aqui trazidos, uma imagem negativa da polícia. Mas o que é que podemos fazer?
Tem razão. Mas porque é que o Estado e a Administração Interna não dão mais condições para a polícia trabalhar?(Aplausos)
Vocês gostavam de ter aqui uma piscina não? Portugal é um país pobre e a polícia também. A polícia tem que compensar muitas vezes a falta de material com muito esforço e dedicação. Muitas vezes mais do que devia. Nem imaginam a quantidade de baixas psicológicas que temos.
Fonte:
http://dn.sapo.pt/inicio/portugal/inter ... id=1245818