Talvez seja o tópico a que melhor se adequa.
Não é propriamente um "facto espectacular"´mas é um acontecimento interessante e talvez desconhecido para muitos...
O Incidente Laconia
À esquerda, o U-156 , com a bandeira da Cruz Vermelha estendida na ponte, socorre os sobrevivente do Laconia, enquanto que no canto superior direito, o Liberator Americano aproxima-se.A história do "Incidente Laconia" começou na manhã de 12 de Setembro de !942. O U-156 estava em patrulha no Atlântico Sul, entre a costa da Libéria e a Ilha da Ascensão. Comandado pelo Capitão Werner Hartenstein, este submarino alemão era um dos muitos IXC's destacados ao longo da Costa Oeste Africana. Enquanto navegava à superficíe para Sul, um grito de aviso do vigia, trouxe Hartenstein até à ponte do U-Boat. A sua atenção estava fixada na silhueta de um grande navio, sozinho no horizonte distante, a sudeste da sua posição.
O navio, de pavilhão britânico, navegava ao largo da costa africana, a cerca de 500 milhas de terra, e numa área frequentemente patrulhada por aviões aliados, que operavam a partir da base de Freetown.
O Capitão Hartenstein alterou o curso de forma a navegar paralelamente ao navio, mantendo a distância de forma a que passassem despercebidos, seguindo o fumo que saía das chaminés do navio britânico, até que se pudesse aproximar, quando a noite chegasse.
Rapidamente percebeu que o seu alvo era o " Laconia" da
British Cunard Star Liner. No inicío da guerra, o Laconia tinha sido convertido num navio de transporte de tropas, armado com artilharia de convés, cargas de profundidade e até equipamente de identificação submarina. Isto fazia do Laconia um alvo militar perfeitamente legítimo.
Werner Hartenstein, comandante do U-165 Mal o sol se põs, Hartenstein aproximou-se do navio britânico, e pelas 22:00, o U-156 estava em posição de ataque. Passado algum tempo, o navio aliado surgiu na mira do submarino, e Hartenstein disparou dois torpedos de uma distância de 2 milhas. Depois de uma silenciosa espera de pouco mais de 3 minutos, tempo que demoraram os torpedos a efecturem o seu percurso, atingiram o seu alvo, e de imediato o "Laconia" parou, começando a afundar-se.
O LaconiaA esta altura, o U-Boat de Hartenstein vem à superficíe, e dirige-se até ao navio na tentativa de capturar oficiais de alta patente. Pelos últimos raios de sol, a tripulação do U-Boat assistia da ponte à destruição que se lhes oferecia perante os seus olhos:
Os sobreviventes lutavam por se manter à superficíe, e muitos deles eram sugados pela deslocação do navio, algumas pessoas amontavam-se em pequenos botes salva-vidas. Era uma cena de caos total, os destroços em chamas iluminanavam o céu escuro, havia cadávares a flutuar por todo o lado, os gritos de pânico e de dor eram insuportáveis.
À medida se iam aproximando do navio destruído, a tripulação do U-571 parecia ouvir vozes em italiano a pedir ajuda: “Aiuto, aiuto” ...
Ainda um pouco confuso, o Capitão Hartenstein recolhe alguns sobreviventes que entretanto nadavam até ao submarino e rapidamente descobre, a verdadeira situação a bordo do Laconia.
O navio transportava cerca de 2732 passageiros; 136 tripulantes, 285 soldados britânicos, 80 civis, incluíndo mulheres e crianças, 160 Guardas Polacos e 1800 prisioneiros de guerra italianos. O "Laconia" não era já, portanto, o navio militar que Hartenstein pensava que fosse...
Apercebendo-se do erro, Hartenstein imediatamente lança uma espectacular operação de resgate. Centenas de sobriventes são recolhidos, incluíndo civis, nomeadamente mulheres e crianças horrorizadas. Muitas são levados para os apertados compartimentos do submarino. Os restantes, subiam para o tombadilho do U-Boat e ali se amontoavam, entre outros centenas que nos sobrelotados botes salva- vidas se apoiavam, ligando os botes ao submarino através de cordas e cabos.
Os submarinos transbordavam de feridos, mulheres e criançasAinda mais, Hartenstein emitiu pedidos de auxilío para submarinos alemães que estivessem na zona e emitiu uma mensagem rádio, em Inglês claro, transmitindo a posição do U-Boat, e pedindo assistência imediata a navios aliados, prometendo a suspensão das hostilitidades durante o resgate dos sobreviventes.
O U-156 permaneceu à superficíe durante 2 dias e meio, providenciando toda a ajuda necessária e possível, como cuidados médicos, àgua, comida, e cobertores.
Entretanto, no Quartel-General dos U-Boats, em Paris, o Almirante Karl Doenitz estava estupefacto com as acções do U-156. Apesar de ter ordenado que não se fizessem operações de resgate desta natureza, desta vez, ele não só a autorizou, mas como a apoiou, entrando em contacto com outros U-boats para que ajudassem Hartenstein.
Doenitz iria explicar mais tarde, “Dar uma ordem contrária às leis da humanidade iria destruir completamente o moral das tripulações de U-Boat, e eu não poderia dar ordem contrária".
Os sobreviventes são recolhidosDois dias depois, chega o U-506, comandado por Erich Wurdeman, e junta-se à operação. Para apressar o resgate, Doenitz ordena que mais 3 submarinos se dirigissem ao local, de forma a contribuir com a ajuda necessária. Hasteando a bandeira da Cruz Vermelha o U-506 de Erich Wurdeman e o U-507 Harro Schacht chegam 2 dias depois, 15 de Setembro. Mais tarde, juntou-se a eles o submarino italiano Cappelini.
Estes quatro submarinos, que tinham unido esforços para ajudar os sobreviventes, partilhavam agora entre si os náufragos, com os botes de salva-vidas cheios a reboque, centenas deles apinhados no tombadilho, e outros tantos no interior do submarino.
Assim, o grupo zarpou rumo á costa africana, para se encontrarem com os navios de da França Vichy, destinados a proteger os submarinos e acolher os sobreviventes, muitos deles severamente feridos, e a precisar de cuidado urgente.
O resgate prossegue No dia seguinte, 16 de Setembro, às 11:25 da manhã, esta concentração the U-Boats foi avistada por um B-24 Liberator, um bombardeiro americano que operava a partir da ilha da Ascensão. Os sobreviventes e as tripulações acenavam e pediam ajuda. Como a bandeira da Cruz Vermelha estava desfraldada sobre os submarinos, o piloto James D. Harden deu meia volta e comunicou à base por rádio o sucedido, aguardando instruções. O oficial que estava de serviço nesse dia era o Capitão Robert C. Richardson III, e a ordem transmitida ao piloto foi clara:
"Sink sub!" - Afundar Submarino!
Meia hora mais tarde, Harden voava de volta ao local onde estava o grupo de U-Boats, e os sobreviventes lá em baixo sentiram um alivio no espírito, na esperança que o avião americano lhes mandasse mantimentos, medicamentos, mantas...
Em vez disso, ignorando a bem visível bandeira da Cruz Vermelha, foram atacados de forma cobarde e indiscriminada por bombas e cargas de profundidade. Uma bomba aterrou mesmo em cima de um pequeno bote salva-vidas, e centenas de pessoas morreram naquele ataque. Consta que o avião, voando a baixa altitude durante o seu primeiro ataque, era um alvo fácil para as baterias anti-aéreas dos submarinos. Contundo, Hartenstein deu ordens expressas para que as armas não fossem utilizadas. O mortal ataque continuou por mais algum tempo, até que o U-516, ficando danificado, foi forçado a submergir, deixando centenas de vitímas lutando por se manter á tona da água, enquanto que os outros submarinos mergulhavam para escapar ao ataque do bombardeiro americano.
Mais tarde, o U-506 e o U- 507 voltaram ao local, incapazes de aceitar o facto de deixar morrer aquelas pessoas que à umas horas atrás tinham salvo da morte certa.

Felizmente, os navios da França Vichy, tinham chegada de Dakar, e no dia seguinte, recolheram os restantes sobreviventes que até aí tinham estado no convés dos submarinos atacados. No total, registaram-se 1621 mortos e 1111 sobreviventes, incluíndo aqueles que que tinha sido salvos pelos sobrelotados submarinos alemães.
As acções tomadas nesse dia pelo Capitão Richardson foram por muitos consideradas como um grave crime de guerra, embora nunca tivesse sido julgado ou condenado.
Mulheres e crianças recolhidas pelos U-BoatsComo resultado deste incidente, o Almirante Doenitz emitiu uma ordem proíbindo os U-Boats de participarem em operações de salvamento, e mais, de providenciar quaisquer assistência aos sobreviventes de ataques submarinos. Esta directiva ficou conhecida como a "Ordem Laconia".
Até aí, era comum os U-Boats ajudarem os sobreviventes dos seus ataques, providenciando mantimentos, e apontando a direcção mais perto de terra firme. Apesar desta ordem clara, alguns comandantes de U-Boats continuaram a auxiliar os sobreviventes dos seus ataques.
Depois da guerra, Doenitz foi jugado por crimes de guerra, e a "Ordem Laconia" foi exactamente usada como base para a sua acusação. Mais surpreendente, foi o apoio demonstrado por muitas figuras proeminentes da US Navy ao Almirante Doenitz.
O Almirante Chester Nimitz veio em sua defesa, e afirmou mesmo que os Estados Unidos operaram segundo as mesmas leis de combate e resgate de sobreviventes que a Marinha Alemã. Apesar destas evidências, Doenitz foi condenado pelos Tribunal Militar Internacional de Nuremberga, enfrentando condenações por crimes de guerra, e sentenciado a 11 anos e meio de prisão.
As tripulações dos U-Boat's ficaram especialmente ressentidas quanto ao sucedido, ficando sempre, no fundo dos seus pensamentos, a ideia que estavam a ser condenados, não por "crimes de guerra", mas pelo perigo e medo, que ao longo de todo a guerra, tinham imposto aos aliados.
E acima de tudo, que a hipocrisia americana, tinha deixado escapar impune o Capitão Richardson.
Seis meses mais tarde, em 8 de Março de 1943, o U-156 era atacado novamente por um bombardeiro americano, afundando o submarino, com toda tripulação que tinha participado na operação de resgate. Entre os mortos, estava o Capitão Werner Hartenstein, que veio depois a ser considerado um herói por muitos dos sobreviventes que tinha acolhido no seu submarino.