Nova corrida por armas
Ex-ministro das Relações Exteriores e candidato à Presidência do México
Jorge Castañeda
Nas últimas semanas muitos observadores da situação militar da América Latina detectaram o que pode ser o começo de uma nova corrida armamentista na região. O presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva foi fotografado no Tikuna, o primeiro submarino convencional produzido no país. Ele usou a oportunidade para destacar apoio às suas Forças Armadas.
De forma semelhante, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, manifestou a intenção de comprar caças russos Mig 29 e aviões Tucano de vigilância. Faz isso, talvez, por causa dos problemas recentes com a Colômbia. Até o Chile, depois de um lento processo de avaliação de suas opções, ainda está ponderando se compra uma dúzia de caças de fabricação americana (F-16) ou uma alternativa sueca (Gripen).
Estaria havendo uma nova corrida armamentista na América Latina? Se a resposta é sim, há alguma forma concebível de que isso ajude aos problemas sociais e econômicos do hemisfério?
Choques regionais e conflitos de fronteira existem desde tempos imemoriais na América Latina. Houve a Guerra do Chaco e o conflito entre Chile e Bolívia no século 19, a chamada "Guerra do Futebol" entre Honduras e El Salvador nos anos 60, o confronto entre Equador e Peru nos anos 80, e a disputa entre Chile e Argentina por causa da fronteira da Antártica, que finalmente acabou no começo da década de 90. Mas a razão principal para os gastos pesados com armas na América Latina foi quase sempre interna.
Ou o militarismo correu vários países, se armou fortemente e aumentou tropas, ou fracos governos civis com medo de golpes e chantagens tranqüilizaram seus militares com todos os tipos de mimos bélicos desnecessários. Pelos padrões internacionais, os gastos militares na América Latina são baixos; mas apesar disso são excessivos em relação às necessidades da região.
Hoje, a situação é mais complexa. Na Venezuela, claro, é uma preocupação para Chávez deixar os ex-companheiros de Exército contentes. Outro fator são os persistentes conflitos com a vizinha Colômbia, principalmente no sentido das constantes acusações e suspeitas de que Chávez estimula e apóia a guerrilha das Farc. O alto preço do petróleo permite que a Venezuela continue com seus gastos militares, e parece que há pouco a se fazer para evitar isso.
No Brasil, os problemas são de certa forma diferentes. Lula tem conseguido combinar harmoniosamente suas raízes socialistas com o tradicional nacionalismo brasileiro, intenso nas Forças Armadas do país. "Brasil, país grande" é um slogan universal no gigante da América do Sul - um país que tem fronteira com nove vizinhos e o temor de que sua longínqua floresta não seja facilmente patrulhada.
Sentimentos semelhantes são visíveis em outros lugares da região. Mas a questão, em todo lugar na América Latina, é se não seria uma idéia melhor implementar a idéia do ex - e talvez o futuro - presidente da Costa Rica Oscar Arias: uma América Latina desarmada, que direcione "os gastos com espada" em arado. Arias, prêmio Nobel em 1987, tem uma boa razão para promover essa idéia: seu país não tem Exército. Uma iniciativa ousada que deveria ser restaurada em vista da incipiente corrida armamentista da América Latina.
De fato, poderia ser a pedra fundamental de um novo programa para o próximo secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), que será eleito nas próximas semanas. Obviamente, estou torcendo para o candidato mexicano, o ministro Luis Ernesto Derbez. Mas quem quer que seja eleito precisará de novas idéias e iniciativas para revigorar uma instituição adormecida. Frear a germinação de uma corrida armamentista é a melhor idéia que se pode ter. (Project Syndicate)