Poder Aéreo Russo na Invasão da Ucrânia – Factos e Mitos (Parte 7) (Última)
Terminamos esta breve análise á participação das VKS na Ucrânia por destacar as deficiências nas missões de apoio aéreo próximo (CAS) e interdição do campo de batalha. A conclusão é de que as limitações Russas não deveriam ser surpreendentes devido á bem conhecida ausência de “pods” de aquisição de alvos (
targeting pods) laser/GLONASS em comparação com as Forças Aéreas Ocidentais. “Pods” modernos como o
Litening III ou
Sniper são vitais para as tácticas CAS da NATO/US. Equipados com sensores multi-espectrais estabilizados, permitem vigiar, identificar, fixar e atacar alvos de uma distância suficientemente segura para evitar a ameaça dos letais MANPADS. A indústria Russa, apesar de ter desenvolvido alguns protótipos de “pods” para potenciais clientes de exportação, tem sido incapaz de os fornecer em número para as próprias VKS.

O Sukhoi Su-24M “Fencer” baseia a capacidade óptica de ataque no sistema Kaira-24 (seta laranja na foto) localizado na “barriga” do avião. A câmara EO possui modos de contraste e intensificação para melhorar a aquisição de alvos em condições de baixa visibilidade e/ou pouca iluminação (uma substituição muito pobre para a ausência de visão térmica). Tem dois campos de visão – um para procura e um segundo, com cerca de 3x zoom, para identificação de alvos. A distância média de detecção, para um alvo do tamanho de um MBT, é de 5km - especificações muito aquém das capacidades mínimas dos sistemas Ocidentais.
Como avião de ataque dedicado, o Sukhoi Su-34 “
Fullback” possui um sensor electro-óptico retráctil com designador laser chamado
Platan, mas este sistema fornece um campo de visão (
field of view) muito limitado e não inclui capacidade térmica para operações nocturnas ou com mau tempo. O sensor fixo SOLT-25 do Sukhoi Su-25SM3 “
Frogfoot” ou o
Kaira-24 retráctil do Sukhoi Su-24M “
Fencer” oferecem campos de visão ainda mais limitados – o SOLT-25 pelo menos dispõem de capacidade infravermelha. Além dessa desvantagem, os sistemas Russos tem estabilização e capacidade de zoom significativamente inferiores quando comparados com sistemas Ocidentais, o que limita ainda mais a habilidade dos pilotos em encontrar e adquirir alvos no campo de batalha a uma distância segura. O que isto significa na prática, é que mesmo os aviões de ataque dedicados são forçados a voar directamente para a zona de combate enquanto tentam localizar, identificar e fixar posições Ucranianas bem camufladas enquanto usam sensores com capacidade em mau tempo limitada, estabilização pobre e resolução/
zoom insuficiente – o que obriga, por sua vez, a aproximarem-se demasiado dos alvos. Disto resulta uma grande pressão e maior carga de trabalho no cockpit dos pilotos Russos e um perfil de voo que vai aumentar ainda mais a vulnerabilidade frente ás defesas anti-aéreas. E para aviões de ataque não dedicados, como os Sukhoi Su-35S ou Su-30SM, a situação é ainda pior. Para atacar um alvo que não seja devidamente visível no radar ou sem coordenadas precisas GPS/GLONASS, estes aviões, que não possuem sensores electro-ópticos internos, tem de recorrer aos sensores dos próprios mísseis que transportam (por exemplo, o Kh-29T “
Kedge”) para localizar e atacar alvos. Estes sensores, pela sua natureza, são muito mais limitados em termos de custo, espaço, peso e potência quando comparados com sensores equivalentes instalados em aviões ou em “pods” dedicados, portanto oferecem pior resolução de imagem,
zoom e estabilização – além disso, o limite de campo de visão é ainda mais ”estrito” quando comparado com sistemas (já de si limitados) como o
Platan ou SOLT-25.
O sucessor do “Fencer”, o Su-34 “Fullback”, também incorpora um sensor EO/laser ventral, designado como Platan, mas é apenas adequado para uso a médias altitudes devido ao reduzido campo de visão. Conforme vemos nas fotos acima e abaixo, o sistema é retráctil para proteger as ópticas e só se expõem quando estritamente necessário. Quando a Força Aérea da Malásia escolheu o Su-30MKM “Flanker” optou pelo “pod” de aquisição de alvos Damocles da Thales, muito superior a qualquer sistema oferecido pelos Russos. Desde então a Rússia têm cortejado os Franceses para fabricar esse “pod” sob licença para equipar os seus próprios Su-30 e Su-34. 
Na Síria, muitas destas limitações eram mitigadas pelo facto das VKS operarem a média altitude, fora do alcance dos MANPADS, dando tempo aos pilotos para encontrar, localizar e atingir alvos. Mesmo assim, a maioria das munições usadas foram bombas simples (não guiadas) e os alvos resumiam-se a posições fixas em áreas urbanas cercadas – totalmente diferente do cenário na Ucrânia, com alvos pequenos, móveis, bem camuflados e protegidos. O sucesso da campanha aérea na Síria assentou no facto da oposição não ter forma de contestar o controlo dos céus e, por conseguinte, encontravam muitas dificuldades em segurar território debaixo de bombardeamentos e com pouca capacidade de manobra. Na Ucrânia, a incapacidade das VKS em destruir os sistemas SAM móveis impediu-os de operarem a média-alta altitude além das linhas da frente, e a vulnerabilidade aos MANPADS tornou os ataques repetidos a baixa altitude demasiado perigosos. Neste contexto, as limitações técnicas dos Russos, junto com o treino insuficiente dos pilotos, explicam o falhanço na condução de missões CAS e interdição efectivas. Estes impedimentos decorrem, não de insuficiências tecnológicas, mas pelo facto da doutrina militar Russa, como um todo, confiar no uso de artilharia em massa, assaltos mecanizados e fogos de precisão baseados em terra como táctica (a nível operacional) para assegurar letalidade no campo de batalha – o apoio aéreo e interdição surgem como actores secundários. Por conseguinte, a Rússia não investiu fortemente no tipo de sensores, aviões e treino de pilotos que as Forças Aéreas Ocidentais dão por garantido, depois de décadas de campanhas contra-insurreição e manutenção de paz, onde o poder aéreo assegurou o grosso do poder de fogo.