Como que voltando quase ao principio do topico, a lembrar o texto de Giavazzi, chegou-me hoje as maos o texto que segue, da autoria de Joao Ferreira do Amaral, economista portugues conceituado, proximo do PS e consultor economico de Jorge Sampaio, que todos devem conhecer.
A apreciaçao que faz da 'soluçao argentina' e a defesa da respectiva aplicaçao em Portugal, neste caso em contradiçao com o economista italiano, implicaria a saida de Portugal da 'moeda unica' ou o regresso do escudo, como preferirem, dà bem ideia do dramatismo da nossa situaçao presente.
Ignoro se o 'balanço argentino' sera tao positivo assim, se o mesmo é transferivel para a economia portuguesa que julgo bem diferente e sobre as reais consequencias, que J.F. do Amaral nao especifica mesmo reconhecendo os 'custos de saida', porém todos nos temos umas luzes suficientes para vislumbrar alguns deles...( so o aumento, certamente enorme e inevitavel, das taxas de juro, causaria uma perturbaçao dificil de imaginar, nao falando no custo acrescido das importaçoes basicas,...), assim como as vantagens da desvalorizaçao da moeda nas exportaçoes, competitividade em geral, talvez no menor rigor de cumprimento do défice etc ...mas...sera esse um caminho a seguir? Valera a pena ? teremos argumentos proprios e suficientes para seguir por ai ?...
Preocupante !!...embora sabendo que se trata de uma ideia ou opiniao, mas com um peso e vindo de um observador especial, que nao podemos ignorar ...
João Ferreira do Amaral
A recuperação da Argentina
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Pouca gente se tem interessado pelo que se está a passar com a economia argentina. E, no entanto, nada de mais útil e instrutivo para se compreender o que se passa na economia portuguesa e quais os seus caminhos de futuro.
A Argentina, durante vários anos e seguindo as teses de algumas iluminárias com formação adquirida em universidades americanas de meia tigela, seguiu a obnóxia política de manter estável a taxa de câmbio do peso contra ventos e marés, ou seja, qualquer que fosse o ritmo da inflação interna.
Pouca gente se tem interessado pelo que se está a passar com a economia argentina. E, no entanto, nada de mais útil e instrutivo para se compreender o que se passa na economia portuguesa e quais os seus caminhos de futuro.
A Argentina, durante vários anos e seguindo as teses de algumas iluminárias com formação adquirida em universidades americanas de meia tigela, seguiu a obnóxia política de manter estável a taxa de câmbio do peso contra ventos e marés, ou seja, qualquer que fosse o ritmo da inflação interna. Conforme era de esperar, como o ritmo da inflação argentina era relativamente elevado, esta decisão, certamente das mais erradas que algum governo tem tomado em matéria de política económica, levou a uma grande apreciação real da moeda argentina. As consequências não se fizeram esperar: enorme perda de competitividade, problemas insolúveis de endividamento externo e quebra pronunciada da actividade económica, com a consequente crise social generalizada.
Nos dois anos de 2001 e 2002 o Produto Interno Bruto desceu 15% em termos reais, o que fora de situações de guerra, não é fácil de conseguir. Até que em 2002 a política mudou – teve que mudar. O peso argentino desvalorizou mais de 50%. A partir daí, a recuperação da economia argentina tem sido espectacular. O PIB, nestes últimos três anos cresceu 8% ao ano em termos reais e as exportações ainda um pouco mais, 8,3%. Ou seja, a Argentina tornou-se quase do dia para a noite uma caso sério de crescimento económico. O que é que fez a diferença? A taxa de câmbio.
As lições para o caso português são fáceis de tirar. Desde 1992, com a entrada no Sistema Monetário Europeu, que vivemos, tal como a Argentina, com uma taxa de câmbio sobreapreciada (a partir de 1999, com a adopção do euro, é uma taxa de câmbio implícita). Tal como a Argentina, embora felizmente em menores proporções, vivemos uma crise prolongada que, entre outras coisas, tem feito que, mesmo beneficiando, como beneficiamos, de um grande auxílio comunitário, o PIB per capita nos últimos cinco anos tenha descido. É impossível – até pela análise da evolução portuguesa das décadas de setenta e oitenta – deixar de culpar a taxa de câmbio sobreapreciada pelo que se está a passar na economia portuguesa. E consequentemente nenhum economista independente deixará de avaliar como um enorme erro a nossa entrada na moeda única, que fez sobreapreciar e mantém apreciada a taxa de câmbio. A solução dos nossos problemas, mais uma vez tendo em conta a experiência argentina e a nossa própria evolução passada, exige necessariamente uma depreciação da taxa de câmbio.
O que – é bom que enfrentemos a realidade – implicaria a saída da moeda única. Por isso o dilema que enfrentamos é o seguinte: ou nos mantemos na moeda única e espera-nos a estagnação secular; ou saímos e temos oportunidade de crescer e de nos tornarmos mais ricos, mas teremos de suportar os custos da saída, que não serão pequenos.
Por mim, prefiro, apesar de tudo, a segunda opção. Porque os nossos governantes, que tomaram a péssima decisão de aderir à moeda única sem sequer consultarem o povo português foram vítimas duma ilusão infantil: é que com a globalização, as taxas de câmbio deixavam de ter importância. É exactamente o contrário. Numa economia globalizada, onde os choques de competitividade são mais frequentes é justamente onde é necessário dispor do instrumento cambial.
Nem é outra a lição do exemplo argentino.