Esta colecção de perguntas e respostas, é colocada aqui, porque se trata de uma questão que tem a ver com a marinha e é trazida do tópico sobre o F-35.
https://www.forumdefesa.com/forum/index.php?topic=13814.msg461018#msg461018Eu defendi que, os F-35 são demasiado caros e que em termos de aproveitamento do dinheiro, tais verbas se atribuidas à compra de seis submarinos, dariam a Portugal uma capacidade de primeira linha, coisa que não terá com os F-35.
Surgiu então uma questão sobre o facto de em termos de construção naval, ser comum considerar que um navio custa todos os anos, em manutenção, um décimo do seu valor de aquisição.
Este valor é indexado ao valor inicial da compra, pelo que a cada ano que passa, o custo da manuteção á cada vez maior relativamente ao valor do navio que se vai desvalorizando.
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Agora as questões, no que respeita a meios militares:
-Essa percentagem de 10%, é a contar com o preço base do navio ou o preço do contrato assinado na sua compra (que muitas vezes inclui armamento e uma carrada de outras coisas à mistura)? É que aqui os valores variam muito.
Como é evidente, o factor de 10% é um fator de referência. O facto de não ser aleatório, não implica obviamente que seja fixo.
Você terá situações em que os valores não chegam a 6% e outros em que ultrapassam os 15%.
O que é importante realçar, é que o fator de 10% do valor do equipamento adquirido é utilizado de forma muito comum, por pessoas que estão seguramente mais dentro destes assuntos que nós todos juntos.
-Essa percentagem, inclui variáveis como o preço praticado pelo estaleiro que realiza a manutenção?
Essa percentagem não implica variáveis, porque é uma estimativa.
Aliás nem outra coisa faria sentido, porque em muitos casos, o armador não sabe onde o navio vai fazer as reparações.
-Essa percentagem tem em consideração o local onde o navio foi construído? Um Arleigh Burke feito nos EUA, custará cerca de 2200M, um navio igual feito na Coreia do Sul custará cerca de 60 ou 70% desse valor.
Pelo que sei a percentagem, calcula-se para o valor que o navio terá, entregue pelo estaleiro, novo, antes de impostos e do içar da bandeira.
O valor inclui o preço do casco, os motores, a instalação e todos os trabalhos destinados a permitir a utilização normal do navio, incluindo os custos com as provas de mar e o combustível utilizado durante o período em que o navio está em provas.
Considerando o custo de radares, sistemas de segurança, salva-vidas certificados (SOLAS) motores e sistemas de locomoção e apoio e por aí fora, o estaleiro onde o casco foi montado muitas vezes nem representa 33,33% do valor final.
-E se os navios comprados, tiverem o seu preço inflacionado pelos custos de desenvolvimento, ou por os navios ainda se encontrarem numa fase de baixo volume de produção? O custo de manutenção também contempla isto?
Os 10% são para o custo do navio descrito acima, incluindo aí o custo do projeto.
Isto é variavel, porque há casos em que o projeto é entregue ao estaleiro já pronto.
-Como é que se compara custo de manutenção para diferentes sistemas do navio? Como é se formos comparar um canhão de 76mm como o das BD (comprado em segunda-mão, digamos por 2 milhões) vs uma versão mais moderna do mesmo canhão (comprado novo e que custou 20 milhões)? Será que os custos de manutenção e de aquisição são proporcionais?
Se os componentes utilizados para construir o navio forem em segunda-mão, o valor do equipamento novo é tido como referência. Como é evidente, neste caso a percentagem dispara, o que é comum em navios militares, onde são utilizados equipamentos transferidos de outros navios.
-Inclui variáveis como a utilização do meio ao longo do ano, quantas vezes faz a manutenção e de que nível durante o ano, etc?
Não inclui variáveis porque como já disse várias vezes, é uma estimativa e não um cálculo preciso.
Ou seja, como é que é possível extrapolar os custos de manutenção dos navios, quando existem tantas variáveis à mistura?
É por existirem tantas variáveis à mistura, que se convencionou utilizar os 10% como valor de referência. Toda a gente sabe que haverá sempre flutuações, e que essas flutuações podem ser nos dois sentidos.
Eu já tive conhecimento (através de publicações da especialidade) de casos em que um armador esperto conseguiu manter os custos em menos de 6% nos primeiros anos, e de casos em que o armador passados dois anos teve que vender, porque os custos eram demasiado elevados para o que o navio desse lucro ...
Se calhar no mercado civil a regra dos 10% funciona, por os navios serem bem mais simples, não têm tantas variáveis em termos de equipamento.
Os navios civis têm sistemas redundância, muitas vezes tão ou mais sofisticados que navios militares. São diferentes em muitos outros pontos, como as áreas estanques no interior, maior numero de anteparas e maior estanquidade.
Um navio militar, é mais resistente, pode passar mais tempo dentro de água sem ter que ir para a doca seca (e isto tem a ver com o consumo mais que outra coisa qualquer).
São produzidos num volume bem maior, o que reduz o custo de aquisição, mas não reduz o custo de manutenção, etc. Agora claramente não dá para aplicar a mesma regra em meios militares.
Muito pelo contrário, há imensos casos em que o armador vai ao estaleiro com um projeto já feito, e onde o armador apenas analisa o projeto, e diz se pode construir, e que alterações é que propõe no projeto para poder adapta-lo ao estaleiro.
Em imensos casos, o estaleiro pode já ter um projeto feito, mas mesmo assim, quase nunca os navios são iguais uns aos outros. O armador introduz sempre modificações, porque como nos navios militares, pode escolher os motores, toda a eletrónica e mesmo fazer alterações às acomodações internas.
Em termos gerais, se queremos ter navios sempre operacionais e não optar por fazer o que é costume em Portugal, o valor de 10% é provavelmente um calculo por baixo.
Os navios para corresponderem a todos os requisitos para operações NATO, têm que cumprir com um numero de quesitos que implicam um elevado custo no sentido de garantir que todos os sistemas correspondem às necessidades.
Neste aspecto, um navio militar, é provavelmente ainda mais caro de manter que um navio civil.
É claro que podemos sempre trapacear, fingir que as manutenções são feitas, deixar os equipamentos por vistoriar ou as revisões por fazer.
Podemos fazer tudo isto.
Mas isso implica gastar muito dinheiro para depois não beneficiar de um meio muito sofisticado, que para estar operacional precisa garantir que os equipamentos estão a funcionar, e esta garantia custa muito, muito dinheiro.
As contas que faço, têm isso em consideração.
E por isso afirmo que, mesmo para manter duas fragatas modernas de defesa aérea, o orçamento terá que esticar bastante, mas bastante mesmo.