Artigo do Diário Insular de 04/01/2013
LAJES PODE SER ESTATÉGICA NUMA ALIANCA COM O BRASIL
Depois da hipótese de transformar as Lajes num campo de treino para uma empresa dos EUA ou numa base estratégica para a China, levanta-se agora a possibilidade de apostar numa aliança com o Brasil.
As facilidades aeroportuárias dos Açores, nomeadamente da Base das Lajes, são um dos eixos fundamentais motivadores de uma aliança estratégica entre Portugal e o Brasil. A ideia é defendida por Jorge Nascimento Rodrigues, jornalista, no site administradores.com.br, considerado um dos maiores canais online sobre administração e negócios em língua portuguesa.
O texto do especialista, publicado no passado dia 16 de dezembro, adianta que as Lajes - “designadas nos anos 1940 a 1960 pelos americanos como o porta-aviões de betão no Atlântico Norte” -, o aeroporto da Portela e o porto de Sines (para além de outros como o de Lisboa e o do Funchal para o turismo de cruzeiros) “formam um triângulo estratégico de alto valor, interessante para uma potência atlântica em projeção como é o Brasil”. A localização estratégica não é, de facto, a única razão de interesse para uma aliança atlântica entre o Brasil e Portugal. As relações históricas, assim como a língua unificadora, são outros dois motivos fortes.
Neste sentido, escreve-se, Cabo Verde também poderia fazer parte desta aliança. Trata-se, de acordo com Jorge Nascimento Rodrigues, de uma plataforma arquipelágica cuja importância geopolítica é pouco ressaltada.
ALIANÇAS GASTAS
O artigo do site administradores.com.br descontrói a ideia de que Portugal deva apostar numa união exclusiva com a Europa e com a Alemanha, com os EUA ou com Inglaterra. As opções tradicionais, adianta-se, parecem não funcionar.
Jorge Nascimento Rodrigues, também colaborador do semanário Expresso, sustenta que a aliança com a Inglaterra é uma carta gasta. Por outro lado, diz, colocar as esperanças nos EUA começa a mostrar-se obsoleto com as mudanças geoestratégicas de Washington DC para outras paragens.
Já investir na Alemanha pode até ser perigoso. “A Alemanha é hoje provavelmente o principal fautor atual que poderá catapultar a Europa, e em particular a Europa periférica, para a zona de risco geopolítico mundial. Os próprios meios da intelligence norte-americana o sublinham”, diz.
Desta feita, defende, o arco atlântico deve ser considerado do ponto de vista geopolítico, por oposição “à condição de periferia de miséria e de ponto de cruzamento de posicionamento de grandes potências “exteriores” para que a atual estratégia alemã nos está a empurrar”.
Jorge Nascimento Rodrigues vai ainda mais longe. A continuar neste caminho, agarrado à União Europeia e à liderança alemã, Portugal incorre num processo de desacreditação histórico.
“A continuarmos o austerismo e a subserviência aos desígnios da atual estratégia da chanceler Merkel seremos conduzidos a uma condição de estado pária, um enxovalhamento que jamais tivemos nem mesmo no tempo da união de coroas com os Felipes de Espanha ou por ocasião do Mapa-Cor-de-Rosa”, sublinha.
O especialista escreve, por isso, que Portugal vive um impasse, sendo necessário fazer uma rutura estratégica para escapar à “sina de um Estado pária da União Europeia, situação para que esta crise da dívida soberana e a receita do austerismo derivado da estratégia alemã atual nos está a empurrar”.
POTÊNCIA EMERGENTE
O Brasil mostra-se, por isso, uma opção acertada, nomeadamente por tratar-se de uma potência emergente. Embora considere que a importância do país não merece a devida atenção por parte de Portugal, o autor refere que esta aliança tem de começar a ganhar contornos no campo da segurança atlântica e da logística global.
“O Brasil é olhado em Portugal sobretudo como um destino de investimento ou de emigração (...) ou como interessado em “usar” Portugal como porta de entrada na Europa ou nos outros PALOP.
Mas a importância do atual Brasil– democrático e reconhecido crescentemente como uma potência emergente – é outra para Portugal, é geopolítica”, escreve.
No entanto, o jornalista não crê que Portugal deva ligar-se exclusivamente a esta aliança do Atlântico, com o Brasil e Cabo Verde.
Assim, considera, o país deve apostar numa “geometria variável”.
“Significa esta hipótese de alinhamento abandonar a União Europeia e a NATO e partir numa jangada de pedra pelo Atlântico para além das Canárias? Não. Significa introduzir na União Europeia e na aliança militar um valor acrescentado por via do posicionamento estratégico e do goodwill histórico específico de Portugal. O que não impede de seguirmos sempre uma estratégia em geometria variável no plano global, em que a projeção global da China é naturalmente uma peça fundamental do xadrez, bem como da própria Índia”, frisa.
Neste domínio, Portugal poderá fazer uso das relações históricas, que iniciou por altura dos Descobrimentos.
Portugal, escreve, é o único país do mundo que tocou as novas potências do século XXI - Brasil, China e Índia -, assim como potências regionais, como a África do Sul.
A CAMINHO DA GRÉCIA
Caso Portugal mantenha a mesma linha de atuação geoestratégica, corre o risco de torna-se um “shatterbeltv vulnerável a projeções de poder extra-atlânticas e extra-europeias”.
É o que começa a acontecer com a Grécia, “humilhada” por potências da mesma união. “O risco enorme que corre a Grécia de se tornar uma plataforma de cruzamento de interesses estratégicos da China e da Rússia, para além do recrudescer dos velhos fantasmas dos Balcãs e na fronteira euroasiática (envolvendo a Turquia e Israel), não deve ser “importado” para Portugal”, escreve Jorge Nacimento Rodrigues.
IMPRENSA INTERNACIONAL DÁ CONTA DA IMPORTÂNCIA DAS LAJES
Ideias que vem de fora
Se, por um lado, Washington parece querer desinvestir na localização estratégica das Lajes, por outro, há quem veja no lugar potencial que não se esgota numa base adormecida.
Recorde-se, neste sentido, um artigo publicado na “National Review Online”, assinado por Gordon G. Chang, advogado, escritor e autor da obra “The Coming Collapse of China”, que dava conta de um possível interesse das autoridades chinesas pela Base.
Segundo Chang, aliás, a visita, a 27 de junho, do primeiro-ministro chinês, Wen Jiabao, à Terceira, pode não ter sido desprendida de intenções. O especialista dizia acreditar que a Terceira representa agora uma “grande atração” para Pequim. “Se a China controlasse a base, o Atlântico deixaria de ser seguro (...) Aviões chineses poderiam patrulhar as áreas do norte e do centro do Atlântico e, assim, cortar o tráfego aéreo e marítimo entre os Estados Unidos da América e a Europa. Pequim também seria capaz de negar acesso ao mar Mediterrâneo”, argumentava. Para além disso, a China, poderia atingir solo norte-americano, uma vez que “as Lajes ficam a menos de 2300 milhas de Nova Iorque, menos que a distância entre Pearl Harbor e Los Angeles”.
Lembre-se ainda que a Pan Am International Flight Academy estaria interessada em criar um centro de treino para pilotos nas Lajes, ao nível da aviação civil, mas também militar. A notícia foi lançada a 11 de julho pelo diário “Açoriano Oriental”, que dizia ter tido acesso a documentos que dão conta dessa intenção. O jornal escrevia que a Pan Am considera “que a autorização para um futuro centro de treinos de pilotos nas Lajes, com condições para ser montado num curto espaço de tempo ‘facilitaria o sucesso’ do Centro de Formação Aeronáutica dos Açores, recentemente criado em Santa Maria”.
De resto, falou-se ainda, em 2010, na possibilidade de criar um campo de treino de caças norte-americanos na Base das Lajes. DI, aliás, chegou a apresentar as coordenadas da proposta dos EUA sobre essa matéria. Em causa estaria a possível inclusão do espaço aéreo do Corvo.
Em entrevista ao nosso jornal, em abril desse ano, o responsável de negócios da Embaixada dos EUA em Portugal, David Ballard, afirmava que a criação de uma zona de treino para aviões de última geração sobre o Atlântico, tendo como apoio a Base das Lajes, estava dependente de uma decisão política entre Portugal e os Estados Unidos.
“Ainda falta acertar alguns pormenores, é certo. Mas falta uma decisão política”, acrescentava, não avançando mais detalhes. Também a 15 de abril, o Jornal de Notícias (JN) citava fontes do Governo Regional dos Açores para noticiar que os estudos técnicos e ambientais sobre o campo de treinos no Atlântico estavam concluídos e não impediam a concretização deste projeto.