Não consigo ainda perceber os motivos que levaram ao Sr. Presidente da República a dissolver a Assembleia da Republica.
Passados 2 dias, ainda ninguém sabe os reais motivos de tal acto. Só temos assistido a uma série de especulações, interpretações e extrapolações do pensamento de uma pessoa que como máxima figura do Estado e para evitar especulações que corroem a confiança da sociedade nas suas instituições, já deveria ter a muito tempo explicado os motivos que o levaram a tomar tal decisão.
Partindo do principio que a sua decisão se baseou nos últimos acontecimentos que abalaram o Governo, como foram algumas contradições entre alguns membros do mesmo, os comentários mais ou menos infelizes de outros, ou a saída do Ministro Henrique Chaves e as suas criticas ao Primeiro-Ministro na “celebre carta” e aplicando um critério de comparação, nenhum Governo no mundo industrializado duraria mais de 6 meses.
Se aplicarmos isso a realidade portuguesa basta recuar poucos anos e ver aquilo que foram os últimos meses do Governo do Eng. Guterres.
Estou-me a lembrar de episódios como a saída do Dr. Maria Carrilho e as suas bombásticas criticas ao Eng. Guterres, ou a saída da Dra. Manuela Arcanjo do também Governo do Eng. Guterres e as suas declarações demolidoras em directo para rádios e televisões do que ela pensava do então Primeiro-Ministro.
Por tais factos o Governo foi demitido (Governo que só tinha uma maioria simples no parlamento) pelo Presidente da República? A resposta é não.
Mesmo quando o Eng. Guterres se demitiu como Primeiro-Ministro, o Presidente Sampaio convidou o PS a formar Governo, mesmo carecendo este de uma maioria no Parlamento.
É bom lembrar que o Dr. Santana Lopes só tinha 4 meses no Governo (Governo este que foi empossado pelo Presidente Sampaio 4 meses antes), um Governo que não teve tempo de preparar como gostaria e deveria, ao invés de outros que tiveram anos e nas quais as situações acima descritas se sucediam frequentemente.
A situação económica também não deverá ter sido. Estamos em um período de recuperação a nível nacional e Europeu que embora ainda fazendo-se sentir algumas sequelas da recessão que atravessamos a pouco tempo, como o desemprego e o congelamento de salários na função pública, o Governo preparava-se para pela primeira vez em dois anos dar aumentos moderados na função pública, nas pensões e reduzir o IRS, tentando em simultâneo manter controlado o “deficit orçamental”.
Também é bom lembrar os custos que uma campanha eleitoral e umas eleições implicam para a economia do país.
Problemas com a capacidade do Governo legislar e aplicar o seu programa de Governo também não. Este Governo possuía uma maioria estável e coesa no Parlamento que lhe permitia aprovar sem sobressaltos qualquer diploma que ali apresentasse.
Alias, este Governo teve a coragem de em dois anos avançar com mais reformas que outros não fizeram em seis, uma das quais, a chamada Lei do Arrendamento, tão necessária para evitar a degradação dos nossos centros urbanos, irá ficar sem efeito pela dissolução da AR.
Então quais foram os motivos? Uma interpretação abstracta saída sabe-se lá de onde que alega que o Governo não tem condições para garantir a estabilidade governativa?
Se estas dúvidas não forem dissipadas as pessoas começarão a pensar que tudo foi uma jogada política para o Sr. Presidente da República colocar no Governo o partido socialista (que muito recentemente mudou a sua direcção política) e dando um sinal preocupante à sociedade e aos agentes económicos de que de agora em diante um Governo mesmo com uma maioria estável no parlamento pode ser derrubado por uma interpretação abstracta e arbitrária daquilo que é estabilidade.