Aljubarrota - uma nova visão ?

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papatango

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Aljubarrota - uma nova visão ?
« em: Maio 15, 2004, 07:56:01 pm »
Por causa da batalha de Agincourt, e de um estudo apresentado no Discovery Channel sobre as reais razões da vitória inglesa, pensei no seguinte:

Durante muito tempo, se estudou a vitoria Inglesa ocorrida na batalha de Agincourt em 1415, entre as tropas inglesas comandadas pelo rei Henrique V contra as tropas de Carlos VI, rei dos franceses, que não esteve presente na batalha.

As tropas francesas, constituidas por cerca de 6.000 homens (5.000 dos quais arqueiros, de arco longo e os restantes tropas a cavalo) venceram as tropas francesas constituidas por cerca de 20.000 homens entre cavalaria pesada e besteiros.

As razões da vitória inglesa foram sempre apontadas como sendo:

Razão numero 1
A grande qualidade dos arqueiros ingleses que conseguiam disparar uma grande quantidade de setas, contra a cavalaria pesada francesa, e posteriormente sobre a infantaria.

Razão numero 2
O facto de a cavalaria pesada francesa estar num campo ensopado, o que tornava muito mais dificil a sua movimentação, resultando numa completa imobilidade de um cavaleiro com armadura, uma vez caido no chão.

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O argumento numero 2, está provado como tendo tido influência, no entanto foi também provado que o numero de tropas era de tal forma superior, do lado francês que o simples numero impediria os ingleses de ganhar a batalha, ainda mais que nem todos os franceses (longe disso) estarem equipados com armadura.

O argumento numero 1, é também utilizado para justificar a vitória portuguesa em Aljubarrota, sobre castelhanos e franceses.

No entanto, os estudo efectuados (mostrados pelo Discovery Channel) verificou-se que na alta idade média as setas inglesas, não conseguiam perfurar a armadura dos cavaleiros da época. Os arqueiros ingleses eram capazes de provocar razias na infantaria, mas nunca na cavalaria.

Além do mais, tendo a cavalaria chegado ás posições ocupadas pelos arqueiros, os arqueiros passavam a ser “soldados” a pé, deixando de ser uma tropa para atacar á distância.

Além do mais em Agincourt havia uma enorme predominância de arqueiros mais de 80% da tropa, enquanto que em Aljubarrota os arqueiros ingleses não chegavam a representar 10% do total.

Ora, se em Agincourt, os arqueiros acabaram não tendo grande relevância, sendo mais de 80%, então naturalmente, menos importância tiveram em Aljubarrota onde eram muito menos.

Portanto, porque razão os os Castelhanos e os franceses foram derrotados em meia hora  em Aljubarrota, e porque razão os franceses foram derrotados numa manhã em Agincourt ?

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O meu raciocínio

Os estudos mais recentes indicam que Agincour foi travada numa área comprida, no sentido norte-sul, com os franceses a norte e os ingleses a sul.

Nesse campo, dos dois lados (este e oeste) havia declives, o que fazia com que as tropas tentassem avançar pela zona mais alta do terreno para estabelecer contacto com o inimigo, e para evitar a posição desvantajosa de atacar desde uma posição inferior.

Neste ponto encontramos algumas parecenças com Aljubarrota. O campo não estava molhado (muito pelo contrario, era Verão), mas a áreada batalha, escolhida pelo condestável D. Nuno alvares Pereira, era estreito, com a agravante de s castelhanos terem que subir para atacar os portugueses.

Muitas vezes falamos na questão das “tocas de lobo” e outras armadilhas feitas contra a cavalaria, mas no entanto,estas, foram mais eficiente no primeiro dos dois confrontos da batalha de Aljubarrota, que se terá dado por volta da uma da tarde, quando cerca de 2000 homens da cavalaria pesada francesa foram destruidos.

Os restantes 30.000 homens chegaram mais tarde, e nessa altura, na batalha a sério, as armadilhas não tiveram grande importância (pelo menos no sentido que se julga).

As características do terreno, terão obrigado o exército francês a comprimir-se, numa área relativamente estreita, onde não era possível colocar um grande numero de pessoas, pelo que se gerou um efeito que foi já simulado por computador, correspondente ao que acontece numa manifestação ou num concerto de musica, quando há muita gente junta e uma delas cai ao chão.

Gera-se um movimento em cadeia, em que uns caem e empurram os outros.

Em Agincourt, esta terá sido a razão da vitória inglesa.

Óra, existindo razões para estabelecer um paralelo entre Agincourt e Aljubarrota, e sendo os castelhanos em numero muito superior aos franceses, acredito, que o mesmo problema se terá colocado aos castelhanos.

Comprimidos uns contra ou outros, tendo que contornar as armadilhas colocadas,  no combate anterior (contra a cavalaria francesa) os castelhanos não tinham como movimentar as suas tropas com eficiência.

O seu enorme numero, tornaria qualquer movimentação práticamente impossível.

As crónicas, quer a de Froissart quer a de Fernão Lopes, referem que houve uma enorme confusão no lado castelhano, exactamente como em Agincourt, o que considero ter sido uma confusão causada pelo mesmo problema.

As unicas tropas Castelhanas que conseguiram movimentar-se estavam fora do principal campo de batalha, tendo por campo livre movimentado no sentido de tentar atacar as forças portuguesas pela retaguarda.

Quando o fizeram, a tragédia tinha-se instalado no campo de batalha castelhano, deveria haver centenas se não milhares de castelhanos mortos, espezinhados uns pelos outros.

O terror de tal espectáculo terá levado grande parte dos castelhanos a fugir do campo, para tentar escapar á pressão provocada pela multidão de soldados a pé e cavalos que se esmagavam uns contra os outros.

As tropas castelhanas que reagiram, não estiveram nessa “auto-chacina” por isso reagiram. No entando, nessa altura já era demasiado tarde porque as forças portuguesas estavam em condições de os combater, ainda mais que estavam animados pela visão da enorme derrota entretanto sofrida pelos castelhanos no campo principal.

Portanto, a vitória de Aljubarrota, terá provavelmente tido pouco ou quase nada a ver com a ajuda dos ingleses, mas teve, acima de tudo a ver com a determinação das forças avançadas portuguesas e da própria cavalaria que combateu a pé, e ao impedir o grande numero de castelhanos de avançar os forçou a se esmagarem entre si.

Como em Agincourt com os franceses, além da evidente qualidade superior das tropas e dos comandos portugueses, uma grande parte da vitória deveu-se ao facto de os castelhanos, serem em numero demasiado.

Gostaria de ouvir opiniões sobre o tema, nomeadamente se alguém aqui teve ocasião de ver o documentário do Discovery Chanel sobre a batalha de Agincourt.

Cumprimentos
É muito mais fácil enganar uma pessoa, que explicar-lhe que foi enganada ...
 

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Spectral

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« Responder #1 em: Maio 15, 2004, 09:33:19 pm »
Citar
No entanto, os estudo efectuados (mostrados pelo Discovery Channel) verificou-se que na alta idade média as setas inglesas, não conseguiam perfurar a armadura dos cavaleiros da época. Os arqueiros ingleses eram capazes de provocar razias na infantaria, mas nunca na cavalaria.


A questão dos arcos ingleses é muito polémica. Já vi em documentários as setas a não conseguirem perfurar as armaduras, mas também vi noutros a perfurarem portas de madeira de uma grossura muito ( mas mesmo muito) considerável.

No entanto aos ingleses não seria obrigatório atigirem o cavaleiro para o porem fora de acção. Se a seta acertasse no cavalo provavelmente este atiraria o cavaleiro ao chão, com tudo o que isso implica. Mas, ainda há outro ponto a considerar. As armaduras medievais, pelo menos dessa altura, não eram tão pesadas e incómodas como isso. Pelo contrário, tinham o peso muito bem distribuido por toda a armadura, de modo que davam uma grande flexibilidade ao cavaleiro ( num documentário no canal História vi um tipo com uma armadura dessas a dar um mortal para trás).


Quanto a Aljubarrota ( assim como Agincourt) considero essencial, como o Papatango já referiu, a estreiteza do campo de batalha. Aí o número de espanhóis tornou-se simplesmente prejudicial. Além que a contribuição dos arqueiros/besteiros também me parece ter sido sobrevalorizada: pura e simplesmente não eram em número suficiente para causar um efeito muito assinalável.

PS: Agincourt é a batalha do discurso do "We few, we band of brothers..." não é ?

Cumptos
I hope that you accept Nature as It is - absurd.

R.P. Feynman
 

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dremanu

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« Responder #2 em: Maio 15, 2004, 10:49:50 pm »
Excelente "post""  PT, muito interessante. Por mim, digo que o factor decisívo foi a qualidade de liderança das tropas Luso-Inglêsas, e a coragem das mesmas no campo de batalha.

Todos os factores a favor de Portugal demonstram a existência de um plano estratégico por detrás da batalha. Desde a escolha do terreno mais favorável às nossas tropas, à instalação das armadilhas, e a forma como os combatentes foram dispostos no campo de batalha para maximizar o impacto das tropas lusas. E até à própria exploração psicológica do inimigo, que por ter mais numeros, e por possuir a conhecida arrogância cultural Castelhana, com certeza iria descontar a capacidade dos Lusos de ganharem a batalha, e lançar-se ao ataque sem reparar que os Portuguêses tinham vários factores estratégicos e táticos que permitiam a estes iliminar as vantagens numéricas dos Castelhanos.

Nenhum factor material teria feito a diferença a favor de Portugal, não fosse o exército Português ter sido liderado pelo grande Nuno Alves Pereira. A questão das capacidades dos arcos Inglêses, não passa de ser uma tentativa de reduzir algo que foi verdadeiramente o trabalho de um gênio militar.

"Esta é a ditosa pátria minha amada."
 

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emarques

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« Responder #3 em: Maio 16, 2004, 12:08:38 am »
Isso das flechas que penetram ou não a armadura acho que tem um bocado a ver com as teorias do historiador que organiza tudo. Já vi imagens de testes em que uma flecha bate contra uma couraça e é repelida. Também já vi imagens de flechas a penetrar armaduras. Também vi esse tipo que dava o mortal para trás, spectral. ;)

E sim, Azincourt é a batalha do tal discurso.

"We few, we happy few, we band of brothers;
For he to-day that sheds his blood with me
Shall be my brother; be he ne'er so vile,
This day shall gentle his condition:
And gentlemen in England now a-bed
Shall think themselves accursed they were not here,
And hold their manhoods cheap whiles any speaks
That fought with us upon Saint Crispin's day."

Magnífico.
Ai que eco que há aqui!
Que eco é?
É o eco que há cá.
Há cá eco, é?!
Há cá eco, há.