Arquivo britânico revela papéis sobre caso que inspirou 007
DOMINIC CASCIANI
da BBC Brasil
Documentos e fotografias divulgados pelo MI5, o serviço de inteligência britânico, revelam detalhes fascinantes da verdadeira história que inspirou Ian Fleming a criar o personagem James Bond.
Os objetos incluem canetas explosivas e torpedos humanos.
Os documentos estão nos Arquivos Nacionais do Reino Unido e mostram detalhes da guerra secreta para defender Gibraltar. Eles narram uma história de disfarces brilhantes, mulheres fatais e canetas explosivas.
Veja imagens de equipamentos usados na guerra secreta
Eles também mostram a história completa de como um plano italiano envolvendo torpedos humanos inspirou Fleming a escrever "Thunderball", que acabou se tornando um dos primeiros filmes de Bond, "007 Contra a Chantagem Atômica".
Fleming passou a Segunda Guerra Mundial na inteligência naval, e biógrafos mapearam como suas experiências o inspiraram a criar as aventuras de 007.
Batalha
Durante a Segunda Guerra Mundial, o general Franco, da Espanha, se dizia neutro --apesar de ser um "amigo próximo" dos aliados. E apesar de um conflito de personalidade de proporções épicas entre Franco e Hitler, Gibraltar foi poupado de ataques diretos.
No entanto, com os alemães, os espanhóis e os italianos querendo retirar o Reino Unido de sua colônia mediterrânea, uma guerra secreta de espionagem, sabotagem e contrabando começou.
O MI5, liderado por David Scherr, foi acionado para defender os interesses do Reino Unido. A história pessoal de Scherr, desvendada após 60 anos, revela detalhes sobre a contra-espionagem.
Muitos inimigos e informantes viviam em Gibraltar. A equipe de Scherr sabia disso e fazia de tudo para confundir os inimigos sobre os planos britânicos para a colônia.
Em outras ocasiões, agentes alemães é que davam falsas pistas aos britânicos, que faziam buscas intermináveis em mercados à procura de bombas escondidas em vegetais.
Mas apesar de os britânicos conseguirem lidar com os espanhóis e os alemães --impedindo 70 ataques em quatro anos--, Scherr lembra que os italianos eram mais difíceis de combater.
Elite
A arma secreta italiana eram os Fontilla MAS --mergulhares que conseguiram atingir com sucesso 14 navios mercantes em três anos.
Os italianos criaram torpedos especiais que poderiam ser pilotados por mergulhadores até o alvo, tanto saindo da praia quanto de submarinos.
"O método normal de aproximação era ficar na superfície até cerca de 73 a 91 metros do alvo e aí sim submergir", diz Scherr.
"Os homens MAS deixavam dispositivos incendiários no casco do navio e aí escapavam para a costa espanhola usando o torpedo, que os tirava do local."
Inspiração
Segundo Andrew Lycett, biógrafo de Fleming, o autor se inspirou nessa história para escrever "Thunderball", em 1965.
Na história de Fleming, o personagem Emilio Largo usa portas submarinas e torpedos humanos como meio de contrabandear armas nucleares roubadas de seu iate luxuoso, o Disco Volante.
No fato real, os britânicos ficaram confusos com os ataques, graças a falsas informações plantadas pelo inimigo. Mas a rede de agentes duplos britânicos se desenvolveu mais rápido do que o esperado.
Um desses agentes era uma mulher, que se assemelha muito à Bond girl de Fleming.
Com o codinome de a Dama de Copas, "essa era uma mulher com uns 30 anos. Ela sentava, cruzava suas pernas, acendia um cigarro, soltava a fumaça devagar, olhando ao mesmo tempo para o seu nariz, e então ria e dizia: 'Eu sou a dama de copas. Quem é você?'", lembra Scherr.
Foi uma descoberta da Dama que ligou os mergulhadores às autoridades espanholas. Depois foi apenas questão de tempo para que os planos fossem desvendados.
O plano italiano deveria ter causado grandes danos à marinha britânica em 1942. Três torpedos, cada qual com dois homens à bordo, deveriam ser lançados para atingir o navio HMS Nelson e os porta-aviões HMS Furous e Formidable.
Mas dois deles apresentaram defeitos e tiveram de ser consertados rapidamente. Quando eles foram lançados para atingir seus alvos, atiradores navais conseguiram interceptá-los, causando a morte de cinco dos mergulhadores.
A equipe de Scherr descobriria a estratégia dos italianos algum tempo depois.