Prisão de funcionários diplomáticos abre conflito entre Londres e Teerão
O regime iraniano abriu ontem mais uma frente de conflito após prender nove funcionários da embaixada britânica em Teerão, acusando-os de instigar a rebelião interna que se seguiu às eleições presidenciais de 12 de Junho cujo vencedor oficial foi Mahmoud Ahmadinejad.
O caso relembra o sequestro dos diplomatas norte-americanos em Novembro de 1979, uma das mais séries crises políticas que opôs o Irão aos Estados Unidos e que terminou a 28 de Janeiro de 1980 quando, após 444 dias de cativeiro, os 52 reféns foram libertados.
David Miliband, ministro dos Negócios Estrangeiros do Reino Unido, exigiu ontem a "libertação imediata" dos britânicos e voltou a negar o envolvimento dos ingleses no protesto pós-eleitoral.
Miliband participou ontem no encontro dos ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia, em Corfu, e enviou uma mensagem forte a Teerão: "Este tipo de perseguição e intimidação é inaceitável. Pretendemos ver [os funcionários da embaixada] ilesos e em liberdade rapidamente".
Os 27 apoiaram a posição de Londres. Jan Kohout, ministro dos Negócios Estrangeiros da República Checa, que ocupa a presidência rotativa da UE, disse: "Tornámos claro às autoridades iranianas que haverá uma resposta forte e colectiva [da Europa] face à prisão e intimidação dos funcionários estrangeiros e iranianos que trabalham nas embaixadas europeias". Os ministros trocaram impressões sobre os novos passos diplomáticos e alguns defenderam mesmo a imposição de sanções sobre o Irão.
Fosso entre Londres e Teerão
Nas últimas duas semanas, os iranianos detiveram várias pessoas com passaportes britânicos. A agência Fars citou uma fonte governamental que garantia "o papel activo dos ingleses na provocação da recente rebelião".
Os nove diplomatas ingleses foram presos no sábado à noite. Um deles é o principal conselheiro do embaixador britânico no Irão, o homem que mais sabe sobre a complexa teia de poderes da política do país. O regime iraniano decidiu, entretanto, libertar quatro pessoas.
A acção iraniana surge na sequência de um conflito que se arrasta com a Grã-Bretanha há anos, sobretudo desde a presidência de Ahmadinejad. Em Janeiro de 2009, a BBC lançou o seu canal de televisão persa, o que irritou o regime e levou ao encerramento do consulado do Reino Unido em Teerão - provocado por alegadas "perseguições dos iranianos".
O correspondente da BBC em Teerão foi expulso na última semana, após as duras palavras do aiatola Ali Khamenei: "Nesta rebelião, os britânicos comportaram-se muito mal e é justo acrescentar ao slogan "Abaixo a América", o slogan "Abaixo a Inglaterra".
Divisão no aparelho
Apesar da forte repressão policial e paramilitar sobre os manifestantes de Teerão, três mil pessoas concentraram-se ontem numa das praças da cidade para apoiar o candidato da oposição, Hossein Mousavi, informou a Associated Press.
A manifestação foi duramente reprimida com bastões e gás lacrimogéneo, mas foi a primeira que, nos últimos cinco dias, mobilizou milhares de pessoas nas ruas. O aparelho de segurança do regime parecia ter dominado a rebelião interna. Mas no fim-de-semana, os apoiantes do candidato da oposição, Mir Hossein Mousavi, mobilizaram-se novamente. Esta manifestação sucede dois dias depois de Mousavi ter declarado que não aceita "uma recontagem parcial dos votos" e não cede "a pressões e ameaças". O político continua a afirmar que o regime roubou os seus votos e deu a vitória a Ahmadinejad.
A batalha das ruas também se trava nos bastidores do regime, entre as elites políticas. A principal clivagem opõe os conservadores ortodoxos aos reformistas, que começaram já a ser purgados das posições de poder: foi o caso de 17 guardas da revolução e do ministro do petróleo, Akbar Torkan, que escreveu um artigo num jornal da oposição.
O aiatola Rafsanjani está a tentar destituir o aiatola Ali Khamenei no órgão que o nomeia: a Assembleia de Peritos (88). Pretende nomear uma comissão de três aiatolas que dividiram o poder hoje concentrado num único homem.
Ionline