A MODERNIZAÇAO DA FRAGATAS CLASSE VASCO DA GAMA.
por António Coelho Cândido*
requisitos operacionais), essencialmente
por duas ordens de razões: obsolescência logística ou obsolescência operacional. A obsolescência logística é fácil de
compreender para sistemas com mais de
20 anos, enquanto que a obsolescência
operacional está relacionada com o “estado da arte”, requerendo a sua substituição por novas tecnologias, para manter,
e até melhorar, a capacidade operacional
destas plataformas, equiparando-as às
novas construções.
Realça-se, também, a redução significativa do impacte ambiental associado ao
MLU pela aplicação de novos sistemas e
materiais, amigos do ambiente, promovendo-se o alinhamento normativo nesta
área, sempre em evolução.
Outro conceito importante é o Apoio
Logístico Integrado (ALI, ou ILS – Integrated Logistics Support), que consiste numa
metodologia aplicável a todos os projetos
de aquisição de novos sistemas/equipamentos, compreendendo uma abordagem disciplinada que influencia e desenvolve as melhores soluções de apoio
logístico para a sustentação dos meios,
ao longo do seu CV.
Os processos do ALI (fig. 2)(1) têm como
objetivos principais:
• Influenciar o projeto de aquisição/
construção, garantindo que as infraestruturas, ferramentas especiais, lotes de
sobressalentes e a formação e treino são
otimizados para maximizar a fiabilidade/
disponibilidade dos meios, sistemas e
equipamentos ao longo de todo o CV;
• Preparar a sustentação dos meios,
adotando as melhores soluções para a
1. INTRODUÇÃO
As três fragatas MEKO 200 PN da
classe VASCO DA GAMA (FFGH VG),
construídas na Alemanha no final da década de oitenta do século passado, foram
projetadas e construídas obedecendo a
requisitos operacionais fundamentados
em cenários substancialmente díspares
da realidade atual (i.e. guerra fria NATO
- Pacto de Varsóvia em confronto com
os atuais cenários de missões de combate à pirataria) incorporando tecnologia
que, decorridas mais de duas décadas e
meia de intensa exploração operacional,
se encontra logística e/ou funcionalmente
obsoleta. Existe, pois, não só a necessidade, mas, também, a oportunidade de,
simultaneamente, assegurar a sustentabilidade dos sistemas até ao final do seu
ciclo de vida, adequando-os ao atual espectro de missões.
A necessidade de assegurar a sustentação das FFGH VG durante o período remanescente do seu ciclo de vida, previsto
ocorrer até 2035, compele à minimização
da sua obsolescência logística, técnica e
operacional pela via da sua manutenção
e modernização, racional e pragmática,
e assume contornos de um programa
transversal, contemplando um conjunto
de projetos com elevado grau de integração e de transversalidade técnica, sem os
quais os navios deterão apenas capacidades operacionais residuais, não sustentáveis, até ao final da sua vida.
Antes de nos focarmos no processo
de modernização das FFGH VG, apresentam-se alguns conceitos relacionados
com a gestão do Ciclo de Vida (CV) de
um navio, simplificados, mas essenciais a
todo o processo de aquisição e de sustentação logística dos meios de ação
naval (designação normalmente utilizada
para caraterizar os navios e aeronaves da
Marinha).
O CV (fig. 1) pode ser descrito como
o período que decorre desde o início do
projeto de aquisição até ao final de vida
útil, onde se inclui o período de abate.
Aproximadamente a meio da vida útil, surge a designação MLU (Mid-Life Upgrade),
cujo significado representa uma modernização que deve ocorrer por essa altura, e
que está na génese deste artigo.
O CV contempla vários Ciclos de Manutenção (CM), que incluem um período
operacional seguido de um período de
manutenção mais prolongado. O CM típico da Marinha vai desde os 36 meses
para os pequenos navios até aos 80 meses para os submarinos.
O MLU, no caso das FFGH, deve ocorrer após cerca de 20 anos de operação e
tem como objetivo dotar o navio de novos
sistemas (decorrentes, ou não, de novos
sustentação integrada e otimizada ao longo do CV, garantindo o aprontamento e
disponibilidade do apoio logístico desde o
início da operação dos meios (fig. 1).
Os projetos de aquisição de novos
meios navais não se focam apenas na
fase de aquisição/construção, mas sim
em todo o seu CV, para que sejam racionalizados os custos, através da adoção
de soluções de apoio logístico integradas
e otimizadas, desde a fase de projeto até
ao fim de vida (fig. 2).
Foi ao abrigo destes conceitos, entre
outros, que foram construídas as FFGH
VG, entrando ao serviço no início da década de noventa do século passado, tendo
sido projetadas com base em requisitos
operacionais fundamentados em cenários
de emprego diferentes dos atuais, que são
mais diversificados, complexos e em rápida evolução, de que são exemplo o terrorismo marítimo, a proliferação de armas, o
tráfico, a migração irregular e a pirataria.
A atualização de capacidades, especialmente as de guerra antissubmarina,
em navios conhecidos pela sua robustez
e com capacidade para operar dois helicópteros, contribuirá significativamente
para o valor militar desta plataforma, evidenciando o comprometimento de Portugal para a segurança marítima global.
2. PROGRAMA
Pretende-se com este programa estender a vida útil das FFGH VG até 2035,
tendo já sido realizada uma análise de
mercado, a fim de definir o custo de modernização por navio e o correspondente
nível de ambição, incluindo o número de
navios a modernizar, face ao orçamento
disponível.
O desenvolvimento do programa visa
maximizar a comunalidade de configuração entre estas fragatas e as fragatas da
classe BARTOLOMEU DIAS, minimizando
o impacto financeiro e de planeamento,
assim como o risco, através de soluções
de aquisição comuns.
Tendo sido identificado e caracterizado em termos técnicos, financeiros e de
planeamento, o universo dos projetos que
constituem o programa de modernização,
privilegiou-se, em primeiro lugar, a erradicação da obsolescência logística, e em
seguida, o aumento de desempenho e de
capacidade combatente.
Neste contexto e no seguimento do
Conceito Tecnológico de referência desenvolvido, foram identificados e caracterizados em termos técnicos, financeiros e
de planeamento, o universo dos projetos
que irão constituir o Programa de MLU
das FFGH VG, privilegiando-se, como
referido, a erradicação da obsolescência
logística em capacidades imperativas já
existentes a bordo.
Pela sua criticidade e importância
destaca-se a necessidade de modernização dos “cérebros do navio”, nomeadamente, o sistema de gestão de combate
(CMS – Combat Management System) e
o sistema de gestão da plataforma (lPMS
– Integrated Platform Management System):
• O CMS é um sistema nevrálgico, que
confere ao navio capacidade de processamento e análise, constituindo-se como
o elemento funcional integrador da informação proveniente dos vários sensores,
apresentando-a de forma operacionalmente legível ao operador, permitindo o
estabelecimento das possíveis ações num
dado cenário operacional.
• O IPMS é outro sistema nevrálgico
que assegura o comando, controlo e gestão da plataforma, garantindo a adequada
operação dos sistemas e a segurança do
navio. Adicionalmente, mercê do elevadíssimo nível de automação que possui,
poderá vir a permitir uma redução no número de operadores embarcados.
Adicionalmente, dos restantes projetos
previstos no programa de modernização,
revestem-se de particular importância:
• O Electronic Warfare System (EW),
sistema constituído pelos subsistemas de
Electronic Counter Measures (ECM), vulgo jammer, e Electronic Support Measures (ESM) é, no atual contexto operacional, essencial às operações navais, pelo
nível de informação e conhecimento que
confere à plataforma.
• O Integrated Communications Control System (ICCS), sistema produzido
pela empresa nacional EID, representa
a maior incorporação de tecnologia, expertise e incorporação de mais-valia da
indústria nacional no âmbito do presente
Programa. O atual sistema SICC existente
a bordo encontra-se perto da obsolescência logística, sendo de importância
fulcral assegurar a sua sustentabilidade e
uma performance que permita uma gestão eficiente e eficaz das comunicações.
• O Electro-Optical Surveillance System, permitirá dar resposta aos requisitos
de defesa própria, proteção de força e de
o impacto financeiro e de planeamento,
assim como o risco, através de soluções
de aquisição comuns.
Tendo sido identificado e caracterizado em termos técnicos, financeiros e de
planeamento, o universo dos projetos que
constituem o programa de modernização,
privilegiou-se, em primeiro lugar, a erradicação da obsolescência logística, e em
seguida, o aumento de desempenho e de
capacidade combatente.
Neste contexto e no seguimento do
Conceito Tecnológico de referência desenvolvido, foram identificados e caracterizados em termos técnicos, financeiros e
de planeamento, o universo dos projetos
que irão constituir o Programa de MLU
das FFGH VG, privilegiando-se, como
referido, a erradicação da obsolescência
logística em capacidades imperativas já
existentes a bordo.
Pela sua criticidade e importância
destaca-se a necessidade de modernização dos “cérebros do navio”, nomeadamente, o sistema de gestão de combate
(CMS – Combat Management System) e
o sistema de gestão da plataforma (lPMS
– Integrated Platform Management System):
• O CMS é um sistema nevrálgico, que
confere ao navio capacidade de processamento e análise, constituindo-se como
o elemento funcional integrador da informação proveniente dos vários sensores,
apresentando-a de forma operacionalmente legível ao operador, permitindo o
estabelecimento das possíveis ações num
dado cenário operacional.
• O IPMS é outro sistema nevrálgico
que assegura o comando, controlo e gestão da plataforma, garantindo a adequada
operação dos sistemas e a segurança do
navio. Adicionalmente, mercê do elevadíssimo nível de automação que possui,
poderá vir a permitir uma redução no número de operadores embarcados.
Adicionalmente, dos restantes projetos
previstos no programa de modernização,
revestem-se de particular importância:
• O Electronic Warfare System (EW),
sistema constituído pelos subsistemas de
Electronic Counter Measures (ECM), vulgo jammer, e Electronic Support Measures (ESM) é, no atual contexto operacional, essencial às operações navais, pelo
nível de informação e conhecimento que
confere à plataforma.
• O Integrated Communications Control System (ICCS), sistema produzido
pela empresa nacional EID, representa
a maior incorporação de tecnologia, expertise e incorporação de mais-valia da
indústria nacional no âmbito do presente
Programa. O atual sistema SICC existente
a bordo encontra-se perto da obsolescência logística, sendo de importância
fulcral assegurar a sua sustentabilidade e
uma performance que permita uma gestão eficiente e eficaz das comunicações.
• O Electro-Optical Surveillance System, permitirá dar resposta aos requisitos
de defesa própria, proteção de força e de
3. DESAFIOS
E OPORTUNIDADES
Esta modernização distingue-se de
qualquer programa de aquisição de navios pela multiplicidade de contratos e
projetos complexos que a Marinha terá de
gerir em simultâneo. O programa constitui um momento único para desenvolver
e capacitar a empresa Arsenal do Alfeite,
S.A. em projetos de grande envergadura
e complexidade, salvaguardando assim
uma infraestrutura que se pretende capaz
de responder às necessidades de uma
Marinha de Guerra. Por outro lado, num
contexto em que se perspetivam novos
e desafiantes projetos, importa edificar
estruturas de recursos humanos capazes
de gerir, acompanhar e fiscalizar este tipo
de projetos, onde o acompanhamento
próximo das várias etapas do Programa,
por parte do utilizador final, se reveste de
particular importância.
A exemplo do atual ICCS, produzido
pela empresa nacional ElD, que representou a maior incorporação de tecnologia e
de produção da indústria nacional nestes
navios, com grande expressão a nível internacional, também noutros sistemas,
existem oportunidades de envolvimento
de empresas nacionais, especialmente no
Follow-On Support. Neste âmbito, a existência de empresas nacionais com participaçao
pação direta no fornecimento de sobressalentes e na manutenção de sistemas
de comando, controlo e comunicações é
fundamental para a prontidão dos navios.
Ainda como desafios a ter em conta
em qualquer modernização na atualidade,
salientam-se o ciberespaço e os sistemas
não tripulados. No futuro, os ataques cibernéticos, com o objetivo de bloquear
o “comando e controlo”, serão cada vez
mais prováveis e, por conseguinte, ter-se-
-á de assegurar a resiliência cibernética
dos sistemas. Também assistiremos a um
aumento massivo do uso de sistemas não
tripulados, onde a inteligência artificial terá
um papel crescentemente decisivo para
a autonomização, e consequentemente
para o aumento da eficácia e eficiência
destes meios.
Estamos assim diante de um ambiente
complexo que envolverá a ordem mundial
com incertezas e mudanças repentinas,
pelo que os diversos intervenientes que
melhor interpretarem e se ajustarem aos
desafios emergentes estarão na linha da
frente para apresentarem as soluções
mais inovadoras, amigas do ambiente,
economicamente viáveis, sustentáveis e
fiáveis, sendo este último ponto crucial
para a indústria militar naval.
A modernização de meia-vida das
FFGH VG servirá, simplesmente, como
paliativo para as reais necessidades da
Marinha e de Portugal no médio prazo.
Ao abordar este tema, não podemos deixar de referir a necessidade de edificar
a regeneração da Capacidade Oceânica
de Superfície, através de uma “Nova Geração de Fragatas”, garantindo que este
investimento é compreendido e abraçado
pela sociedade portuguesa num quadro
de grandes limitações financeiras. Num
contexto em que as Marinhas do Século XXI se deparam com um ambiente
multifacetado, altamente complexo e de
grande exigência, onde uma nova geografia marítima mundial surge, por via da
delimitação das plataformas continentais,
situação que terá implicações nas relações internacionais. O desafio torna-se
ainda maior, porquanto a tecnologia e as
soluções de baixo custo atualmente existentes podem vir a apontar caminhos que,
inevitavelmente, comprometerão a sustentabilidade operacional da Marinha. Por
conseguinte, para que Portugal continue
a salvaguardar a sua autonomia estratégica, as fragatas, a par de submarinos e
de navios-reabastecedores, constituem
a base da esquadra de qualquer nação
marítima e o meio fundamental para assegurar o controlo do mar nos espaços
marítimos.
Tal como no passado, pensar uma
marinha é um desafio de longo prazo e
o investimento em meios navais de eleva-do custo e grande complexidade deverá
ser pensado em função do ambiente estratégico presente e futuro, naturalmente
alinhado com as Missões e Tarefas decorrentes dos diplomas estruturantes da
defesa nacional e das Forças Armadas,
tornando-se assim necessário, considerando o fim do ciclo de vida das atuais
fragatas em 2035, começar desde já a
desenhar o futuro modelo, adaptado às
circunstâncias do país.
* Superintendente do Material
Vice-almirante