O não a Constituição NÃO é o fim da UE. E ainda bem.
Longa vida a UE.
Talvez sim, ou talvez não, do futuro só deus sabe....
Porque o assunto, que me parece importante, tem sido aqui debatido com interesse, mas de forma algo telegrafica e possivelmente menos compreensivel para alguns membros menos familiarizados com o tema, permito-me desenvolve-lo um pouco mais.Comecemos pela entrevista de
Jean-Claude Juncker(PM do Luxemburgo e Presidente do Conselho da UE):
" E preciso demonstrar aos franceses, que dizer NAO, por mau humor, por razoes conjunturais, é renunciar aos beneficios e vantagens do tratado constitucional.Recusar um texto que pode melhorar as politicas europeias, preferindo os antigos textos, julgados demasiado liberais é totalmente anti-'cartesiano'.O campo do NAO nao é homogéneo.Nao encontro um ponto de convergencia entre os argumentos de M.Fabius(PSF) e M. Le Pen (extrema-direita).Ha no campo do nao, pessoas que querem mais Europa e outros que pensam que se foi demasiado longe.Como po-los de acordo ? Os partidarios do SIM, e sou um deles, nao deveriam dizer que tudo vai ser melhor; uma Constituiçao por si so nao melhora ou deteriora nada.Os parlamentares europeus, eleitos por sufragio universal e os governos nacionais que se apoiam sobre uma legitimidade democratica interna, aplicarao este texto.O que nao difere da Constituiçao da V Republica( actual versao da Constituiçao francesa):ela permitiu a França privatizar e nacionalizar, permitiu a alternancia e a coabitaçao.
(No caso de um NAO)
... nao ha um plano B.Se a França e os Paises Baixos disserem NAO, os outros membros devem prosseguir o processo de ratificaçao previsto.
(questao de Tony Blair retroceder com o plebiscito caso o NAO triunfe em França)
...compreendo que ele tenha duvidas sobre a oportunidade de pedir aos britanicos para irem as urnas, depois de um NAO frances, e renegociar um texto que diluiria o anterior, para ter 'menos Europa'.Se a França diz NAO, mesmo sendo a França, nao se pode retirar aos outros paises o direito de se pronunciarem.O Conselho, no fim abordara esse problema.Os partidarios do NAO, tentam legitimar a ideia que a renegociaçao seria possivel, porque a Constituiçao estaria morta depois de um NAO.Eles tem porém de respeitar a dignidade dos outros paises, tanto mais que eles dao um tao grande valor a Europa das naçoes.A ideia que iriamos todos renegociar, é de uma ingenuidade extrema.De resto como as facetas do NAO sao tao variadas, nao vejo sequer sobre o que poderiamos negociar.
(o tratado poderia ser 'laminado' ?)
...com enormes dificuldades e com alguns estados, excluindo a França, talvez se pudessem arranjar pontos de encontro através do mecanismo da cooperaçao reforçada.Mas nao acredito... se a França disser NAO,se outros a seguissem, e o tratado nao entrasse em vigor, a crise seria tal que seriamos incapazes de seleccionar as disposiçoes do tratado susceptiveis de funcionar sem Paris.Todos os estados membros sao iguais, mas sem a França dificilmente poderiamos seguir...
(a França seria a 'ovelha negra'?)
... A França pode ser o unico estado membro a dizer NAO.A Europa teria entao um problema, mas a França teria um problema bem maior...
(as incertezas francesas nao traduzirao um medo e uma incompreensao face ao funcionamento da Europa?)
... toda a gente fala dos aspectos negativos, ninguém fala dos seus sucessos, como o euro, por exemplo:qual seria o preço do litro de gasolina em França sem moeda unica?Qual seria o estado da industria aeronautica francesa, alema,britanica, sem a Europa? todos os cidadaos estao confrontados com uma densidade tal de problemas que se procuram soluçoes simples.E o NAO responde muito bem ao desejo das nossas sociedades de ter respostas simples.E tao facil dizer NAO, como exigente dizer SIM a forma 'nuancée' com a qual a Europa tenta responder aos problemas.O projecto de tratado clarifica a forma como a Europa funciona, e torna-la mais inteligivel.Os que clamam 'France!France!France!' devem considerar que os negociadores franceses conseguiram aumentar o peso do seu pais em termos de voto.O tratado constitucional visava primeiramente por em ordem os tres tratados existentes, e que fundimos num so texto: é a terceira parte que retoma as disposiçoes anteriores sem as modificar.A primeira e segunda parte descrevem a Europa tal qual ela sera, com a integraçao da Carta dos Direitos Fundamentais e as modalidades de funcionamento da Europa, ou seja a emergencia sob o plano juridico do Estado de direito europeu, que nao existia.
Melhoramos o funcionamento da Uniao, precisamos as suas competencias:todos os cidadaos, parlamentares e homens politicos, saberao onde acabam os poderes do Estado nacional e começam os da Uniao.
(a directiva Bolkestein vai ser revista ?)
... o direito de trabalho é e ficara o do pais onde o serviço é efectuado.Esta fora de questao que a abertura do sector de serviços contribua a minar as bases dos nossos sistemas sociais."
-entrevista de 29/4/2005- ao jornal Le Monde- trad. da minha responsabilidade,desculpem a extensao mas Jean-Claude Juncker,que conheço bem e por quem tenho imenso respeito pessoal e politico,(nao conheço politicos portugueses que se lhe comparem)me parece muito certeiro nas suas observaçoes.
Pessoalmente, penso que a hipotese de um NAO frances(nao sigo Juncker nesse ponto), podera levar a uma' cooperaçao reforçada' entre estados, ou seja a criaçao de nucleos dentro da Europa(lembro apenas como exemplo historico a existencia anterior do Benelux, mas evidentemente agora noutros moldes ).Esta Europa a varias velocidades seria a meu ver a menos favoravel a Portugal ('centrifugaçao' espanhola provavel).
Outra hipotese seria a de que nada se passaria de especial, continuando a Europa a funcionar através do tratado de Nice.Interessante, mas segundo os especialistas pouco provavel, pois Nice foi uma excelente receita para a paralisia das instituiçoes.A Constituiçao era e é indispensavel para o alargamento e as novas adesoes, que ja estao a ser implementadas.
Ainda uma outra hipotese seria a renegociaçao parcial do tratado, mantendo alguns textos e eliminando outros.Mas dificil de aceitar, pois os compromissos actuais foram tantos e por vezes tao contraditorios, que se um estado rejeitar, outros imediatamente tenderao a retornar as suas posiçoes iniciais e voltaremos ao principio, e em muito piores condiçoes( cit.Center of European Reform-GB).
A possibilidade de uma Europa a velocidade variavel ( ou seja alguns paises aplicavam a Constituiçao apos ratificaçao, e outros nao), parece ser dificil de aplicar.Como dizia o jornal alemao Suddeutsche Zeitung ' os paises que nao ratificarem a Constituiçao, deveriam enquanto membros restritos, limitar os seus direitos de voto no Conselho e Parlamento, bem como a participaçao da Comissao, apenas às areas nas quais eles aceitaram a integraçao '. Para além de dificuldades praticas para levar a cabo esta diferenciaçao, ' seria muito dificil imaginar um pais como a França aceitar um estatuto de segunda classe, apesar de, ou até por, ter dito nao a Constituiçao '.
Para muitos observadores a hipotese mais provavel sera uma renacionalizaçao de diversas politicas que estao hoje integradas, uma tendencia que se vinha assistindo ultimamente e que a Constituiçao visava precisamente inverter.Ou seja, um ano apos a reunificaçao do continente com a entrada na Uniao dos paises da Europa central e oriental seria um estranho retrocesso na historia.
Finalmente, e menos abordada, estara a hipotese da dissoluçao a prazo da Uniao Europeia, pouco provavel é certo, mesmo pouco, mas em politica costuma-se dizer que o pior nunca é de excluir totalmente...
Através do site
http://europa.eu.int/scadplus/constitution/index_pt.htm tem links para o texto integral da Constituiçao Europeia, em portugues.