In memorium... Eduardo Prado Coelho Olha -te no espelho

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routechecker

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In memorium... Eduardo Prado Coelho Olha -te no espelho
« em: Setembro 10, 2007, 09:30:33 pm »
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Subject: In memorium... Eduardo Prado Coelho Olha -te no espelho



Eduardo Prado Coelho - In Público

 

A crença geral anterior era de que Santana Lopes não servia, bem como Cavaco, Durão e Guterres. Agora dizemos que Sócrates não serve. E o que vier depois de Sócrates também não servirá para nada. Por isso começo a suspeitar que o problema não está no trapalhão que foi Santana Lopes ou na farsa que é o Sócrates. O problema está em nós. Nós como povo.

 

Nós como matéria-prima de um país. Porque pertenço a um país onde a ESPERTEZA é a moeda sempre valorizada, tanto ou mais o que o euro. Um país onde ficar rico da noite para o dia é uma virtude mais apreciada do que formar uma família baseada em valores e respeito aos demais.

Pertenço a um país onde, lamentavelmente, os jornais jamais poderão ser vendidos como em outros países, isto é, pondo umas caixas nos passeios onde se paga por um só jornal E SE TIRA UM SÓ JORNAL,

DEIXANDO-SE OS DEMAIS ONDE ESTÃO.

 

Pertenço ao país onde as EMPRESAS PRIVADAS são fornecedoras particulares dos seus empregados pouco honestos, que levam para casa, como se fosse correcto, folhas de papel, lápis, canetas, clips e tudo o que possa ser útil para os trabalhos de escola dos filhos... e para eles mesmos.

 

Pertenço a um país onde as pessoas se sentem espertas porque conseguiram comprar um descodificador falso da TV Cabo, onde se frauda a declaração de IRS para não pagar ou pagar menos impostos.

 

Pertenço a um país onde a falta de pontualidade é um hábito. Onde os directores das empresas não valorizam o capital humano. Onde há pouco interesse pela ecologia, onde as pessoas atiram lixo nas ruas e depois reclamam do governo por não limpar os esgotos.

 

Onde pessoas se queixam que a luz e a água são serviços caros.

 

Onde não existe a cultura pela leitura (onde os nossos jovens dizem que é muito chato ter que ler) e não há consciência nem memória política, histórica nem económica. Onde os nossos políticos trabalham dois dias por semana para aprovar projectos e leis que só servem para caçar os pobres, arreliar a classe média e beneficiar a alguns.

 

Pertenço a um país onde as cartas de condução e as declarações médicas podem ser compradas, sem se fazer qualquer exame. Um país onde uma pessoa de idade avançada, ou uma mulher com uma criança nos braços, ou um inválido, fica em pé no autocarro, enquanto a pessoa que está sentada finge que dorme para não dar-lhe o lugar. Um país no qual a prioridade de passagem é para o carro e não para o peão. Um país onde fazemos muitas coisas erradas, mas estamos sempre a criticar os nossos governantes. Quanto mais analiso os defeitos de Santana Lopes e de Sócrates, melhor me sinto como pessoa, apesar de que ainda ontem corrompi um guarda de trânsito para não ser multado. Quanto mais digo o quanto o Cavaco é culpado, melhor sou eu como português, apesar de que ainda hoje pela manhã explorei um cliente que confiava em mim, o que me ajudou a pagar algumas dívidas. Não. Não. Não. Já basta.

 

Como matéria-prima de um país, temos muitas coisas boas, mas falta muito para sermos os homens e as mulheres que nosso país precisa.

Esses defeitos, essa CHICO-ESPERTERTICE PORTUGUESA congénita , essa desonestidade em pequena escala, que depois cresce e evolui até converter-se em casos escandalosos na política, essa falta de qualidade humana, mais do que Santana, Guterres, Cavaco ou Sócrates, é que é real e honestamente ruim, porque todos eles são portugueses como nós, ELEITOS POR NÓS. Nascidos aqui, não em outra parte...

 

Fico triste. Porque, ainda que Sócrates fosse embora hoje mesmo, o próximo que o suceder terá que continuar trabalhando com a mesma matéria prima defeituosa que, como povo, somos nós mesmos. E não poderá fazer nada... Não tenho nenhuma garantia de que alguém possa fazer melhor, mas enquanto alguém não sinalizar um caminho destinado a erradicar primeiro os vícios que temos como povo, ninguém servirá. Nem serviu Santana, nem serviu Guterres, não serviu Cavaco, e nem serve Sócrates, nem servirá o que vier. Qual é a alternativa?

 

Precisamos de mais um ditador, para que nos faça cumprir a lei com a força e por meio do terror? Aqui faz falta outra coisa.

 

E enquanto essa outra coisa não comece a surgir de baixo para cima, ou de cima para baixo, ou do centro para os lados, ou como queiram, seguiremos igualmente condenados, igualmente estancados....igualmente abusados!

 

É muito bom ser português. Mas quando essa Portugalidade autóctone começa a ser um empecilho às nossas possibilidades de desenvolvimento como Nação, então tudo muda..

 

Não esperemos acender uma vela a todos os santos, a ver se nos mandam um Messias.

 

Nós temos que mudar. Um novo governante com os mesmos portugueses nada poderá fazer. Está muito claro... Somos nós que temos que mudar. Sim, creio que isto encaixa muito bem em tudo o que anda a nos acontecer: desculpamos a mediocridade de programas de televisão nefastos e francamente tolerantes com o fracasso. É a indústria da desculpa e da estupidez. Agora, depois desta mensagem, francamente decidi procurar o responsável, não para castigá-lo, senão para exigir-lhe (sim, exigir-lhe) que melhore seu comportamento e que não se faça de mouco,

de desentendido. Sim, decidi procurar o responsável e ESTOU SEGURO QUE O ENCONTRAREI QUANDO ME OLHAR NO ESPELHO.

 

AÍ ESTÁ. NÃO PRECISO PROCURÁ-LO EM OUTRO LADO.

 

E você, o que pensa?.... MEDITE!


 

EDUARDO PRADO COELHO
When people speak to you about a preventive war, you tell them to go and fight it. After my experience, I have come to hate war. War settles nothing: Dwight David Eisenhower : 34th president of the United States, 1890-1969
 

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Luso

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« Responder #1 em: Setembro 10, 2007, 10:32:33 pm »
Permita-me que discorde, routechecker.

Embora seja fácil concordar com os bons sentimentos e a moralidade fácil e cómoda do falecido (perdoe-me mais uma vez a franqueza) - cujo percurso profissional merceria um contraposto com as suas afirmações, julgo que tais raciocinios são prejudiciais para os indivíduos.

Repare ( e perdoem-me a linguagem simplista e rude)

1- O seu vizinho rouba (mas não é por isso que o vai fazer também);
2- O outro seu vizinho rouba;
3- O seu familiar rouba;
4- O funcionário que deveria combater o roubo rouba;
5- O Chefe que deve servir de referência rouba;
6- Os que roubam são louvados;
7- Os que roubam vão de férias para o estrangeiro...

Se o sistema consente com o roubo, porque não foi capaz de criar estruturas para o evitar para o bem de todos e em benefício exclusivo do indivíduo mais "atento às modas", não lhe parece que aquele que não se adapta ao ambiente é o mais fraco e que deve desaparecer?
Não estou aqui a defender o roubo (e se calhar até estou  :mrgreen: ) mas o que pretendo dizer é que a falha só existe quando há regra. E sem regra não há falha!
E uma sociedade eficiente precisa de regras impostas com a força e com a razão. Presentemente há pouca força e a pouca que há geralmente é aplicada sem ou com pouca razão.
O Prado Coelho e outros espertinhos são (eram) muito hábeis em diluir as responsabilidades de quem deve gerir a força e a razão. E em dar lições de moralidade a quem pouco pode efectivamente fazer.
Quem se acredita que teriamos um melhor governo se não nos furtássemos ao pagamento de impostos?
Quem acredita nisso?

A propósito deixo-vos um texto que julgo que vem a propósito (e que será alegadamente da autoria de um magistrado)

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o fim do regime

Já lá vão uns anos Francis Fukyama escreveu um livro que o fez famoso, primeiro pelo arrojo do título, e da tese, e mais tarde, pelo ridículo. O livro chamava-se 'O fim da História', e proclamava a vitória absoluta e definitiva da civilização ocidental. O problema é que a história está longe de acabar. Atente-se em Portugal - com histórias atrás de histórias, muitas sem fim à vista - em que se assiste hoje, ao vivo e em directo, aquilo que mais não é que o fim, o último estertor, de uma espécie de regime. A prova provada que a História está muito longe de ter acabado.

Os sinais andam todos por aí, para quem os quiser ver. A objectividade é coisa que deixou de existir, a única exigência que se requer é a da fidelidade, e tudo - mesmo tudo - se tornou governamentalizado , e governamentalizável. Os factos esses não interessam - só o spin. Vivemos num país onde é possível aprovar um novo Código de Processo Penal, o qual contém uma alínea que de tão insidiosa, (quase) ninguém se recorda de a ter introduzido e - pasme-se de a ter lido. Nem quem o votou, nem quem o aprovou - em Belém. É a velha lei - as rolhas flutuam sempre, e há-as de todas as cores. É a lei... do silêncio em que tudo se arranja, em nome do sossego, de um favor, de uma promoção, ou da chantagem mais ou menos discreta. O medo - basta ver o episódio DREN - também conta.

Vivemos num País onde não é possível mais dissociar o Estado, um ente abstracto - em quem todos deviamos confiar - 'deles'. Já criticamos esta e aquela medida porque 'eles' - sejam quais forem não são de 'confiança'. Portugal agora está assim. Cerceia-se a liberdade básica à informação, ao mesmo tempo que se tenta entreter o bom 'povo' com a mais pura propaganda. Por estes dias até - pasme-se - a cartada nacionalista se agita - seja para proteger o Presidente da Comissão Europeia, seja naquela que é seguramente uma das mais bem montadas (e arriscada - e vamos ver se não também suicida - também) operações das últimas décadas, para salvaguardar o bom nome da nossa polícia, naturalmente a 'melhor' do mundo. Ao mesmo tempo, promovem-se 'reformas' - eufemismo que serve para justificar o controlo e governamentalização estrita de tudo e mais alguma coisa. Estava tudo tão mal, e estava, que tudo passa - porque afinal não poderá ficar pior. Pode, e vai ficar. Sobram, pesem os submarinos, no papel, os militares, que não por acaso, e para quem souber ler, sacaram a Cavaco o único veto realmente relevante que veio de Belém.

O drama disto disto é que a 'rapaziada', dos que nos governam, ao Noam Chomsky português, não percebem que (já) se está no domínio da insustentabilidade. O nacional-porreirismo, o deixa andar, que nos caracteriza permitiu a criação de uma sociedade por castas, onde uns podem podem opinar e mandar, quiçá ter acesso a informação privilegiada e outros não. A tese, e o esquema, tem barbas e nunca deu grandes resultados. Eles, os guardiões do templo, acham-se únicos e imprescindíveis. Mesmo quando arrufam entre si, não vislumbram, muito menos desejam, qualquer alternativa que não sejam eles próprios. Nos entretantos esperam que o povo cante e ria.

Só que, destruindo - por acção e omissão - toda e qualquer espécie de escape e de equilíbrio - através do próprio sistema - estão tão só e apenas a cavar não só a sua própria sepultura como também a do regime em que se inserem, já que impedem toda e qualquer capacidade deste se auto-regenerar por dentro.

E não, este não é uma prosa pessimista, antes pelo contrário. É, quanto muito, uma prosa levemente fatalista e resignada. Isto vai mesmo ficar muito pior, antes de haver uma réstia de esperança de poder ficar melhor. As coisas são o que são.


http://grandelojadoqueijolimiano.blogsp ... egime.html
Ai de ti Lusitânia, que dominarás em todas as nações...
 

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Sintra

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« Responder #2 em: Setembro 11, 2007, 01:15:32 pm »
Dois excelentes exemplos daquele tipico pensamento: "Nós não vamos a lado nenhum porque somos uns merd...s"
A unica diferença é que um culpa "o povo" (todos nós) e o outro culpa "os governantes, o sistema". A mania de nos auto depreciarmos deve estar algures nos genes... Mas é uma mania um bocado palerma.
 

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Luso

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« Responder #3 em: Setembro 11, 2007, 02:06:58 pm »
Citação de: "Sintra"
Dois excelentes exemplos daquele tipico pensamento: "Nós não vamos a lado nenhum porque somos uns merd...s"
A unica diferença é que um culpa "o povo" (todos nós) e o outro culpa "os governantes, o sistema". A mania de nos auto depreciarmos deve estar algures nos genes... Mas é uma mania um bocado palerma.


Para já eu não me deprecio coisa nenhuma, até porque já sei onde posso ir - ou não - neste sistema. Mas já agora, Sintra, qual é a sua opinião pessoal?

Se não é a turba desorganizada e desmoralizada que ganha a batalha e se também não é o Chefe competente e respeitado que é capaz de a conduzir à vitória, o que será que é capaz de conduzir a esse resultado, na sua opinião que certamente não será tão palerma, para utilizar a sua expressão?
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Sintra

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« Responder #4 em: Setembro 17, 2007, 08:10:55 pm »
Citação de: "Luso"
Se não é a turba desorganizada e desmoralizada que ganha a batalha e se também não é o Chefe competente e respeitado que é capaz de a conduzir à vitória, o que será que é capaz de conduzir a esse resultado, na sua opinião que certamente não será tão palerma, para utilizar a sua expressão?


 Esta eu mereci  :oops:

 Antes de mais, queria dizer que de forma alguma estava a chamar "palerma" à sua opinião, Luso, ou à do routechecker ou à do Eduardo Prado Coelho (se bem que, por vezes, embirrava solenemente com as crónicas no Público do sr em questão ).
 O que eu queria dizer (e prometo que da próxima vez não escrevo a correr), é que temos uma certa tendência de nos auto depreciarmos como povo, e estes dois textos reflectem isso mesmo, foi a essa tendência depressiva que eu me referi como "palerma". Portugal não é o Pais de "chico espertos" que o texto do EPC sugere...
 

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Luso

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« Responder #5 em: Setembro 17, 2007, 09:34:42 pm »
Citação de: "Sintra"
Citação de: "Luso"
Se não é a turba desorganizada e desmoralizada que ganha a batalha e se também não é o Chefe competente e respeitado que é capaz de a conduzir à vitória, o que será que é capaz de conduzir a esse resultado, na sua opinião que certamente não será tão palerma, para utilizar a sua expressão?

 Esta eu mereci  :mrgreen:
Concordo consigo. Não somos um país de chico-espertos, mas também é nossa obrigação como indíviduos, numa sociedade progressivamente disfuncional, de não sermos parvos ou "anjolas". O melhor seria não termos motivos para falar da vida social portuguesa nestes termos, mas a realidade é o que é. Tenho a certeza - não fé - que os portugueses, com líderes razoáveis seriam capazes de muito!
Ai de ti Lusitânia, que dominarás em todas as nações...