Futebol de Portugal torna-se exemplo para o Brasil

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Futebol de Portugal torna-se exemplo para o Brasil
« em: Outubro 16, 2004, 07:53:49 pm »
Após construir novos estádios, que estão atraindo mais torcedores, Portugal discute alteração em sua lei de esportes para melhorar situação contábil dos clubes e torna-se um exemplo para o Brasil

Não é só no Brasil que temas como incentivo fiscal para o esporte, renegociação de dívidas de clubes com o governo, limitação dos mandatos de dirigentes de futebol e segurança nos estádios estão em voga. Em Portugal, eles também estão na ordem do dia.

Atolados por denúncias de corrupção, que envolvem lavagem de dinheiro no futebol e investigação sobre arbitragens nos campeonatos nacionais, os portugueses decidiram reagir e voltaram a discutir mudanças na legislação esportiva. Querem aproveitar o sucesso da Euro-2004, torneio em que a seleção de Luiz Felipe Scolari ficou com o vice-campeonato, para dinamizar o futebol local e aproximar seus clubes das principais potências européias.

A competição entre as seleções gerou uma onda nacionalista, envolveu a população, que não parava de exibir bandeiras de Portugal nos táxis, nas janelas de casas e apartamentos e em automóveis particulares, e deve, segundo estimativas, aumentar o público do Campeonato Português de 2004/2005 em mais de 70% em relação à temporada passada.

Nos últimos quatro anos, as câmaras municipais gastaram mais de 340 milhões de euros para ajudar os clubes da Primeira Divisão a construir e reformar os estádios para a Eurocopa. Já o governo federal investiu outros 310 milhões de euros.

É hora de começar a colher os frutos dos investimentos. A intenção do governo é alterar a Lei de Bases do Sistema Desportivo, que regula o esporte no país desde 1990.

Para tanto, apresentou proposta de lei que, entre outras coisas, amplia os poderes do Conselho Superior do Desporto, órgão integrado à administração pública, cujo papel deixaria de ser meramente consultivo e passaria a ser fiscalizador, especialmente no tocante às finanças dos clubes locais. Em outras palavras, o poder e o controle do governo sobre as associações esportivas aumentaria.

A preocupação das autoridades é justificada pela situação contábil dos times que disputam a Primeira Divisão da Liga Portuguesa. Na temporada 2001/2002, os quatro principais clubes do país apresentaram déficit contábil de 55 milhões de euros. Na temporada 2002/2003, os números ficaram quase no mesmo patamar. Porto, Benfica, Sporting e Boavista, juntos, tiveram prejuízo da ordem de 50 milhões de euros.

Para o economista Fernando Almeida Cardoso, autor do livro "Transformação dos Clubes em Sociedades Anônimas Desportivas", um dos principais objetivos do decreto-lei de 1997, que permitia aos clubes virarem empresa, era tornar o futebol uma atividade mais rentável, controlada por administradores profissionais.

Mas não foi o que se viu. Os clubes, que deveriam deter no máximo 40% das ações, acabavam formando nova empresa para controlar 10% mais uma ação. Com isso, administrações amadoras continuaram no comando.

E, contabilmente, os clubes seguiram no vermelho. Um dos problemas é que os lucros do exercício das SAD (Sociedades Anônimas Desportivas) acabavam não sendo revertidos para o esporte. Por isso, o governo passou a defender que as SAD não poderiam mais repartir dividendos enquanto não estivesse constituída uma reserva legal, equivalente à metade da soma das despesas dos últimos três anos.

A tendência é de melhora, com a alteração na lei, a modernização das arenas esportivas e a empolgação do público português com o futebol local - o Porto, que contratou o meia Diego e o atacante Luís Fabiano, venceu a Liga dos Campeões e a seleção de Scolari ainda não perdeu nas Eliminatórias do Mundial de 2006.

A venda de carnês para o Campeonato Português 2004/2005, por exemplo, cresceu em relação à temporada anterior - cerca de 60%. O Sporting, o clube que tem a SAD mais bem administrada, conseguiu vender 25 mil carnês antes do início do campeonato. Na temporada anterior, havia vendido apenas 9 mil.

Situação muito diferente da que ocorre no Brasil, onde, apesar de o Brasileiro por pontos corridos partir em 2005 para sua terceira edição, a venda antecipada não é uma realidade.

E os clubes - que só à Previdência devem mais de R$ 700 milhões, sendo que metade dos que entraram no Refis, programa de refinanciamento das dívidas, foi excluída por falta de pagamentos - continuam na penúria e correm sério risco. Afinal, o INSS, se houvesse vontade política, poderia até ter feito uma intervenção nas associações inadimplentes.

Com a Lei de Moralização do Futebol, o governo tentou, como aconteceu em Portugal, fazer os clubes tornarem mais transparente sua situação financeira. Eles passaram a ser obrigados a tornar públicas suas movimentações financeiras, exibindo o balanço do exercício do período anterior até 30 de abril de cada ano.

Mas, aqui como lá, a decisão do governo de aumentar o controle sobre os gastos e a situação financeira dos clubes e federações esportivas acabou gerando polêmica.

No Brasil, a principal reclamação é que não há consenso sobre como devem ser contabilizados os jogadores, geralmente o principal ativo dos clubes. Há aqueles que usam os valores de mercado - o montante estimado que receberiam caso o atleta fosse negociado. Outros preferem colocar quanto pagaram para ter o jogador. Um terceiro grupo contabiliza quanto gastou até o momento para manter o atleta.

Em Portugal, as principais equipes reclamam que não podem contabilizar os jogadores por seu valor de mercado, o que poderia ampliar seus ativos. Eles são contabilizados, na verdade, pela diferença entre o valor investido em sua aquisição, renegociação de salário ou formação e a amortização acumulada desse mesmo custo histórico ao longo do contrato.

Trata-se de um problema sério, reclamam os clubes, porque seus ativos são desvalorizados. Com a amortização, o passe do jogador acabava caindo, quando, pelo contrário, vários atletas poderiam estar se valorizando, graças a boas atuações, aumentando os ativos das instituições esportivas e seus resultados contábeis.

O que acabou acontecendo foi a formação de fundos de investidores para comprar e vender jogadores. Os atletas assinam contrato com os principais times portugueses e, depois de valorizados, acabam vendidos para as principais praças da Europa, ficando os clubes com apenas um percentual do valor.
Mas a questão está longe de se restringir à transparência da administração do futebol português e à situação contábil dos clubes.

Outro ponto que está em discussão é a criação do Conselho Superior do Desporto, idealizado pelo governo para resolver litígios esportivos. Os clubes não concordam com a idéia e dizem que a interferência estatal começa a ser demasiada. Eles lembram que a Liga Portuguesa, que organiza e administra o campeonato nacional, já tem uma Comissão Arbitral e que é ela - e não o governo - que deve resolver eventuais litígios entre os clubes, entre eles e seus atletas ou entre eles e a própria liga.

Os dirigentes também alegam que a proposta de lei do governo não prevê regime fiscal específico para as sociedades desportivas. Assim como querem os clubes brasileiros, eles pedem uma espécie de Pró-Bola, que envolveria incentivos fiscais para quem investisse na formação, renegociação de dívidas com o setor público e medidas emergenciais para socorrer os clubes, em especial os da Segunda Divisão.

Em troca do auxílio governamental, aí sim aceitariam maior controle do Estado e, mesmo os clubes que não têm ações negociadas na bolsa de valores, comprometer-se-iam a tornar públicas todas as suas movimentações financeiras, auditadas por empresa indicada pelo governo. Caso contrário, com o apoio da Liga Portuguesa, dizem não aceitar a interferência das autoridades públicas. Pregam o direito da liberdade de associação e mostram-se contrários à limitação dos mandatos dos dirigentes a quatro anos, defendendo que eles possam ser reeleitos quantas vezes os sócios da agremiação quiserem, como acontece na Espanha.

E também condenam os investidores que defendem que uma empresa pode ter participação em quantas sociedades desportivas quiser. Os clubes são favoráveis a parecer da Liga Portuguesa, que acha que uma empresa se associar a mais de um clube, detendo parte do capital da sociedade desportiva, deveria ser proibido pela possibilidade de conflitos de interesses.

É a velha história: se uma empresa detém o controle de dois ou mais clubes que vão jogar entre si e se beneficiar da vitória de um deles, o outro não pode ser forçado a entregar o jogo? Para os portugueses, podem sim. E, pelo sim, pelo não, melhor não arriscar.

Turismo deverá pagar contas da Euro-2004

Apesar do sucesso da Euro-04, cuja organização mereceu elogios de todos os países participantes, a conta do torneio ainda não foi paga. Foram investidos cerca de 650 milhões de euros nos dez estádios que receberam os jogos e na segurança do evento. Em contrapartida, a arrecadação imediata foi de 262 milhões de euros.

Mas o governo espera que, com a projeção mundial que abrigar a Euro deu ao país, Portugal possa colher mais frutos por ter sido a sede, como aumento no turismo. Durante o torneio de seleções, a taxa de ocupação hoteleira chegou a 100% em algumas regiões e ultrapassou os 90% em Lisboa.

Graças à competição, foram criados 36.150 empregos em 2004 e, de imediato, os portugueses receberam mais de 250 mil visitantes. A expectativa é que a conta seja paga até 2010, porque o turismo deve crescer, segundo estimativas oficiais, entre 4% e 6% por ano por causa dos investimentos feitos e da projeção que mais de cem estações de TV deram ao país nos próximos seis anos.

Neste sentido, a situação é bem mais animadora do que a de Atenas, cujas contas dos Jogos Olímpicos não serão pagas antes de 2020 e o turismo em 2004, em vez de aumentar, decresceu em relação ao ano anterior, devido principalmente ao medo de atentados terroristas.

Governo quer clubes garantindo segurança

Preocupado com o aumento da violência em estádios portugueses - de 268 torcedores detidos em 2002/2003, o número passou para 519 em 2003/2004 -, o governo acha que os clubes mandantes não só devem ser punidos em casos de incidentes, mas devem se responsabilizar pela segurança. A discussão ficou calorosa.

Para a Liga Portuguesa, a proposta é absurda. Ela acha que o Estado tenta transferir uma responsabilidade que é sua - garantir a segurança da população - para entidades privadas. O governo, por sua vez, alega que o correto seria dar proteção fora dos estádios, mas dentro, justamente por se tratar de um evento de associações privadas, que objetivam o lucro, elas é que deveriam se preocupar com a segurança - um modelo adotado pela Inglaterra e que se tornou um exemplo mundial. Enquanto isso, no Brasil, a discussão hoje está parada. Embora 79% dos torcedores digam que a violência é o principal motivo que os afastam dos estádios, conforme aferido pela 3ª Pesquisa LANCE!-Ibope, a Comissão Nacional de Prevenção da Violência e Segurança nos Espetáculos Esportivos (Consegue) não saiu do papel após quase dois anos, apesar de ter sido prometida pelo ministro Agnelo Queiroz.

Recompensa para ceder atletas à seleção

Além de exigirem mudanças na proposta de lei do governo, os clubes portugueses apresentam outra reivindicação. Querem uma contrapartida financeira por cederem jogadores para a seleção nacional. A maioria acha que o dinheiro deveria sair da confederação portuguesa, mas pelo menos três defendem que saia do governo, sob o argumento de que a seleção representa o país.

Os principais times reclamam que atualmente não só não recebem um tostão da confederação como são eles que arcam com o seguro por acidentes pessoais, que cobre possíveis contusões dos jogadores que defendem a seleção. Eles apresentaram ao governo português um estudo do G-14, que reúne 18 das maiores equipes da Europa, defendendo que a contrapartida seja paga não apenas em Portugal, mas em todos os países do continente.

Números

Dindim público

650 milhões de euros foram investidos pelos governos municipais e federal português para receber a Euro-04

Gringos

250 mil visitantes a mais Portugal recebeu por causa da Euro-2004

Procura

60% a mais de carnês foram vendidos para o Campeonato Português de 2004/2005, antes do início do campeonato, em relação à temporada anterior

Fonte: Revista Lance!A+ (http://lancenet.ig.com.br/lancea+/)
As pessoas te pesam? Não as carregue nos ombros. Leva-as no coração. (Dom Hélder Câmara)
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