O segredo está na cor do papel higiénico

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dremanu

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O segredo está na cor do papel higiénico
« em: Março 30, 2005, 05:15:37 pm »
Do jornal "Negócios".

José Diogo Madeira

O segredo está na cor do papel higiénico

É na capacidade de inovar que Portugal tem de aprender, libertando de dentro de si mais líderes com este espírito até meio louco de onde saem invenções tão fascinantes como a do papel higiénico preto.
O Deustche Bank publicou, na passada semana, um estudo sobre o crescimento de 15 economias europeias, num horizonte que se alarga até 2020. Portugal obtém, aí, uma taxa de crescimento anual de 2%, acima do andamento de países como o Reino Unido, a Suécia ou a Alemanha. Aliás, só a Irlanda, Espanha, França e Áustria conseguem, segundo o mesmo estudo, crescer mais depressa do que os portugueses. Estes estudos têm de ser tidos como indicativos. A economia não é propriamente uma ciência exacta. Se o fosse, bastaria contratar meia dúzia de prémios Nobel na especialidade para que um qualquer país saltasse da «cepa torta» para um lugar honroso nas tabelas mundiais de desenvolvimento económico. E, como dizia Keynes, o que interessa o longo-prazo, se no longo-prazo estamos todos mortos? Até 2020, teremos todos mais coisas em que pensar do que neste estudo do Deustche Bank e ninguém se lembrará, nessa data, de confirmar a acuidade destas estimativas...

Mas o que importa é que, afinal, isto não está assim tão mal. Uma taxa de crescimento de 2% ao ano é entusiasmante, especialmente tomada com o devido efeito de «capitalização»: representa um crescimento de 35% no total do período, o que tendo por base um cenário de quase estagnação demográfica, permite chegar a uma conclusão interessante: mais riqueza pelo quase mesmo número de pessoas, ou seja melhor PIB per capita. Parece que, nessa altura, pior do que nós só mesmo a Grécia. Se deixarmos de lado a questão competitiva com os restantes 13 países que ficarão com um PIB per capital acima do nosso, até que é bom...

Mas, e ainda de acordo com o modelo que inspirou o DB para estas conclusões, quanto mais aberta for a economia de um país, maior é o seu potencial de crescimento. Por economia aberta entende-se o comércio internacional e o investimento estrangeiro realizado por cada país. Ora, este é um tema onde as empresas portuguesas mais têm progredido nos últimos anos, ainda que de uma forma discreta e quase clandestina. Os exemplos são muitos, desde aqueles recorrentes como Sonae, Cimpor, Millennium, até um dos mais curiosos e esquecidos, como o da Renova. Esta marca de papel higiénico, sedeada em Torres Novas, é bem conhecida pelos portugueses, mas nos últimos anos encetou um plano de expansão para Espanha e França, para onde quer agora levar também o seu papel higiénico de cor preta.



Esta ideia do papel higiénico preto é arriscada - alguns «experts» em marketing dizem que o preto é a cor da sujidade e que, portanto, os consumidores terão pouco interesse em comprar o produto. Mas Paulo Pereira da Silva, o presidente da companhia acredita que ele será bem recebido pelo segmento mais sofisticado do mercado, nos três países onde a Renova vende. Já, no passado, a Renova teve sucesso com campanhas de marketing arrojadas, que aliás lhe permitiram a entrada com êxito em Espanha e em França. Para lá das virtualidades deste papel higiénico preto, o que importa realçar é que o desenvolvimento da economia portuguesa depende, e em muito, do empreendedorismo de gente como Paulo Pereira da Silva.

É certo que a aposta na educação, o investimento num «plano tecnológico», uma política demográfica expansionista, um orçamento equilibrado são determinantes no longo-prazo para o crescimento de um país. Mas as políticas públicas de nada servem se o tecido empresarial não se soltar e tomar riscos. As nações com maior desenvolvimento económico são aquelas que têm uma dinâmica empresarial maior, com maior capacidade de empreender e de assumir riscos - financeiros, empresariais, tecnológicos - e não aquelas que implementam as melhores políticas públicas. É como ter um excelente «hardware», quando o «software» não existe ou é insuficiente.

Ora, é esta capacidade de inovar que Portugal tem de aprender, libertando de dentro de si mais líderes com este espírito até meio louco de onde saem invenções tão fascinantes como a do papel higiénico preto. E esta gente tem de continuar a apostar na internacionalização dos seus negócios, porque é evidente que o mercado português é demasiado pequeno para a consolidação de muitos grandes, médios e pequenos grupos económicos. Quando Portugal precisar menos de «messias» políticos como, a seu tempo, foi Cavaco Silva e agora parece ser José Sócrates e cultivar mais destes empreendedores, temos País. Até lá, vamos ficando pelos penúltimos lugares das tabelas europeias. Não é mau, mas é um destino poucochinho.
"Esta é a ditosa pátria minha amada."