Portugal e CEDEAO colidem na ONU por causa de Bissau
Portugal e a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) trocaram hoje críticas no Conselho de Segurança da ONU sobre a Guiné-Bissau, com o bloco africano a qualificar o regresso das autoridades depostas como "exigência impossível" da CPLP.
A troca de argumentos foi protagonizada pelo representante permanente de Portugal na ONU e pelo seu homólogo da Costa do Marfim, em representação da CEDEAO, numa reunião do Conselho de Segurança em que Brasil e Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) pediram a realização de uma conferência internacional de alto nível sobre a Guiné-Bissau.
Youssoufou Bamba, embaixador costa-marfinense, afirmou que o "processo de transição" no país está a ser dificultado pela "facção pró-Carlos Gomes Júnior do PAIGC", o maior partido guineense, com "apoiantes internacionais", apesar dos esforços do governo saído do golpe de Abril para "alcançar a inclusão e consenso".
O "novo ambiente" em Bissau, adiantou, é de "paz política, segurança e estabilidade, em vez do caos e anarquia e outras formas de desinformação propaladas por alguma comunicação social", enquanto a paralisada Assembleia Nacional "espera-se que volte a funcionar em breve".
Isto deveu-se aos "esforços incansáveis da CEDEAO para encorajar o diálogo" e a comunidade internacional "não deve precipitar-se em julgamentos, mas permitir que os actores dialoguem entre si", defendeu.
Bamba lamentou que "alguns países", caso de Portugal, "persistam na sua recusa em reconhecer e lidar com o governo de transição" e criticou que a "facção dura do PAIGC e figuras internacionais" continuem a apoiar Carlos Gomes Júnior e insistam na "impossível exigência de reposição do governo deposto".
A CEDEAO, disse, lamenta que o presidente deposto Raimundo Pereira tenha sido convidado a participar na cimeira da CPLP de 20 de Julho.
A próxima reunião do grupo internacional de contacto para a Guiné-Bissau deverá ter lugar em Setembro, à margem da Assembleia Geral da ONU, mas a CEDEAO está a qualquer altura "pronta a viajar para Lisboa" para ter uma "discussão franca e aberta com a CPLP" para a comunidade internacional finalmente "falar a uma só voz", adiantou.
O embaixador português na ONU, Moraes Cabral, não previa falar no 'briefing' mas acabou por pedir a palavra para apontar erros na intervenção da CEDEAO, sublinhando que o PAIGC não faz parte do governo de transição e que alguns elementos que o integram "há muito tempo que não têm nenhuma ligação" ao partido.
Disse ainda ser "uma falta de elegância" chamar "facção Carlos Gomes Júnior" a um grupo de parlamentares do PAIGC que representa "dois terços do parlamento".
Os parceiros internacionais, adiantou, vão continuar a refrear a sua ligação à Guiné-Bissau até haver um plano para "uma transição política credível".
Moraes Cabral rejeitou ainda a descrição de "normalização da vida" no país, apontando para o "aumento actividade criminosa e tráfico de droga", relatado pelo representante da ONU, Joseph Mutaboba.
No seu último relatório sobre a Guiné-Bissau, o secretário geral da ONU afirma que o narcotráfico está em crescendo desde o golpe de Estado de 12 de abril e que a situação humanitária degradou-se, exigindo resposta mais firme da comunidade internacional.
Mutaboba sublinhou hoje a necessidade da CEDEAO e da CPLP, em articulação com a União Europeia e a União Africana, ultrapassarem as divergências existentes e chegarem a uma posição comum.
"Os parceiros têm de chegar a uma posição comum sobre como assistir o país no restabelecimento total da ordem constitucional. O tempo é essencial, são precisos passos concretos", disse Mutaboba.
António Gumende, embaixador de Moçambique na ONU e representante da CPLP na reunião, e Maria Luiza Viotti, embaixadora do Brasil que preside à Comissão de Consolidação da Paz para a Guiné-Bissau, apontaram ambos para uma degradação da situação geral no país desde o golpe de Estado.
Gumende e Viotti apelaram ao secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, que convoque uma reunião internacional de alto nível com os principais parceiros, com objectivo de delinear uma "estratégia conjunta para restaurar a ordem constitucional na Guiné-Bissau".
Lusa