BCG admite que subornou (através do escritório em Lisboa) responsáveis angolanosA informação tinha sido comunicada pela própria Boston Consulting Group ao Departamento de Justiça norte-americano, que optou não processar a consultora dado que, além de ter denunciado o caso, despediu os envolvidos e cooperou com a investigação.
Entre 2011 e 2017, os escritórios da Boston Consulting Group (BCG) em Lisboa subornaram responsáveis angolanos e membros do MPLA, com o objetivo de que a consultora saísse vencedora dos contratos a que concorria em Angola.
O processo era feito através do envio de dinheiro para contas "offshore" controladas por homens fortes dos responsáveis políticos. Numa das situações a BCG acordou o pagamento a um agente ligado a oficiais angolanos entre 20% e 35% do valor do contrato, com esse dinheiro a rodar entre três entidades "offshore" diferentes.
"Certos funcionários da BCG em Portugal tomaram medidas para ocultar a natureza do trabalho do agente para a BCG quando surgiam questões internas, incluindo através da atualização da data de contratos para um período anterior e da falsificação do alegado propósito do trabalho do agente", pode ler-se na investigação do Departamento de Justiça norte-americano (DoJ) publicado esta quarta-feira.
Estes sete anos coincidiram com o fim do "reinado" de José Eduardo dos Santos, que abandonou a presidência após 38 anos.
Esta prática foi inicialmente reportada pela própria BCG ao Departamento de Justiça norte-americano. Daí que na investigação tornada pública esta quarta-feira - apesar de as práticas incorrerem numa violação do "US Foreign Corrupt Practices Act" - o departamento indica que não vai processar a consultora, uma vez que além de ter denunciado o caso, despediu as pessoas envolvidas e cooperou com a investigação.
Entre 2011 e 2017, a BCG ganhou 11 contratos com o Ministério da Economia e um com o Banco Nacional de Angola (BNA), que geraram uma faturação de 22,5 milhões de dólares e lucros de 14,4 milhões de dólares. Como parte do processo com o DoJ, a consultora não aceitou esse valor.
Neste período, o Ministério da Economia era liderado por Abrahão Gourgel. Já o Banco Nacional de Angola teve três governadores, José Lima Massano (2010-2015), José Pedro de Morais (2015-2016) e Walter Filipe (2016-2017).
José Lima Massano é atualmente ministro para a Coordenação Económica do governo liderado por João Lourenço. Quanto a Walter Filipe foi condenado, em 2020, a oito anos de prisão pelos crimes de peculato na forma continuada e de burla por defraudação na forma continuada pelo seu envolvimento no caso dos "500 milhões". Neste processo, foi também condenado a cinco anos de prisão, pelos crimes de fraude e tráfico de influências, o filho do antigo presidente José Eduardo dos Santos, José Filomeno dos Santos (Zenú).
Quanto a José Pedro de Morais é referenciado como membro da elite angolana que melhor respondeu ao repto de João Lourenço para a devolução de dinheiro aos cofres do Estado. O antigo ministro das Finanças e ex-governador do BNA terá entregue cerca de 60 milhões de dólares, dinheiro que se encontrava depositado no estrangeiro.
A BCG afirmou ao Departamento de Justiça que "retirou os indivíduos da empresa, encerrou o escritório em Luanda" e "continuou a reforçar significativamente as suas funções de 'compliance', controlos internos e a formação".
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