WikiLeaks, um novo mundo?

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Camuflage

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Re: WikiLeaks, um novo mundo?
« Responder #165 em: Março 14, 2011, 07:22:08 pm »
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Portugal conta tudo antes das reuniões na Europa
Há 30 telegramas entre 2006 e 2009 que mostram como, antes de cada Conselho Europeu de ministros dos Negócios Estrangeiros, Portugal informa os EUA sobre o que lá se vai passar. (Aceda aos telegramas na íntegra através deste texto)

Durante três anos seguidos, entre 2006 e 2009, os Estados Unidos obtiveram regular e sistematicamente informações sobre a política externa portuguesa e europeia, seguindo de perto alguns dossiês e pressionando os que consideravam mais "sensíveis". É isto que se conclui da análise dos telegramas oriundos da embaixada americana em Lisboa durante aquele vasto período (e, ao que se sabe, depois disso) que relatam, mês a mês e ponto por ponto, as reuniões dos seus diplomatas com homólogos portugueses.

Aos americanos interessa-lhes tudo, das questões europeias em geral a questões da política externa em particular. Uma obsessão, todavia: o Kosovo e a sua independência, declarada unilateralmente a 17 de fevereiro de 2008 e só reconhecida por Portugal em outubro desse ano. E um interesse especial: a cimeira UE-África, realizada em dezembro de 2007, no âmbito da presidência portuguesa da União, em cuja unidade de missão esteve previsto participar um diplomata americano, ao abrigo de um programa de intercâmbio.

Em ambos os temas, os EUA fizeram sentir a sua "forte oposição" em relação às atitudes portuguesas, não coincidentes com as suas, como refere o embaixador Alfred Hoffman, ao relatar, num telegrama de 24/10/2007, um encontro sobre o Kosovo com as diplomatas portuguesas Liliana Araújo e Rita Laranjinho. "Respondemos veementemente que as discussões da troika não podiam ser inconclusivas e que adiamentos sucessivos só contribuiriam para a instabilidade", diz, a propósito da informação de que o relatório sobre a situação naquele território, que seria entregue posteriormente, não seria considerado "o fim" do processo.


O tom é semelhante num outro documento, de 18/7/2007, desta feita sobre o Zimbabwe, quando o diplomata americano Daniel Fried se reúne em Lisboa com os diretores políticos dos 27 Estados da UE. Narrando a reunião, escreve Hoffman: "O embaixador Fried elogiou os esforços portugueses para realizar uma cimeira UE-África, mas expressou a sua esperança de que Portugal enviaria um forte sinal de apoio à boa governação, não convidando o Presidente do Zimbabwe Robert Mugabe". A resposta portuguesa foi lapidar: "Portugal encontrará uma solução". Como se sabe, Mugabe veio à cimeira, mas o convite foi assinado por José Sócrates, "apenas" como primeiro-ministro do país anfitrião, não de presidente em exercício da UE.

Os americanos, reconhecem, aliás, que "os portugueses estão determinados em realizar com êxito uma cimeira UE-África" (telegrama de 28/3/2007) e que Portugal "aguenta firme" quanto a Mugabe. "Não controlamos quem representa África, isso é com a União Africana", responde o assessor diplomático do primeiro-ministro ao embaixador Hoffman, quando este lhe "expressa a profunda preocupação" com a eventual presença do líder africano, num telegrama de 5/11/2007.

Curiosamente, o Tratado de Lisboa, a maior 'conquista' da presidência portuguesa, nem sequer é referido nos telegramas a que o Expresso teve acesso.

Porém, muitos outros temas são abordados, ao ponto de nos indagarmos se os próprios deputados portugueses seguem com tanta atenção os passos da política externa portuguesa.
Small fish

Os americanos querem saber tudo e de tudo dão conta para Washington. Desde os Balcãs ao Médio Oriente (com realce para o Irão), passando pela Rússia e Geórgia, a propósito de cuja guerra o embaixador Stephenson acha "interessante que Portugal ainda confie nas promessas de Medvedev". Abordam África, mas também a Ásia, onde conta a China, a Coreia do Norte ou até a Birmânia. Frequentemente, comentam as posições portuguesas, ou fazem a distinção entre o que lhes parece ser a posição oficial e a pessoal do seu interlocutor.

Sobre a cimeira UE-Rússia, por exemplo, que Portugal organizou em outubro de 2007 e que mereceu grande atenção à parte americana, diz Hoffman: "Os portugueses estão atentos em marcar os mesmos pontos que nós, embora não tão assertivamente como gostaríamos". E comenta: "Sócrates e outros funcionários governamentais caracterizaram a cimeira como um sucesso... mas parece-nos a nós de pequena monta (small fish)".

Mais tarde, num texto sobre um encontro com Jorge Rosa de Oliveira (ex-assessor diplomático do PM), o embaixador anota que este lhe afirmou que o "objetivo de Portugal era garantir que as relações com a Rússia fossem melhores no fim do que no princípio da cimeira". "Não me surpreende" - escreve - "a satisfação de Portugal em ter cumprido objetivos tão pouco ambiciosos". Sobre o próprio Rosa de Oliveira, é mordaz: "Apesar de amigável e acessível, tende às vezes a inclinar-se para uma inútil retórica socialista".

Nestes telegramas não se estranha que tantos e variados assuntos da política portuguesa e europeia sejam referenciados. Os encontros onde tais assuntos são conversados fazem parte da rotina diplomática. O que surpreende é a sua regularidade e intensidade. Praticamente todos os meses, sempre antes das reuniões do antigo Conselho de Assuntos Gerais e Relações Externas (CAGRE) e, muitas vezes, das reuniões informais dos ministros dos Negócios Estrangeiros da UE, há um encontro... e um relatório para Washington sobre as opiniões portuguesas e as posições europeias.

"Fora do quadro da União, falamos com vários países amigos, a seu pedido, mas os americanos praticamente institucionalizaram estes encontros e aparecem sempre. Os outros só de vez em quando". comentou ao Expresso fonte diplomática portuguesa. Os americanos não brincam em serviço.

 
Porque Portugal não reconhece o Kosovo?

Portugal tardou a reconhecer o Kosovo - em outubro de 2008, oito meses após a sua declaração unilateral de independência - por uma tripla conjunção: porque Cavaco Silva punha reticências; porque o Governo temia que "os partidos à esquerda e à direita se unissem contra o PS e o PSD" (PC, BE e CDS eram contra); e para preservar o entendimento com a Sérvia e evitar que esta cortasse relações com Portugal. Quanto ao ministro Luís Amado, queria, primeiro, evitar a declaração unilateral, depois conseguir o consenso na EU e, finalmente, reconhecer o Kosovo logo "na primeira leva". É assim que o embaixador Thomas Stephenson vai comentando, em sucessivos telegramas, o "incompreensível" atraso de Portugal no reconhecimento. Só em julho o diplomata obtém a garantia de que o processo é "uma questão política, mais do que legal", uma afirmação que lhe é feita pelo então diretor de política externa, Nuno Brito. O tema é objeto de uma atenção obsessiva, ao ponto de o embaixador questionar o próprio Presidente sobre o assunto até admitir, ironicamente no próprio dia do reconhecimento (7/10), que "só acreditará quando o vir".

in: http://aeiou.expresso.pt/portugal-conta ... pa=f637482
 

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Camuflage

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Re: WikiLeaks, um novo mundo?
« Responder #166 em: Abril 17, 2011, 02:21:37 pm »
- «WikiLeaks: Cavaco travou tropas no Afeganistão». Governo ponderou enviar companhia para lutar na frente.

In: http://www.tvi24.iol.pt/sociedade/quios ... -4071.html

Alguém viu essa release do Expresso ontem?
 

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Camuflage

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Re: WikiLeaks, um novo mundo?
« Responder #167 em: Abril 20, 2011, 08:56:47 pm »
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Cavaco travou envio de comandos para o pior cenário de guerra

O Governo português ponderou enviar uma companhia de comandos entre 2009 e 2010 para o pior cenário possível da guerra no Afeganistão, em que 150 militares iam combater sem quaisquer restrições, sob as ordens dos ingleses. Cavaco travou o plano.

Uma companhia de 150 comandos esteve para ir combater na zona mais perigosa do Afeganistão, entre 2009 e 2010, sob o comando das tropas britânicas, sem qualquer restrição no uso da força e com um risco elevado de vir a ter baixas, pelo que se percebe na correspondência diplomática norte-americana. O contingente iria ser colocado em Helmand, a mais difícil de todas as províncias, no sul do país, ao lado de Kandahar. Com uma forte presença de talibãs, intensificada a partir de 2006, é lá que é produzido quase todo o ópio afegão.
Um telegrama confidencial enviado para Washington a 21 de maio de 2009 pela embaixada dos Estados Unidos em Lisboa revela que o ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, confirmou ao embaixador Thomas Stephenson a intenção de Portugal “em fazer regressar uma Quick Reaction Force à ISAF (a missão da NATO no Afeganistão), muito provavelmente integrada com o comando britânico na província de Helmand”, o ponto nevrálgico da guerra naquela altura. No verão de 2009, a província entraria numa fase de ferro e fogo, com a maior operação de marines desde a guerra do Vietname.
A intenção de enviar tropas especiais para o “inferno” de Helmand e “sem caveats”, sem limitações de combate, parece ter-se mantido de pé durante pelo menos sete meses. Em novembro de 2009, o comandante-chefe das forças terrestres britânicas, Peter Wall, veio a Portugal para se encontrar com o Estado-Maior do Exército, admitindo ao Expresso que os ingleses “adorariam trabalhar juntos com os portugueses” e que os 150 comandos portugueses destacados para irem para o Afeganistão podiam contar com apoio logístico para participarem na frente de batalha. Os britânicos tinham o comando de toda a região sul do país, incluindo Helmand e Kandahar.
Os americanos tinham sabido por fontes informais no Governo, e um mês antes do encontro com o ministro, da missão a Helmand. Stephenson promoveu nessa altura uma reunião com os seus homólogos da França, da Itália, da Dinamarca, da Polónia e da Austrália para convencerem Lisboa a mandar mais homens para a guerra, ao mesmo tempo que revelava ao Departamento de Estado que ia passar a trabalhar com o embaixador britânico no mesmo sentido.
O plano Helmand, contudo, nunca foi assumido publicamente pelo Governo português e caiu por terra. Uma companhia de comandos foi em missão para o Afeganistão nos primeiros meses de 2010 mas ficou instalada em Cabul, sem se envolver em manobras de ataque.
No encontro com o embaixador, de maio de 2009, o ministro dos Negócios Estrangeiros explicou que estava à espera de que o Conselho Superior de Defesa Nacional, que inclui o Presidente, desse luz verde ao plano. “Amado contou que os contactos com o Presidente dão a entender que ele está inclinado a apoiar esse cenário”, escreveu Stephenson. Mas o apoio, pelos vistos, não veio.
O que não seria, de todo, uma surpresa. Cavaco Silva é referido várias vezes na correspondência como o principal entrave a uma maior participação portuguesa na guerra, em contraste com o Governo.
Num almoço de um assessor diplomático de Amado com um conselheiro da embaixada dos EUA, relatado num telegrama confidencial de 9 de novembro de 2007, a clivagem com Belém já era notória. “Paulo Lourenço disse que a decisão de reduzir a contribuição de Portugal na ISAF de uma companhia de reação rápida (150 comandos) para um C-130 e uma equipa de 15 militares em agosto de 2008 foi tomada durante uma discussão acalorada do conselho superior de defesa”, vem no telegrama.
“Ele disse que os chefes dos ramos, o CEMGFA, o primeiro-ministro e os ministros da Defesa e dos Negócios Estrangeiros se opuseram todos à redução de tropas. Foi claro que a força de bloqueio foi o próprio Presidente, aparentemente motivado pela preocupação sobre a escalada da violência, a possibilidade crescente de haver baixas e o impacto disso na opinião pública”.
A retirada dessa companhia de comandos em agosto de 2008, que tinha estado em Kandahar e sofreu uma baixa, foi muito mal recebida pelos americanos, criando um embaraço diplomático. “Nós expressámos a nossa profunda preocupação por termos conhecido inicialmente essa decisão ao lermos um artigo de uma agência de notícias iraniana sobre uma ida do ministro da Defesa a uma comissão parlamentar”, lê-se no mesmo telegrama. Numa nota final, o embaixador nota que o assessor diplomático, Paulo Lourenço, “foi franco nos seus comentários, que são consistentes com relatos anteriores de uma série de fontes de que o Presidente Cavaco Silva não era um grande fã da participação de Portugal na ISAF”.
Confrontado com o teor dos telegramas, o gabinete do ministro da Defesa não quis comentar, remetendo para as declarações públicas feitas por Augusto Santos Silva quando o Expresso começou a publicar os telegramas do WikiLeaks, a 26 de fevereiro, em que condenou a divulgação dos documentos. O ministro dos Negócios Estrangeiros também optou por não reagir.
in: http://www.jornaldoalgarve.pt/2011/04/c ... de-guerra/
 

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Camuflage

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Re: WikiLeaks, um novo mundo?
« Responder #168 em: Setembro 03, 2011, 01:54:56 pm »
Para quem quiser aceder  a todos os telegramas já o pode fazer aqui: http://cables.mrkva.eu a password para acesso aos 250 mil telegramas foi revelada num livro.

Achei muito curioso o telegrama censurado pelo jornal Expresso aqui: http://downloadsexpresso.aeiou.pt/expre ... BON273.pdf e quando se vai ver o telegrama original: http://cables.mrkva.eu/cable.php?id=208130 percebe-se que afinal a parte censurada era algo positivo sobre o Governo português, onde o Amado mostrava preocupação e queria rapidamente resolver as questões salariais que afectavam os civis portugueses a trabalhar para a base das Lajes. Qual o motivo por detrás do jornal Expresso para censurar algo deste género?
 

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nelson38899

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Re: WikiLeaks, um novo mundo?
« Responder #169 em: Setembro 04, 2011, 11:38:42 am »
Citação de: "Camuflage"
Para quem quiser aceder  a todos os telegramas já o pode fazer aqui: http://cables.mrkva.eu a password para acesso aos 250 mil telegramas foi revelada num livro.

Achei muito curioso o telegrama censurado pelo jornal Expresso aqui: http://downloadsexpresso.aeiou.pt/expre ... BON273.pdf e quando se vai ver o telegrama original: http://cables.mrkva.eu/cable.php?id=208130 percebe-se que afinal a parte censurada era algo positivo sobre o Governo português, onde o Amado mostrava preocupação e queria rapidamente resolver as questões salariais que afectavam os civis portugueses a trabalhar para a base das Lajes. Qual o motivo por detrás do jornal Expresso para censurar algo deste género?

Muito simples, tentar deitar a baixo um ministro/governo que era contrário ao patrão desta empresa.
"Que todo o mundo seja «Portugal», isto é, que no mundo toda a gente se comporte como têm comportado os portugueses na história"
Agostinho da Silva
 

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miguelbud

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Re: WikiLeaks, um novo mundo?
« Responder #170 em: Setembro 07, 2011, 07:38:01 pm »
WikiLeaks: EUA preocupados após encontro de Sócrates com Chávez

A embaixada norte-americana em Lisboa mostrou, em 2006, ao Governo português, «fortes preocupações», relativamente a um encontro entre o então primeiro-ministro José Sócrates e o Presidente venezuelano Hugo Chávez. É pelo menos isso que consta de mais um telegrama diplomático divulgado pelo portal WikiLeaks.

A representação diplomática norte-americana relata, num documento com a data com 28 de Julho de 2006, que o então embaixador dos EUA na capital portuguesa, Alfred Hoffman, se reuniu com o chefe da diplomacia portuguesa, pasta na altura assumida por Luís Amado, para expressar as «fortes preocupações» de Washington em relação ao «crescente reforço militar» de Caracas, noticia a agência Lusa.

De acordo com o mesmo telegrama, a conversa surgiu depois de um encontro entre Sócrates e Hugo Chávez, que decorreu a 23 de Julho no aeroporto de Lisboa, durante uma escala de reabastecimento do avião do líder venezuelano.

O embaixador norte-americano disse que a imagem transmitida do encontro terá sido «infeliz», uma vez que Chávez estava a realizar um périplo que incluía países como a Bielorússia, Irão e a Rússia.

A representação norte-americana frisa, no mesmo documento, que o Governo português, «acredita que cativar Chávez é mais eficaz que isolar [o líder venezuelano] e que ouvir uma mensagem de senso comum de países como Portugal irá desviar a atenção dos disparates populistas que ouve de líderes como o Presidente bielorusso [Alexander] Lukachenko e do Presidente iraniano [Mahmud] Ahmadinejad».

Ainda no documento, a embaixada norte-americana refere que Portugal trata com particular cuidado o relacionamento com o líder venezuelano, uma vez que 600 mil cidadãos portugueses vivem na Venezuela, «a maior comunidade portuguesa fora da Europa».

O telegrama diplomático acrescenta também que José Sócrates terá transmitido algumas destas mensagens durante o encontro, e que terá sublinhado o forte relacionamento de Portugal com os Estados Unidos.