Em primeiro lugar, estamos a falar da divisão da terra santa e da terra prometida, para as religiões monoteistas do planeta. Retirar a religião da equação, é tentar fazer a quadratura do circulo.
Do ponto de vista religioso, Deus prometeu a terra aos povos que Nele acreditavam.
Assim, não apenas as tribos de judeus receberam a promessa. A promessa foi feita por exemplo também aos Ismaelitas, ou seja: Aos árabes do deserto.
Esses tomaram a terra para eles e sedentarizaram-se mais depressa, mas os judeus, que eram essencialmente pastores, seguiam com os seus rebanhos pelas várias terras até que ficaram prisioneiros do Faraó no Egito e foram escravizados por 4 séculos.
Só então Deus ordena a Moisés que vá ao Faraó e liberte o seu povo. E só então os judeus rumam finalmente à terra prometida.
Podemos não querer discutir as questões biblicas, mas infelizmente é o que eu vejo da parte de muito cidadão de Israel, quando tenta explicar a situação. Eles vêm sempre com a questão de terem direito divino à terra, para justificar terem conseguido o seu controlo mais de três mil anos depois de o terem perdido.
O problema é religioso, tanto do fanatismo religioso do Hamas, que se apoia na religião para continuar a guerra, como do lado do fanatismo dos judeus.
Os judeus que controlam o poder, não são mais que aqueles que assassinaram Itzak Rabin, que era do Likud, ou seja, um partido de direita secular israelita.
As pessoas que estão no poder em Israel, são capazes de matar os seus próprios cidadãos, por razões religiosas.
Por isso não me espanta se o senhor Nethanyau soubesse que algo bem complicado se estava a preparar, e não fez nada.
Ninguém aqui disse que os israelitas são extremistas religiosos, mas as pessoas que estão no poder, são, e isso mostra-nos o que acontece quando para governar, é preciso o apoio parlamentar de fanáticos.
Os israelitas não são nem nunca foram um povo, são uma coleção de grupos. Você tem por exemplo os judeus do oriente, os Mizrahim, que são onde se encontra a maioria dos que afirmam que, o Estado de Israel não tem já direito divino à terra, porque por mais de uma vez, Deus o ajudou, mas os judeus não cumpriram a promessa de serem fieis a Deus e aos seus principios e por isso Deus os expulsou da terra prometida.
Depois tem as várias variações dos Askenazi, os judeus da Europa e da Russia, que neste momento são a maioria, mas que são também os que menos têm a ver com a terra prometida propriamente dita. Para um árabe, muitos dos Askenazi são apenas europeus e americanos que migraram para aquela terra, por razões religiosas, não tendo a ela qualquer direito.
Depois tem os Sefarad, um ramos especifico dos judeus, que são os da Hispania, menos significativos e muito especificos (na idade media, um judeu Sefarad não autorizava filha ou filho a casar com um judeu que não fosse Sefarad)...
O problema não são os cidadãos de Israel, o problema são as pessoas que neste momento gerem o país, onde o extremismo religioso tem aumentado, e a prova disso são os resultados eleitorais.
A questão é:
Se os judeus, 3200 anos depois têm estes direitos todos, quantos direitos terão os outros ?
Os italianos podiam exigir de volta a Lusitania ocupada ...
A questão como disse acima, é igualmente religiosa.
Mesmo o ponto de vista de que Israel tinha que estar na terra prometida, é posto em causa por teologos judeus, quando afirmam que esse direito dos judeus prescreveu, porque os judeus não cumpriram com a sua parte do pacto, explicito na Aliança entre Deus e o seu povo.
Ao quebrarem o pacto, ao ofenderem Deus, os judeus perderam o direito à terra prometida, e é por isso que foram espalhados pelos quatro cantos da terra.
O que chamamos Sionismo, é uma visão inicialmente muito minoritária entre os judeus, e vem especialmente dos Askenazi, os Mizrahim que durante séculos eram a maioria, não acreditavam no regresso a Sião.
Portanto a tese do regresso à terra prometida, é essencialmente uma criação dos judeus europeus.
A verdade objetiva, é que não existia absolutamente NENHUMA ligação entre os povos europeus que professavam a religião hebraica e a terra que na Biblia lhes tinha sido prometida por Deus há milhares de anos.
A promessa de Deus, foi aliás aos povos que o reconhecessem, o honrassem e a Ele prestassem tributo e sacrificios.
Entre esses descendentes, estão os que hoje conhecemos como cristãos.
Até os que aqui se consideram cristãos, temos tanto direito à terra prometida como os judeus.
O que é que eles são a mais que nós ?
Já vou tarde, mas vou resumir a resposta. A mim não me interessa as religiões. A mim interessam-me soluções práticas que beneficiem os dois lados o suficiente para que haja paz. Com base nisto, se tens um problema, tens de procurar a solução com base na lógica.
Tendo em mãos o problema de criar o Estado de Israel, escolhes a solução mais lógica, que neste caso é olhar para os antecedentes históricos e colocar lá. O factor religioso vai sempre pesar, nem que seja como critério de desempate. Por sorte, aquele território estava livre (não era nenhum Estado), tendo sido dividido entre Israel para os judeus e Palestina (Cisjordânia + Gaza) para os que se identificassem como tal e que já vivessem lá.
A divisão foi mal feita, já que teria tido muito mais lógica que o território palestino fosse um só, e Israel hoje ficava feliz da vida que não tinha que se preocupar com a falta de profundidade estratégica que sofre devido à Cisjordânia. Jerusalém podia ser território neutro, controlado pela ONU. Infelizmente não tomaram esta decisão. Outro problema foi a Jordânia ter ficado com 70% do território original do Mandato, o que estraga logo qualquer tentativa de divisão equitativa. Mas como vemos, não existe qualquer contestação à Jordânia, pura e simplesmente porque são muçulmanos como a vizinhança toda.
A questão religiosa explica sim, o porquê de só Israel ser um problema ali para os países à volta. Mas não é uma questão de serem judeus, é uma questão de não serem Muçulmanos. Se se criasse ali um país cristão, era um problema. Criasses ali um Curdistão, para os Curdos, era também um problema. Crias ali uma fábrica de brinquedos do Pai Natal, era um problema. Jordânia + Palestina? Tudo tranquilo, desde que não sejam "diferentes". O radicalismo não se resume ao Hamas e outros grupos terroristas. O radicalismo está entranhado em grande parte das populações desses países, daí vermos protestos em massa por causa de Gaza, mas não protestam contra o apedrejamento e/ou morte de uma mulher do próprio país.
Entretanto, a situação actual carece de soluções pragmáticas e que não penalizem um lado e beneficiem o outro. Continuo a achar que a ONU, se quer tanto a Paz na região, deveria promover a segurança, começando desde logo por uma capacidade de policiamento dos territórios palestinos. Evitando ataques, nomeadamente provenientes de Gaza, as chances para uma pacificação das relações aumentam drasticamente. Até esta solução ser testada, tudo o resto é palhaçada.
PS: falar de Portugal e de pseudo-direitos de outros sobre o nosso território, é burrice. Portugal conquistou o território, foram séculos de conflitos. Portugal ganhou o direito de existir, não lhe foi oferecido. Tanto Israel como a Palestina têm o direito de existir, mediante soluções favoráveis a ambos e localizados num local onde faça sentido. Fazer uma comparação em que "Os italianos podiam exigir de volta a Lusitania ocupada ..." (e portanto Portugal deixar de existir) é igual aos que defendem o fim de Israel para tudo aquilo ser Palestina, ou o fim da Palestina para tudo aquilo ser Israel.
PS2: O extremismo, em especial a extrema direita, tem crescido um pouco por todo o mundo, algo que pode ser influenciado por vários factores. Até na Europa, incluindo Portugal se tem visto esse fenómeno. A solução, em democracia, normalmente passa por não lhes dar razões para a popularidade subir. Em Israel chegou primeiro, que por exemplo em França ou Itália, porque já existia uma ameaça constante. Se em Israel fossem tudo ateu, a extrema direita iria crescer na mesma, porque andarem constantemente a ser atacados pelo vizinho, terá inevitavelmente esse resultado.
Sabendo que a extrema direita governar Israel é um problema, também se sabe que continuará a ser enquanto existirem ataques vindos do lado.