Eu não pretendo fazer proselitismo da causa monárquica porque entendo que devem as pessoas meditar sobre o que as rodeiam e comparar propaganda com factos. Tenho que confiar na inteligência das pessoas. É só dessas que eu me quero rodear. Deixo-vos aqui um texto que considero interessante que roubei do "Per-Espectivas" (do dono do desaparecido Letras com Garfos")...
Sexta-feira, 24 de Agosto, 2007
Porque sou monárquico
Arquivado como: Portugal — Orlando @ 4:48 pm
Quando lemos as obras em prosa de Fernando Pessoa, devemos ter muita cautela no juízo ideológico, porque nunca sabemos qual a “personagem” que escreve. Poderemos encontrar em Pessoa loas à restauração da monarquia e ao integralismo lusitano, e logo adiante, a diabolização da monarquia. Por vezes, Pessoa culpa a monarquia pelos erros da república; outras vezes, de tantos erros na república, dizia Pessoa que pelo menos a monarquia tinha um sentido decorativo, e que nem isso a república tem. Contudo, tenho muitas dúvidas que Pessoa concordasse com a política integracionista de Portugal em Espanha, nitidamente imposta pela União Europeia, e seguida com obediência canina, pelos actuais políticos do centrão português.
Não sou monárquico porque sou passadista, sou-o porque penso no futuro. O problema é que o futuro que eu penso não é o mesmo que os iberistas europeístas defendem para Portugal. Por isso é que os iberistas são republicanos; não descortinamos por aí um iberista monárquico, porque seria um contra-senso, um absurdo. Por isso é que a dinastia dos Duques de Bragança (que começou em 1640) é maldita em Espanha, e a monarquia em Portugal o pior inimigo dos iberistas espanhóis e portugueses. Antes de mais, temos que tentar perceber os vários tipos de iberismo existentes.
O Iberismo de Unamuno é o iberismo das nacionalidades ibéricas subordinadas a Madrid, uma “federação” em que existe uma língua superior a todas, a língua franca: o castelhano. Unamuno coloca a língua e a cultura castelhanas acima de todas as outras línguas e culturas ibéricas – a língua de Castela é a “língua superior” porque é a que tem mais falantes. Esta supremacia linguística iberista já não faz sentido, numa altura em que a língua inglesa é de facto a mais falada no mundo. O Iberismo de Unamuno é o que existe hoje com as autonomias em Espanha. Unamuno passou à História, o seu prazo de validade expirou.
Depois, temos o Iberismo Pessoano, e não totalmente assumido, o de Miguel Torga. Escreve Fernando Pessoa:
“Para uma união ibérica de qualquer espécie, seja essa espécie qual for, três coisas são essenciais, e sem elas nada se poderá fazer, e antes de elas se fazerem é inútil pensar sem receio nosso em qualquer aproximação. Essas três coisas são: primeira, a abolição da monarquia em Espanha. Segunda, a separação final da península nas três nacionalidades essenciais – a Catalunha, Castela e as províncias que conseguiu submergir na sua personalidade, e (terceira) a criação do estado galaico-português.”
Fernando Pessoa coloca a hipótese de um tipo de iberismo que os iberistas de Madrid nunca aceitarão. Por exemplo, a abolição da monarquia em Espanha significaria o fim da Espanha como país – não como nação, porque não existe só uma nação em Espanha. Fernando Pessoa reconhece implicitamente que a monarquia une uma Espanha com várias nações, e implicitamente reconhece que a melhor forma de manter uma nacionalidade, mesmo contra-natura como é o caso espanhol, é através de um regime monárquico. Fernando Pessoa reconhece (sem ser explicitamente) que a monarquia tem um poder aglutinador. O caso da actual Bélgica é um exemplo da força aglutinadora da monarquia num país com duas nações completamente diferentes.
Pessoa defende depois a independência das nacionalidades ibéricas:
“É absolutamente impensável a solução do problema ibérico sem ser por uma federação; é impensável a federação com a constituição desigual, antinatural, viciosa e falsa, dos estados ibéricos actuais. Se os espanhóis não querem, como é natural, encarar de modo algum essa solução do problema, pedimos que nos desculpem de deixar de pensar no assunto.”
Fernando Pessoa defende (depois da abolição da monarquia em Espanha) as seguintes nacionalidades ibéricas independentes: a Catalunha (que pode incluir, ou não, Valência), Castela, País Basco, Andaluzia, e um estado galaico-português, que incluiria os territórios de Portugal e da Galiza.
Escreve Fernando Pessoa: “o grande inimigo da Ibéria é Castela”.
Exactamente porque Fernando Pessoa – tal como Miguel Torga – pede aquilo que é impossível aceitar pelos actuais iberistas, não pode ser considerado como “iberista”. Fernando Pessoa dá um xeque-mate ao iberismo, ao dizer que este só seria possível sob a bandeira da justiça e da igualdade entre as nações ibéricas. Escreve Pessoa (in “Da Ibéria e do Iberismo”):
“A primeira nação inimiga da Ibéria é a Espanha – no sentido da actual Espanha, Castela imperando antinaturalmente num agrupamento que não conseguiu absorver, porque não absorveu a Galiza e a Catalunha”.
O Iberismo de Miguel Torga é geográfico, telúrico, e não político ou mesmo cultural. Miguel Torga sempre criticou o fatalismo impotente do português contemporâneo, e nunca poderia por isso sucumbir a um fatalismo que admitiria a inexorabilidade da alienação cultural portuguesa, submetida por um fado que exige a integração de Portugal em Espanha.
O Iberismo de Fernando Pessoa é, de facto e na prática, um anti-iberismo, no sentido da sua exigência extrema no respeito pelas nacionalidades ibéricas. Fernando Pessoa pede o que os iberistas espanhóis nunca poderiam aceitar, e nesse sentido, é um inteligente anti-iberista português.
Por último, temos o Iberismo actual, protagonizado boçalmente por políticos portugueses como o ministro Mário Lino e, de uma forma inconfessável, por José Sócrates e muita gente dentro das fileiras do Partido Socialista. O Iberismo actual é uma recuperação do iberismo de Unamuno, um iberismo maçónico desta feita integrado numa política europeísta de integração.
Para todos os países europeus, com excepção de Portugal, a integração europeia significa a alienação de uma parte da sua soberania para todos os outros países. Para Portugal, a integração europeia significa a alienação de uma parte da sua soberania para todos os outros países europeus, e a outra parte que resta alienada a Espanha. Com a integração europeia, os outros países da Europa ficam, ainda assim, com alguma coisa, mas Portugal fica praticamente com nada. Não existisse o Brasil, a integração portuguesa na Europa transformaria Portugal, a médio prazo e numa perspectiva de Bruxelas, numa província espanhola governada a partir de Madrid. Seria o Brasil que nos lembraria que Portugal ainda existe.
Assumo-me monárquico – e defensor da continuidade da dinastia dos Duques de Bragança no trono de Portugal. Explico-me: monárquico, porque os iberistas actuais, defensores da transformação de Portugal em província autónoma espanhola, odeiam a força aglutinadora desempenhada historicamente pela monarquia no nacionalismo português, e sou defensor da dinastia dos duques de Bragança porque os iberistas espanhóis, defensores da supremacia da cultura castelhana, são dela inimigos históricos fidagais. Os espanhóis iberistas odeiam os Duques de Bragança.
Em suma: sou por D. Duarte Pio, aka D. Duarte II, porque os caminhos alternativos que os europeístas colocam aos portugueses são a vergonha e a infâmia.