Boa tarde,
Os que andam à procura de justificações na Lei das Armas e no Regime Jurídico das Armas e Munições devem direcionar as suas buscas para as Leis da Segurança Interna e da Segurança Nacional.
Em primeiro lugar eu quero agradecer aos que de uma forma tranquila e pensada me responderam, todos de uma forma ou de outra focaram aspectos essenciais que gostei de ler, boas observações de gente habituada a pensar nestes assuntos. Obrigado.
O meu ponto de vista;
Vamos colocar as coisas em contexto:
Quando se fala de policia deve fugir-se da lógica de estrutura militar tendente a apontar ou culpar de imediato quem comanda, quem dá ordens e está presente; não, é que nas FS o comandante, o graduado, só em ocasiões muito especiais e planeadas está presente, a norma é não estar, as coisas funcionam com uma orgânica e fluidez muito dessemelhante e de difícil apreciação para um militar habituado a nem se mexer sem uma ordem superior. É que o agente, o operacional da rua, o patrulheiro, o arvorado do carro patrulha, nas mais das vezes é o comandante de si próprio e tem o poder e dever de iniciativa – e, é claro, arca com as consequências da sua actuação e decisões.
Embora a PSP seja um corpo altamente hierarquizado (como as FA), em termos de autoridade publica temos todos a mesma. Assim, aquilo pode ter sido desencadeado (e muito provavelmente foi) pelo primeiro policia que lá passou ou se apercebeu da situação, e a legitimidade da sua actuação é tão válida quanto as acções desencadeadas por ordem superior. Se actuou dentro das normas e da lei o seu comandante directo (e os seguintes) só tem de apoiar e validar o seu desempenho e mais nada, se concorda ou não é irrelevante, a legalidade e racionalidade prevalecem. Nas mais das ocorrências os nossos comandantes só delas sabem, das acções e decisões que provocaram, no dia seguinte quando chegam à esquadra e leem e despacham os nossos relatórios, participações, autos, etc… (nos casos graves são informados imediatamente ou logo que possível – aqui foram-no, com certeza).
Reparem que as leis nunca mencionam os postos ou as categorias dos policias, apenas se referem a agentes de autoridade, explicitamente reconhecendo a mesma a todos eles, do mais maçariquinho ao mais pintado, abrindo uma pequenina excepção quando confere a qualidade de Autoridade de Policia Criminal aos oficiais (que efectivamente têm funções de comando) e de Orgãos de Policia Criminal aos restantes (importante, mas matéria técnica que não acrescenta aqui nada, é só para efeitos da aplicação do código do processo penal).
Portanto não é de todo adequado trazer para aqui um comandante, cascar-lhe no pelo, para o ilibar ou culpar; a PSP não é a tropa, o comissário não vai à frente, não tem de ir, não pode ir sempre nem com todos; os oficiais que reagiram, fizeram-no à posteriori em função do que lhes foi transmitido pelo pessoal no local, com base nas descrições e participações que redigiram, e em normas prévias bem como no actual estado de cooperação entre as policias e as FA.
Numa outra vertente e presumindo que todos vocês são/foram militares:
O policia, nomeadamente o de competência genérica, como o PSP ou o GNR, enquanto autoridade de segurança pública e opc vê todo o espaço publico cuja segurança lhe foi especificamente entregue por escala ou ordem directa, que tanto pode ser uma só uma rua como uma freguesia, duas ou três – chamamos-lhe giro – como o sentinela de reforço de uma unidade militar vê o espaço à sua volta: tudo o quanto seja incomum e ali se passe, sobretudo em termos de segurança, tem a ver com ele, é a primeira autoridade, o primeiro responsável e o primeiro a responder por essa área e por tudo o que lá acontecer no seu turno.
Assim, um militar a controlar o trânsito, de viaturas ou peões, a encerrar uma rua, de alguma forma a condicionar as pessoas e a circulação, é sempre um incidente ou anomalia que tem de ser imediatamente investigada pelo agente que primeiro constatou esse acontecimento, e se for anti-social, ilegítimo ou ilegal tem de imediatamente tratar de lhe por fim. Sim, prendendo o militar, se for necessário. Todavia, tendo sempre presente que quando os militares o fazem é normalmente por bons motivos.
Nesta situação em concreto, lamento, mas continuo a qualificá-la de ridícula.
Primeiro: esqueçam a perigosidade dos químicos empregues. Alguma terão, mas são exactamente os mesmos que muitíssimas empresas de desinfestação e autarquias estão a usar um pouco por todo o país, e até são adquiridos no mesmo importador. Sou uma pessoa bem informada.
Seguinte: se algum perigo na sua utilização existisse esse seria sobretudo para os residentes da envolvência dado que de uma área residencial se trata, e não para os supostos peritos que os aplicavam, esses, em principio, saberiam com o que estavam a lidar e estavam protegidos pelo seu conhecimento e equipamento. Por isso e à falta de outros motivos, por uma questão de bom senso, e eu ainda acredito que ele exista nas FA, se algum perigo real existisse seriam os militares os primeiros a informar e a convocar a polícia.
Depois: imaginemos que para além dos supostos riscos associados à toxicidade dos produtos em causa existiam também preocupações reais de segurança, nomeadamente quanto à integridade física dos executantes e da sua maquinaria. O que fariam os PE’s encarregados do perímetro de segurança se um civil, um funcionário da casa, um residente naquela rua, ou outro qualquer, com boas ou más intenções, resolvesse atravessá-lo, violá-lo, testá-lo? Como procederiam sabendo que militar não pode dar ordens a civis? Poder dar, pode; o civil é que no espaço publico só lhe obedece se quiser. Abriam fogo, chamavam a policia? Mas chamavam antes ou depois de o balear?
Acontecendo essa desgraça, inteiramente possível, não tendo os militares qualquer cobertura legal que os proteja ou preveja essa situação, seria julgado pela lei geral penal, um homicídio, um sarilho monumental, interno e judicial, pelo que estou convencido desde o primeiro minuto de que a presença dos militares e a não comunicação às autoridades tem mesmo a ver com a perigosidade nula da operação. Nenhum comandante com dois neurónios a funcionar ia expor assim e desnecessariamente os seus soldados a apuros que lhe condicionariam o resto da vida – logo para começar, uns meses de preventiva estavam garantidos.
Já me alonguei demasiado, deixo a questão dos F16 e das fragatas da marinha, para outra ocasião.
Para concluir digo o seguinte:
Aquilo não foi mais nem menos que um aproveitamento publicitário por parte do exército, que tem de rentabilizar todas estas ocasiões e tempos de antena para aparecer, para se mostrar. Precisa imenso disso, as oportunidades não são muitas, e essa parte compreendo-a. Não precisa é de se esticar para com quem não anda para ali com fitas, que faz o seu trabalho naquelas ruas, todos os dias, haja ou não químicos, tenhamos ou não covid. Foi isso e acerca disso que o DN Magina e o CEME falaram.
Continuo a dizer, há leis que enquadram estas situações, podemos não gostar delas, mas enquanto existirem são para cumprir. Esteve muito bem a PSP.
Bem hajam.