Uma entrevista que o presidente da PARTEX concedeu ao jornal PUBLICO, e que me pareceu
muito interessante e algo preocupante (mas de que transcrevo apenas em especial a parte concernente ao Brasil).
Capital especulativo subiu 30 vezes na energia
18.11.2007
O presidente da Partex Management Oil Services e da Partex Services, a petrolífera totalmente detida pela Fundação Gulbenkian, aconselha a levar a sério o aviso da Agência Internacional de Energia de que nos próximos sete anos o planeta vive sob a ameaça de ruptura de abastecimento de petróleo. É "o dedo na ferida", diz.
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Os sauditas estão sentados em dois activos cruciais. Têm as maiores reservas mundiais (264 mil milhões de barris) de petróleo, equivalentes a 20 biliões (milhões de milhões) de dólares a preços correntes, mas também têm as suas reservas monetárias em dólares, mais de 800 milhões, pelo que a depreciação do dólar tem um grande impacto no país. Acresce que há pressões na OPEP para mudar o sistema de preços do petróleo.
O petróleo pode ser cotado em euros?
Não, mas as pressões existem. Tanto que a OPEP definiu agora mais um cabaz, o Genève, com cinco moedas (dólar, euro, iene, libra esterlina e franco suíço).
E isso vai levar-nos a que preços de equilíbrio?
Não estamos só a lidar com os fundamentos da teoria económica. Perante um preço tão elevado, os economistas diriam claramente que a oferta aumentaria, mas estamos a ignorar uma variável-chave que é a geologia, que pode condicionar muita desta oferta.
O mercado petrolífero tem dois condicionamentos estruturais. Do lado da oferta, é a falta de acesso das grandes companhias às reservas que existem, portanto não se aplica aqui a regra de favorecer a eficiência da produção, dando acesso a quem paga melhor. Do lado da procura, também temos um condicionamento fortíssimo. Em muitos países do mundo os preços dos combustíveis são subsidiados - a China decidiu agora aumentar os preços em 10 por cento, e foi uma convulsão. Quando os preços são subsidiados, não há incentivos à mudança de hábitos de consumo.
O que torna mais difícil fazer previsões...
O preço em cada dia é fixado à partida pelo preço de produção do barril mais marginal que é necessário para responder à procura e, nesta altura, é de cerca de 30 dólares por barril, que corrresponde às areias betuminosas do Canadá e aos óleos extrapesados da Venezuela. Na Península Arábica, os preços de produção são da ordem dos dois dólares por barril, mas em termos económicos é o preço do barril marginal que tem que entrar no cálculo. Somam-se os royalties, que se paga aos países e que podem chegar aos 15/20 dólares, e o preço dos transportes que são cerca de oito dólares. Estas três variáveis são a chave para os custos de produção da matéria-prima. Temos, em cima disto, os 20 dólares do capital especulativo, 15 a 20 do "factor medo", claramente associado ao preço actual e temos o efeito do dólar. Temos outras três variáveis - geopolítica, dólar, hedge funds/capital especulativo - que obscurecem muito toda esta composição.
Por que razão países como o Brasil querem entrar na OPEP?
Também fiquei perplexo com o anúncio da possível entrada do Brasil. Angola é um exemplo. Foi observador muitos anos, depois entrou para a OPEP, mas esta tem quotas de produção e vai impô-las aos angolanos, que estão, no entanto, numa trajectória de aumento da produção até dois milhões de barris por dia.
É contraditório?
O próprio Brasil, entrando para a OPEP, a médio prazo, será submetido a essa questão. Penso que é um pouco a ilusão de que o cartel pesa na economia mundial, que dá maior capacidade de negociação, que reforça a posição geopolítica destes países.
A OPEP é uma força económica relevante, mas com todos os constrangimentos que existem e com a necessidade de o modelo energético mudar, talvez o preço mítico dos 100 dólares seja decisivo para os decisores políticos.
Quando diz que as companhias nacionais não se desenvolvem tecnologicamente, não é verdade que a Petrobras investiu muito na exploração de petróleo em águas ultraprofundas?
O caso Petrobras é quase uma excepção no âmbito das companhias nacionais. A companhia tem um centro tecnológico que é o Cenps, que procurou sempre aglutinar investigadores de todo o mundo. A Petrobras nunca se isolou, não só atraves do centro, mas também através da ligação a universidades americanas. A Petrobras beneficiou também do fim do monopólio, há alguns anos. Todas as grandes companhias estão no Brasil e há uma interacção muito forte.
É um caso de sucesso, sem dúvida a melhor companhia do mundo em águas ultraprofundas e as últimas descobertas [campo de Tupi Sul] provam-no mais uma vez. São descobertas importantes para o Brasil e para a Galp.
Para ilustrar o que representa a descoberta de Tupi, veja-se que o planeta está hoje a consumir 85 milhões barris/dia, é uma piscina olímpica que se esvazia em cada 15 segundos, o que dá 5500 piscinas por dia. O planeta está a consumir à volta de 29 a 30 mil milhões de barris/ano, mas em termos de reservas médias que se repõem por ano são nove mil milhões de barris. Quer dizer, por cada três barris que consumimos só estamos a conseguir repor um e o campo de Tupi representa, se for o valor máximo (oito mil milhões de barris), o consumo mundial de três meses.
Tem-se dado atenção suficiente ao facto de a Rússia querer controlar o fornecimento de gás à Europa como também o mercado asiático até ao Japão, no gás natural?
Na relação Europa-Rússia, esta não deve ser diabolizada. A Rússia é dirigida por um mestre da geopolítica moderna e do lado da UE temos 27 anões políticos, sem um pensamento geopolítico unificado. A Europa é ainda muito importante para a Rússia porque toda a sua rede de gasodutos está montada para o lado europeu, de onde saem as receitas que alimentam o bem-estar do Governo russo e do país.
Veja-se o que aconteceu com o gasoduto Nabbuco, o projecto que a petrolífera austríaca OMV estava a dinamizar com o apoio de todos os Governos europeus e que ia ligar o centro da EU à Turquia e depois esta à Ásia Central. Isso ia evitar a dependência em relação à Rússia e ao Irão - mas Moscovo fez um ataque demolidor e o Nabbuco foi liquidado.
A Europa tem de repousar na Rússia, é um parceiro privilegiado, mas tem que diversificar as suas fontes de abastecimento. Desde 1989, com a queda do muro, a Europa passou a olhar apenas para leste em termos de energia, descurou a bacia atlântica e o Norte de África.
Se olharmos para os investimentos russos, verificamos que a maior parte é na distribuição. A produção de gás russo provém, em 75 por cento, de cinco ou seis campos que já estão em depleção. Sem investimento na produção, podemos ter aqui, no gás, também um bloqueamento.
Por que é que a Rússia não investe na produção?
É aí que está o pensamento geopolítico de Vladimir Putin. Esta fase crucial, estabelecida pelo próprio Presidente, é como transformar um regime de partido único num gasoduto de regime único. Quer dominar toda a rede de distribuição pela Europa e Ásia. Já se associou aos dois grandes produtores da Ásia (Cazaquistão e Turquemenistão), fez uma cimeira do mar Cáspio, quer dominar a rede de gasodutos investindo na aquisição de activos na Europa.
O peso da Alemanha e da França impede a UE de olhar para o Atlântico, em termos energéticos?
Pesa bastante. A Alemanha continua a ser uma das locomotivas da Europa. Se olharmos para o projecto dos anos 90 de criação das redes com o Norte de África, está paralisado. Se olharmos para a bacia atlântica, não há fluxos de gás natural (de Trindade e Tobago, Venezuela, Guiné Equatorial, Angola, etc.) para a Europa representativos.
Portugal podia desempenhar um importante papel.
Prevejo que a Europa vá ter uma falta de gás a partir de 2011 na ordem dos 70 mil milhões de metros cúbicos, equivalente à soma do consumo da Espanha e França, e vai ter necessidade de muitos terminais como o de Sines, para importar gás do exterior. L.F.
Presente em dez blocos petrolíferos no Brasil, a Partex vai ficar de fora do leilão que o Governo de Lula da Silva marcou para o próximo dia 26. "Decidimos não participar", declara Costa Silva. "Para já, foram retirados [da licitação inicialmente prevista] muitos blocos apetecíveis e nós já lá temos dez. Para a nossa dimensão, mantemo-nos aqui, mas continuamos a trabalhar com a Petrobras. Somos operadores na bacia de Potiguar, onde já fizemos várias descobertas, e vamos continuar".
O gestor da Partex considera que os últimos resultados do campo de Tupi Sul, na bacia de Santos, no Brasil - e que decuplicou a capacidade de produção da Galp Energia - são muito positivos, tanto para a petrolífera portuguesa como para a Petrobras. A Partex não está neste consórcio de Tupi Sul, mas está muito expectante na mesma. "Estamos [no bloco] ao lado e pensamos que é dos melhores daquela zona".
Com concessões distribuídas pelo Médio Oriente, Cazaquistão, Brasil e Angola, a primeira região continua a ser "parte fundamental da estratégia". O campo do Cazaquistão vai passar à fase de desenvolvimento, esperando-se que dê "uma contribuição importante no futuro". Quanto a Angola, e ao bloco 17 do qual a francesa Total é operadora e a Partex é parceria do consórcio, "as indicações até agora são extremamente positivas". "Pensamos que vai gerar um pólo de produção no futuro, assim como evidentemente o Brasil".
As concesões da Partex representavam, no final de 2006, uma capacidade de produção equivalente a 46 mil barris por dia, perto de um sexto do consumo nacional. As suas reservas provadas eram de 215 milhões de barris no fim de 2005, o que representou um aumento superior a 13 por cento face ao ano anterior.
As concessões já em produção estão em Omã e Abu Dabi, representando a primeira cerca de 60 e 40 por cento do total, respectivamente. O bloco do Brasil poderá produzir a partir de 2008. Os testes-piloto decorrem na bacia de Potiguar. "Veremos se consolidamos e expandimos", é a expectativa de Costa Silva.
A Partex Oil & Gas é totalmente detida pela Fundação Calouste Gulbenkian. Incorpora uma série de holdings detentoras das suas várias concessões petrolíferas. A gestão destas é assegurada através da Partex Services e PMO-Partex Managment Oil Services, às quais preside Costa e Silva.