Partindo do principio de que os “astros” venham a estar alinhados algures no decurso dos próximos anos, conjugando de forma perfeita, entre outros factores, a capacidade de pressão da Marinha, a vontade política e a existência de “pilim” nos cofres do Estado, teria mesmo assim de se ponderar muito bem o que adquirir.
Primeiro, substituir as 5 fragatas existentes por 3 ou 4 unidades novas representará sempre (se não em termos qualitativos, pelo menos em termos quantitativos), uma perda de capacidades.
Segundo, equacionar qualquer compra abaixo de 4 unidades de superfície é o mesmo que dizer que o País nunca mais vai dispor, em permanência, de mais do que um navio disponível para emprego do mesmo no exercício da sua soberania (4 unidades é o mínimo exigível para garantir que existe um navio em permanência em manutenção, um outro em treino / exercícios, um outro em missão junto de uma das organizações de segurança que o país integra, seja a NATO ou a UEO, e o último disponível para empenho operacional naquilo que forem as necessidades do País).
Terceiro, vender os navios que possuímos, já com mais de 25 anos no “pêlo”, irá render, por unidade, algo em torno a ¼ do valor de um navio novo (e isto partindo do principio de que tudo o que está dentro de cada um deles sai no pacote – porque se alguém se lembrar de começar a tentar vender os navios sem parte dos sistemas de armas, sonares ou radares instalados, então o valor unitário baixa e muito).
Quarto, uma opção destas obedece a um planeamento estratégico que não existe. Seria necessário decidir JÁ o que é que se pretende comprar, fazer um planeamento a médio / longo prazo, e vender JÁ o que temos (garantindo entregas faseadas, para não perder entretanto capacidades). Como mínimo, com uma decisão positiva a ser tomada em 2018, teríamos o primeiro navio NOVO lá para 2021 / 2022 (dependendo do estaleiro e da respectiva carteira de encomendas). Mesmo que nos fosse entregue um navio novo todos os anos (o que é quase utopia, mas enfim), significaria que teríamos a frota totalmente renovada apenas lá para 2025.
Quinto, duvido muito, mas mesmo muito, que os ENVC tenham capacidade para construir de raiz toda uma série de navios de superfície do tipo das DAMEN 10514 ou das F110. No caso concreto, melhor seria fazer uma parceria entre os ENVC e a DAMEN ou a NAVANTIA, e produzir em conjunto (com os ENVC a realizarem uma percentagem dos trabalhos e a casa Mãe o grosso), tanto para as unidades que viessem a ser adquirido por Portugal, como para quaisquer outras unidades que viessem a ser produzidas para terceiros. Não se trata de diminuir a qualidade do trabalho realizado pelos ENVC, mas sim de constatar que, como nunca foi construído nada do género em Portugal, nos falta adquirir experiência no capítulo da moderna construção naval modular e na integração de sistemas de armas e sensores avançados. Não quero com isto dizer que não seria possível construir cá os navios – quero com isto dizer que a relação custo / beneficio de construir por cá este tipo de navios, sem ter já algum background, não seria provavelmente (e para já), compensadora.
Sexto, seria preciso pensar muito, mas muito bem MESMO, o que é que se vai construir / adquirir. Uma fragata multimissão, com boas capacidades tanto para defesa aérea, como para ASW e combate de superfície, não é um navio nada barato. Só para o casco é necessário contar para aí com uns 250 a 300 milhões de euros por unidade. Em cima disso, é necessário acrescentar outro tanto para armamento e sensores.
Sétimo, os navios têm de ser pensados para possuir o máximo de capacidades com o mínimo de tripulação. Tal significa poder embarcar algo como 1 canhão de 76 ou 127 mm, um ou dois sistemas CWS, um ou dois canhões de 30 mm, uns dois sistemas de lançamento de SSM, umas 12 a 16 células de lançamento (de preferência verticais), de SHORADS, uns 4 tubos lança-torpedos, dois sistemas para lançamento de Decoys / Chaft, ECM, ESM, sonar de casco e sonar rebocado, radar 3D, radar director de tiro ( e mais uma quantidade de equipamentos que outros foristas que são especialistas na área poderão detalhar e que a mim nem sequer me ocorrem), colocados num navio de 120 a 140 metros de comprimento, com uma tripulação (ideal) de cerca de 120 a (máxima) 150 elementos.
Oitavo, tão importante como possuir os navios é criar as condições para ter tripulações preparadas para os guarnecer (e reservas para colmatar quaisquer necessidades), ter as quantidades necessários de armamento embarcado (e em reserva), ter “pilim” para custear, pelo menos, cerca de ¼ dos dias do ano em navegação / operação, e ter vontade e “€€€€” para fazer 2 ou 3 upgrades de muitas dezenas de milhões no decurso dos 30 a 40 anos de vida útil operacional de cada navio.
Agora….
Se nem sequer se fala em construir mais NPO’s (que tanta falta fazem, e que custam uns 40 ou 50 milhões de Euros cada), ou um reabastecedor de esquadra (que custa 150 a 200 milhões), falar de novas fragatas não é quase como perguntar se alguém ainda acredita que o Pai Natal existe?
Cumprimentos (e siga a Marinha)!
PS – como ainda (tento) acreditar no Pai Natal, para mim, e dentro do que vi por aí, optaria por 4 SIGMA 10514 da DAMEN. O projecto da F-110 da NAVANTIA, que ao inicio me parecia muito interessante (algo entre uma Álvaro de Bazan e uma fragata ligeira, com todas as capacidades lá dentro e uma tripulação a rondar as 120 almas), parece afinal ter-se transformado num navio de 140 metros, com uma tripulação a rondar os 150 elementos – ou seja, quase um destroyer. Para além disso, o custo unitário passou de uns 550 / 600 M € para algo à volta de 750 a 800 M €.