O rumo certo

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dremanu

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O rumo certo
« em: Março 30, 2005, 05:33:45 pm »
Já não me lembro onde fui buscar este texto, mas aqui fica para ler porque oferece mais informações sobre a realidade económica do nosso país.
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Única

O rumo certo
 
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Os manifestos de personalidades de todos os quadrantes lançados nos últimos meses, os temas de inúmeros congressos e conferências e os debates da campanha eleitoral banalizaram a ideia de que Portugal precisa de um novo rumo, de uma nova estratégia, de choques - tecnológicos, de gestão, de valores... -, de uma lista infindável de reformas estruturais para sair da crise geral em que se afundou.
 
Reformas na saúde, na educação, na formação profissional, no sistema científico e tecnológico, na gestão das empresas e organizações, no ordenamento do território, no urbanismo, no ambiente, na justiça, na fiscalidade, no funcionamento dos mercados, na segurança social, no sistema político, na administração pública.
 
Mas há quem não precise de esperar por essas almejadas reformas para passar à acção e fazer com que Portugal funcione bem. São pessoas que acreditam em que a situação crítica a que chegámos é também da responsabilidade de cada um de nós, da atitude de cada cidadão e não apenas do sistema, da sociedade, do Governo, enfim, dos «outros». Escolhemos, por isso, nas páginas que se seguem, casos de sucesso em sete áreas-chave para o desenvolvimento - saúde, educação, ambiente, justiça, indústria, sistema político e sociedade civil - onde os diagnósticos do «Estado da Nação» têm sido muito pessimistas. Ao mesmo tempo, recordamos o essencial desses diagnósticos, apontando soluções para sair da crise.
 
Os alertas de que o modelo de desenvolvimento dominante desde a integração na União Europeia já não serve têm-se multiplicado nos últimos anos, mas a procura de alternativas que nos levem a prosperar de novo e a vencer na Europa e no comércio mundial continua a ser tímida e inconsistente, como se tivéssemos chegado a um beco sem saída. Na verdade, a economia portuguesa encontra-se hoje cercada por concorrentes de todo o tipo no comércio internacional e na captação de investimento estrangeiro (ver infografia na páginaseguinte), que põem em causa os seus alicerces.
 
A nossa dinâmica indústria automóvel e de componentes, que já é o segundo maior exportador nacional, não está apenas ameaçada por países do Leste europeu como a Eslováquia ou a Polónia, mas também por várias regiões de Espanha, como a Galiza, Valência ou Catalunha. Da mesma forma, no têxtil e vestuário não é só a supremacia chinesa que abala o principal sector exportador português. Há rivais para todos os gostos, como Marrocos, Turquia, Roménia, Bulgária, Índia ou Paquistão, países muito diversificados em termos de dimensão e de nível de desenvolvimento. O mesmo se passa na electrónica, onde China, República Checa, Hungria ou Malásia não deixam Portugal respirar. E em sectores estratégicos onde existem potencialidades inexploradas, como a aeronáutica, a competição vem mesmo de muito perto - da Andaluzia.
 
É possível quebrar este cerco? Augusto Mateus diz que sim, mas critica o facto de «em muitos debates se defender a necessidade de deitarmos fora o que temos e de irmos à procura daquilo que não temos», quando a solução passa mais por «mudar o modelo de negócio e ganhar novas capacidades» nos sectores onde as empresas portuguesas já têm uma presença forte. E o ex-ministro de Economia exemplifica: «O turismo deve desenvolver-se à volta da saúde, da terceira idade, e por isso precisamos de apostar em projectos de investigação científica nas ciências da vida. Por outro lado, Portugal tem o 'know-how ' de tudo o que é necessáriopara o conforto de uma casa moderna, dos têxteis à cerâmica, ao vidro, ao mobiliário e à electrónica. O erro é que nos concentrámos na produção e não na investigação e desenvolvimento, na inovação, no 'design' e na concepção», actividades que acrescentam mais valor e que exigem trabalhadores altamente qualificados.
 
Mas para o nosso país mudar o seu padrão de especialização no comércio internacional precisa de «crescer com aumento da produtividade e não com aumento do emprego, porque o nosso problema não é quantitativo mas qualitativo, tem que ver com falta de competências profissionais, de capacidade de gestão e de organização». Os economistas Luís Mira Amaral e José Félix Ribeiro também definiram, num estudo recente encomendado pela Agência Portuguesa para o Investimento (API), as actividades que poderão aumentar o potencial de crescimento nacional e quebrar o cerco internacional. Três exemplos: o têxtil reorientado para a produção de consumíveis hospitalares para toda a Europa, as indústrias de moldes e de componentes automóveis viradas para a aeronáutica e a concepção e produção de equipamentos para electrónica e robótica submarina.
 
O nosso país chegou a uma etapa da sua evolução em que já não há lugar para ilusões e fugas para a frente. Quase duas décadas depois da entrada na UE, somos desta vez confrontados a sério com o esgotamento de um modo de vida que, em várias ocasiões, nos fez pensar que, mesmo sem grande esforço, estava próximo o momento em que seríamos tão ricos, educados, cultos, eficientes, organizados, influentes e reconhecidos como os nossos parceiros mais avançados do clube europeu.
 
É certo que nos últimos vinte anos muita coisa mudou e que Portugal se aproxima hoje das médias europeias em indicadores tão importantes como a mortalidade infantil, o número de habitantes por médico, o peso da população estudantil universitária, o nível dos serviços bancários, os quilómetros de auto-estrada ou a taxa de penetração de telemóveis. Mas o problema é que em muitas outras frentes tão ou mais importantes para alcançarmos o que há de melhor na Europa ficámos para trás, fizemos pouco, decidimos mal, desperdiçámos oportunidades e adiámos soluções, em especial na frente económica.
 
Apesar da dimensão dos problemas que nos mantêm afastados da Europa próspera e civilizada, as alternativas para os resolver existem, desde que o nosso país adopte uma estratégia de desenvolvimento clara e inteligente. A sua concretização exige sacrifícios, trabalho, organização, persistência, vontade de mudar. Por isso tem de ser uma estratégia mobilizadora e estimulante, que aponte para um horizonte de 10 a 15 anos.
 
Mesmo sem ela, há sinais de esperança, há transformações na sociedade portuguesa que podem surgir onde menos esperamos. É o que se passa nos índices de leitura, um indicador que nos coloca sistematicamente nos lugares mais baixos dos «rankings» culturais da UE, devido à fraca escolaridade da população e aos maus resultados do sistema de ensino. As duas maiores cadeias de livrarias do país - a FNAC e a Bertrand - estão a atravessar, em plena crise, uma fase de grande expansão das suas actividades. A cadeia francesa (sete lojas) é líder do mercado, mas a Bertrand (39 lojas) prepara-se para a alcançar, e o ano de 2004 foi o melhor de sempre da cadeia de livrarias portuguesa. Em 12 meses as duas marcas venderam 5,5 milhões de livros!
"Esta é a ditosa pátria minha amada."