Portugal, com Cavaco, deixou de ser um país para lá dos pirineus, para se tornar um país europeu.
Cavaco conseguiu o "impossível"? Obviamente que não. É sabido que
havendo uma liberalização do mercado este responde numa primeira fase de modo favorável. Primeiro, porque foi no tempo de Cavaco que se começaram as privatizações. Segundo, porque foi no seu tempo que se deram as primeiras deslocalizações de fábricas e pólos indústrias (então, a globalização era uma coisa boa
) para Portugal vindas da Europa Central. Isto é, deu-se crescimento económico. Num outro ponto
a situação financeira melhorou com a vinda dos fundos da CEE e que possibilitaram, assim, a mobilização de verbas para outros campos de investimento. Pode-se pois concluir que os três principais factores do crescimento económico de Portugal no final da década de 80
mais do que a política governamental, dependem da adesão à CEE e da natural pujança económica que isso traz.
Um segundo tópico não menos importante é o modo como
o poder local geriu as verbas da CEE: de um modo irracional, mal planeado e até mesmo corrupto. Isto são factos que vieram na imprensa portuguesa e em estudos internacionais. O que tem isso a ver com Cavaco? Ora,
o poder central - isto é, o Governo e, portanto, Cavaco Silva - deveria ter controlado essa gestão e, sobretudo, porque tinha uma responsabilidade política sobre este - tal como o poder central, o poder local era social-democrata. Os erros não se desculpam, pagam-se. Estes fundos foram mal administrados e
os responsáveis políticos não podem ser desculpabilizados.
Por outro lado, se se construiram estradas e infra-estruturas que nos ligaram à Europa e permitiram um melhor escoamento dos nossos produtos, deve-se notar que, por exemplo,
a Irlanda apostou numa formação superior, na modernização da sua agricultura e pesca e numa economia competitiva. Com dinheiros europeus. Portugal usou esses fundos essencialmente para construção de infra-estruturas. Opções? Sim. Porém, o
dinheiro da CEE/UE não é infinito e, portanto, deveria ter sido usado (até numa lógica de pacto de regime) na modernização da nossa capacidade técnico-produtiva e que a longo prazo (os vinte anos que completamos agora) iria seguramente produzir por ela própria as verbas necessárias para estradas e infra-estruturas. É o que ocorre, aliás, na Irlanda. E, no entanto, a Irlanda também investiu em infra-estruturas.
O nosso erro foi investir só nestas. Mais uma vez
os responsáveis políticos não podem ser desculpabilizados. Isto é uma crítica válida para Cavaco e Guterres. Porém, isso não desculpabiliza Cavaco.
Em geral, as infra-estruturas geraram um crescimento económico a curto prazo (através das empresas de construção), porém, não se traduziram num investimento proveitoso a médio prazo. E basta ver que isso não capacitou as empresas de construção para actuarem de forma independente no exterior.
Deste modo,
Cavaco não poderia ter do ponto vista económico o meu voto. Cavaco Silva fala agora que a ocupação de cargos públicos conforme cor partidária foi um erro. Não obstante,
não deixa de ser interessante que seguinto esta lógica, Cavaco poderá ser levado a nomear ao invés de militantes socialistas, militantes do PSD e CDS. Isto é, na prática, militantes dos partidos que o apoiaram. Gostaria de ver tal afirmação caso o governo fosse social-democrata. Sendo socialista não me espanta.
Do ponto de vista político podia só destacar o modo como foram tratadas figuras valiosas como Eurico de Melo, Fernando Nogueira e Cadilhe. Cavaco que é incapaz na sua auto-biografia de criticar Santana Lopes e de explicar porque não o elevou a ministro. faz-lhe mesmo elogios, para meses depois lhe chamar de má moeda. É pois uma pessoa cujas opiniões se centram no politicamente correcto. Eu pessoalmente
gosto de opiniões frontais (concorde com elas ou não).Cavaco tem um projecto governativo para Belém. Isso é inconstitucional. E poderá mesmo gerar confrontos com o Governo.
Não digo que Cavaco demita o Governo, mas pode desgastá-lo. Eu pessoalmente não acredito que o PSD constitua opção. Infelizmente, também não creio que Cavaco tenha cultura humanista (independentemente de ter ou não cultura livresca) para o diálogo. E isso em Belém é muito importante.
Em Belém não se pede um projecto governativo, mas alguém cujo perfil é de uma pessoa sensível e capaz de gerir os imprevistos que surjam de uma forma consensual e imparcial. Para mim essa pessoa (digo-o muito claramente) é
Manuel Alegre.
Manuel Alegre que tem mostrado, nos seus discursos, uma preocupação constante pelas Forças Armadas e sua dignificação e modernização. Manuel Alegre que, coerente com os seus princípios, fez a guerra para ter a capacidade moral para a criticar. Manuel Alegre que foi o deputado socialista que mais votou contra o seu próprio partido. Manuel Alegre que se manteve distante e críticos face à lógica do poder - por exemplo, na célebre questão do "queijo limiano". Pensem nestes factos.
Cumprimentos,
Pedro Monteiro