Protótipo do submarino será construído em laboratórioConhecida como complexo do reator, instalação de pesquisa será formada por 11 prédios
Lyne Santos
Marinha já iniciou a construção de parte dos edifícios do Laboratório de Geração Núcleo-Elétrica, o Labgene
Um modelo do primeiro submarino nuclear brasileiro será construído no Centro Experimental de Aramar (CEA), que integra o Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP). O protótipo funcionará no Laboratório de Geração Núcleo-Elétrica (Labgene), uma das áreas mais importantes no desenvolvimento da embarcação.
O Labgene, também conhecido como “complexo do reator”, será formado por 11 prédios. O destaque fica para os edifícios do reator e das turbinas, que serão responsáveis por testar os circuitos primário e secundário do equipamento, respectivamente.
O prédio das turbinas ainda está em fase de obras. O outro, do reator, aguarda a autorização ambiental para sua construção. A expectativa da Marinha é que a liberação venha ainda neste semestre. A demorase deve aos elementos radioativos que serão utilizados no prédio. Considerado de classificação nuclear, a instalação do reator precisa atender os mesmos requisitos de projeto e de licenciamento de uma usina termonuclear, como Angra 1 e 2, que funcionam em Angra dos Reis (RJ) e produzem energia para diferentes estados.
“O (reator) que está sendo feito é capaz de gerar energia para uma cidade de 25 mil habitantes. Já uma usina gera para 250 mil pessoas. Esses prédios serão a simulação do submarino em terra. Eles servirão para testar variáveis do projeto e treinar a tripulação”, disse o capitão de corveta e engenheiro naval responsável pela implantação do Labgene, Danilo Grosso.
Segundo o capitão de corveta, o prédio do reator precisa ter uma estrutura para resistir a terremotos, tornados e sismos (abalos). Devido a essas exigências, foi escolhido um local estratégico para a construção. A área selecionada fica sob leito rochoso, o que ajuda na estabilidade e na integridade do prédio. “(O leito de rocha) impede a passagem de vibrações. Mesmo em sondagens a 100 metros de profundidade foram encontradas rochas intactas”, destacou Grosso.
O Laboratório de Testes de Equipamentos de Propulsão (Latep) é outra unidade construída em Aramar para avaliar os equipamentos, antes que sejam colocados em conjunto com o reator. No local, é verificado o funcionamento das turbinas e dos geradores, o denominado circuito secundário. Ao todo, o submarino vai contar com quatro turbogeradores, entre os de propulsão e os auxiliares.
Além das turbinas do submarino nuclear, o Latep está testando turbinas que serão exportadas para a Colômbia. A princípio, elas seriam examinadas na Alemanha, porém os custos ficariam bem mais altos.
COMBUSTÍVEL
Em Aramar, acontece ainda a produção do combustível a ser utilizado no reator do submarino. O trabalho é feito na Usina de Produção de Hexafluoreto de Urânio (Usexa), elemento chavepara a fabricação do combustível.
Na usina, ocorre a conversão do urânio em pó, o chamado yellow cake, no gás hexafluoreto de urânio. O procedimento é necessário para que fique mais fácil separar o Urânio 235, presente em baixa concentração no mineral e importante para a produção do combustível.
“Atecnologia foi desenvolvida e projetada no Brasil, já que não adquirimos matéria prima no mercado internacional. Depois isso, poderá ser transferida para a sociedade civil, sendo utilizada pela Petrobras e na medicina, por exemplo”, explicou o engenheiro de Metalurgia Paulo Dias, responsável pela operação da Usexa.
A usina de conversão da base militar atenderá apenas as demandas da Marinha relacionadas ao Programa de Desenvolvimento de Submarino com Propulsão Nuclear. O laboratório não prestará serviços a usinas nucleares, uma vez que trabalha com quantidades de urânio bem menores do que as necessárias para essas plantas (o volume de combustível necessário para a embarcação é bem inferior ao demandado por essas instalações de energia).
Quando em plena operação, a unidade da Marinha no Interior de São Paulo poderá converter até 40 toneladas de yellow cake por ano. Para as usinas Angra 1, 2 e 3, seria necessário converter 500 toneladas anuais.
No Brasil
“A tecnologia foi desenvolvida e projetada no Brasil, já que não adquirimos matéria-prima no mercado internacional”
Paulo Dias, responsável pela operação da Usina de Produção de Hexafluoreto de Urânio da CEA
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Marinha dá os primeiros passos para ter seu submarino nuclear
Construção de um protótipo do reator da embarcação já está em estudos em base no Interior de São Paulo
Lyne Santos
6/3/2012
Após ingressar na seleta lista de países com um porta aviões, o Brasil vai integrar um grupo ainda mais restrito, o das nações com um submarino nuclear. A previsão é que a embarcação esteja pronta para os primeiros testes de mar em 2023. Atualmente, o projeto passa pelas fases de construção do protótipo do reator nuclear e produção do combustível, que devem ser concluídas em dois anos.
Essas etapas são desenvolvidas no Centro Experimental de Aramar (CEA), unidade da Marinha localizada na cidade de Iperó, a 125 quilômetros de São Paulo. No local, visitado pela Reportagem de A Tribuna, é feita parte das atividades de pesquisa da Armada.
O CEA também abrigará instalações onde serão testados os equipamentos nucleares a serem implantados no submarino. Um dos futuros prédios, por exemplo, será um protótipo, em terra, do próprio veículo. De acordo com o projeto, nesse imóvel, serão recriados os ambientes da embarcação e será testado seu reator, responsável pela produção de energia que a movimentará.
“O nosso reator protótipo será utilizado para testar o projeto, ver se ele funciona de fato. Se funcionar, vamos reproduzi- lo exatamente igual e colocar a bordo do submarino. Se não, vamos fazer as modificações apropriadas para que a segurança e o desempenho sejam aqueles requeridos”, explicou o superintendente do Programa de Desenvolvimento de Submarino com Propulsão Nuclear da Marinha do Brasil, o contra-almirante e engenheiro naval Luciano Pagano Junior
Será a primeira vez que o Brasil construirá integralmente um reator nuclear. Os principais equipamentos para sua montagem foram adquiridos ao longo dos anos, já que a ideia de ter um submarino com esse tipo de propulsão surgiu no País há mais de duas décadas.
O primeiro submarino nuclear do mundo foi o Nautilus, fabricado pelos Estados Unidos em 1954. Quase 60 anos depois,apenas cinco países contam com esse tipo de embarcação – Rússia, China, Inglaterra e França, além dos Estados Unidos. Todos integram o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). A Índia também tem um projeto em andamento.
O grupo é mais seleto do que o dos países com porta-aviões, tipo de embarcação presente nas marinhas de dez nações atualmente.
As turbinas do futuro submarino nuclear são avaliadas no Laboratório de Testes de Equipamentos de Propulsão, um dos prédios do CEA
SUBMARINOS
Segundo o contra-almirante Pagano Júnior, o submarino brasileiro será montado no estaleiro em construção nas proximidades do Porto de Itaguaí, às margens da Baía de Sepetiba, no litoral sul do Rio de Janeiro. Na área, também será implantada uma base naval. A estimativa da Marinha é que os empreendimentos sejam finalizados em meados de 2015.
Ao todo, serão investidos € 6,7 bilhões (cerca de R$ 15,4 bilhões, com base na cotação de ontem) na implantação de todo o projeto. Esse montante inclui os gastos com a construção da base naval, do estaleiro, do submarino nuclear (sem o reator) e de quatro submarinos convencionais. Estes últimos vão substituir os que a Marinha tem hoje e já estão com idade avançada – Tupi, Tamoio, Timbira, Tapajó e Tikuna. O primeiro deve ser lançado ao mar em 2017.
Assim como o submarino nuclear, os convencionais serão fabricados a partir de um contrato firmado com a França em 2008. Pelo acordo, os franceses são responsáveis pela construção dos equipamentos e da tecnologia não-nuclear.
quipamentos serão testados antes de serem instalados na embarcação
MOTOR
A principal diferença entre os submarinos convencionais e os de propulsão nuclear está no motor. Enquanto o primeiro se movimenta graças a um motor a diesel, o segundo utiliza um reator nuclear.
O submarino brasileiro não usará armamento nuclear. Isso se deve, principalmente, ao Tratado de Não- Proliferação Nuclear (TNP), assinado pelo País em 1968 e que impede a uso dessas armas pela nação.
De acordo com o contra-almirante Pagano Junior, a construção de um submarino nuclear garante à Marinha novas condições para defender o mar territorial brasileiro. Para ele, a embarcação é um instrumento de trabalho de qualidade e eficiência. “É mais ou menos como você defender o seu forte apache com arco e flecha e, em seguida, passar para armas de fogo”, exemplificou.
São as características do motor que asseguram as principais vantagens dessa embarcação. O equipamento permite que o submarino permaneça meses submerso e ainda atinja uma maior velocidade. Os diferenciais são essenciais no caso de fuga ou perseguição a um inimigo. O tempo que ele ficará embaixo d’água dependerá apenas do estresse da tripulação.
“A vantagem do submarino em um conflito é que ele não é detectável enquanto está submerso. Já quando está fora, é totalmente vulnerável. O tempo de submersão é a proteção do submarino”, explicou.
O oficial reiterou ainda que o submarino é um fator inibidor para possíveis inimigos. “Do ponto de vista do que se entende que é o poder naval, o exercício da capacidade de defender, o submarino é peça fundamental”.
Tripulação é selecionada entre militares voluntários
A seleção dos tripulantes para os submarinos militares, tanto os convencionais como, futuramente, o nuclear, é feita por regime de voluntariado, explicou o contra-almirante Luciano Pagano Junior. Segundo ele, para ser um bom profissional a bordo deste tipo de embarcação, é preciso querer, já que oficiais e marinheiros são submetidos a um elevado estresse psicológico.
No caso específico do submarino nuclear, é justamente o comportamento da tripulação que determinará quanto tempo ele ficará submerso. Normalmente, a embarcação fica meses embaixo d’água, para a realização de missões. E para que os militares estejam preparados, será aplicado um treinamento bastante rigoroso, que vai durar mais de um ano.
“Eles precisam estar aptos a viver com companheiros, com uma tripulação que varia entre 50 e 80 homens, dependendo do tipo de submarino. E isso intimamente, pois é um espaço muito pequeno e limitado para compartilhar com essas pessoas o dia a dia”,disse o contra-almirante.
A Marinha já iniciou o processo de seleção para a tripulação. A preparação incluirá testes em câmaras hiperbáricas (onde a pessoa é submetida a uma pressão elevada) e missões em submarinos convencionais. “Tem toda uma cultura que é criada para que paulatinamente ele esteja preparado”.
Além do estresse psicológico, os tripulantes de um submarino nuclear costumam sofrer com o estresse profissional, informou Pagano Junior. Isso porque cada um tem sua função específica, executada sob o risco de “por a perder todos os tripulantes”. “Manobras erradas significam um grande desastre. É uma profissão estressante”, destacou.
A principal diferença no treinamentodas equipes de embarcações com propulsão nuclear está na parte técnica, ou seja, em como operar o reator com segurança. Nessa área, o Brasil conta com o apoio da França, parceiro do País na construção desse submarino. Segundo o contra-almirante, “há um acordo com a França que visa não treiná-los (os tripulantes) lá, mas sim, obter informações que permitam reproduzir esse treinamento no Brasil, com base na experiência de quem já faz isso há 20 anos”.
O centro de treinamento para aplicar essas instruções foi concluído em Aramar no ano passado. A parte prática dessa qualificação terá aulas realizadas no complexo do reator, onde será testado o equipamento. A intenção é que o tripulante chegue a bordo com conhecimentos significativos, disse Pagano Júnior. “Aqui, ele será supervisionado, estará em um ambiente mais controlado para aprender a operar na prática o reator de verdade”.
As dificuldades impostas aos tripulantes fará com que seja necessário um rodízio entre eles. Cada vez que o submarino retornar, um outro grupo embarcará em uma nova missão. “É para que se possa usufruir daquele submarino nuclear o máximo possível. É uma ferramenta muito cara. É prejuízo ficar parada”
Contra-almirante Pagano Junior explicou como a tripulação é selecionada