Defesa/Contrapartidas: CIP diz que há "nevoeiro" no cumprimento dos contratos
Lisboa, 30 Jun (Lusa) - O presidente da Confederação da Indústria Portuguesa (CIP) diz que as empresas nacionais estão sem receber encomendas prometidas, no valor de 3.000 milhões de euros, resultantes dos contratos de contrapartidas militares, estranhando que haja muito "nevoeiro" neste processo.
"Parece que os contratos de contrapartidas, que poderiam envolver 3.000 milhões de euros para a indústria nacional, estão envolvidos em nevoeiro propositadamente", declarou Francisco Vanzeller à agência Lusa, lamentando depois que se trate de um problema que "vem já dos anteriores governos [PSD/CDS-PP]".
As contrapartidas decorrem dos contratos de compra de equipamento militar e prevêem que os consórcios vencedores se comprometam a arranjar negócios para empresas portuguesas.
Segundo Francisco Vanzeller, em relação ao cumprimento dos contratos de contrapartidas, "pelo lado da indústria nacional, sabe-se que não há praticamente encomendas e que, pelo lado do Governo [actual], não há quase resposta".
"Tive uma conversa com o primeiro-ministro, José Sócrates, que me deu informações sobre a forma como poderia obter respostas em relação aos contratos de contrapartidas, mas ele próprio não conhecia as respostas. Tive também uma conversa muito agradável com o ministro da Defesa, Luís Amado, que me vai mandar elementos do processo, mas que também me disse não saber muito", referiu.
Francisco Vanzeller afirmou ainda ter enviado duas cartas "urgentes" sobre o assunto das contrapartidas militares ao Ministério da Economia e da Inovação, mas não recebeu qualquer resposta.
"Não gosto de levantar suspeitas, mas, quando está em jogo tanto dinheiro, tanto disfarce e tanta confidencialidade, somos obrigados a desconfiar. Não acredito que se esteja a roubar dinheiro. Talvez seja antes um caso de falta de atenção, ou talvez se ache que as contrapartidas não eram para cumprir logo de entrada", admitiu o presidente da CIP.
Nas queixas contra actuação das entidades oficiais portuguesas no processo de contrapartidas, o ex-dirigente socialista e presidente da Iberomoldes da Marinha Grande, Henrique Neto, foi mais longe do que o presidente da CIP nas suas declarações à agência Lusa e disse mesmo suspeitar de "interesses partidários".
"Se os governos anteriores (PSD/CDS-PP) negociaram mal os acordos de contrapartidas militares, é muito estranho que o actual executivo (do PS) não diga isso em público, até porque na política é sempre com rapidez que se passam culpas para o passado", aponta o empresário, que levanta a hipótese de existirem "negócios menos claros" neste processo.
"Pode haver negócios menos claros no processo das contrapartidas militares. Não devo evitar as palavras: existem suspeitas que há interesses partidários metidos nisto. Não é normal que dois partidos se sucedam no poder e tenham comportamentos exactamente iguais numa questão em que o interesse nacional está claramente expresso", afirma Henrique Neto.
No entanto, O presidente da Comissão Permanente de Contrapartidas (CPC), Rui Neves, afirma que o contrato das contrapartidas pela aquisição dos submarinos (no valor de 1,2 mil milhões de euros) está cumprido a 40 por cento, mas considera "grave" que o dos helicópteros (que ronda os 403 milhões de euros) só tenha cinco por cento de cumprimento.
"O nosso patamar mínimo para o cumprimento das contrapartidas é cem por cento. A lei é muito clara: se não houver cumprimento total num determinado projecto, pode haver compensação em outro projecto [em que se ultrapassem os objectivos], mas, no final, tem de se atingir cem por cento", declarou Rui Neves, que em Maio de 2005, sucedeu ao ex- dirigente do CDS-PP Pedro Brandão Rodrigues na presidência da CPC.
Segundo Rui Neves, caso os consórcios que venderam equipamento militar a Portugal não cumpram os seus contratos de contrapartidas, "serão executadas as garantias", após a conclusão dos prazos para o cumprimento desses contratos, que é de cerca de quatro anos no caso dos helicópteros EH 101 e de seis anos e meio no caso dos submarinos.
No entanto, o presidente da CPC entende que a execução das garantias deve apenas constituir a solução de último recurso por parte do Estado Português.
"Não sei se o país ganha com a execução das garantias [dos contratos], que apenas deve existir como solução de última instância. A execução das garantias é sempre mais pobre do que o cumprimento dos contratos [por parte dos consórcios vendedores], porque o maior interesse é que as empresas nacionais obtenham negócios, tecnologias e exportações", declarou este responsável, cujo cargo é tutelado pelos ministros da Defesa, Luís Amado, e da Economia, Manuel Pinho.
Rui Neves apontou ainda como dificuldade no cumprimento dos contrapartidas o facto de colocarem em negociação pequenas e médias empresas nacionais com grandes consórcios internacionais.
Mas Francisco Vanzeller recusa este argumento de que os contratos de contrapartidas não são cumpridos por alegada fraqueza da indústria nacional perante grandes multinacionais estrangeiras fornecedoras de equipamento militar.
"Isso são desculpas, porque a Efacec tem problemas e não é uma pequena empresa nacional. A Autosil não é também uma pequena empresa, mas as encomendas prometidas [baterias] foram parar a uma pequena firma da Grécia", reage o presidente da CIP.
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