Da Itália ao Japão: Um triunfo italiano durante a II GM

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André

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Da Itália ao Japão: Um triunfo italiano durante a II GM
« em: Agosto 09, 2007, 10:16:46 pm »
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O Alto Comando italiano, suspeitava que os aliados tinham quebrado seus códigos de rádio internacionais e, como o rádio era o mais vital meio para se comunicar com seus parceiros do Eixo no Extremo Oriente; os italianos teriam que entregar novos livros de códigos para os japoneses, para assegurar a segurança nas comunicações. Esta foi a motivação por trás de um voo de alcance muito longo, e bastante esquecido nas histórias do pós-guerra.

A possibilidade de efectuar uma ligação aérea estável entre Roma e Tóquio havia sido vislumbrada pela Regia Aeronautica desde o final de 1941 e, em 29 de Janeiro de 1942, um relatório escrito foi apresentado para o comando aéreo para determinar a praticabilidade da empreitada, utilizando três diferentes rotas, com os novos Fiat G.12 GAs (Grande Autonomia). Entretanto, para o primeiro voo experimental, foi escolhido um Savoia Marchetti S.75 GA [S.M.75 GA], equipado com motores Alfa Romeo 128 RC.18.



O primeiro S.75 GA (com o número de série RT MM.60537) foi entregue em 17 Março de 1942, mas foi decidido usá-lo numa missão “simbólica”, que consistia em lançar folhetos de propaganda sobre Asmara [N. do T.: com as seguintes palavras: “Italiani di Eritrea: la Patria non vi dimentica. Ritorneremo!", nas antigas colónias italianas na África Ocidental. Esta missão foi realizada no dia 7 de Maio de 1942, partindo de Guidonia (Roma) e, após uma paragem para reabastecimento em Bengazi, o avião descolou no dia 8 de Maio, às 17:30 h., para lançar os seus folhetos sobre Asmara às 03:00 de 9 de Maio e, então, pousando de volta em Roma-Ciampino às 21:30 h do dia 9.

O voo tinha durado 28 horas sem qualquer problema, confirmando a praticabilidade dos voos para o Japão. O Dr. Publio Magini foi o navegador e co-piloto daquele voo. Na época, o Dr. Magini era considerado um dos melhores pilotos italianos e era um “expert” em voo por instrumentos. Ele tinha desenvolvido um sistema de navegação estelar, ao qual chamou de “Curvas de Altitude das Estrelas”.

Infelizmente, o MM.60537 foi severamente danificado numa aterragem de emergência apenas dois dias depois. Quando do seu retorno a Guidonia, a tripulação do MM. 60537 recebeu ordens de voar para o Aeródromo de Ciampino, a apenas 19 quilómetros dali. Logo após a descolagem, todos os três motores pararam e o avião caiu. O piloto, Capitão Paradisi e o Dr. Magini escaparam dos destroços antes que o combustível incendiasse e o avião explodisse. Paradisi perdeu uma perna no desastre e o Dr. Magini sofreu um sério ferimento na perna que o incapacitou para o voo por um mês.

Em 12 de Maio, a companhia Savoia Marchetti recebeu ordens de acelerar a produção do segundo S.75 GA (MM.60539), que foi, como o seu antecessor, não-oficialmente denominado "S.75 RT" (Roma-Tóquio) e, em 24 de Maio, um terceiro S.75 RT (MM.60543) foi encomendado.

Devido a vários problemas políticos e militares, o voo foi adiado e o carregamento originalmente previsto foi sistematicamente reduzido até o avião ter que descolar sem qualquer carga a bordo. Agora, apenas o desafio e o prestígio que seria alcançado com o feito (do ponto de vista italiano) mantinham a continuidade do projecto.

Finalmente, às 5:26 h do dia 29 de Junho de 1942, o S.75 RT MM.60539 descolou de Guidonia com a seguinte tripulação: Tenente-coronel Antonio Moscatelli, Capitão Mario Curto, Capitão Dr. Publio Magini (todos eles pilotos), Segundo Tenente Ernesto Mazzotti (rádio-navegador), Primeiro-sargento Ernesto Leone (engenheiro de voo). Às 14:10 h, o S.75 aterrou em Zaporozje [N. do T.: base italiana situada na Ucrânia ocupada pelos alemães], onde o CSIR (Corpo Expedicionário Italiano na Rússia) tinha estabelecido uma rádio-base e de reabastecimento. A viagem para Zaporozje havia corrido sem incidentes e o Dr. Magini e seus companheiros da tripulação decidiram não correr o risco de iniciar a segunda parte da viagem à tarde, na esperança de evitar a intercepção. Como resultado, eles passaram a noite no aeródromo e descolaram ao anoitecer do dia seguinte, às 20:06 h do dia 30 de Junho.

Devido ao peso do combustível que carregavam, seu avião não podia atingir mais que 2.500 pés (762 m) e sua velocidade era perigosamente baixa, fazendo deles um alvo extremamente vulnerável. Acelerar o avião ameaçava superaquecer os motores e a tripulação monitorizava ansiosamente os indicadores quando a temperatura atingia níveis mais elevados.

Deve ser dito que Zaporozje estava muito próximo de Rostov, onde um selvagem combate pelo controlo da cidade estava em andamento. Holofotes soviéticos estavam em toda a parte, iluminando o céu nocturno enquanto o avião cruzava a frente de batalha. Quase imediatamente, eles foram avistados e focos de luz prenderam-se ao avião. Rastos de fogo – granadas antiaéreas soviéticas – subiram aos céus para saudar o avião, que deveria parecer-lhes um alvo fácil. Felizmente para a tripulação, os soviéticos não acertaram nenhum dos disparos no lento avião em vôo baixo. O Dr. Magini e seus colegas tripulantes tiveram de aguentar o fogo antiaéreo inimigo pelos próximos 160 km da sua jornada - Dr. Magini anota no seu jornal - "Aquilo não foi nem um pouco agradável”.

Eventualmente, os disparos cessaram e o aparelho ficou sozinho na noite escura. A sua rota levou-os ao norte do Mar Cáspio, a seguir o Mar de Aral e o Lago Balkhash. Quando começou a amanhecer, eles haviam atingido a cadeia de montanhas Altai, que separa a União Soviética da China. Voando baixo  num longo vale, eles, finalmente, encontraram-se sobre o deserto de Gobi. Por horas a fio, eles sobrevoaram a vastidão de areia desabitada e desolada que é o deserto de Gobi. Neste ponto a navegação celestial pelas “Curvas de Altitude das Estrelas” do Dr. Magini foi vital, pois eles não possuíam cartas de navegação do deserto de Gobi.

O Dr. Magini era de opinião que eles deviam ter feito todo o caminho restante directamente para o Japão, mas quando se aproximaram do território controlado pelos japoneses, estes insistiram que eles deveriam aterrar em Pao-Tow-Chen, localizado a leste de Pequim, próximo ao Rio Amarelo. Isso foi necessário devido as medidas de segurança impostas pelo Japão sobre o seu espaço aéreo, após o “Raid Doolittle”, dois meses antes. Caças patrulhavam as ilhas japonesas dia e noite, prontos para abater quaisquer aparelhos sem a insígnia japonesa nas asas.

Os italianos acabaram, na verdade, ultrapassando Pao-Tow-Chen e foram forçados a voltar para atrás. Quando fizeram isso, foram apanhados no meio do caminho por uma chuva torrencial e tiveram dificuldade para identificar sua própria posição ou mesmo encontrar a cidade. A tempestade durou o suficiente para o Dr. Magini determinar a posição do aparelho e eles estavam quase planando sob a cobertura de nuvens quando encontraram a cidade.

Às 17:20 h de 1º de Julho de 1942, após um vôo de 6.000 km em 21 horas e 14 minutos, o S.75 RT aterrou no aeródromo de Pao-Tow-Chen, na China. Soldados japoneses imediatamente se posicionaram à volta do avião logo que a tripulação desembarcou. Autoridades do Japão e dois oficiais italianos estavam esperando por eles. Os italianos eram o Capitão Roberto de Leonardis, o Adido Naval e Enrico Rossi, um intérprete.

Eles foram escoltados para o hotel local, o qual, ironicamente, era uma réplica das casas de Pompeia, (próximo de Nápoles). Para cada tripulante foram “dadas” pelo menos duas Gueixas que os banharam e lavaram os seus sujos uniformes. Enquanto esperavam pelas roupas, os italianos vestiram quimonos, o que só adicionou estranheza ao surrealismo que eles já experimentavam neste ambiente.

O Dr. Magini e seus companheiros foram obrigados a permanecer ali por um dia, esperando um guia da Força Aérea japonesa que chegaria de Tóquio. As rotas aéreas de e para a terra natal japonesa mudavam diariamente e qualquer avião no local, altitude ou curso errados corria o risco de ser derrubado dos céus. Enquanto esperavam, equipas de terra japonesas pintaram as insígnias do sol nascente nas asas e fuselagem do seu avião.

Eles finalmente descolaram em direcção a Tóquio por volta das 7:00 h da manhã do dia 3 de Julho. O guia de voo japonês, um Capitão, acompanhou-os e instruiu-os exactamente qual o curso que deveriam tomar. A sua rota conduziu-os sobre Pequim – Dairen – Seul – Yonagom - Tóquio; uma viagem de 2.700 km. Eles aterraram na base aérea de Tachikawa, próxima a Tóquio às 17:04 h do dia 3 de Julho de 1942.

Após vários dias entre cerimónias e o planeamento do voo de regresso, o avião deixou Tóquio, ainda sem qualquer carga a bordo, às 05:20 h do dia 16 de Julho de 1942, alcançando Pao-Tow-Chen às 15:40 h. Ali, as marcas japonesas foram removidas e o avião descolou com o carregamento máximo de combustível (com alguma dificuldade, devido ao pequeno comprimento da pista...), às 21:45 h GMT de 18 de Julho, aterrando em Odessa às 02:10 h GMT de 20 de Julho. Às 11:00 h do mesmo dia, o S.75 RT descolou novamente, alcançando Guidonia às 17:50 h. Benito Mussolini, em pessoa, estava aguardando a chegada do avião.

Todo os detalhes do voo, após repetidas solicitações dos japoneses, tinham que ser mantidos em segredo, mas a notícia apareceu, cinco dias depois, nos jornais italianos e os japoneses imediatamente decidiram impedir quaisquer novos voos utilizando a rota originalmente seguida, solicitando o estudo de uma rota mais a sul. Isto causou atrasos e impediu mais progressos no planeamento do voo previsto para Agosto de 1942, usando o segundo S.75 RT MM.60543, que teve que ser cancelado.

Futuros voos iriam utilizar o novo Fiat G.12 RT, mas as dificuldades criadas pelos japoneses a respeito da rota a sul (de Roma para a Ilha de Rodes, então prosseguindo sem escalas para o sul da Bulgária, norte da Turquia, Mar Cáspio, nordeste do Irão, Afeganistão, voando ao sul da Cadeia dos Himalaias, sobre o Golfo de Bengala, atingindo, finalmente, Rangum) e com os preparativos para garantir suporte rádio e navegacional adequados (especialmente em Rangum), provocaram atrasos até 17 de Novembro de 1942, quando o Governo italiano (e a Regia Aeronautica), decidiu por fim ao projecto.

ComandoSupremo.com


Pergunto aos caros foristas se conheciam este pequeno momento brilhante para a Itália durante a Segunda Guerra Mundial. :?:
« Última modificação: Agosto 17, 2007, 06:39:55 pm por André »