Quando estão em perigo vidas humanas a ordem é "para matar"
A percentagem de erro de um atirador da polícia "é de zero por cento" e na maioria dos cenários em que estão em perigo vidas humanas a ordem é "para matar", revelou um instrutor de tiro.
"A percentagem de erro de um atirador furtivo é zero por cento. A sua intenção é atirar para matar. Na maioria dos cenários não há alternativa, nomeadamente quando há reféns e a sua vida está em perigo", afirmou à Lusa o instrutor de uma força policial.
Contudo, segundo a mesma fonte, "há situações, nomeadamente em casos de suicídio, que essa ordem pode ser alterada e aí tenta-se tirar a arma à pessoa".
O assalto a uma dependência do BES de Campolide, em Lisboa, culminou quinta-feira com a libertação de dois reféns, sem ferimentos, e com um assaltante morto e outro ferido gravemente, que se encontra no hospital de S. José.
Os sniper fazem parte do Grupo de Operações Especiais (GOE) da PSP, mas funcionam como uma equipa à parte, não tendo o mesmo tipo de treino.
Num cenário em que são feitos reféns, a "análise de risco é complicadíssima e tem em conta uma série de factores: o local de actuação (uma habitação, um telhado, etc.), o número de alvos e de reféns, as armas, número de efectivos policiais, os equipamento e a facilidade de os manobrar", explicou a fonte.
A primeira fase da intervenção policial é sempre a negociação, feita por uma equipa que transmite as informações ao posto de comando.
"O negociador trabalha directamente com o alvo e transmite todas as informações ao posto de comando, que as analisa. Depois alguém decide o que fazer, mas sem comunicar ao negociador", explicou.
"Quando é tomada a decisão de abater o alvo, o negociador não tem conhecimento disso", acrescentou.
Outra fonte policial, que classificou o negociador como "a chave essencial em todo o processo", disse à Lusa que a ordem para os sniper dispararem "é dada após os negociadores fazerem uma avaliação de toda a situação e quando não conseguem resolver o problema pela via do diálogo".
Quando o diálogo falha, cabe ao posto de comando tomar decisões e dar a ordem ao atirador para actuar quando "tiver o quadro limpo".
"É o atirador que decide o momento de disparar. O sniper só actua quando não há qualquer risco para o refém. Através da mira telescópica, este consegue ver tudo ao pormenor, inclusive onde está o dedo do sequestrador no gatilho da arma", referiram.
"Quando o tiro é frontal, o alvo de um sniper é a cavidade crânio-orbital, um triângulo que vai da linha das sobrancelhas à base do nariz. O projéctil atravessa o crânio e o cérebro e acerta no tronco raquidiano, desligando completamente a máquina humana. Este é o tiro ideal", sublinhou o instrutor de tiro.
Numa análise ao ocorrido na dependência do BES, o instrutor disse que "o assaltante que estava à porta do banco a agarrar a mulher [refém] morreu instantaneamente com o tiro do sniper".
A PSP disse hoje que pela primeira vez foi dada ordem para disparar com o objectivo de "neutralizar" os dois sequestradores.
Nesta situação, segundo a mesma fonte, "o risco para os reféns não foi muito grande porque a operação estava programada e era tranquila. Tiveram tempo de montar uma equipa de assalto e programar o tiro".
O treino diário dos sniper, na Quinta das Águas Livres, em Belas, consiste em 10 por cento de exercício físico e 90 por cento de tiro, explicou fonte policial. Este tipo de polícias apenas existe em Lisboa e quando é necessário intervirem numa operação em outro local do país são deslocados de helicóptero.
"Um bom atirador deve ter capacidade para gerir a situação de risco, sentimentos, destrezas motoras finas e conflitos interiores", considerou o instrutor, adiantando que "há pessoas para quem atirar é fácil, simples, intuitivo, uma vez que têm aptidão natural para gerir conflitos".
Um bom atirador é alguém que "tem muita calma e sangue frio para não deixar o cérebro parar". Junta-se a estas características um grande à vontade com o manuseamento de armas e a confiança adquirida nos intensos treinos diários, sublinhou.
JN