A propósito das constantes discussões no Fórum sobre reestruturações no exército:
"Uma outra concepção da guerra
José Manuel Barroso
Jornalista
O exército americano, num prazo de uma dezena de anos, vai "desaparecer", se comparado com o actual (e os EUA já têm um avanço militar impressionante sobre os restantes países do mundo).
Até os nomes das unidades militares actuais serão outros. Dentro em pouco, os tradicionais batalhões, brigadas ou divisões passarão à História, "como passaram as legiões tomanas ou os terços espanhóis" (para usar as palavras do prof. António José Telo, na palestra introdutória ao Seminário sobre Portugal e a Transformação na Segurança e Defesa, realizado há tempos na Academia Militar).
As "forças objectivo", em preparação nos EUA, depois de instaladas terão capacidade para destruir os exércitos actuais, como os exércitos actuais a teriam em relação aos exércitos napoleónicos. Entramos no que parecia o domínio da ficção. Melhor: a ficção vai-se tornando realidade.
E a realidade será esta: unidades SCF (Sistema de Combate Futuro ou FCS, na designação em inglês) com homens e equipamento capazes de caberem num avião C-130; veículos de combate de menor envergadura e peso, mas maior resistência, mobilidade, poder e qualidade de fogo; oito tipos de veículos blindados tripulados e sete tipos de veículos não tripulados (VNT), dos quais dois deles para missões de combate com armas modelares e outros para recolha de informação e definição de alvos; os veículos de combate tripulados podem transportar pequenos VNT, a utilizar na acção (desde os VNT de dez toneladas e de combate autónomo aos de um quilograma de peso, com inteligência artificial, que pode iluminar alvos com o auxílio de sensores, guiando assim os mísseis, e aos três tipos de veículos aéreos).
Os VNT, por exemplo (anfíbios, aéreos ou terrestres, já na fase de protótipos), podem ser tão pequenos que podem penetrar num edifício, no caso das unidades de infantaria, através de uma janela ou de uma frincha.
Munições inteligentes programáveis de nova geração (mesmo nas armas individuais) produzirão o mesmo efeito do que utilizando dez vezes das actuais. As companhias e os batalhões serão substituídos por Unidades de Acção (UA), sendo a sua composição - da mínima à máxima - variável, praticamente infinitas, segundo as circunstâncias e as necessidades.
Mísseis, artilharia, morteiros e helicópteros serão todos equipados com armas inteligentes programáveis. A logística será quase toda realizada com VNT e robotizada.
A artilharia, por exemplo, pode ter alcances superiores a 50 quilómetros. O apoio de fogos será realizado por mísseis que podem ser disparados na vertical, "a partir de contentores, veículos, robots ou meios aéreos, tripulados ou não, que formam uma rede no campo de batalha" (e continuo a usar as informações do texto de António José Telo).
Um veículo de combate de infantaria, por exemplo, terá apenas cinco militares (para uma dezena, agora), mas transportará também dois a três VNT terrestres ou aéreos.
As futuras forças de combate serão todas aerotransportáveis, infocentradas e digitalizadas num escalão espantosamente superior às que já actualmente o são, podem combater coordenadas num espaço descontínuo.
Com forças deste tipo, uma acção como a da guerra do Iraque (refiro-me ao período da guerra de invasão) poderia ser realizada, com maior eficácia ainda, com menos de cem mil homens - ou seja, um terço dos empenhados em 2003.
O avanço das novas forças armadas americanas será, dentro de uma dúzia de anos, tão grande, em relação às actuais forças militares dos diversos países, que aqueles que não dispuserem (a Europa, por exemplo) destas forças SCF não poderão realizar acções combinadas com as dos EUA. Os planos de operações para as novas forças ou as actuais serão também totalmente diferentes.
António José Telo pergunta também (e caímos no "nosso" cerne da questão): o que é tem Portugal a ver com isto? Esta questão levanta-se, hoje, não apenas a Portugal como a todos os países da União Europeia e, sobretudo, aos que pertencem também à NATO.
A questão é se a Europa é capaz de (ou deseja) ser o tal pilar europeu da Aliança, neste tempo de revolução na organização e no conceito de forças militares.
Na medida das suas possibilidades, defende Telo, Portugal deve apanhar o barco "quando ele ainda está no porto", para não correr o risco de o perder. Isto é: preparar com coragem a mudança revolucionária, na base de uma definição clara das suas alianças e enquadrado nelas. Ser-nos-á possível, como muito bem pergunta Telo, transformar a Defesa?"
http://dn.sapo.pt/2006/08/01/opiniao/um ... uerra.html