AS GUERRAS NAPOLEÓNICAS NA PENÍNSULA IBÉRICA

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quintanova

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« Responder #60 em: Março 13, 2008, 04:42:57 pm »
O autor David Martelo é que editou um livro interessante, Os Caçadores - Os Galos de Combate do Exército de Wellington (Ed. Tribuna) que traça um historial da infantaria ligeira.
Na minha opinião, haveria muito mais a dizer e talvez desse um livro bem mais elaborado, mas mais vale um livro que nada.

David Martelo aponta, e muito bem, que desde sempre houve infantaria ligeira, com, entre outros, o exemplo do Vélites romanos que tomavam, muito à semelhança das guerras napoleónicas, a dianteira da linha e 'escaramuçavam' o inimigo, flagelando a linha adversária.

Em 1800, mais do que isso, e com o fumo das armas disparadas, criavam um 'screen' de fumo que impedia o inimigo de perceber as movimentações.
Alguns testemunhos indicam que o soldado de infantaria ligeira, no calor do combate, não conseguia ver o colega do lado (acho que os ingleses combatiam com os chamados binómios).

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Benny

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« Responder #61 em: Março 13, 2008, 05:17:02 pm »
Muito obrigado. O meu pouco conhecimento sobre a infantaria ligeira está limitado à era Napoleónica e à Guerra de Independência Norte-Americana.

Sobre este tema posso recomendar este livro de um conhecido e brilhante autor:

http://www.amazon.com/Rifles-Mark-Urban/dp/0571216811


Cumpts,

Benny
 

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quintanova

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« Responder #62 em: Março 13, 2008, 06:39:55 pm »
Parece interessante, mas fala da experiência norte-americana da Guerra da Independência? Nessa guerra, os ingleses viram-se na ponta errada do poderio da infantaria ligeira, e é daí que os Rifles se desenvolvem para chegar às Guerras Napoleónicas.

Confesso que anda um pouco farto das fontes inglesas, normalmente condescendentes e paternalistas.

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quintanova

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Luz Soriano
« Responder #63 em: Março 13, 2008, 06:44:21 pm »
A quem interessar e não souber,

Na Biblioteca Nacional Digital pode-se encontrar digitalizado a seguinte obra, uma das fundamentais, acerca da Guerra Peninsular:

Luz Soriano, História da Guerra Civil e do estabelecimento do governo parlamentar em Portugal comprehendendo a história diplomática militar e política d'este reino desde 1777 até 1834, Lisboa, 1866-1890

http://purl.pt/12103

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Lancero

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« Responder #64 em: Março 14, 2008, 03:11:00 pm »
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Brasil/Corte: Jaime Gama considera guerra peninsular base de reflexão para segurança e defesa actuais  



    Lisboa, 14 de Mar (Lusa) - A Guerra Peninsular é uma referência para a actual discussão nacional sobre a defesa e a segurança em Portugal, afirmou hoje o presidente da Assembleia da República, Jaime Gama.  

 

     "￾ um período da nossa história, particularmente sensível, enquanto centro de reflexão para aquilo que deve ser um verdadeiro conceito de segurança e defesa para o nosso país, que ainda vale na actualidade", afirmou Jaime Gama, hoje no Parlamento, na sessão de abertura da conferência "Guerra Peninsular, Soberanias Atlƒnticas, Novas Instituições".    

 

    A Guerra Peninsular ocorreu no início do séc. XIX, na sequência das invasões francesas na Península Ibérica ordenadas por Napoleão Bonaparte.

 

 

    Na sessão de abertura desta conferência, que se insere nas comemorações da chegada da família real e da Corte portuguesa ao Brasil, esteve presente o presidente da Cƒmara de Deputados daquele país, Arlindo Chinaglia, que acentuou a importƒncia desta deslocação na evolução do Brasil.  

 

    "A sua importƒncia para o Brasil é tanta que não se distingue da emancipação política do país, com consequências importantes no seu desenvolvimento económico, social e político", declarou.  

 

    Para o político brasileiro, "foi inédita a atitude de um soberano europeu rumo a uma distante colónia para instalar a sua corte. O feito permitiu a realização de grande significado para o brasil".    

 

    A reflexão sobre este período, segundo afirmou Jaime Gama, é uma forma de saber "se mais desejamos viver na época de hoje ou ter vivido nesta época gloriosa sobre a qual agora nos debruçamos".  

 

    Na conferência "Guerra Peninsular, Soberanias Atlƒnticas, Novas Instituições" estão previstos vários debates com personalidades académicas portuguesas e brasileiras, discutindo as implicações e as consequências globais da revolução francesa e da independência dos Estados Unidos.  

 

    Esta iniciativa foi organizada conjuntamente pela Assembleia da República de Portugal e pela Cƒmara de Deputados do Brasil, no ƒmbito das comemorações do 200 anos da chegada da Corte portuguesa e de D. João ao Brasil.  

 

    Sobre a mesma temática, terá lugar uma conferência nos próximos dias 5 e 6 de Maio, em Brasília, com a participação de deputados portugueses e brasileiros.    
"Portugal civilizou a Ásia, a África e a América. Falta civilizar a Europa"

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Lancero

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« Responder #66 em: Abril 01, 2008, 10:20:43 pm »
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Defesa: Jaime Gama participa nas cerimónias do Bicentenário da Guerra Peninsular e Construção das Linhas de Torres    

 

    Lisboa, 1 Abr (Lusa) - O Presidente da Assembleia da República, Jaime  Gama, e o presidente da Comissão Parlamentar de Defesa, Miranda Calha, participam  quarta-feira nas cerimónias comemorativas do bicentenário da Guerra Peninsular  e da Construção das Linhas de Torres, em  Torres vedras.  

 

   Após as Honras Militares, cerca das 10:30, a prestar ao Presidente da  Assembleia da República, Jaime Gama acompanha os membros da Comissão de  Defesa numa visita ao forte de São Vicente, onde será descerrada uma lápide  evocativa da efeméride.    

 

   Na cerimónia usarão da palavra o Chefe de Estado Maior do Exército,  José Luís Pinto Ramalho, o Presidente da Comissão Parlamentar de Defesa,  Miranda Calha, o Presidente da Câmara Municipal de Torres Vedras, Carlos  Manuel Soares Miguel, e o Presidente da Assembleia da República.  

 

   A Guerra Peninsular, entre 1807 e 1814, teve uma sequência de acontecimentos  que envolveram a península Ibérica e que remontam à Campanha do Rossilhão  (1793-95), quando tropas portuguesas reforçam as castelhanas, integrando  a primeira aliança liderada pela Inglaterra contra a França revolucionária.  

 

   Após a ascensão de Napoleão Bonaparte ao poder (1799), a Espanha alia-se  à França para, por meio da invasão e da divisão de Portugal entre estes,  atingir indirectamente os interesses comerciais do Reino Unido e Irlanda  do Norte (Guerra das Laranjas, 1801).  

 

    Em Agosto de 1807, enquanto Napoleão faz concentrar tropas em Baiona  para a invasão de Portugal, os representantes da França e Espanha em Lisboa  entregaram ao príncipe regente de Portugal, D. João, as suas exigências:  Portugal teria que se juntar no bloqueio continental que a França decretara  contra a Inglaterra, fechar os seus portos à navegação britânica, declarar  guerra aos ingleses, sequestrar os seus bens em Portugal, e prender todos  os ingleses residentes.  

 

   Nas Linhas de Torres, o exército anglo-português, com participação de  milícias populares, sob comando do Duque de Wellington, derrotou e explusou  do país as tropas napoleónicas.  
"Portugal civilizou a Ásia, a África e a América. Falta civilizar a Europa"

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HELLAS

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« Responder #67 em: Abril 01, 2008, 10:54:37 pm »
Citação de: "Lancero"
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Defesa: Jaime Gama participa nas cerimónias do Bicentenário da Guerra Peninsular e Construção das Linhas de Torres    

 

    Lisboa, 1 Abr (Lusa) - O Presidente da Assembleia da República, Jaime  Gama, e o presidente da Comissão Parlamentar de Defesa, Miranda Calha, participam  quarta-feira nas cerimónias comemorativas do bicentenário da Guerra Peninsular  e da Construção das Linhas de Torres, em  Torres vedras.  

 

   Após as Honras Militares, cerca das 10:30, a prestar ao Presidente da  Assembleia da República, Jaime Gama acompanha os membros da Comissão de  Defesa numa visita ao forte de São Vicente, onde será descerrada uma lápide  evocativa da efeméride.    

 

   Na cerimónia usarão da palavra o Chefe de Estado Maior do Exército,  José Luís Pinto Ramalho, o Presidente da Comissão Parlamentar de Defesa,  Miranda Calha, o Presidente da Câmara Municipal de Torres Vedras, Carlos  Manuel Soares Miguel, e o Presidente da Assembleia da República.  

 

   A Guerra Peninsular, entre 1807 e 1814, teve uma sequência de acontecimentos  que envolveram a península Ibérica e que remontam à Campanha do Rossilhão  (1793-95), quando tropas portuguesas reforçam as castelhanas, integrando  a primeira aliança liderada pela Inglaterra contra a França revolucionária.  

 

   Após a ascensão de Napoleão Bonaparte ao poder (1799), a Espanha alia-se  à França para, por meio da invasão e da divisão de Portugal entre estes,  atingir indirectamente os interesses comerciais do Reino Unido e Irlanda  do Norte (Guerra das Laranjas, 1801).  

 

    Em Agosto de 1807, enquanto Napoleão faz concentrar tropas em Baiona  para a invasão de Portugal, os representantes da França e Espanha em Lisboa  entregaram ao príncipe regente de Portugal, D. João, as suas exigências:  Portugal teria que se juntar no bloqueio continental que a França decretara  contra a Inglaterra, fechar os seus portos à navegação britânica, declarar  guerra aos ingleses, sequestrar os seus bens em Portugal, e prender todos  os ingleses residentes.  

 

   Nas Linhas de Torres, o exército anglo-português, com participação de  milícias populares, sob comando do Duque de Wellington, derrotou e explusou  do país as tropas napoleónicas.  


Quero precisar,que quem realmente queria partir Portugal porque Napoleao prometiu meia Portugal como reino foi una personagem lamentavel que ninguem queria ca, e que terminou mal tambem ca. Ele nao queria ganhar terras para Espanha, ele queria isso para ele, e vendiu Espanha a Napoleao por isso. Se Espanha valia pouco para ele, Portugal ainda menos, assim que com una personagem assim nada bom podemos esperar.Godoy nao gostamos nem voces nem nos, assim que nao façam como se os espanhois gostaramos daquelo, pois foi una vergonha.
 

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quintanova

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« Responder #68 em: Maio 12, 2008, 10:12:55 pm »
No final da Guerra Peninsular o Exército Português de Operações retornou a Portugal, tendo cá chegado em finais de Agosto de 1814 (provavelmente no dia 25). Uma testemunha, D. José Trazimundo Mascarenhas Barreto, 5.º Marquês de Fronteira, então com 12 anos de idade, deixou escrito o seguinte:

"A entrada dos corpos foi brilhantissima. Recordo-me de vêr entrar os Regimentos de Cavallaria n.º 1 e n.º 4, commandado este pelo bravo Conde de Penafiel que, apesar da sua grande fortuna e independencia, fez todas as campanhas da Guerra peninsular, os Regimentos de Infanteria n.ºs 1, 4, 13 e 16, sendo o 13 commandado pelo jovem João Carlos de Saldanha, hoje Duque de Saldanha, que apenas tinha vinte e quatro annos, e um numeroso parque de artilharia. Á frente d'esta brilhante columna vinha o General Lecor seguido d'um bello Estado Maior e de muitos officiaes superiores que, tendo feito a Guerra peninsular, mas não estando nos seus corpos, se agregaram ao Estado Maior para gozarem, e com justiça, das honras d'aquelle dia.
Foi por esta occasião que vi, pela primeira vez, o General Luiz do Rego que tanta gloria adquiriu durante a guerra. Estava na força da edade e tinha o ar marcial que sempre o caracterizou. Foi saudado pelos habitantes de Lisboa com grande enthusiasmo.
Os corpos mal tinham espaço para desfilar por secções, porque o povo era tanto que, a todos os momentos, interrompia a marcha. Vi os porta-machados do Regimento 4 e uma parte da companhia de granadeiros, levados em triumpho nos braços do povo, quando passavam pela frente do palacio onde estavam os Governadores do Reino, numa das varandas".


fonte: Memórias do Marquês de Fronteira e d'Alorna, D. José Trazimundo Mascarenhas Barreto (v. 1), Coimbra: Imprensa da Universidade, 1926 (1861) - pp.131-132.

Noutro sítio, http://www.somosportugueses.com/mch/modules/icontent/index.php?page=489, levantado pelo Prof. Mendo Castro Henriques, pode-se ler também o testemunho de Manuel José Maria da Costa e Sá, do qual destaco duas pequenas histórias deste ajuntamento, ao mesmo tempo as maiores do mundo para quem as viveu e para quem as lê hoje:

"Uma Velha de maior idade, dirige-se ao Rossio, ali pergunta por dois Filhos, que parece tinha no Regimento N.° l de Infantaria, sabe que são ambos mortos, e com uma energia verdadeiramente expressiva levanta as mãos aos Céus, “Bendito sejais DEOS. Pai meu, (diz), que mos concedeste para acabarem no seu Serviço, e no do meu Príncipe”: e mudança alguma mais se lhe observa: a outra, um Soldado que se apresenta, ao passar o Regimento N.° l de Infantaria, sem uma perna perdida em combate; "este" diz hum Indivíduo dos circunstantes, "mostra ter encarado os Inimigos", “Sim Senhor..”, responde ele, “…mas fiquei impossibilitado de o poder encarar muitas vezes, pois perdi esta perna no principio da Campanha, e fiquei inútil, e não pude colher bastante gloria, paciência”, dizia lacrimejando, “mas ainda encostado a um muro, como tenho os braços sãos, posso mostrar que sou Português” (...)".

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PereiraMarques

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« Responder #69 em: Maio 13, 2008, 04:33:11 pm »
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Jacinto Correia e a Subversão Popular de 1808

Lugar de Atouguia, Gorcinhos – Mafra, finais de Janeiro de 1808: ao final da manhã, o jornaleiro Jacinto Correia, habitante da área, de 46 anos,
casado e com filhos, dirige-se, como habitualmente, para casa com o produto do seu trabalho. No caminho, é abordado bruscamente por dois
soldados franceses que o pretendem roubar. Jacinto  Correia não teme e não cede, segue-se uma violenta luta entre os três homens. O jornaleiro saloio, homem de rija têmpera e habituado ao trabalho duro do campo, habilmente e com raiva, brande a foice roçadora que transporta e golpeia mortalmente os dois soldados que o atacaram.

Em pouco tempo, uma força militar francesa detém Jacinto Correia, que é presente a tribunal e julgado num Conselho de Guerra.

Apesar de algumas autoridades locais tentarem o perdão do jornaleiro, o Tribunal empurrou o processo para uma incriminação do réu, que impunha
punir exemplarmente.

Em determinada altura do julgamento, porque o jornaleiro apresentava uma atitude de serenidade e desafio, foi-lhe perguntado por Loison, “se o
arrependimento já tinha exercido algum efeito no seu espírito”. A resposta, tão convicta como desconcertante, “se todos os Portugueses fossem como eu, não ficaria um francês vivo”, enraiveceu a normal cólera de Loison.

(...)


 :arrow: http://www.exercito.pt/portal/exercito/ ... orreia.pdf
 

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quintanova

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« Responder #70 em: Maio 16, 2008, 10:00:21 am »
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Presidente nos 200 Anos da Ordem da Torre e Espada

    O Presidente da República presidiu, na Sede da Liga dos Combatentes, em Lisboa, à Cerimónia Comemorativa dos 200 Anos da Ordem da Torre e Espada, tendo proferido uma intervenção.

    Na ocasião, o Presidente Cavaco Silva entregou diplomas de Sócios honorários da Liga dos Combatentes aos onze condecorados com a Ordem da Torre e Espada.

    Depois de ter visitado uma Exposição alusiva à mais alta condecoração militar portuguesa, o Presidente participou na cerimónia do lançamento do Selo comemorativo dos 200 Anos da Ordem da Torre e Espada.


http://www.presidencia.pt/?idc=10&idi=16017

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PereiraMarques

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« Responder #71 em: Maio 16, 2008, 01:26:43 pm »
Ja agora uma questao de pormenor, a Banda das Tres Ordens (Cristo, Avis, Sant'iago), nao pode/deve ser considerada como a mais alta condecoracao portuguesa? Ou deve apenas ser considerada como insignia privativa (e exclusiva) do Chefe de Estado Portugues?
 

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quintanova

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« Responder #72 em: Maio 18, 2008, 06:32:02 pm »
A banda das três ordens é a mais alta ordem portuguesa, sem dúvida, mais não seja porque é detida pelo grão-mestre de todas as ordens, mas a Torre e Espada é a mais alta dada por feitos em campanha, sendo a segunda mais alta no geral e a mais alta (no sentido em que qualquer cidadão a pode receber pelo mérito e não pelo cargo).

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PereiraMarques

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« Responder #73 em: Maio 21, 2008, 12:29:46 am »
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A 1ª Invasão Francesa:
porque não se lutou desde a primeira hora?

Tenente‑Coronel PilAv João José Brandão Ferreira*
* Sócio Efectivo da Revista Militar.
 
“A teus pés, fundador da monarquia
vai ser a lusa gente desarmada!
Hoje cede à traição a forte espada
Que jamais se rendeu à valentia!”
Início do soneto declamado pelo autor,
Capitão de Cavalaria Luís Paulino de Oliveira Pinto
da França, junto ao túmulo de D. Afonso Henriques,
na Igreja de Santa Cruz de Coimbra, em 1807,
após a primeira Invasão Francesa.
 
As invasões francesas foram um facto histórico maior, na história de Portugal, do qual deixámos de guardar memória e nem sequer temos como povo, nem sequer a nível das elites, verdadeira consciência das consequências que tais invasões tiveram e que se repercutem até aos dias de hoje. Sim, até aos dias de hoje!
 
As consequências não foram “apenas” materiais e sociais, foram doutri­nárias e sobretudo políticas.
 
Na parte social, as perdas humanas foram enormes e nunca ao certo contabilizadas. Estima‑se que cerca de 10% da população tenha perecido não só pela acção inimiga como também pela doença, pela fome e pelo frio. Seriam cerca de 300 000 compatriotas nossos, um número inimaginável nos dias de hoje, mesmo tendo em conta que hoje somos quatro vezes mais …
 
No mais o país ficou arrasado: a agricultura e a pecuária destruídas; os campos talados; os monumentos roubados; igrejas profanadas; cidades, vilas e aldeias incendiadas; território ermado; pontes e outras “obras de arte”, destruídas; população esbulhada e deslocada (estima‑se que atrás das Linhas de Torres se aglomeraram cerca de 600 000 pessoas!), todas as actividades produtivas desarticuladas.
 
No campo doutrinário, inoculou‑se a nação com ideias estranhas à sua matriz portuguesa, não se conseguindo ou querido, disseminá‑las de um modo progressivo e adequado. A imposição de tais ideias, a maioria oriundas da revolução francesa, dividiu a família real, a corte, as forças armadas e toda a nação, dando origem a divisões políticas profundas que ainda se entre­chocam nos dias de hoje. A consequência mais profunda desta divisão política foi uma guerra civil intermitente que lavrou durante cerca de 100 anos e só terminou, não completamente, porém, com a Constituição de 1933.
 
Pelo caminho ficaram dezenas de assuntos da maior importância por arrumar. Não tenho esperança que venham a ser arrumados.
 
Vamos então tentar perceber como Portugal foi abrasado pela fúria Napoleónica.
 
 
“No conjunto presente enquanto as coisas não tomam jeito, a maior política será o maior disfarce e a melhor negociação será a de ter boas tropas e bons navios.”
José da Cunha Brochado, carta de 28 de Novembro
de 1700 a El Rei D. Pedro II
 
Os poderes em Portugal tinham toda a obrigação de estar mais que avisados dos perigos que ameaçavam o País, tendo em atenção os graves eventos que ocorriam na Europa e no Continente Americano e, em particular, por via das Inconfidências Brasileiras, da Campanha do Roussilhão e da infeliz Campanha de 1801 desenvolvida contra nós por uma coligação franco‑espanhola em que perdemos Olivença, ilegalmente ocupada, desde então, pela Espanha.
 
Lamento incomodar as consciências dos leitores sobre este ponto, mas não posso deixar de o enfatizar.
 
E, ainda, porque se deveria ter levado a sério a ameaça de Napoleão quando ao comentar a actuação da esquadra portuguesa, no Mediterrâneo ao lado da Inglesa, afirmou: “Virá o tempo que a Nação Portuguesa chorará com lágrimas de sangue a ofensa que praticou à República Francesa”.
 
Mas em vez de tirar as ilações naturais e preparar o país para um conflito mais do que certo, reforçando o Poder Nacional de todas as maneiras possíveis e preparando uma linha de actuação politica e as estratégias económica, militar, diplomática, financeira, psicológica, etc., que a sustentasse, optou‑se por se tergiversar e adiar constantemente no caminho a seguir, entregando à Providência Divina a prevenção das desgraças. Não me parece até, que os actuais habitantes deste cantinho ocidental da Europa, tenham aprendido muito com os seus antepassados …
 
A Revolução Francesa pela dinâmica que criou, tornou a França exportadora de ideologia por atacado. Com a subida ao Poder de Napoleão, aquele país tornou‑se imperialista e dispôs‑se nada mais, nada menos, do que a subjugar toda a Europa e, naturalmente, todas as suas dependências ultramarinas.
 
Contra a República Francesa, que tinha transformado cada cidadão num soldado e cada soldado num cidadão, levantaram‑se diversas coligações, das principais potências europeias habilmente manipuladas pela Inglaterra que, defendida pelo Canal da Mancha evitava comprometer forças suas em solo europeu, desenvolvendo toda a sua campanha no mar. As coligações foram sendo sucessivamente derrotadas pelo grande cabo‑de‑guerra corso, numa série de brilhantes batalhas. No mar, no entanto, a sorte era‑lhe adversa.
 
A hora de Portugal chegou, quando Napoleão, na sequência da vitória de Iena, em Novembro de 1806, decretou em Berlim o bloqueio continental, com o que pretendia impedir todo o comércio e comunicação com a Grã‑Bretanha. Em seguida, apeou a monarquia espanhola colocando um irmão seu no trono de Madrid.
 
Pela Paz de Tilsit, após a vitória de Friedland, que selava a derrota da Rússia, da Áustria e da Prússia, o auto proclamado imperador dos franceses, fez um ultimatum ao governo de Lisboa (e a outros países) segundo o qual teríamos que declarar guerra à Inglaterra e fechar‑lhes todos os portos. E se não o fizéssemos até 1 de Setembro de 1807, o país seria invadido. Estávamos em Julho desse ano. E não contente com isso ainda mandou um “aviso”, a 14 de Agosto, que obrigava Portugal a “oferecer voluntariamente” uma elevada quantia em dinheiro e quatro mil soldados.
 
Nestas circunstâncias Portugal não tinha grandes escolhas (e já devia saber disso de guerras anteriores!...); ou declarava a neutralidade ou escolhia um dos lados da contenda. Em qualquer dos casos só um milagre evitaria a guerra.
 
A neutralidade seria o que melhor conviria aos interesses portugueses e por isso ela foi tentada. Mas era irrealista, dado que não é neutral quem quer, mas sim quem tem Poder para o fazer. Ora Portugal não tinha na altura poder suficiente para se interpor entre as duas super potências da época. Declarar‑se ao lado da Inglaterra resultaria numa invasão franco espanhola da Metrópole; mas pôr‑se ao lado dos poderes continentais implicaria a perda de todo o Ultramar, de que dependia a sua existência.
 
E isso não garantia que a Inglaterra não viesse a desembarcar forças suas na Península, trazendo a guerra à Metrópole.
 
Por isso parecia lógico que a situação menos má fosse declarar em altura própria, a actualidade da Aliança Inglesa e preparar o país para as consequências possíveis. Nada disto se fez. A Corte e o Conselho de Estado estavam divididos, os embaixadores inglês e francês moviam as suas influências no seu seio e o próprio governo inglês na insidiosa actuação, por vezes pérfida, em que modela a sua diplomacia, nunca foi também claro no apoio que estaria disposto a facultar‑nos e quando. O Primeiro‑Ministro William Pitt, chegou até a responder a um pedido nosso, esta frase sugestiva: “O governo de S. Majestade só ajuda os governos que, em primeiro lugar, se queiram ajudar a si próprios!”
 
Até ao fim tentou‑se tapar o Sol com a peneira e o desespero fez até com que fossem tomadas algumas atitudes de vergonhosa subserviência e apaziguamento, sobretudo relativamente a Paris.
 
Foi no meio deste ambiente que surgiu a ideia de pôr a família real portuguesa a salvo no Brasil, privando assim Napoleão de deitar mão ao Poder Político português, gorando os seus projectos de domínio de Portugal. Esta ideia teve o apoio, senão mesmo a sua origem, do governo inglês. Pouco se fez, sem embargo, para a tornar viável.
 
Napoleão soube, em 9 de Outubro de 1807, que o governo português recusava o ultimatum e ordenou a invasão.
 
Por um golpe de sorte a Corte em Lisboa, soube através de um comerciante português, que tinha passado por Bayonne, da existência do Exército Francês aí estacionado, que se destinava à invasão de Portugal. Mais tarde a informação foi confirmada pelo nosso ministro na capital espanhola.
 
Tolhidos por uma paralisia incompreensível pouco se ia fazendo para lidar com a situação e só se soube que a invasão se tinha dado quanto Junot estava em Abrantes.
 
 
“É necessário estarmos apercebidos para nos defen­dermos de quem quiser ofender, porque a presteza aproveita às vezes mais que a força nas coisas da guerra. Não descansem os amigos da paz, na que agora gozam, se a querem perpetuar porque os contrários dela, se a virem mansa, levá‑la‑ão nas unhas”.
Padre Fernando Oliveira (estratega do Sec XVI)
 
Entretanto, em Lisboa reinava a confusão e o pânico. A Corte dispunha apenas de escassos 15 dias para rejeitar ou aceitar as exigências resultantes de Tilsit.
 
Logo no dia 18 de Agosto reuniu‑se o Conselho de Estado, tendo apenas um dos conselheiros, D. Rodrigo de Sousa Coutinho, advogado que se “fizesse guerra à França e Espanha … e (quando Portugal) não fosse feliz nas armas passasse a Família Real para o Brasil”; e o conselheiro Thomaz Villanova Portugal, insistiu na saída imediata “para o Brasil do Príncipe da Beira, com o título de Condestável e com tropa, acompanhado das infantas e de dois generais …”.
 
Os restantes conselheiros inclinaram‑se para que Portugal “se unisse à causa do Continente e fechasse os portos”.1
 
A 30 de Agosto nova reunião que aprovou a ida do Infante D. Pedro, para o Brasil à excepção de Sousa Coutinho que continuou a “sustentar que se devia fazer a guerra e na retirada, sair toda a Família Real para o Brasil”.
 
Esta decisão espoletou a preparação de quatro naus destinadas àquela tarefa, no Arsenal de Lisboa. A nau destinada a transportar o herdeiro do trono era a “Afonso de Albuquerque”, navio antigo mas considerado ainda em boas condições.
 
Logo que esta esquadra ficou pronta o Príncipe Regente decidiu informar os governos da França, Espanha e Inglaterra da decisão do Conselho de Estado. A reacção francesa consubstanciava uma declaração de guerra; a da Espanha mantinha uma contínua ameaça e a da Inglaterra limitava‑se a dar conselhos, o mais importante dos quais contemplava a saída imediata para o Rio de Janeiro de toda a Família Real.2 Durante o mês de Outubro e face às ameaças francesas, discutiu‑se na Corte qual das duas opções seria preferível: apenas a ida do Príncipe Real se de toda a Família, para a segurança das terras brasileiras. Mas nada se decidiu!
 
Em Novembro a confusão aumentou, com as perturbadoras notícias chegadas de Espanha e com o exército invasor já em movimento. A Corte ainda tentou acalmar Napoleão com a oferta de uma espada de oiro guarnecida de diamantes e a promessa de se cumprirem os seus desejos. Mas era tarde demais.
 
Por este tempo (11 de Novembro) arribou ao Tejo uma esquadra russa vinda da Turquia, constituída por nove navios que ninguém duvidou ser consequência do acordado em Tilsit entre a França e a Rússia. O Almirante russo insistiu em vários propósitos que eram contrários aos tratados em vigor, mas tudo se lhe consentiu. E um oficial russo chegou mesmo a declarar com o maior desembaraço, que se o Príncipe os não deixasse entrar (no Tejo) dentro estava quem lhe abriria a porta …”3. Por aqui se pode ver quão longe teria ido a traição entre os portugueses. Estranhamente a esquadra manteve‑se apenas espectadora durante todo o desenrolar dos eventos.
 
A 14 de Novembro uma esquadra inglesa de cinco navios comandada pelo Almirante Sidney Smith postou‑se ao largo da Foz do Tejo ficando a bloquear a costa portuguesa. Uma nova fragata britânica chegou entretanto, entrando no Tejo com a bandeira de parlamentário para levar instruções ao embaixador inglês, Lord Strangford. Este deslocou‑se a bordo da força inglesa, tendo regressado a 21 de Novembro à capital, com um exemplar do jornal “Monitor” do dia 11 de Novembro, o qual continha o decreto imperial datado de 27 de Outubro de 1807, pelo qual Napoleão decidira que “a Casa de Bragança deixara de reinar em Portugal”!
 
O Conselho de Estado votou então pela saída imediata de toda a Família Real para o Brasil, deitando mão a todos os navios de guerra e mercantes surtos no Tejo e que fosse possível aparelhar.
 
A 24 de Novembro o governo português deu conta finalmente que Junot estava em Abrantes, quando ainda o julgava em Salamanca. A invasão tinha avançado a 19 de Novembro, entre Segura e Castelo Branco. Em simultâneo um exército espanhol comandado pelo General Taranco, ocupava o norte do País. Os dias seguintes foram de desvairamento na Corte.
 
E em vez de embarque ordeiro a ânsia da fuga de todos os filhos de algo do Reino resultou numa confusão indescritível, levando a que se perdessem muitos haveres, se preparassem mal os navios e os sobrecarregassem com todo o tipo de carga e passageiro em demasia. A Família Real embarcou a 27 e com ela uma multidão estimada entre 10 a 15 000 pessoas, com todas as riquezas que puderam transportar.
 
Devido ao mau tempo (factor que deveria também ter sido equacionado com antecedência), a esquadra de cerca de 30 a 40 navios, comandada pelo Almirante D. Manuel da Cunha Sottomayor, só conseguiu largar o Tejo a 29, sendo comboiados por quatro navios de guerra ingleses. Esse foi o dia em que as tropas avançadas do Exército francês, destroçadas e maltrapilhas, conseguiram chegar a Lisboa. Junot no seu desespero ainda avistou os navios ao longe…
 
Todos os navios à excepção de um conseguiram atingir o Brasil numa viagem de dois meses, muito penosa pelas terríveis condições a bordo. A chegada ao Rio de Janeiro só se deu a 7 de Março de 1808. O Príncipe Regente deixou em Lisboa uma junta governativa para receber Junot e indicações para que não se molestasse os franceses, para evitar represálias.
 
Porém uma delegação da maçonaria portuguesa tinha‑se adiantado e ido saudar em Sacavém, os franceses como libertadores …
Tinha começado um longo calvário para a Nação Portuguesa.
 
 
“Todos os homens dos 15 aos 60 anos se armem, cidades, vilas e povoações que se fortifiquem.
Quem o não fizer incorre em pena de morte e as vilas que franquearem as suas portas serão arrasadas”
Real Decreto de 11/12/1808, incitando os portugueses a resistirem aos franceses
 
Afinal a resistência que com tantos receios se quis evitar brotou naturalmente do povo enquadrado pelas pequenas forças militares que restavam.
 
De facto uma das primeiras medidas de Junot foi licenciar o Exército português e escolher um corpo constituído pelas melhores tropas que não tardou a enviar para França. Constituíam‑no seis a sete mil homens (muitos dos quais desertaram) que veio a constituir a Legião portuguesa comandada pelo Marquês de Alorna e que tão valentemente se veio a bater nas campanhas do Centro da Europa. Apenas cerca de 100 destes bravos regressou a Portugal…
 
Desde cedo a atitude das tropas francesas começou a gerar incidentes e revoltas. O primeiro motim sério registou‑se quando a bandeira nacional foi arriada do Castelo de S. Jorge e substituída pela francesa!
 
Em Maio de 1808, deu‑se uma insurreição em Madrid contra os franceses. O contingente espanhol que ocupava o Porto prendeu o comandante francês e retirou para a Galiza. A 11 de Maio o General Sepúlveda, Governador das Armas de Trás‑os‑Montes revoltou‑se e instituiu uma junta a que presidiu.
 
A revolta alastrou a todo o País. As tropas francesas conseguem debelar alguns focos. Uma intervenção inglesa é então negociada pela Junta do Porto e aqueles desembarcam a 1 de Agosto frente à Figueira da Foz.
 
A 17 e a 20 de Agosto travam‑se os combates da Roliça e do Vimeiro. Vencidos os franceses estes negoceiam a rendição e pela Convenção de Sintra são autorizados a partir com armas e bagagens e o produto dos seus saques …
 
Chegou entretanto o General Beresford com a incumbência de reorganizar o Exército Português.
 
A cruenta guerra que se seguiu só terminou em 1814, com as tropas anglo‑lusas às portas de Toulouse.
 
Porque não resistimos?
 
 
“Se todos os portugueses fossem como eu não restaria um só invasor…”
Jacinto Correia
Português, fuzilado pelos franceses em 25 de Janeiro de 1808
 
 
Como se pode constatar, Junot foi expulso de Portugal ao fim de seis meses. E pode verificar‑se que dado o estado depauperado em que ele chegou à fronteira portuguesa, dois batalhões bem adestrados e comandados seriam suficientes para o esmagar na passagem das Talhadas. Mas nunca se encarou seriamente a hipótese de resistência. Porquê?
 
Fundamentalmente por uma deficiente formação e escolha das elites que nos governam.
 
Tal facto originou na altura questões que podemos sintetizar em problemas de:
 
Liderança
 
Política
 
Ideologia
 
Traição
 
Ordem Psicológica
 
Derivados do medo
 
De facto o Príncipe Regente não tinha compleição nem estatura moral, intelectual e psicológica para fazer frente a tão complexos e perigosos desafios. Numa época onde eram requeridas grandes decisões, alguma audácia, exemplo e força de vontade, o futuro Rei mostrava‑se tíbio, indeciso, infeliz, sem astúcia nem golpe de asa, mal aconselhado e sofrendo da forte personalidade da mulher de quem se viria a afastar.
 
Dos principais conselheiros e membros do governo nenhum também se destacou pelos dotes de clarividência e perseverança à excepção de D. Rodrigo de Sousa Coutinho, já mencionado.
 
Tais características nas principais figuras com peso político no reino originaram que não se concebesse atempadamente uma clara linha de actuação política com objectivos bem definidos, nem se definiram estratégias para os alcançar. Esta indefinição além de gerar confusão de actuação, dúvidas no devir colectivo, impediu que se reforçasse adequadamente o Poder Nacional, nomeadamente a economia, a diplomacia, as forças militares e o Sistema de Informações, indispensáveis aos sucessos futuros.
 
Esta falta de definição de uma política teve também origem em causas ideológicas. As sequelas doutrinárias da Revolução Francesa já tinham chegado a Portugal e eram sobretudo disseminadas pelas lojas maçónicas, nomeadamente de rito francês e escocês, em franco desenvolvimento desde o consulado de Pombal, e por vários diplomatas e militares estrangeiros durante a sua passagem por Portugal.
 
Tais ideias eram fundamentalmente subversivas da ordem política exis­tente e eram transmitidos preferencialmente à nobreza e burguesia cultas e também a alguns sectores da Igreja.
 
Estas questões ideológicas vieram a resultar, algumas em traição e todas, seguramente, contra os interesses nacionais da altura por terem dado origem a dois partidos: “o partido francês e o partido inglês”. Ora só interessava à Nação que existisse o “partido português”…
 
A questão ideológica não explica por si só o que atrás se afirma. Para tal concorreu também a corrupção de muitas consciências, em grande parte originados na acção de Marechal Lannes e do próprio Junot enquanto embai­xadores da França em Lisboa, nos períodos que antecederam a 1ª invasão.
 
Finalmente adiantam‑se causas psicológicas que afectaram a mente de muitas personalidades na Corte e fora dela o que teve a ver sobretudo com o mito criado pela invencibilidade dos exércitos napoleónicos, sobretudo quando comandados pelo próprio imperador. Isto gerou os medos mais variados (e sabe‑se como o medo é mau conselheiro) e obnubilou por certo o discernimento das decisões.
 
 
Porque deveríamos ter resistido?
 
“O peso da mochila do soldado é incomparavelmente mais leve que o peso das grilhetas do escravo”
Eisenhower
 
 
Em primeiro lugar é necessário começar por dizer que resistir a quem nos assalta a casa, neste caso a casa portuguesa, é um direito e um dever de todos os nacionais, a começar pelos mais responsáveis.
 
É uma questão de princípio.
 
Em segundo lugar por uma questão de Honra. Por muito deletérias que sejam as ideias e a moral de uma época, o conceito de honra agiganta‑se sempre bem alto pela sua excelência e altivez. Transportando isto para a Instituição Militar, um Exército só se deve render quando esgotada a sua capacidade de lutar e morrer faz parte do Dever Militar, por mais que espíritos desorientados trocem da questão ou tentem inventar guerras sem mortos.
 
Depois porque a resistência permite o reforço da coesão e o moral nacional.
 
A “alma” de uma Nação tempera‑se e reforça‑se nas agruras e nos feitos praticados em conjunto. Em 1800 os portugueses já tinham um lastro longo de uns e de outros.
 
Em seguida, porque permite aumentar a nossa capacidade de negociação em termos diplomáticos, tanto durante como após o conflito. E permite a garantia dos nossos direitos, aumentando a autoridade moral.
 
Aliás não se entende que haja receio das elites, em Portugal, em oferecer resistência seja em que época for. Muito menos naquela altura.
 
Quando o Major de Engenharia Talaya com apenas 30 homens defendeu a praça de Campo Maior durante 10 dias contra uma Divisão francesa, em 1811, nada há a temer, da resistência.
 
Quem consegue fazer as Linhas de Torres Vedras, em 1810, com 108 fortes, 151 redutos, revelins e batarias, entre a Foz do Lisandro e Alhandra e guarnecê‑las com 1 067 peças de artilharia e 68 000 homens, também teria conseguido organizar mormente a defesa em 1807, se tivesse havido vontade para isso.
 
Quem tem no seu seio um punhado de gente, como aqueles pescadores de Olhão que decidiram atravessar o Atlântico Sul num pequeno barco de pesca, inapropriado para o efeito, só para irem dar a notícia da expulsão dos franceses de Portugal, ao seu Rei, não há que temer opor resistência seja a quem for. E ao dito de Napoleão após a batalha de Wagram, afirmando não haver em toda a Europa infantaria como a portuguesa, julgo que não é preciso acrescentar mais nada, pois não pode haver mais abalizado e eloquente elogio.
 
O Exército e o povo não se bateram no início da primeira invasão francesa apenas e pela simples razão de que ninguém lhes deu ordem. E é nisto que reside a nossa maior vulnerabilidade como Estado/Nação desde que o filho de Henrique de Borgonha individualizou e alargou o Condado onde ainda hoje vivemos.
 
 
Conclusão
 
“Com quem saiba conduzi‑los, eles irão a toda a parte e combaterão quem se quiser …; marcharão sujeitando‑se às maiores fadigas, sem um murmúrio, e vivendo apenas de pão e água com um dente de alho como condimento…”
Diogo Ferrer, Oficial do Exército Britânico
(sobre os soldados portugueses, século XVIII)
 
A Geopolítica, cujos factores primordiais, são a geografia e o carácter da população, sempre condicionaram, condicionam e condicionarão o “status quo” político, estratégico e social da Nação Portuguesa.
 
Estes factores não foram avaliados devidamente pela liderança existente na época dos eventos que evocamos. Constata‑se ainda, no meio da tergiver­sação política e social ocorrida que apenas uma personalidade com peso político teve o discernimento da opção mais correcta: D. Rodrigo de Sousa Coutinho. A sua voz não fez vencimento. A saída da Família Real para o Brasil parece correcta e deve ser encarada como uma retirada estratégica e não como uma fuga.
 
Contudo, devido ao modo atrabiliário como foi preparada a saída e o muito mau estado dos navios no que concerne a fabricos, excesso de carga e falta de provisões, tornou a travessia do Atlântico numa verdadeira aventura que poderia ter degenerado numa tragédia de consequências incalculáveis.
 
Sem embargo já não parece acertado ter‑se permitido o embarque da quantidade enorme de gente que seguiu com o Rei. O Rei devia ter‑se feito acompanhar das pessoas necessárias à constituição de um governo fora da sua sede normal (Lisboa), do tesouro real e das forças militares e navais que conseguisse salvar para posterior emprego militar. A nobreza e burguesia que embarcou devia ter ficado no Reino e sofrido com o povo as agruras da crise. A retirada da Família Real, devendo estar preparada e planeada há muito mais tempo, só se devia efectuar depois de se verificar que não era possível prosseguir na defesa e tal a pusesse em perigo.
 
De facto a não resistência não evitou nenhuma das desgraças que se racionalizara em tal tomada de decisão, apenas acrescentou indignidades e emba­raços. E nem sequer parece coerente com uma das primeiras decisões do Príncipe Regente após a sua chegada ao Rio, que foi a de declarar guerra à França!
 
Mas só com a mudança de Regência em Lisboa se começou a reorganizar o Exército de Linha e se deu início à reconstrução de praças e fortalezas, com a nomeação para a pasta dos assuntos da Guerra, de D. Miguel Pereira Forjaz.
 
Caros leitores:
 
Já há muito que devíamos ter aprendido, entre muitas coisas, que é fundamental prepararmos e seleccionarmos as elites que nos governam para serem esclarecidas e patriotas; que um Exército não se improvisa de um dia para o outro; que existem realidades geopolíticas a que não nos podemos furtar e que isso implica um equilíbrio constante entre a maritimidade e a continentalidade; que tem que se ter muito cuidado com toda a sorte de ideologias que não são conformes à matriz nacional e ao estado de desenvolvimento cultural médio da população, em cada época, ou pura e simplesmente são erradas e maléficas; que as virtudes morais e cívicas têm que ser cultivadas sem desfalecimento; que as leis têm que ser adequadas às pessoas em que se aplicam; que o desenvolvimento lento e sustentado é preferível a eventuais soluções de ganho rápido e desgarrados no tempo e no espaço; que não se deve gastar mais do que o que se produz; que quanto mais dobramos a cerviz, mais mostramos o fundo das costas, etc.
 
Mas, por estranha maldição, não somos capazes de aprender.
 
Só os povos que sabem resistir ficam na História e fazem a História. Os outros serão pasto de vontades alheias e olhados com um misto de indiferença e comiseração.
 
Mas para sermos donos do nosso futuro temos que reflectir constante­mente sobre o passado para podermos aprender com os erros e acertos que nele se espelham.
 
Os portugueses já têm antiguidade mais do que suficiente como povo e uma vivência rica de acontecimentos os mais variados para poderem transformar as notícias em informações, estas em conhecimento que dão em seguida origem a sínteses de saber. Saber estar, saber fazer e saber prever.
 
Infelizmente e olhando a praxis política contemporânea e seus principais actores verifico que não se tem conseguido nada disto, a não ser a insistência nos erros.
 
Quero alertar, no entanto, que não parece terem minguado os “Napoleões” potenciais que nos rodeiam. Já, porém, dificilmente vislumbro porto seguro para onde retirar noutra emergência.
 
 
Bibliografia
 
Barata, Manuel Freire Themudo – “As Invasões Francesas e a Organização da Resistência Portuguesa”, Cadernos de História Militar nº 1, Direcção do Serviço Histórico‑Militar, Lisboa, 1989.
Direcção dos Serviços de Engenharia – “Engenharia Militar Portuguesa”, 1997.
Ferreira, João José Brandão – “A Evolução do Conceito Estratégico Ultramarino Português, da conquista de Ceuta à Conferência de Berlim”, Atena, Lisboa, 2000.
________“A Evolução do Conceito Estratégico Ultramarino Português, da Conferência de Berlim, à Descolonização”, Hugin, Lisboa, 2002.
Serrão, Joel e outros – “Dicionário da História de Portugal”, Figueirinhas, Porto.
 
Conferência
Santos, Cor Valdez dos – “A Viagem da Família Real para o Brasil”, International Congress on the Iberian Pesinsula (1780‑1840), em 24 de Julho de 1989.
 
Revistas
Barrento, António – “Invasões Francesas, Portugal na Fronteira do Poder Terrestre e no Poder Marítimo”, Revista Militar, nº 8, Agosto de 1989.
Ramos, Rui – “As Invasões Francesas na História de Portugal”, Jornal do Exército, nº 489, Outubro de 2000.
 
_____________
 
 1 Boletim do Arquivo Histórico Militar nº 46.
 2 Valdez dos Santos, “A Viagem da Família Real para o Brasil”, pag. 5.
 3 Valdez dos Santos, obra citada, pag. 5.

 
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EVOCAÇÃO DO BATALHÃO ACADÉMICO DE 1808
     
No âmbito das Comemorações do Dia da Brigada de Intervenção, a realizar na cidade de Coimbra no período de 2 a 6 de Junho e inserido nas Comemorações dos 200 Anos da Guerra Peninsular, o Exército leva a efeito um conjunto de actividades para evocar o “Batalhão Académico de 1808”, cujas acções foram preponderantes no reforço da revolta popular no centro do País e na reacção aos efeitos perniciosos da Primeira Invasão Francesa.


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