Luso -> Durante os anos 50, Portugal tentou tornar operacional uma esquadra de caças a jacto e as dificuldades foram tremendas. A artilharia era artilharia de 87.6m, peças que não eram assim tão desactualizadas, aliás os indianos tinham o mesmo tipo de artilharia.
Quanto à munição e ao armamento ligeiro, bem assim como ao caso dos chouriços, não há nada a dizer, realmente ainda está por esclarecer...
Nada do que discutamos no entanto se pode analisar sem olhar para a realidade de 1961. Em Angola tinha havido um massacre, e o direito de um país como Portugal governar um território dependia da sua capacidade de garantir a segurança e o desenvolvimento desses mesmos territórios. Logo, em comparação com Goa, Angola aparecia como um problema mil vezes maior.
Aliás, o oficial responsável pela transferência de parte do dispositivo para África foi Costa Gomes, e a decisão foi vista como adequada. A India tinha-se preparado para invadir Goa, quando invadiu os territórios adjacentes a Damão (Dadrá e Nagar-Haveli) e foi a pressão internacional que impediu os indianos de prosseguir.
Quanto ao material disponivel de «saldo».
Na verdade, os saldos existiram entre 1945 e 1955 no máximo. Lembro que os americanos chegaram por exemplo a voltar a comprar aviões Texan a operadores privados, porque já tinham sido todos vendidos.
Portugal poderia ter comprado uns tanques Sherman, mas de que serviriam contra um exército que tinha carros de combate Centurion e podia dar-se ao luxo de escolher entre utilizar Centurion, Sherman e AMX-13 recebidos havia pouco mais de dois anos ?
Os submarinos, teriam sido o mais importante navio naquele teatro de operações, mas a marinha indiana tinha acabado de comprar fragatas especializdas na luta antisubmarina, a
Talwar e a Trishul.. Um eventual submarino que poderia ser enviado, precisava de uma base, que não existia em Goa, e não existia na costa africana, e mesmo que existisse, estava demasiado longe, porque só os Daphné que foram encomendados em 1964 tinham autonomia suficiente.
Os esforços que foram feitos de última hora resultaram em nada, como foi o caso das peças de 57mm que aparentemente tinham sido distribuidas recentemente e não tinham guarnições treinadas nem munições.
Além disso, o chamado «Plano Sentinela» não parece fazer muito sentido, o que aliás foi afirmado por alguns dos comandantes de esquadrão/companhia. A única hipótese de resistência que desse os oito dias de resistência que Salazar queria, implicava a criação de redutos fortemente preparados para resistir a ataques aéreos e aos ataques da artilharia indiana.
Precisava de artilharia anti-tanque minimamente eficaz, canhões sem recuo, bazookas. Precisava ainda de defesa antiaérea eficaz. Se uma força fica completamente desmoralizada quando é atacada pelos aviões, também se moraliza muito quando vê cair um avião inimigo.
Precisava de uma ou duas baterias de defesa costeira que pudessem responder ao fogo das fragatas indianas.
A questão da moralização das tropas e da vontade dos comandos é também da maior importância. Goa vivia uma modorrenta tarde de sol na estação seca depois da monção.
Além disso, nunca os portugueses na India enfrentaram uma entidade indiana unificada. Começámos a nossa presença numa índia dividida, resistimos ao poder do império Mughal (ou Mogúl segundo alguns), depois enfrentámos o império ou federação Maratha e vivemos tempos quer de aliança quer de guerra com o império de Vijayanagar, que foi um dos nossos aliados na fase inicial. Todos estes impérios estavam em guerra entre eles e isso jogou a nosso favor.
Debatemo-nos pela primeira vez contra um nacionalismo Hindú, em grande medida inventado, como o são muitos dos nacionalismos. As nossas tropas não estavam preparadas do ponto de vista psicológico, e nenhuma tropa resiste aos factores que referi no post anterior em situação de combate.
Ainda assim, há casos de eficiência. As tropas do 1º EREC em Goa, chegaram a ficar praticamente cercadas e recuaram, passando pelas linhas que já estavam em posse de forças inimigas, de forma profissional (a acreditar nos relatos).
Muitas das tropas retiraram em boa ordem, cumprindo ordens, e com apoio de artilharia (caso de Damão).
Em Goa, o plano de retirada funcionou e as tropas chegaram onde se previa, mas quando lá chegaram era suposto iniciarem a resistência. A retirada foi vista como isso mesmo, uma retirada e tropas a retirar nunca deram alento a ninguém.
Como em todos os conflitos, houve gente capaz e gente que não se mostrou à altura. Isso parece-me evidente.
O caso de Goa também representa para aqueles que lideraram o processo de descolonização, um problema. Pois não houve processo de descolonização, a invasão foi tão ilegal quanto a invasão de Timor pela Indonésia, e era preciso justificar essa (mais essa) desistência.
Quando somos dirigidos por gente que acha que se deve negociar com os terroristas, compreendemos melhor o que se passou.
O ministro dos negócios estrangeiros recebeu uma carta de um cidadão de Goa, que está transcrita no livro «A queda da Índia Portuguesa» cuja leitura recomendo.
Infelizmente, para mim, que votei três vezes no individuo que representava a política externa portuguesa naquela altura (das quatro que ele apareceu no boletim de voto), só posso dizer que me enganei.
Hoje, estou infelizmente convencido para lá de qualquer dúvida razoável, que dei o meu voto a um patife !
Mas a História não se escreve na sequência dos acontecimentos. Só agora ela começa a ser escrita.
Compete aos que vêm depois decidir quem ficará na História como Herói, e quem ficará na História como traidor, ou pior como um reles canalha...
Só o tempo o dirá