A ‘JIHAD QUE A PIDE DESEJAVA

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A ‘JIHAD QUE A PIDE DESEJAVA
« em: Setembro 26, 2016, 10:11:37 pm »
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O lado oculto do 25 de Abril – 32 anos depois
A ‘JIHAD QUE A PIDE DESEJAVA

Serafim Lobato
(Jornalista, Licenciado em História, Mestre em estudos
Portugueses pela Universidade Aberta)

   

Os anos passam e uma nova história é escrita. Numa altura em que se comemora 32 anos sobre a ‘Revolução dos Cravos’, que pôs fim a 48 anos de uma ditadura obscurantista, continuam a descobrir-se dados novos sobre uma época recheada de acontecimentos que, por um ou outro motivo, permanecem nas brumas do esquecimento.
 
Uma das áreas menos conhecidas dos últimos tempos do ‘Estado novo’ é a da política ultramarina. Dizia-se que, ao contrário de Salazar, Marcelo Caetano, o último Presidente do concelho do ‘tempo da outra senhora’, estaria disposto a negociar a autonomias das ex-colónias com os movimentos independentistas. Dados mais recentes, porém, revelam uma outra face da política africana, em que o governo de Lisboa parecia disposto a tudo para pôr cobro às pretensões de quantos perseguiam a independência. Inclusivamente ao apoio de uma autêntica ‘guerra santa’, em que colocaria as populações muçulmanas contra ao principais movimentos que lutavam pela independência.
Claro que esta pretensão não seria divulgada aos quatros ventos, nem empunhada como bandeira pelo regime português, em Lisboa, no decorrer de uma sessão solene no Mosteiro dos Jerónimos, mas sim organizada e planeada, silenciosa e sub-repticiamente, como operação clandestina, com rótulo de ‘muito secreto’.

O braço executante seria, aliás, um governo muçulmano e o autor do projecto – a PIDE/DGS – tencionava conseguir para ele a ‘bênção’ do coronel Muammar Kadafhi, senhor da Líbia, para esta causa.
Os contornos e pressupostos desta operação estão documentados e podem ser consultados no arquivo Nacional da torre do Tombo (ANTT). A Polícia política intitulou-a de ‘OPERAÇÃO MECA’. 
Em 1973, uma delegação chefiada por um alto responsável, em nome do governo português (poderá ser um director da PIDE/DGS, mas pelos conselhos e comentários que emite e por controlar, ao mesmo tempo, uma outra operação, admito que possa mesmo ser um alto representante governamental), reuniu-se em Paris, com uma delegação congénere do sultanato de Zanzibar (que já fazia parte da Tanzânia), chefiada pelo primo direito e cunhado do Sultão, M. k. Bargash. A reunião conspirativa visava a separação do sultanato do estado tanzaniano, então liderado por Julius Nyerere, constituindo-se em entidade política autónoma, sob a liderança religiosa islâmica.

O Zanzibar seria o rastilho da ‘Jihad’ em que os
muçulmanos acabariam com a FRELIMO


Antes deste encontro, houve ‘contactos’ preparatórios efectuados por um misterioso ‘410’, possivelmente um agente ‘infiltrado, cujo rasto não foi possível determinar no dossier consultado.
‘Em 13 FEV. 73, iniciou-se a ‘OPERAÇÃO MECA’ com uma reunião em Paris no Hotel Crillon na sequência de contactos ordenados e instruídos ao ‘410’ para desenvolver junto da organização do sultão de Zanzibar’, de nome Karume. Assim começa o seu relatório o responsável presente, que nunca é nomeado explicitamente. A reunião na capital demorou dois dias.   
Este encontro teve lugar em consonância com um outro, realizado na mesma altura, no Hotel Président, em Genebra, Suiça, que envolveu, entre outros três políticos oposicionistas ao regime de Nyerere: os irmãos Óscar e Andrew Kambona e o médico James Nkombo, este a residir na Alemanha Ocidental.

Esta acção paralela, que visava também desagregar o regime de Nyerere, recebeu o nome de código de ‘Operação Girassol’. Escreveremos sobre ela noutra ocasião.

Pelo tipo de letra dos documentos e pela sua ordenação, admite-se que o responsável pelas duas operações deveria ser a mesma pessoa. Infelizmente, porém, a sua identidade permanece incógnita em ambos os relatórios, pelo menos na parte que nos foi possível consultar.
Da leitura do documento da ‘OPERAÇÃO MECA’, a parte mais interessante estava centrada no projecto que o responsável defende para jugular o nacionalismo dominante no continente africano.
 Assim, esse responsável escrevia que a delegação portuguesa estava interessada em ‘encaminhar’ a sua aproximação ao mundo árabe, através do sultão de Zanzibar, para uma ‘campanha mais vasta de Jihad (Guerra santa), em oposição do continente (nacionalista e progressista) e em defesa do Islão’, uma orientação que visava ainda ‘captar a simpatia de diversas nações árabes, nomeadamente a Líbia’.

O projecto só não avançou porque a posição do
Zanzibar era muito débil e não oferecia confiança

Do relatório, retira-se que o seu autor ‘torceu o nariz’ à capacidade dos seus interlocutores para subverter, de imediato, a ordem interna tanzaniana em Zanzibar, embora considerando que a organização do sultão ‘tem bases dispondo de bons contactos no interior e exterior do país, susceptíveis de boa utilização por nós, não só na colheita de informações mas também nos contactos com o mundo árabe, o que lhes foi incutido tendo principalmente em atenção Tripoli (coronel Cadahfi – com esta mesma grafia) e o Cairo’.

O interesse do responsável ia essencialmente para ‘a especial relevância’ de ‘conseguir a adesão do mundo árabe nesta luta contra a presença chinesa no Índico e na África Oriental’.
 E com esta ‘aliança’ com o islamismo militante, defende mesmo que o regime português deve apoiar e incrementar o seu radicalismo, incluindo a ‘guerra santa’.
Comenta então o responsável, que parece ser um conhecedor da realidade islâmica: ‘Sob o ponto de vista religioso, constatou-se nesta primeira reunião que do grupo faziam parte alguns sunitas, facto que se reveste de certa importância, visto que a população das ilhas pertencem na sua maioria a esta escola’.
‘Inicialmente tinha-se julgado que o grupo zanzibarita a contactar seria todo pertencente à escola ibadita, mais ligado portanto à família do sultão e a Oman. Tal facto permite encaminhar no plano interno e internacional (sublinhado nosso) a campanha sob a tonalidade mais vasta de Jihad – ‘guerra santa’, em oposição ao continente e em defesa do Islão’.
‘Chama-se ainda a atenção para a identidade existente entre o sunismo nas ilhas e a mais forte escola corânica de Moçambique. A tradicional solidariedade islâmica e o espírito da comunidade internacional (UMMA) parece ser portanto um factor a aproveitar nesta luta, pois a posição a tomar face aos interesses do islamismo no Índico pode captar a simpatia de diversas nações árabes, nomeadamente a Líbia’.
‘Neste aspecto, os contactos estabelecidos poderão ser úteis, porque mais uma vez poderão esclarecer certas nações árabes sobre a nossa actual política islâmica em Moçambique’, assim reza o relatório do regime marcelista.

Na pasta existente no ANTT não foram disponibilizados mais documentos sobre a ‘OPERAÇÃO MECA’, desconhecendo-se se existem mais dados ou se teve continuidade. Recorde-se que, um anos depois, o regime de Marcelo Caetano foi derrubado pelo 25 de Abril de 1974.
Curiosamente, cerca de uma década antes da Administração norte-americana de Ronald Reagan ter recorrido e incrementado uma ‘aliança’ com o islamismo religioso islâmico para derrubar o poder soviético no Afeganistão em nome da defesa da ‘civilização ocidental’, o regime ditatorial português de Marcelo Caetano já estava alancar ‘as orientação teóricas’ dessa política, cujo desfecho se está a virar, actualmente, contra o próprio Ocidente.





Revista ‘FOCUS’ – n.º 341 – De 26 de Abril de 2006 (Pág.s 96 a 98)
слава Україна!

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