Primeiro combate naval no Brasil

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Primeiro combate naval no Brasil
« em: Setembro 30, 2004, 04:31:01 pm »
O primeiro combate naval no Brasil  

Guilherme Poggio

O relato das três primeiras expedições portuguesas ao Brasil informava ao rei de Portugal, D. Manoel, que além de árvores de pau-brasil, nada mais havia de proveito. Naquele momento, as viagens para a Índia mostravam-se muito lucrativas e a coroa portuguesa voltou seus recursos principais para o comércio com as colônias do Oriente. O Brasil não ficou esquecido, apenas colocado em segundo plano e arrendado para um consórcio de comerciantes portugueses de pau-brasil, liderados por Fernando de Noronha.

A existência de pau-brasil nas terras recentemente descobertas por Portugal repercutiu muito na Normandia, um dos principais pólos têxteis da época. Sabendo da existência de um vasto território abundante em pau-brasil e fracamente defendido, os mercadores privados no norte da França (Bretanha e Normandia) decidiram organizar expedições para a colônia lusitana. Até então o governo francês de Luís XII pouco interviu na ação dos corsários de seu reino. A política oficial francesa começou a mudar com a subida ao trono do Rei Francisco I em 1515. Opositor ferrenho do Tratado de Tordesilhas, partilha territorial feita em 1494 entre Portugal e Espanha, forças do rei passaram a atacar possessões espanholas por todo o globo. Além disso, rompeu acordos e tratados que tinha com Portugal em 1524 e passou a questionar a legitimidade deste país em relação ao Brasil. Contando com apoio governamental, os corsários franceses passaram a agir no litoral brasileiro de forma mais intensa, inclusive atacando feitorias portuguesas aqui instaladas.

Espanhóis e franceses se encontram no litoral da Bahia

Em julho de 1525, uma frota espanhola partiu do porto de Sevilha com o objetivo de refazer a viagem de Fernando de Magalhães até as Ilhas Molucas (Oceano Pacífico), contornando o extremo Sul da América (posteriormente denominado estreito de Magalhães). Ao se aproximar da entrada do estreito, em pleno inverno austral, a frota foi surpreendia pelo clima rigoroso. A nau São Gabriel, comandada por D. Rodrigo de Acuña, se separou das demais e seguiu rumo Norte pelo litoral brasileiro. Ao atingir o litoral nordestino, parou junto à foz de um rio situado nas proximidades do paralelo 10º S para reparar seu navio.  

No dia 21 de outubro de 1526, a nau de D. Rodrigo estava sendo reparada quando foi surpreendida por um ataque dos franceses. Sem poder se defender, D. Rodrigo embarcou num batel com outros sete homens afim de resolver a questão diplomaticamente. Neste meio tempo, os homens que permaneceram a bordo da São Gabriel tomaram a embarcação e fugiram. D. Rodrigo e seus homens foram aprisionados pelos corsários franceses durante trinta dias. Ao partirem, abandonaram o capitão espanhol com o seu batel. Sem víveres e com poucos remos. D. Rodrigo e seus homens remaram rumo norte, até encontrarem a feitoria portuguesa de Pernambuco. Lá permaneceram.

A armada guarda-costa

Quando Cristovão Jaques retornou de sua segunda viagem ao Brasil, ficou sabendo do falecimento do Rei D. Manoel. A morte do rei reduziu o prestígio do navegador junto à corte. Jaques procurou por diversas vezes D. João III, sucessor de D. Manoel, para que este financiasse uma nova viagem ao Brasil. Mas o novo rei não lhe deu ouvidos. O monarca mudou de idéia quando o embaixador português na França comunicou-lhe sobre os preparativos franceses para uma viagem à costa brasileira. D. João III mandou preparar uma "armada guarda-costa". Para comandá-la, escolheu Cristovão Jaques,  homem duro, sem escrúpulos e que conhecia bem a costa brasileira.

 A frota comandada por Jaques não era das maiores, mas impunha respeito. Compunha-se de uma nau e cinco caravelas. No meio do caminho, uma das caravelas foi enviada para a Guiné. Os cinco navios restantes seguiram para o Brasil. Ao aportar na feitoria de Pernambuco, Jaques encontrou o espanhol D. Rodrigo. Este lhe informou do ataque que havia sofrido por parte dos corsários franceses um pouco mais ao Sul. Antes de partir para a caça aos corsários, Jaques mandou carregar a nau Hieros com pau-brasil. Enquanto a nau era carregada, uma das caravelas foi enviada em missão de reconhecimento. Algumas informações dão conta de que, ao retornar, a caravela trouxe notícias de uma suposta troca de tiros entre a nau São Gabriel e os corsários franceses na Baía de Todos os Santos. Caso o combate realmente tenha acontecido (narrado posteriormente por D. Rodrigo em sua carta a Cristovão de Haro), este foi o primeiro combate naval em águas brasileiras. No entanto, pouco ou nenhum significado teve para o futuro da colônia ou para a coroa portuguesa.

Após a partida da Hieros, Jaques seguiu para Sul com uma esquadra composta  por quatro caravelas. Disposto a encontrar e afundar as embarcações francesas o português tinha o fator surpresa ao seu lado, além de conhecer o número de naves inimigas. O encontro entre as duas frotas ocorreu em fins de julho de 1527 no litoral baiano. Numericamente o combate estava equilibrado pois a esquadra francesa também era composta por quatro embarcações. Para a surpresa de Jaques, a quarta embarcação da frota francesa era exatamente a caravela que ele havia enviado para a Guiné.

A esquadra portuguesa atacou os corsários de forma impiedosa. Os combates foram violentos e duraram um dia inteiro. Entre os invasores, muitos tripulantes morreram. Possivelmente mais de uma centena, incluindo os pilotos. Os navios franceses estavam quase indo a pique quando muitos marinheiros os abandonaram e se refugiaram em terra. Um grupo se entregou aos portugueses. Conforme o relato de alguns sobreviventes, Jaques mandou enforcar uma parte. Outros foram enterrados até os ombros e tiros de espingarda foram disparados. No final, Jaques ainda conseguiu capturar um galeão de nome Leynon de Saint Pol de Leon e o conduziu até Pernambuco juntamente com alguns prisioneiros.

Reflexos do Combate

Os franceses capturados foram enviados para Portugal, onde permaneceram presos e foram condenados à morte. O grupo que se refugiou em terra foi posteriormente resgatado (possivelmente por outros navios franceses) e repatriado. Ao chegarem na França, relataram ao rei Francisco I sobre as brutalidades sofridas e as crueldades com que foram tratados. Uma carta de protesto foi enviada a D. João III, exigindo o pagamento de reparações. O rei de Portugal negociou por seis semanas com os franceses mas não fez concessões. No entanto, Cristovão Jaques, que já não gozava de tanto prestígio na corte como no reinado anterior, foi destituído de seu cargo em função das acusações de crueldade cometidas com os prisioneiros.

O combate de julho de 1527 seria o primeiro de muitos outros entre Portugal e a França pela costa brasileira. Os franceses só seriam definitivamente expulsos da colônia no século seguinte, quando se retiram do Maranhão.

Fonte: Poder Naval OnLine (http://www.naval.com.br/)
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